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“Uma boa Igreja tem que ter grande amor aos pobres”, afirma Fernando Altemeyer

25/02/2019

Entrevistas

A Doutrina Social da Igreja é o tema da quarta entrevista da série especial sobre a CF 2019. Para abordar o tema, conversamos com Fernando Altemeyer Junior, chefe do Departamento de Ciência da Religião da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Segundo o texto-base da CF, “A Doutrina Social da Igreja evidencia a necessidade de uma participação ativa e consciente dos cristãos leigos e leigas na vida da sociedade, sendo esse um de seus princípios permanentes”. Para o especialista, a preocupação social da Igreja nasce do exemplo de Jesus Cristo. “Olhar para os pequenos é a maneira de ser da Igreja”, afirma.

Confira a entrevista concedida a Frei Gustavo Medella:

Site Franciscanos – De que maneira a preocupação social se faz e se fez presente na vida da Igreja desde o seu início?

Fernando Altemeyer Jr. – Precisamos ir ao coração de Jesus para entender que a preocupação com os irmãos é o coração do Evangelho. Está na oração do Pai Nosso. Tudo nasceu da encarnação de Jesus, ao voltar-se para os mais pobres. Ele mesmo era pobre, mas não miserável. Ele era um carpinteiro, um operário qualificado, mas vivia cercado dos mais simples e mais pobres, zelando pela vida dos camponeses, desempregados, de pessoas doentes. Essa preocupação com o simples, o pobre, o último já nasceu da própria experiência de Jesus. A Igreja, no seu início, tem o exemplo de Paulo e os demais apóstolos, como Pedro e Tiago, que ficaram em Jerusalém. Eles andavam pelo mundo e tinham essa preocupação. É só ver as cartas de Paulo aos Gálatas, a preocupação de Tiago numa das cartas apostólicas que fala mais forte na defesa dos pobres. Essa preocupação social nasceu com a Igreja, é uma espécie de pedra de toque da Igreja. Uma boa Igreja tem que ter grande amor aos pobres. Não é somente uma questão moderna, vem lá dos Profetas, da Igreja primitiva. Olhar para os pequenos é a maneira de ser da Igreja. Essa é a nossa maneira de viver a religião!

Site Franciscanos – Em termos mais específicos, quando se começa a utilizar o termo Doutrina Social da Igreja?

Fernando Altemeyer Jr. – No passado, a Igreja sempre falou em favor dos pobres. Todo mundo se lembra de São Francisco de Assis. Mas voltando no tempo, lembramos de Gregório de Nisa, São Vicente de Paulo. Sempre veremos alguém pregando um ensino social em nome da Igreja, das Dioceses e Congregações. Em 15 de novembro de 1891, o Papa Leão XIII escreveu a Encíclica “Rerum Novarum: sobre a condição dos operários”, que se tornou o primeiro documento da Doutrina Social da Igreja (DSI). Os outros Papas seguiram aprofundando os temas, como Pio XI, São João XXIII e agora o Papa Francisco. Isso construiu uma espécie de corpo do ensino da Igreja, como se fosse uma pequena biblioteca, que trata do pensamento social, o que a Igreja pensa sobre política, economia, agricultura, meio ambiente. Ou seja, grandes temas da sociedade. Estamos esperando que o Papa Francisco lance, quem sabe, mais uma Encíclica Social, a última foi a Laudato Si’. Mas agora é esperado que ele lance uma falando, por exemplo, dos refugiados, da acolhida destas pessoas. A Doutrina Social é viva, ela começou lá atrás, em 1891, e vai se aprofundando. Alguns preferem até chamar de Ensino Social da Igreja, mas ficou famosa como Doutrina Social da Igreja. Hoje é uma disciplina em todas as faculdades de Teologia. Todos que estudam Teologia aprendem sobre isso.

Site Franciscanos – Quais são as fontes em que as pessoas podem se basear, buscar mais conhecimento sobre a Doutrina Social da Igreja?

Fernando Altemeyer Jr. – A primeira fonte importante é pegar o texto-base da Campanha da Fraternidade. Há um capítulo todo inspirado na DSI. É um belo resumo sobre o tema da Fraternidade e Políticas Públicas. Para quem quer começar com um pequeno aperitivo, este já é bom. A segunda grande fonte são os documentos dos Papas, começando com a “Rerum Novarum” e seguindo com a Encíclica “Quadragesimo anno” (do Papa Pio XI, publicada em 15 de maio de 1931), Carta Apostólica “Octagesima Adveniens” (de São João XXIII, de 1961), todas disponíveis em português. Uma terceira fonte é o Compêndio de DSI, que é um resumo bem feito de todo pensamento da Igreja Católica sobre o tema. E, por último, sem dúvida, vale a pena ler os documentos da CNBB que tratam da questão social. Há sobre política social, reforma agrária, meio ambiente e recentemente os documentos e pronunciamentos dos bispos sobre as questões sociais importantes, como por exemplo, este desastre e crime que aconteceu em Brumadinho. Os bispos se pronunciam sobre a questão social. É bom que o católico esteja por dentro disso e possa refletir e apoiar o pensamento. As principais fontes são os documentos papais, mas também há textos importantes lançados em cada país, às vezes por uma Conferência Episcopal ou mesmo uma Congregação. É bom o católico estar sintonizado com estas notas e falas, para ele também estar bem informado sobre o pensamento da sua Igreja.

