Capítulo das Esteiras finca bases da futura Custódia Franciscana em Angola
01/02/2024
O Capítulo das Esteiras da Fundação Franciscana da Imaculada Mãe de Deus de Angola (FIMDA) foi celebrado entre os dias 30 e 31 de janeiro, na Fraternidade São Francisco de Assis, de Kilamba Kiaxi, Província de Luanda. Cerca de 50 frades estiveram reunidos nos dois dias marcados pela oração, celebração, reflexão e discussão entre irmãos.
Na tarde do primeiro dia do Capítulo das Esteiras, depois dos frades terem sido motivados pela reflexão conduzida por Frei Gilberto da Silva acerca dos Estigmas de São Francisco, neste ano em que a Família Franciscana celebra o Oitavo Centenário deste acontecimento, e de ter sido retomadas as propostas e compromissos assumidos pelo último Capítulo da FIMDA, em julho de 2023, com apresentação de Frei Ivair Bueno de Carvalho, os frades puderam ouvir as palavras de Frei César Külkamp, Definidor geral, que esteve presente durante todo o encontro.
INÍCIO DO PROCESSO DE TRANSIÇÃO INSTITUCIONAL
No início do Capítulo das Esteiras foi lido o decreto do Ministro geral, Frei Massimo Fusarelli, que nomeava Frei César como seu delegado para acompanhar a transição institucional da Fundação a uma Custódia Dependente da Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil, em trabalho conjunto com o Definitório provincial.
Frei César, tomando a palavra, pontuou que a Ordem dos Frades Menores, há algum tempo, não vê uma de suas Fundações alcançando o status de Custódia. Normalmente, estas entidades são assimiladas por uma Custódia ou Província já existentes. O fato da FIMDA ter alcançado a condição de ser considerada para esta transição deve ser celebrado. Segundo o Definidor geral, alguns requisitos precisam ser atendidos para que a proposição seja apresentada ao Ministro geral:
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- Ter, ao menos, quinze frades solenemente professos;
- Ter, ao menos, três fraternidades constituídas como guardianias – fraternidades com um guardião eleito, que tenham, no mínimo, três frades solenemente professos;
- Ter fundada esperança de estabilidade e perpetuidade.
Frei César ressaltou que, apesar de já existirem vinte e sete frades solenemente professos angolanos – oito deles celebraram a Profissão Solene no último domingo –, uma consulta deve ser feita de modo que cada um deles se manifeste quanto ao desejo de integrar a nova Custódia ou de permanecer na Província a qual a Fundação atualmente pertence. Se o número de adesões à nova Custódia atender ao número exigido, o processo pode seguir adiante.
Entretanto, ter irmãos solenemente professos não é suficiente para fundar a esperança de continuidade e crescimento da nova entidade. Para isso, deve-se considerar o número de formandos angolanos que estão sendo acompanhados nas etapas formativas, além do histórico de ingressos de vocacionados. Atualmente, a FIMDA conta com 46 frades professos temporários estudando Filosofia ou fazendo o Ano Missionário – ano em que o frade, após concluir o curso de Filosofia, é transferido para uma Fraternidade de Angola para compartilhar da vida e missão daquela realidade local –, 14 noviços, 12 postulantes e 58 aspirantes – estando 53 deles cursando o Ensino Médio. Números estes que impressionam e que evidenciam um futuro promissor de crescimento da presença da Ordem dos Frades Menores em Angola.
Frei César menciona que deverá conversar ainda com a Conferência Africana, que reúne todas as entidades da Ordem do continente para obter seu parecer quanto à mudança de status institucional da FIMDA, já que, ao se tornar uma Custódia, ela deverá estreitar seus laços de pertença e participação na Conferência.
UMA NOVA ENTIDADE FUNDADA SOBRE BASES PLANEJADAS E DECIDIDAS EM COMUNHÃO
Na manhã do segundo dia, Frei Rodrigo da Silva Santos reapresentou algumas metodologias já consagradas pelos Institutos Religiosos de modo que eles sejam abraçados pelos frades em Angola de modo a fortalecer um ambiente de diálogo e planejamento. Tudo isso para que se contraponha qualquer espírito de individualismo, que leva o religioso ao isolamento e preocupação apenas com seus próprios interesses e garantias, ou de personalismo, que se sobrepõe sobre a identidade fraterna da Ordem e que a nova Custódia possa caminhar sob um firme planejamento traçado por todos os irmãos. Assim, os irmãos foram incentivados a construírem juntos um Projeto Fraterno de Vida e Missão que considere as realidades locais, tanto sociais quanto eclesiais, assim como o que a FIMDA se propõe a ser naquele lugar onde a fraternidade se encontra. Também foi solicitado que cada frade escreva seu Projeto Pessoal de Vida e Missão, considerando aquilo que com o que a fraternidade já tenha se comprometido a ser e fazer, avaliando-se e estruturando um planejamento de crescimento e amadurecimento pessoal e religioso.
