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Juventudes: Por mais políticas que promovam igualdade de oportunidades

05/04/2019

Entrevistas

A socióloga Anna Luiza Salles Souto, coordenadora da área de Democracia e Participação do Instituto Pólis desde 1996, fala nesta Série Especial da Campanha da Fraternidade – que este ano aborda  o tema “Fraternidade e Políticas Públicas” – sobre as especificidades das Políticas Públicas para a juventude.

 Em entrevista a Frei Gustavo Medella, Ana Luiza parabenizou a CNBB pela escolha do tema “Fraternidades e Políticas Públicas”, que é estratégico, segundo ela, especialmente nesta conjuntura em que o país está atravessando, quando está na agenda de discussões se vamos garantir e ampliar os direitos ou se vamos restringir, tudo isso num país marcado por profundas desigualdades.

 Para Ana Luiza, há um longo caminho a percorrer tendo em vista os direitos das juventudes no país, mesmo se levando em conta o Estatuto da Juventude criado em 2013. Para ela, falar em políticas públicas para a juventude é também falar em formação dos gestores, é falar de quem aplica as políticas públicas para tratar dessa diversidade da juventude.

 Ana Luiza coordenou o Instituto Pólis de 2006 a 2011, uma ONG (Organização Não Governamental) de atuação nacional e internacional, fundada em 1987, com o objetivo de atuar na construção de cidades justas, sustentáveis e democráticas, por meio de pesquisas, assessoria e formação que resultem em mais políticas públicas e no avanço do desenvolvimento local.

 Para ajudar na compreensão do tema, a Província Franciscana da Imaculada Conceição, através da Frente de Evangelização da Comunicação, produziu esta série de entrevistas abordando diversos aspectos das Políticas Públicas e suas áreas de atuação.

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JUVENTUDES

Para falar sobre esse tema, acho importante iniciar pontuando algumas questões. Primeiramente, a juventude é plural e heterogênea. Por isso que hoje em dia se fala em juventudes, no plural. De quem estamos falando? Dos jovens que são cerca de 1/4 da população do país. E o que chamamos de juventudes são os jovens que estão entre 15 e 29 anos de idade, conforme estabelecido no Estatuto da Juventude.

Esta fase da vida é vivida de forma bastante desigual, a depender da classe social do (da) jovem, da raça, gênero, identidade de gênero, orientação sexual, diferenças de territórios, se o jovem mora na área urbana ou rural, e por aí vai. Então, não há uma única juventude. Por exemplo, jovem de alta renda, branco, morador de bairros bem equipados, vivenciam a juventude de uma forma completamente diferente quando comparado ao jovem negro, morador das periferias e favelas das regiões metropolitanas.

DESIGUALDADES PROFUNDAS

Só para se ter uma ideia, foi feita uma pesquisa em 2013 que se chama “Agenda juventude Brasil” e essa pesquisa abordou uma série de temas, mostrando que 54% dos jovens negros declararam já ter perdido algum amigo ou parente de forma violenta contra 45% dos jovens brancos. O  “Atlas da Violência” também registra essas desigualdades. Por exemplo, o risco relativo de uma jovem negra ser vítima de homicídio é duas vezes maior do que uma jovem branca. A chance de o jovem negro ser assassinado é quase três vezes superior a do jovem branco. Então, estamos falando de desigualdades profundas. Sobretudo, essa questão do recorte de raças, que não é recorte, mas uma questão estrutural das desigualdades no Brasil. Por qualquer lente que se olhar, os jovens negros têm os piores indicadores. Educação, trabalho, violência, enfim, a primeira questão é essa: não há uma única juventude. Esse período é vivido de forma desigual a depender daqueles critérios.

ESPECIFICIDADES

A juventude é vista também como uma coisa meio passageira entre esse e o mundo adulto e, portanto, não precisa ter especificidade. Ela vai se tornar adulta, portanto, temos de jogá-la nas políticas do mundo adulto. Não. O período da juventude é um momento importante na vida de crescentes conquistas de autonomias, construção e experimentação de seus projetos de vida e, enquanto tal, isso tem especificidades, necessidades, demandas que precisam de respostas via políticas públicas. Então, falar em juventude tem que falar nas especificidades deste momento de vida.

A juventude é que mais sofre os dilemas na nossa sociedade. Antropóloga Regina Novaes até fala que a juventude é um espelho agigantador dos dilemas da sociedade. Quando aumenta o desemprego, é o jovem que aparece como o que tem maior índice de desemprego, a violência recai sobre o jovem. Então, acho que tem duas questões que são importantes quando a gente fala em juventude e política pública. O Estatuto da Juventude, que é uma lei aprovada em 2013, estabelece direitos dos jovens e diretrizes de políticas públicas para a juventude. Políticas para assegurar direitos desta juventude diversa e plural. Bom, dos princípios que regem as Políticas Públicas, queria destacar dois.

