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O que são e como funcionam as Políticas Públicas?

18/02/2019

Entrevistas

A Campanha da Fraternidade deste ano traz à reflexão o tema das Políticas Públicas. Para compreendê-lo, a Província Franciscana da Imaculada Conceição, através da Frente de Evangelização da Comunicação, produziu uma série de entrevistas abordando diversos aspectos das Políticas Públicas e suas áreas de atuação.

Na segunda entrevista da série, o agente de Pastoral Robert Soares do Nascimento, que compõe o Núcleo em Educação e Direitos Humanos da UNISAL (Centro Universitário Salesiano de São Paulo) e participa do Grupo de Trabalho de Justiça Restaurativa da Comarca de Americana (SP), fala sobre este tema.

Acompanhe a entrevista concedida a Frei Gustavo Medella.

Site Franciscanos – Em linhas gerais, o que são Políticas Públicas?

Robert Soares do Nascimento – Podemos começar com o texto-base da Campanha da Fraternidade deste ano. O texto diz que “Políticas Públicas são ações e programas desenvolvidos pelo Estado para garantir e colocar em prática direitos que são previstos na Constituição e em outras leis”. A presença dos atores sociais – que são o Estado, a sociedade, os movimentos sociais – em sinergia, é fundamental para que as Políticas Públicas sejam adequadas à realidade. O desafio é que estes atores trabalhem de forma conjunta. Em resumo, as Políticas Públicas são ações dos diversos atores sociais envolvidos na resolução de um problema. A ausência no cumprimento de um direito a um determinado grupo ou cidadão é o problema a ser solucionado. O uso desses princípios, critérios e procedimentos podem resultar em ações, projetos ou programas para garantir os direitos previstos na Constituição e outras leis. Prefiro este conceito mais amplo, onde o Estado está presente, mas também os outros atores sociais fazem parte deste desenvolvimento das Políticas Públicas. O texto-base diz que sem a democracia e a participação da sociedade, as Políticas Públicas tendem a refletir mais a força dos agentes de mercado, de grupos políticos ou mesmo das próprias burocracias estatais. Ou seja, nós precisamos cada vez mais promover o debate, fortalecer nossa democracia, para que não fique monopolizada na mão de pequenos grupos.

Site Franciscanos – As Políticas Públicas estão relacionadas a quais temas?

Robert Soares do Nascimento – As Políticas Públicas estão relacionadas a áreas que não têm o devido cumprimento dos direitos dos cidadãos, por exemplo, o direito da criança e do adolescente, assistência social, saúde, educação, esporte, turismo, juventude, habitação, segurança, meio ambiente, alimentação, migrante. Podemos relacionar um rol de direitos estabelecidos na Constituição Federal que não são plenamente atendidos. O povo se une, através de organismos da sociedade civil, e exige o cumprimento por parte do Poder Público. Para isso, nós precisamos conhecer os nossos direitos, para que possamos exigir daqueles que estão no poder, mesmo que eles não tenham prometido. Sabemos bem que as promessas políticas passam, mas os nossos direitos devem permanecer e serem exigidos.

Site Franciscanos – A implementação das Políticas Públicas é uma responsabilidade do governo e do Poder Público?

Robert Soares do Nascimento – Ao Poder Público cabe o ônus, ele tem a incumbência de realizar e efetivar estas Políticas Públicas, que são inclusive previstas em lei. Para isso, deve haver investimento, cotação orçamentária, caminhos para algumas parcerias. As Políticas Públicas têm um caráter técnico e, ao mesmo tempo, político. Por isso, o Poder Público assume esse ônus e dá continuidade com aquele que é responsável pelo povo no cumprimento das leis. Pode-se dizer que há duas formas dessa implementação. A primeira delas é o modelo “top down”, de cima para baixo e o modelo de baixo para cima. O “top down” é um conceito mais tradicional, de trabalho administrativo, relacionado à base hierárquica, à autoridade e ao controle do Estado. Já no modelo que vem da base para cima, considera-se que para se construir a Política Pública é preciso ir devagar, ouvir, considerar as regras, procedimentos, estruturas daquele problema que você quer resolver, envolver a população, ver o interesse público, os movimentos sociais, ouvir a sociedade civil organizada e dar oportunidade para que, de fato, a participação aconteça. O processo de identificação, tomada de decisões, implementação do plano e avaliação pedirão um acompanhamento e a participação dos demais atores sociais. Não só do agente público, mas todos que têm interesse naquela demanda.