Site Franciscanos – Que avaliação o sr. faz do pontificado do Papa Francisco em relação à DSI?

Fernando Altemeyer Jr. – Como um homem que veio de um país de Terceiro Mundo, ele é um Papa bastante vinculado a esta questão. Em sua vida, teve essa sensibilidade, sempre esteve nas favelas de Buenos Aires, ao lado dos imigrantes, na defesa das mulheres, dos simples, dos pobres. Era sua missão, então essa já é uma característica da personalidade dele. Ele contribuiu muito na DSI com a Encíclica Laudato Si’, um documento belíssimo. Ali ele trata da chamada ecologia integral. Estamos interligados na defesa do planeta, da causa comum, para que não haja tanto desastre, desrespeito e morte de animais, de florestas, do meio ambiente e de seres humanos. Acho que o Papa Francisco está dando um show, estou feliz da vida com este Papa. Embora às vezes ele não tenha muito apoio da gente da própria Igreja, que fica em cima do muro, hibernando. Ele vai para frente, tem um olho de águia, procura ver as pessoas em necessidade e colocar toda Cúria Romana em favor dos últimos. Na Itália, por exemplo, ele defende os migrantes, mesmo que o Ministro da Itália seja contra ele. Nas Viagens Apostólicas, ele faz questão de estar com as pessoas que estão em situação de vulnerabilidade, para mostrar o lugar da Igreja, que é ao lado dos últimos, dos fracassados, dos perdedores, garantindo a esperança. Essa é sua grande contribuição. Na prática e também na parte teórica ou normativa, como na Encíclica Laudato Si’, que é uma preciosidade.

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Confira todas as entrevistas:

Tema e Lema da CF | Entrevistado:     Dom Leonardo Ulrich Steiner

Bispo Auxiliar de Brasília e secretário-geral da CNBB.

Conceito de Políticas Públicas | Entrevistado: Robert Soares do Nascimento

Agente de Pastoral, compõe o Núcleo em Educação e Direitos Humanos da UNISAL (Centro Universitário Salesiano de São Paulo) e participa do Grupo de Trabalho de Justiça Restaurativa da Comarca de Americana (SP).

Política como exercício do bem comum | Entrevistado: Felix Fernando Siriani

Formado em Gestão de Políticas Públicas, especialista em Pedagogia Social, Pastoral Escolar e mestrando em Mudança Social e Políticas Públicas.

Doutrina Social da Igreja | Entrevistado: Prof. Dr. Fernando Altemeyer Junior

Chefe do Departamento de Ciência da Religião da PUC-SP.

As ações e ensinamentos de Jesus como inspiração para políticas em favor da cidadania | Entrevistado: Francisco Orofino

Leigo, professor de Teologia Bíblica em Nova Iguaçu (RJ) e assessor do CEBI (Centro de Estudos Bíblicos) e do ISER Assessoria (Instituto de Estudos da Religião).

Os franciscanos e o engajamento político | Entrevistado: Frei Vitorio Mazzuco

Mestre em espiritualidade e coordenador da Pastoral Universitária da USF.

A importância dos Movimentos Sociais na busca do bem comum | Entrevistado: Dom Guilherme Werlang

Bispo da Diocese de Lages (SC) e presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Social Transformadora da CNBB.

Políticas Públicas na área da saúde | Entrevistado: Fernando Pigatto

Presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e Representante da Confederação Nacional das Associações de Moradores (CONAM).

Políticas Públicas na segurança | Entrevistado: Ricardo Bedendo

Jornalista e Mestre em Ciências Sociais, integra o núcleo de Estudos de Violência e Direitos Humanos da Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

Políticas Públicas e Assistência Social | Entrevistada: Rosangela Pezoti

Doutora em Serviço Social, responsável pelas áreas técnica e de articulação política do Sefras – Serviço Franciscano de Solidariedade.

Políticas Públicas em favor dos negros | Entrevistado: Frei David Raimundo Santos

Presidente da Educafro (Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes).

Importância da participação nos espaços de controle social | Entrevistada: Valdênia Paulino

Advogada, integra o Centro de Direitos Humanos de Sapopemba (SP)

Políticas Públicas em favor dos índios e dos povos originários | Entrevistado: Egon Heck

Assessor do secretariado do Conselho Indigenista Missionário – Cimi.

Políticas Públicas e Juventude | Entrevistada: Anna Luiza Salles Souto

Coordenadora da área de Democracia e Participação do Instituto Pólis.

Políticas Públicas e na área da educação | Entrevistado: Professor Dilnei Lorenzi

Pró-Reitor de Ensino, Pesquisa e Extensão da Universidade São Francisco (USF).

Saúde e o bem comum | Entrevistado: Pe. Christian de Paul de Barchifontaine

Assessor Internacional dos Camilianos na Área da Saúde, Relações Públicas das Organizações Camilianas.

O exemplo concreto no Rio de Janeiro | Entrevistado: Adriano de Araújo

Sociólogo, coordenador do Fórum Grita Baixada.