Semana Franciscana termina com homenagem a São Francisco na Igreja do Sagrado
05/10/2019
Frei Augusto Luiz Gabriel
Petrópolis (RJ) – A Paróquia e Convento do Sagrado Coração de Jesus, em Petrópolis, celebrou São Francisco com a Semana Franciscana, oferecendo uma programação intensa e diversificada para os frades e fiéis devotos do Santo de Assis. Solenidade e simplicidade marcaram esses dias, que terminaram neste sábado (05/10), com o Concerto Franciscano do Coral dos Canarinhos.
A ‘semanada’ franciscana teve a palestra “São Francisco de Assis: um apaixonado pelo Evangelho”, ministrada por Frei Almir Ribeiro Guimarães, no dia 1º de outubro. Já Frei Volney José Berkenbrock e o missionário muçulmano Wasin Zafar ofereceram uma reflexão em torno dos 800 anos do Encontro de Francisco com o Sultão. A Celebração do Trânsito de São Francisco, no dia 3 de outubro, ficou ainda mais bonita com o coro dos Canarinhos e dos frades cantando a uma só voz o Salmo 141, pedido feito pelo próprio Frei Francisco há oito décadas. Na Solenidade do Santo de Assis (04/10), o movimento foi intenso durante todo o dia e, nem mesmo a falta de energia, fez com que se deixasse de celebrar aquele que foi luz para o mundo e que irradia o carisma franciscano até os nossos dias.
FRANCISCO: UM APAIXONADO PELO EVANGELHO
O petropolitano Frei Almir abriu a programação, às 19h30, apresentando alguns pensamentos e reflexões de vários escritores que já falaram e falam sobre o Santo.
Segundo ele, São Francisco deslumbrou-se diante do Evangelho, e isso fez dele um ser diferente. “Francisco é alguém que habita as coisas; ele admira, ele é um ser que para, olha, reflete… É a espiritualidade do olhar”, disse o frade, perguntando: “Francisco de Assis, para onde queres nos levar?”.
Para Frei Almir, é necessário redescobrir o Evangelho de Jesus Cristo como uma hermenêutica válida da vida, como uma inspiração de um modo bom e belo, verdadeiro e justo de se viver. “E eu não tenho nenhuma dúvida de que quem melhor fez isso foi São Francisco de Assis”, atestou o frade.
Fazendo referência ao historiador Jacques Le Goff, que descreve São Francisco de Assis como um amigo de todas as criaturas e de toda a criação, Frei Almir afirmou que Francisco espalhou tanta solicitude e compreensão fraternal a todos, caridade no sentido mais elevado, que a história lhe deu em troca a mesma simpatia e admiração afetuosa: “Todos os que falaram dele ou sobre ele escreveram – católicos, protestantes, não cristãos, incrédulos – foram tocados e frequentemente fascinados por seu encanto”.
“São Francisco não é nosso, São Francisco não é da Igreja católica, São Francisco é do mundo inteiro. Não existe maior homem do que ele! Ele foi alguém que soube ler e interpretar o retorno ao Evangelho de Jesus Cristo”, concluiu.
800 ANOS DO ENCONTRO DE FRANCISCO COM O SULTÃO
No 2º dia da Semana Franciscana (02/10), Frei Volney e Wasin Zafar falaram sobre os 800 anos do Encontro de Francisco com o Sultão, que se celebra neste ano. Ijaz Zafar, filho de Wasin, também marcou presença no evento e encantou a todos com a recitação em árabe do primeiro capítulo do livro do Alcorão.
Frei Volney fez um resgate da história do Islã como também das cruzadas que aconteceram antes e durante a vida de Francisco. Segundo ele, a realização de cruzadas tinha como pano de fundo a libertação da Terra Santa. “Porém, tinham também muitos objetivos diferentes. Algumas foram financiadas por comerciantes que visavam a posse de bens. Então, imaginar que as Cruzadas eram apenas guerras por questões religiosas é muito pouco. Inclusive os papas e os reis, durante a Idade Média, eram envolvidos nestas questões”, explicou Frei Volney. Durante o tempo em que Francisco viveu aconteceram três Cruzadas.
Francisco, assinalou Frei Volney, indo até o acampamento dos cruzados dialoga com reis e lideranças e apresenta uma proposta e possibilidade de paz. “Indo também até o Sultão, na cidade de Damieta, nos mostra que ele é um homem que buscou a paz e, no diálogo com as pessoas, foi moldando sua vida”. Segundo o frade, o sultão Al-Malik Al-Kamil é um homem muito interessante, culto e religioso, ainda jovem já havia recebido o título de cavaleiro cristão. “E essa é uma dentre tantas possibilidades que o fizeram dialogar com o Santo de Assis”, sublinhou.