Site Franciscanos – Qual o percurso de nascimento de uma Política Pública?

Robert Soares do Nascimento – O modelo citado no texto-base da CF parte da identificação de um problema, ou seja, a detecção da ausência da eficácia de um direito. O povo, ou um grupo social, tem um direito e ele não foi atendido. A partir da identificação do problema é que começa o processo de formulação das Políticas Públicas. Um determinado grupo social demonstra uma insatisfação legítima, a partir do não cumprimento de uma lei. A partir daí, esse problema passa a ser um problema social. Dessa forma, teremos o interesse do agente público, dando espaço para a mobilização das Políticas Públicas. Após essa identificação, é necessário saber se esta demanda será ou não resolvida pelo Estado. Em caso positivo, passa-se à etapa da formulação, sempre em consonância com os demais atores sociais envolvidos. Vale destacar que, para o Poder Público, esse processo de envolvimento com os outros atores sociais é trabalhoso. A partir do momento em que você envolve a escuta e permite até uma governança na sua administração, tem-se muito mais trabalho, é preciso haver escuta e o processo se torna mais lento. No entanto, acreditamos que isso gera uma eficácia muito maior àquilo que venha se tornar Política Pública implementada.

Site Franciscanos – De que modo as Políticas Públicas estão presentes na vida das pessoas?

Robert Soares do Nascimento – As pessoas confundem muito política com Políticas Públicas. Elas estão relacionadas, mas existe uma diferença. As Políticas Públicas são abrangentes, pois tratam da busca de nossos direitos, de modo especial, os direitos retirados. Isso está muito claro no texto da CF, os direitos retirados dos mais pobres, que são a presença de Cristo. Quando os direitos do povo são retirados, estamos renegando a presença de Jesus nestas pessoas. Como brasileiros, deveríamos lutar para que as Políticas Públicas fossem de Estado e não de governo. Porque o tempo do governo, quatro anos ou oito, em caso de reeleição, é um tempo muito curto para essa política acontecer. Quando ela é de Estado, pode mudar o governo, que a lei está posta, a não ser que o novo governo mude a lei. A política de Estado tem muito mais força.

Site Franciscanos – Por que as pessoas devem se envolver nestas questões?

Robert Soares do Nascimento – A Doutrina Social da Igreja nos provoca para a necessidade de uma participação ativa e consciente do cidadão. Um governo verdadeiramente democrático é definido, além da eleição, também no envolvimento de todos os sujeitos da sociedade civil, em seus diversos níveis, de modo que todos sejam informados e ouvidos no que se refere ao bem comum, num processo de democracia participativa. Acho que essa é a luta do povo, do nosso cotidiano. A participação nas Políticas Públicas faz com que não percamos o espaço. Será uma luta grande, pois, aos olhos do povo, percebemos que as coisas estão caminhando para um tempo nebuloso. Por exemplo, recentemente foi assinado um decreto pelo Poder Executivo Nacional, ferindo a Lei da Transparência. Não sabemos a que ponto vai piorar, mas o certo é que a ação feriu a lei. Isso é grave, devemos lutar para que isso não aconteça. A situação em que vivem os pobres é critério para medir a bondade, justiça, moralidade e efetivação da ordem democrática. “Os pobres são os juízes da vida democrática de uma nação”, reforça o texto da CF. Quando falamos em direitos, vemos o quanto esse tema é presente em nosso cotidiano. Por exemplo, na saúde. A implementação do Sistema Único de Saúde (SUS) foi uma conquista de anos de luta e desenvolvimento de uma política pública decente. Nós temos a clareza de que a maioria da população não pode pagar um plano de saúde, e mesmo que pudesse pagar. A saúde é um direito constitucional! Os espaços de participação são fundamentais, o desenvolvimento dos conselhos, conferências, movimentos sociais, fazem diferença para que as pessoas se conscientizem que as Políticas Públicas estão no nosso dia a dia.