Primeiro é que as políticas têm que ser voltadas para a promoção da autonomia dos jovens. Autonomia no sentido de municiá-los das ferramentas para construir suas trajetórias de vida, de forma autônoma, com liberdade e não que eles tenham, e elas tenham, uma trajetória de vida e escolham o compulsório: nasceu pobre, vai trabalhar como pedreiro; nasceu pobre e negro, vai trabalhar como doméstica. Isso é um absurdo. Então, as Políticas Públicas têm que abrir um leque de oportunidades para que a juventude, sobretudo a juventude pobre e negra da periferia possa ter, fazer suas opções de forma não compulsória.

SUJEITO DE DIREITOS

Outra coisa que o Estatuto tem como princípio é o reconhecimento do jovem como sujeito de direitos. Direitos universais e singulares que atendem à demanda nesse momento da vida. Sobre esse reconhecimento de jovens como sujeitos de direitos, estamos falando de inclusão, de liberdade de expressão, de organização, de escolhas e participação ativa da juventude na vida social, política e econômica do país e estamos falando aqui de participação nos espaços decisórios. A juventude, digamos assim, sofrendo sobremaneira os dilemas da sociedade, tem que ser ouvida, tem que ser respeitada e tem que participar das decisões do país. Há uma diferença geracional grande e aí acho que a juventude tem potência para apresentar novas saídas, novas propostas, para velhos problemas.

Bom, dentro dos direitos que o Estatuto defende ou estabelece, eu queria destacar três:  O direito na participação, formulação, tramitação e avaliação das políticas públicas. E nós estamos falando tanto da participação individual quanto da coletiva, via suas organizações e seus movimentos. Isso pressupõe a livre associação dos jovens e a sua liberdade de expressão. Inclusive, o primeiro direito do Estado da juventude é o direito à participação. Queria destacar também o direto à diversidade e à igualdade de direito de oportunidades. E aqui nós estamos falando da não discriminação por raça, etnia, religião, cultura, sexo, orientação sexual, opiniões, a questão de jovens com deficiência. E aí o Estatuto estabelece que cabe ao Poder Público assegurar, via programas, políticas, a igualdade de direitos de jovens de todas as raças, etnias com relação à vocação, trabalho, cultura, saúde, segurança, acesso à justiça e tal.

FORMAÇÃO

E uma coisa bastante importante para destacar neste momento que estamos vivendo é que o Estatuto coloca, como orientação para o Poder Público, a inclusão de temas sobre questões étnicas, raciais, de deficiência, orientação sexual, gênero, violência doméstica e sexual contra a mulher e que têm que estar na formação, têm que compor o rol de questões que são abordadas na formação de profissionais da saúde, da segurança pública, da educação e dos operadores do Direito. Ou seja, falar em políticas públicas para a juventude é também falar em formação dos gestores, falar de quem aplica as políticas públicas para tratar dessa diversidade da juventude. E aí queria falar também sobre a questão do direito à segurança pública e o acesso à justiça, que é também um direito elencado no Estatuto da Juventude, que fala do direito dos jovens e das jovens de viverem num ambiente seguro para o seu pleno desenvolvimento.

Eu destacaria esses três direitos que estão mais na ordem do dia. Respondem, inclusive, às questões que estão sendo debatidas nesse momento. Mas também fala-se em direito à saúde, com especificidade da juventude, direito à cultura, direito à comunicação, trabalho, enfim uma série de direitos.

Enfim, falar em políticas públicas para a juventude é falar em políticas que promovam a igualdade de oportunidades entre as juventudes.

ESPECIAL SOBRE A CAMPANHA DA FRATERNIDADE


Ouça a entrevista:


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Bispo Auxiliar de Brasília e secretário-geral da CNBB.

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Política como exercício do bem comum | Entrevistado: Felix Fernando Siriani

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Chefe do Departamento de Ciência da Religião da PUC-SP.

As ações e ensinamentos de Jesus como inspiração para políticas em favor da cidadania |Entrevistado: Francisco Orofino

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Jornalista e Mestre em Ciências Sociais, integra o núcleo de Estudos de Violência e Direitos Humanos da Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

Políticas Públicas e Assistência Social | Entrevistada: Rosangela Pezoti

Doutora em Serviço Social, responsável pelas áreas técnica e de articulação política do Sefras – Serviço Franciscano de Solidariedade.

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Importância da participação nos espaços de controle social | Entrevistada: Valdênia Paulino

Advogada, integra o Centro de Direitos Humanos de Sapopemba (SP)

Políticas Públicas em favor dos índios e dos povos originários | Entrevistado: Egon Heck

Assessor do secretariado do Conselho Indigenista Missionário – Cimi.

Políticas Públicas e Juventude | Entrevistada: Anna Luiza Salles Souto

Coordenadora da área de Democracia e Participação do Instituto Pólis.

Políticas Públicas e na área da educação | Entrevistado: Professor Dilnei Lorenzi

Pró-Reitor de Ensino, Pesquisa e Extensão da Universidade São Francisco (USF).

Saúde e o bem comum | Entrevistado: Pe. Christian de Paul de Barchifontaine

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O exemplo concreto no Rio de Janeiro | Entrevistado: Adriano de Araújo

Sociólogo, coordenador do Fórum Grita Baixada.