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Entrevista Frei Gilson Kammer | A reforma da Matriz, o legado franciscano e a Igreja viva

14/10/2023

Entrevistas, Notícias

O cartão postal da cidade de Xaxim, no Sudoeste Catarinense, não pode ser fotografado e nem impresso. Desde o início do ano, os andaimes escondem a bela fachada da Matriz São Luiz Gonzaga e a previsão é que somente no ano que vem, a partir de abril (se as chuvas deixarem), é que ela estará totalmente restaurada. Aí, então, começam os trabalhos laterais de restauração.

 Segundo o pároco Frei Gilson Kammer, a previsão da conclusão das obras deverá durar três anos, ou seja, finalizando em 2025. Mas no alto de suas torres já se pode ter uma ideia de como vai ficar a Igreja Matriz. E o que se vê já enche os olhos. 

 Nesta entrevista, Frei Gilson fala da construção do templo de pedra, da Igreja viva, da sua história franciscana e da história do jovem Frei Augusto Luiz Gabriel. Acompanhe!

Site Franciscanos – O cronograma das obras de restauro da Matriz São Luiz Gonzaga está em dia?

Frei Gilson – A programação seria em torno de um ano a um ano e dois meses. Então, até abril do ano que vem seria o prazo estipulado pela empresa. Devido às chuvas que estamos tendo, já houve um pequeno atraso, talvez de um mês a dois meses. A empresa, em conversa conosco, disse que assim que melhorar o clima teria mais pessoas para as obras, mantendo com isso o prazo, que teve início em fevereiro deste ano. Juntando a parte interna, deveremos precisar de 3 anos e meio.

Site Franciscanos – Mas o piso interno já foi feito em 2019?

Frei Gilson – Sim, já foi feito o piso e uma parte da elétrica foi concluída, faltando pouca coisa para terminar o projeto elétrico. Foi comprado todo o material, só falta executar e concluir o projeto. O telhado foi refeito há 10 anos e não há necessidade de trocar. Só vai ser feita uma limpeza dos telhados, conserto das calhas para evitar as infiltrações. Então, seria mais na parte externa a recuperação. Para se ter uma ideia, está sendo tirado o reboco solto e trocando pelo novo. Depois serão aplicadas a resina com a mica [substância composta de lâminas finas, com brilho metálico, que constitui um dos elementos fundamentais do granito], e o pó de pedra. Toda essa massa aplicada está dando esta característica original, assim como a cor. Não vai tinta nenhuma. A cor natural da areia e um pouquinho do pó de mármore dá essa tonalidade mais clara. Onde está a cor cinza vai o pó de mármore preto.

 Site Franciscanos – Então está cor que já se destaca é a original?

Frei Gilson – Pegaram alguns pedaços e foram fazendo as amostras até chegar naquilo que eles consideravam o original. Pelos relatos das pessoas de mais idade e naquilo que foi obtido a partir dos estudos é o que está mais parecendo com o original novamente. Ou o mais próximo. Aos poucos, conforme vai descendo a restauração, pode-se ver o conjunto.

Site Franciscanos – Uma obra desse porte tem muitos gastos. Na questão financeira, como consegue buscar recursos?

Frei Gilson – É sempre um desafio. Todo o projeto demanda muito dinheiro, mas temos uma comissão que está à frente e ajuda muito neste processo todo, tanto do estudo, da viabilidade e necessidade da reforma e da captação de recursos. No ano passado, com a Festa de Nossa Senhora da Saúde, e também a festa de Frei Bruno, foram dois eventos que deram os maiores montantes para, vamos dizer assim, dar o pontapé inicial.  Mas também temos as doações mensais, que as pessoas vêm aqui na Secretaria fazer, podendo anotar seu nome no Livro de Ouro, a gente fez o carnê, que as pessoas podem doar mensalmente um valor que podem, além de transferências bancárias ou o PIX. No mês passado, fizemos o “Jantar Dançante” e que deu um bom retorno. De modo geral, o que move este trabalho são as doações das pessoas, tanto financeiramente como nos trabalhos para fazer isso acontecer. E já estamos programando a Festa de Frei Bruno de 2024, que vai estar na 12ª edição, nos dias 9 e 10 de março. Lançamos também o bingo, pois ganhamos um lote como primeiro prêmio de uma doação de uma família, temos os patrocínios dos valores em dinheiro – 65 mil -, de algumas empresas da cidade. Agora, temos a Festa da Saúde, um pouco menor. Todos os movimentos que estão sendo feitos, enquanto tiver esse trabalho de restauração, serão aplicados nessa finalidade. Sem deixar de lado toda a questão pastoral. A partir dos dízimos das pessoas, a gente mantém a questão pastoral e os trabalhos de evangelização. Por isso que a gente precisa das doações, das festas, para que isso seja aplicado na construção e na reforma. Mas é sempre um desafio muito grande a questão financeira nos nossos dias, mas devagarinho a gente vai fazendo acontecer.

Site Franciscanos – No início, este desafio chegou a tirar o seu sono, chegou a te assustar?