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Confira todas as entrevistas:

Tema e Lema da CF | Entrevistado:     Dom Leonardo Ulrich Steiner

Bispo Auxiliar de Brasília e secretário-geral da CNBB.

Conceito de Políticas Públicas | Entrevistado: Robert Soares do Nascimento

Agente de Pastoral, compõe o Núcleo em Educação e Direitos Humanos da UNISAL (Centro Universitário Salesiano de São Paulo) e participa do Grupo de Trabalho de Justiça Restaurativa da Comarca de Americana (SP).

Política como exercício do bem comum | Entrevistado: Felix Fernando Siriani

Formado em Gestão de Políticas Públicas, especialista em Pedagogia Social, Pastoral Escolar e mestrando em Mudança Social e Políticas Públicas.

Doutrina Social da Igreja | Entrevistado: Prof. Dr. Fernando Altemeyer Junior

Chefe do Departamento de Ciência da Religião da PUC-SP.

As ações e ensinamentos de Jesus como inspiração para políticas em favor da cidadania |Entrevistado: Francisco Orofino

Leigo, professor de Teologia Bíblica em Nova Iguaçu (RJ) e assessor do CEBI (Centro de Estudos Bíblicos) e do ISER Assessoria (Instituto de Estudos da Religião).

Os franciscanos e o engajamento político | Entrevistado: Frei Vitorio Mazzuco

Mestre em espiritualidade e coordenador da Pastoral Universitária da USF.

A importância dos Movimentos Sociais na busca do bem comum | Entrevistado: Dom Guilherme Werlang

Bispo da Diocese de Lages (SC) e presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Social Transformadora da CNBB.

Políticas Públicas na área da saúde | Entrevistado: Fernando Pigatto

Presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e Representante da Confederação Nacional das Associações de Moradores (CONAM).

Políticas Públicas na segurança | Entrevistado: Ricardo Bedendo

Jornalista e Mestre em Ciências Sociais, integra o núcleo de Estudos de Violência e Direitos Humanos da Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

Políticas Públicas e Assistência Social | Entrevistada: Rosangela Pezoti

Doutora em Serviço Social, responsável pelas áreas técnica e de articulação política do Sefras – Serviço Franciscano de Solidariedade.

Políticas Públicas em favor dos negros | Entrevistado: Frei David Raimundo Santos

Presidente da Educafro (Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes).

Importância da participação nos espaços de controle social | Entrevistada: Valdênia Paulino

Advogada, integra o Centro de Direitos Humanos de Sapopemba (SP)

Políticas Públicas em favor dos índios e dos povos originários | Entrevistado: Egon Heck

Assessor do secretariado do Conselho Indigenista Missionário – Cimi.

Políticas Públicas e Juventude | Entrevistada: Anna Luiza Salles Souto

Coordenadora da área de Democracia e Participação do Instituto Pólis.

Políticas Públicas e na área da educação | Entrevistado: Professor Dilnei Lorenzi

Pró-Reitor de Ensino, Pesquisa e Extensão da Universidade São Francisco (USF).

Saúde e o bem comum | Entrevistado: Pe. Christian de Paul de Barchifontaine

Assessor Internacional dos Camilianos na Área da Saúde, Relações Públicas das Organizações Camilianas.

O exemplo concreto no Rio de Janeiro | Entrevistado: Adriano de Araújo

Sociólogo, coordenador do Fórum Grita Baixada.