Além da formulação destes projetos, uma prática que já tem sido assumida pela Província da Imaculada Conceição por mais de dez anos, Frei Rodrigo retomou o documento da Ordem que trata sobre os Capítulos Locais, ressaltando algumas dimensões desta já consagrada celebração fraterna que, por vezes, são deixadas de lado, como a partilha pessoal de cada irmão de suas experiências e trabalhos, de modo que todos saiam o que acontece com cada confrade que integra aquela fraternidade. O Capítulo Local é uma instância de sinodalidade que deve ser sempre valorizado em uma fraternidade e ele é sinal da qualidade da vida daquela comunidade de irmãos.
COMPROMISSO COM UMA CULTURA DE CUIDADO E RESPEITO
Assim, a reflexão se voltou sobre a cultura do cuidado e de proteção dos menores e adultos vulneráveis, assim como de outras formas de abuso que possam surgir. O tema foi tratado por Frei Rodrigo e por Frei Robson Luiz Scudela. A proposta era a de fomentar a reflexão de que a futura Custódia deveria nascer considerando e se comprometendo com a construção de uma cultura de respeito e da manutenção de ambientes saudáveis e seguros para os próprios frades, para os colaboradores e as pessoas que são atendidas nas atividades evangelizadoras.
Frei Rodrigo comentou que a Ordem estabeleceu um prazo para que todas as entidades construam um programa de formação dos frades na linha da prevenção de qualquer forma de abuso, estabeleçam códigos de conduta e de políticas de recepção e encaminhamento de denúncias que possam ser apresentadas contra um religioso. Isso em respeito ao compromisso que a Igreja tem assumido nos últimos anos nesta dimensão. A Província da Imaculada Conceição já possui uma Comissão constituída para receber e encaminhar as denúncias e agora deve se focar na construção de um Código de Conduta para toda a entidade. A nova Custódia deverá fazer o mesmo.
O frade ressaltou que, além disso, deve-se firmar compromissos com a promoção do bem-estar físico, emocional e espiritual para os frades, de modo que possam estar nas melhores condições de servir à Igreja e às pessoas com a qualidade que elas merecem. Os frades devem respeitar sua própria humanidade e buscar ou oferecer ajuda sempre que forem percebidos sinais de algo que não está bem consigo ou com outro irmão. Deve-se ainda firmar o compromisso com uma permanente formação pessoal, que qualifique sempre mais ou promova a renovação da atividade evangelizadora. Este cuidado consigo mesmo e com os irmãos, certamente, auxilia ou previne deturpações nas relações com os outros que possam vir a se tornar situações de abuso.
Se os abusos sexuais contra menores é uma triste e grave chaga na Igreja, este não é, entretanto, a única forma de abuso possível nas relações humanas. Frei Robson, tomando a palavra, focou sua atenção no abuso de autoridade e abuso econômico contra os quais todos deveriam estabelecer posturas de prevenção.
O abuso de autoridade ocorre quando alguém, pela posição social que ocupa seja por ser religioso ou por desempenhar alguma função na fraternidade religiosa a qual faça parte, se sobrepõe sobre os outros, reduzindo sua dignidade para atender suas próprias vontades. Normalmente, aquele que exerce o abuso de autoridade age além dos limites que sua função lhe permite, rebaixando os outros para que estejam ao seu serviço, humilhando-os para que não questionem suas palavras, negando-lhes os seus direitos.
Já o abuso econômico na vida religiosa pode ocorrer quando um religioso subtrai para si aquilo que deve estar à disposição de todos, quando partilha com o caixa comum apenas as despesas, enquanto as receitas advindas de seus trabalhos são reservadas apenas para seu uso, por exemplo. Este torna-se grave ameaça à comunhão fraterna, visto que aquele que exerce tal abuso normalmente forma vínculos de corrupção e aliciamento de colaboradores e irmãos para manter sua posição de privilégio e benefício. Recusa-se a abraçar uma administração transparente, com prestação de contas aos irmãos dos recursos da fraternidade, construindo um ambiente de suspeita e, tristemente, de pecado contra a pobreza.
Frei Robson acrescentou, que, embora aqueles que pecam pelo abuso sejam os que mais gravemente erram, muitos outros podem reforçar um sistema de abuso quando se recusam a denunciar, corrigir, combater atitudes de desvio ou abuso que testemunham.
CONCLUSÕES DO CAPÍTULO DAS ESTEIRAS
O período da tarde foi dedicado às conclusões do Capítulo das Esteiras. Os frades retomaram muitas das temáticas refletidas no decorrer dos dois dias. Apresentaram propostas que pudessem ser encaminhadas ao Conselho da FIMDA, muitas delas refletindo sinais de esperança no futuro da entidade e compromisso com seu amadurecimento.
Frei Paulo Roberto Pereira, que moderou todas as intervenções e partilhas no decorrer do Capítulo, agradeceu aos irmãos pelo ambiente de escuta e partilha que foi formado no encontro, assim como a coragem e espírito de verdade que muitas das falas foram expressadas em busca de mudanças de alguns aspectos que sempre podem ser melhorados ou convertidos, ou de reforço de potencialidades que são sentidas e desejam que sejam mantidas.
Espera-se ver uma presença franciscana de renovado vigor perpetuando sua história em Angola, com vibrante testemunho de fraternidade e promoção da justiça e da paz. Que o Seráfico Pai São Francisco abençoe seus próximos passos.
Frei Rodrigo da Silva Santos