Já Wasin falou da perspectiva de paz e apresentou aspectos da tradição e cultura mulçumanas. Começou saudando a todos com a expressão “Salamaleico”, que quer dizer, “a paz de Deus esteja com vocês”, e contou experiências e fatos desafiadores que acontecem na sua comunidade, que é um ramo do islamismo.
“Hoje em dia, no mundo inteiro, muitos são os muçulmanos que chamam Deus de Alá, mas não praticam a paz. E a mídia mostra só está parte. Por isso, a maioria das pessoas do Ocidente acredita que o Islã é uma religião de violência e de terrorismo. É o contrário: a própria palavra Islã quer dizer paz e amor”, explicou.
“Que cada um, ao se encontrar com o outro, espalhe a paz; esse é o sentido da nossa religião. Então, se espalhamos a paz em todos os cantos, como podemos ser uma religião terrorista?”, questionou o missionário. “Devemos ser pessoas que querem conhecer o Islã como uma religião de paz”, propôs.
Segundo ele, os ensinamentos do livro sagrado do Alcorão apresenta, do começo ao fim, aspectos de paz. “Amor para todos e ódio para ninguém é o que o Islã mostra na prática”, disse Wasin.
No final da palestra, Frei Volney contou a todos que o Sultão Al-Kamil deu de presente a São Francisco um chifre, que naquele tempo, era o símbolo da liderança que convidava à oração. Segundo Frei Volney, esse encontro entre os dois mudou profundamente a visão do Santo de Assis, que mais tarde deixou em seus escritos vários elementos que fazem referência a este encontro.
A MORTE DE FRANCISCO É REFLEXO DE TODA A SUA VIDA
Uma nova melodia do Hino da Oração das Vésperas, composta pelo músico Frei Ademir José Peixer e cantada pelo coro dos Canarinhos, intercalando as estrofes com a voz dos jovens frades, deu o tom da Celebração do Trânsito de São Francisco na noite do dia 3 de outubro, às 19h30. A Igreja novamente ficou lotada!
Em sua reflexão, o mestre do tempo da Teologia, Frei Marcos Antônio de Andrade, disse que a morte de Francisco é reflexo de toda a sua vida. “De uma vida fundamentada no Evangelho, de uma vida de penitência, não no sentido de mortificação, mas de uma contínua conversão. Capaz de morrer cantando a Deus, e mesmo quando não tem forças para isto, pede que seus irmãos emprestem a voz ao seu Canto a Deus”, refletiu.
Para ele, a celebração do Trânsito não é uma encenação, pois, através da repetição dos gestos de Francisco, faz-se memória e se atualiza o caminhar. “Nos damos conta que nossa vida é um constante ‘Trânsito’. Abertura de acessos, de passagens, de que temos que construir pontes, transpor abismos de todo tipo social, econômico, religioso e político”, ensinou o frade.
Frei Marcos fez referência também aos 800 anos do encontro do Santo de Assis com o Sultão, afirmando que aquele encontro já foi um ‘transitus’ na vida de Francisco. “O caminho foi da minoridade, que é antes de tudo e fundamentalmente, forma de vida: a essência, o fundamento, o vigor, a atitude fundamental de nossa vida”, destacou.
“Assim, celebrar o Trânsito de Francisco deve fazer crescer em nós o mesmo desejo de imitar Jesus Cristo, e assim fazer com que ele continue vivo. Pai Francisco, valeram a pena todas as suas penitências e sua loucura para libertar o nascimento desse espírito tão humano que chamamos franciscano”, concluiu Frei Marcos.
Logo depois, o Coral dos Canarinhos e os frades entoaram o Salmo 141, recitado por São Francisco antes de morrer. A assembleia reunida acompanhou segurando velas acesas. Momento emocionante e rico em significado e espiritualidade franciscana. A celebração continuou com a partilha da vida e a confraternização no salão da Ordem Terceira Franciscana (OFS).
E VIVA SÃO FRANCISCO!
Com bênçãos dos animais, venda do tradicional bolo, oração das Laudes e das Vésperas, a solene celebração da Santa Missa, às 18 horas, coroou o dia repleto de atividades na centenária Igreja do Sagrado, no dia 4 de outubro, dia do santo franciscano.
A Celebração Eucarística foi presidida pelo pároco e guardião, Frei Jorge Paulo Schiavini, e concelebrada por Frei Fernando de Araújo e Frei Ivo Müller. Os frades estudantes serviram como turiferário, naveteiro, cruciferário e acólitos, além da entoação dos cantos de toda liturgia própria do dia.