Frei Gilson – Quando eu cheguei aqui, há cinco anos, já havia essa probabilidade vinculada a uma reforma bem considerável da igreja Matriz. A partir disso, a gente começou a juntar as pessoas da comunidade, trocar ideias com engenheiros, arquitetos, até que conseguimos encontrar essa empresa –  ARS Artes Sacras -, e tivemos algumas sugestões e ideias. A partir daí se viu a viabilidade desse trabalho, mas o medo sempre existe. Uma preocupação de não conseguir cumprir não só pelos valores financeiros, mas manter o valor  histórico-cultural, que é muito grande na cidade. Então, querendo ou não, a gente tem uma visibilidade e buscar as melhores condições é sempre um desafio, uma preocupação. O medo, acho que nesse sentido, também nos ajuda a não fazer loucuras.

Site Franciscanos – E tem todo um legado franciscano nesta igreja?

Frei Gilson – Desde 15 de janeiro de 1947, que foi lançada a pedra fundamental, e antes disso, os frades sempre moraram e evangelizaram esses lados do Oeste Catarinense, quase de modo geral. Esse legado que os franciscanos, como Frei Bruno e Frei Plácido, que foram os sonhadores e incentivadores do povo a construir essa igreja e depois todos os outros frades que passaram ao longo desses 83 anos que a nossa Paróquia celebra, é justamente isso que a gente está buscando fazer. É aquilo que os frades e o povo viveram e que a gente está revivendo. Então, acho que isso também nos motiva – ao contrário de ter medo e desistir – a deixar esse legado. Envolver as pessoas da Comunidade, nesse sentido, nos ajuda também, nos dá coragem de enfrentar esses medos que temos.

Site Franciscanos – Você viveu em Colatina de 2010 a 2019, quando veio para Xaxim. Esta obra é o seu primeiro grande desafio?

Frei Gilson – Em Colatina, a gente fez a reforma tanto da Igreja quanto da Casa Paroquial, que não tínhamos e morávamos numa casa alugada. E depois, a gente fez a reforma da Igreja São Vicente e também o Centro Pastoral, que hoje é utilizado pela Paróquia Santa Clara, e também algumas comunidades do interior. Não são reformas grandes, consideráveis, mas importantes para aquele momento. Mas uma obra desse tamanho é a primeira e, por isso, a gente treme um pouco.

Site Franciscanos – E como define essa experiência em Xaxim, já que começou como presbítero no Norte do território da Província?

Frei Gilson – Em relação à minha primeira experiência em Colatina, tem uma diferença bastante grande, tanto eclesial, pastoral e cultural, principalmente. Mas ao mesmo tempo, o grande desafio da gente enquanto frade, em cada lugar, é perceber de que maneira podemos contribuir para o bem das pessoas, não só o nosso, mas fazendo esse bem, vamos dizer assim,   realizar-se nesse trabalho, nessa vocação que a gente escolheu. Nesse sentido há os desafios, mas que sempre nos ajudam, fazem com que possamos crescer humanamente e como frades também. Então, em toda a experiência em cada local que a gente está, possibilita-nos um crescimento. Há os limites, os desafios, as coisas boas que a gente pode viver e com isso,  pode-se amadurecer enquanto pessoa, enquanto frade. Acho que esse amadurecimento vamos alcançando com a caminhada. Em Xaxim, talvez também encontre isso. Então, é um pouquinho diferente do que vivi em Colatina, mas também possibilita esse crescimento humano e fraterno, vocacional nesse sentido.

Site Franciscanos – Num encontro da Frente das Paróquias, foi pedido que as paróquias assumissem mais o rosto franciscano. Podemos chamar essa Paróquia de franciscana?

Frei Gilson – É um grande desafio. Qual o diferencial, vamos dizer assim, que nós, enquanto frades e a exemplo de São Francisco de Assis, podemos colocar em prática. E aqui, desde 1903, segundo historiadores, os frades vinham de Palmas para as missões. Em 1940 foi criada a Paróquia e a Fraternidade São Luiz Gonzaga, então são mais de 80 anos oficialmente dos cuidados franciscanos. E como fazer? E aí temos dois grandes frades, Frei Plácido e Frei Bruno, que a gente já os conhece bastante e que acabam nos inspirando também. Como falei antes, os dois frades e os outros frades, as pessoas lembram com carinho deles em algum momento ou pela presença deles. Isso também nos ajuda. Acho que é nessa simplicidade, vamos dizer assim, com que os frades se colocaram e que o povo lembra, acredito que a gente pode ser tornar franciscano. Ainda mais. Tornar nossa Paróquia franciscana. É um desafio grande diante talvez daquilo que as pessoas esperam da gente, mas por vezes o franciscanismo é justamente o contrário. Como fazer o bem, não somente aquilo que as pessoas esperam e desejam da gente, mas que por vezes precisamos ir por caminhos diferentes. Então, a humildade é que a gente não pode perder. A partir daí conseguimos se aproximar das crianças, dos jovens e das famílias. Que as pessoas se sintam pessoas vivas. E a partir daí acho que é a experiência franciscana que vai fazer com que o seguimento do Cristo aconteça no modo franciscano. E pode ser o nosso diferencial enquanto frades de fazer com que a nossa Paróquia tenha uma caminhada. Isso não significa que a gente seja melhor do que os outros. Mas é diferente. Ter o carisma franciscano é um desafio pela grandeza de São Francisco e tantos que entraram na história e até os mais recentes que moraram aqui em Xaxim e, como a gente, continuam esse legado franciscano.