Frei Jorge começou sua homilia louvando a Deus que fez grandes coisas em seu servo Francisco de Assis. O pároco usou das palavras do Papa Francisco, proferidas durante a sua primeira visita pastoral a Assis, no dia 4 de outubro de 2013, e disse: “De onde parte o caminho de Francisco rumo a Cristo? Parte do olhar de Jesus na cruz. Deixar-se olhar por Ele no momento em que doa a vida por nós e nos atrai para Ele. Francisco fez esta experiência de modo particular na pequena Igreja de São Damião, rezando diante do crucifixo, que também eu pude venerar hoje. Naquele crucifixo, Jesus não aparece morto, mas vivo! O sangue escorre das feridas das mãos, dos pés e dos lados, mas aquele sangue exprime vida”.
Segundo o frade, Jesus não tem os olhos fechados, mas abertos e grandes: um olhar que fala ao coração. “E o crucifixo não nos fala de derrota, de fracasso; paradoxalmente nos fala de uma morte que é vida, que gera vida, porque fala de amor, porque é Amor de Deus encarnado, e o Amor não morre, antes, vence o mal e a morte. Quem se deixa olhar por Jesus crucificado é recriado, transforma-se uma “nova criatura”. Daqui parte tudo: é a experiência da Graça que transforma, o ser amado sem mérito, mesmo sendo pecadores”.
Para Frei Jorge, quem segue Jesus, recebe a verdadeira paz, aquela que só Ele, e não o mundo, pode dar. “São Francisco é associado por muitos à paz, e é justo, mas poucos seguem em profundidade. A paz franciscana não é um sentimento ‘piegas’. A paz de São Francisco é aquela de Cristo, e a encontra quem ‘toma sobre si o seu jugo’, isso é, o seu mandamento: Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (cfr Gv 13,34; 15,12), disse o celebrante.
O Pároco refletiu também sobre o episódio do Encontro de Francisco com o Sultão, fazendo referência a esta paz franciscana que vem de Deus. “Francisco arrisca sua vida, mas foi surpreendentemente mandado de volta sã e salvo. O gesto de Francisco aparenta ser um gesto de loucura, contudo percebemos a grandeza de Francisco que acreditava que mesmo naquela situação de conflito devia anunciar o Evangelho e anunciar a paz”, acrescentou.
“Que possamos de fato agradecer a Deus por este testemunho tão profundo de São Francisco e, ao mesmo tempo, peçamos que Deus nos faça generosos e transparentes, e que possamos viver com profundida o seguimento de Jesus e a prática da paz”, desejou o celebrante ao concluir sua reflexão.
CONCERTO: FRANCISCO APONTA PARA JESUS
“Francisco fez da sua vida um caminho para Jesus! A sua vida sempre foi fazer com que olhássemos para Jesus”. Com essa explanação, Frei Marcos Andrade, diretor do Instituto dos Meninos Cantores de Petrópolis (IMCP), encerrou o Concerto Franciscano em honra a São Francisco, realizado pelo Coral dos Canarinhos, neste sábado, 5 de outubro, contando apenas com a participação dos tenores e baixos do Coral.
Todo o ambiente foi pensado a partir do espiritual e litúrgico. Por isso, quem entrava na Igreja, deparava-se logo na entrada com uma pequena exposição de quadros de São Francisco de Assis. O roteiro das músicas também foi escolhido a dedo pelo maestro Marco Aurélio Lischt, que ofereceu ao público lindas composições de frades franciscanos, produzidas a partir de textos franciscanos, como por exemplo a canção “Magnificabitur” de Frei Basílio Röwer (1877-1958) (CLIQUE AQUI PARA VER O VÍDEO). Durante as apresentações, os frades da Fraternidade do Sagrado leram textos dos Escritos de São Francisco, dando mais sentido ainda ao evento que foi beneficente. Toda renda arrecadada será destinada para a manutenção do IMCP e do restauro do órgão.
“Este concerto encerra a Semana Franciscana, que contou com palestras, eventos e bênçãos dos animais. A temática principal da apresentação foi os textos e orações de São Francisco e assim como os demais concertos espirituais, realizados ao longo do ano, este também é uma forma de oração e meditação”, destacou Frei Marcos.
Como bis, o Coral apresentou o Hino da oração das vésperas da Solenidade de São Francisco de Assis (VEJA O VÍDEO), composta pelo músico Frei Ademir José Peixer, arrancando calorosos aplausos do público presente. A próxima apresentação do Coral dos Canarinhos será no dia 2 de novembro, feriado de Finados.