Site Franciscanos – Com o processo da Causa de Frei Bruno,  ele é uma inspiração mais forte?

Frei Gilson – As pessoas lembram com muito carinho de Frei Bruno. Sempre gosto de citar Frei Plácido também, porque as pessoas também têm muito carinho por ele. Os dois trabalharam juntos por dez anos e depois Frei Plácido ficou mais cinco anos aqui. Então, os dois tinham uma harmonia muito bonita e o povo percebe isso. Então, assim, é inegável que os dois continuam sendo inspiração para nós, frades, bem como para todo o povo desta Paróquia e grande incentivador desta evangelização que precisa acontecer. Então, os dois nos atualizam para nos sentirmos Igreja viva.

Site Franciscanos – E a ordenação de Frei Augusto tem um significado importante para a Paróquia, não?

Frei Gilson – Com certeza. Tornar-se a paróquia franciscana que foi a pergunta anterior é justamente isso: cada frade sentir-se irmão um do outro, a gente participar da vida do outro. E é justamente isso que o Frei Augusto nos possibilita hoje e que a gente também pode possibilitar a ele toda essa vivência de um momento único. A ordenação presbiteral é importante pessoalmente para ele, para os seus familiares, para a Comunidade da Vila Tigre, mas para toda a nossa Paróquia. Então, nessa Semana Missionária que a gente está vivendo, ela desperta um olhar diferente, um carinho pelo povo. Não só nas comunidades que foram feitas visitas, infelizmente não conseguimos passar em todas as comunidades, mas onde a gente conseguiu passar, esse carinho pode ser visto nas orações pelo bom êxito da caminhada do Frei Augusto, mas também por todos nós. Eles não falam do frei, mas dos freis. Isso mostra também o sentido comunitário, fraterno de todo o nosso trabalho. A Semana Missionária e a Ordenação do Frei Augusto se tornam também um momento bem importante para a nossa Paróquia, dentro dos eventos que ela viveu nos últimos anos, como as Missões Franciscanas da Juventude. Agora esse momento importante para o Frei Augusto é para nós também. O encontro com os jovens que a gente teve no feriado, dia 12, também acho que mostrou isso. Hoje à noite, especialmente com a presença dos coroinhas na nossa celebração. Então, mostra alguns trabalhos que estão sendo buscados na Paróquia, que indicam a simplicidade, o carinho das pessoas para com a Igreja. E não vê a Igreja como algo separado da minha vida. Então, a Igreja, o trabalho, a família, a realização pessoal de cada pessoa perpassa por isso tudo. E a Semana Missionária possibilita tudo isso.

 Site Franciscanos – Frei Augusto é fruto desse legado?

Frei Gilson – Isso. Ontem com os jovens ele deu testemunho, a partir de uma conversa ou de enxergar os frades a celebrar, passar nas famílias, ver o hábito como ele viu, e buscar isso: também eu quero ser frade. E a partir dessa conversa, desse acolhimento que um frade faz, o jovem também pode despertar esse sentido de seguimento da caminhada da vocação religiosa. E isso é um legado. O que os frades fizeram hoje também dão possibilidade de outros jovens nos enxergarem, de acolhê-los e ajudá-los bem na sua vocação.

Site Franciscanos – Como buscar o sentido de pertença e de ser Igreja com o Papa Francisco?

Frei Gilson – O desafio acho que não é só da nossa realidade de Xaxim e do Oeste Catarinense, talvez seja de tantos outros lugares. Como a gente se sentir pertencente a uma comunidade e a uma Igreja? Como eu me sinto Igreja viva? Como eu faço, como eu vivo isso tudo? Talvez pudesse ser aquilo o que me move hoje, participar de uma comunidade, de uma Igreja, não pode ser um peso. Ela precisa ser essa realização. Hoje, o Papa Francisco e todo o legado franciscano de nossa Paróquia impulsionam a sempre buscar esse sentido de pertença, que São Francisco de Assis tinha muito forte. Como eu ser uma comunidade viva? Acho que não é um desafio, mas aquilo que move os nossos passos, caminhando em busca da sinodalidade, na escuta, no acolhimento, no cuidado. Então, acho que passa por tudo isso. Ser a Igreja viva é isso. Então, não é só os frades, o bispo, o padre que são Igreja. Mas somos todos nós. Quando a gente consegue perceber com clareza, eu sou Igreja, essa é a minha Igreja, essa é minha comunidade, a realização acontece, tanto na família, como na comunidade, como no todo da nossa Igreja.


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