O “Enem Franciscano” de 29 jovens
03/11/2019
Moacir Beggo
Guaratinguetá (SP) – Enquanto a grande maioria da juventude brasileira encarava o maior desafio do ano no Enem, um grupo de 29 jovens passou três dias no Seminário Franciscano Frei Galvão, em Guaratinguetá, SP, para viver a experiência do “Enem Franciscano”, o estágio vocacional ou a porta de entrada para o seminário, como disse Frei Diego Melo, o coordenador provincial do Serviço de Animação Vocacional da Província da Imaculada Conceição.
Frei Diego conduziu o estágio, que terminou neste domingo, 3 de novembro, oferecendo momentos de oração, de formação, de trabalho, de esporte e de orientação. E o fez com extrema habilidade e conhecimento de causa. Já é o sétimo ano animando os jovens e agora também está na animação do Serviço de Justiça, Paz e Cuidado da Criação (JPIC). Enquanto Frei Diego deu um panorama geral da vida franciscana, mostrando os critérios que o jovem precisa seguir para ser admitido na Ordem Franciscana e na Província, uma equipe de frades entrevistou os candidatos para conhecê-los melhor.
“A proposta do estágio é conhecerem um pouco qual é a rotina de um seminário, conhecerem um pouco a Ordem Franciscana, a Província e o nosso processo formativo. Toda a nossa dinâmica vai nessa linha. Além disso, o segundo objetivo é conhecermos a eles. Então, é feito um momento de conversa pessoal, chamado de entrevistas. Após a realização do estágio, a Animação Provincial, juntamente com os frades que estiveram aqui e com o parecer do animador vocacional local, teremos diferentes pontos de vista para chegarmos a uma conclusão se o candidato pode entrar no próximo ano, se ele deve continuar no acompanhamento por mais um tempo ou se é orientado a buscar um outro modelo de vida que não seja a vida religiosa”, explicou Frei Diego. Após o estágio, esses jovens receberão uma carta com as orientações e o parecer dos frades.
Essa experiência foi feita com os postulantes, participando com eles do trabalho externo, do esporte e de todos os momentos de orações e celebrações, como a Missa pelos Fiéis Defuntos no sábado de manhã, presidida pelo Secretário de Formação e Estudos, Frei João Francisco da Silva, ou a Missa de encerramento com a comunidade, no domingo, às 9 horas, presidida por Frei Diego. “A liturgia de hoje nos dá a possibilidade de celebrarmos com muita solenidade a todos os Santos e Santas. A Igreja nos apresenta modelos referenciais, ideais, que nos ajudam a encarnar o Evangelho no nosso dia a dia. No entanto, é importante a gente purificar um pouco mais a imagem que nós temos de santidade. Se não cuidarmos, muito facilmente cairemos naquela ideia de pensar os santos como pessoas distantes de nossa realidade, onde vamos até eles somente para fazer pedidos. Depois, se alcançar uma graça, volta para agradecer. Os santos e santas foram pessoas plenamente humanas. Estavam com os pés bem plantados na terra, mas o coração sempre voltado para o céu”, ensinou o celebrante, que teve como concelebrantes Frei Leandro Costa e Frei Ricardo Backes. Frei Felipe Carretta também participou do estágio.
Frei Diego explicou para o povo que lotou a capela do Seminário que no meio dele estavam 29 jovens que vieram de todo o território da Província, desde Santa Catarina até o Espírito Santo. “O que esses jovens buscam? Buscam o ideal de santidade, buscam um ideal nobre. Diante de tantos ídolos que nossa sociedade apresenta, eles descobriram um exemplo, um grande referencial, que é São Francisco de Assis, e que aponta o modo de vida para se chegar à santidade, o modo de vida para trilhar o caminho de Jesus”, enfatizou o celebrante.
“Essa juventude que está aqui hoje nos ensina também que nós devemos buscar respostas radicais para a nossa vida. Que não devemos nos contentar com aquela média 7. Devemos buscar o 10; devemos buscar viver com intensidade. Essa juventude que está aqui hoje é uma juventude que não quer passar na vida de um modo medíocre, leviano. É uma juventude que acredita que a vida só vale a pena quando ela é vivida com intensidade, quando é vivida pra valer! E as bem-aventuranças que vocês vão procurar viver como futuros seminaristas e religiosos, são também esse modelo de vida e santidade para todos nós”, acrescentou.
Frei Diego lembrou que essa escolha nem sempre é compreendida pelas pessoas. Segundo ele, no bairro do Pari, onde mora, foi chamado para dar a extrema unção a uma senhora. “Quando entrei na casa, essa senhora disse assim: ‘Frei, o senhor é frei de verdade?’ Aí respondi: ‘Sim, eu sou!’. Ela olhou para o alto, e disse: ‘Que dó!’ Continuei rezando, no meio da oração, ela perguntou: ‘Frei, há quanto você é frade?’ Eu falei: ‘Olha, há 15 anos sou frei!’ Ela olhou bem para mim e disse: ‘Que dó!’. Eu pensei: tem algo errado comigo e perguntei: Por que a senhora está falando ‘que dó’? Ela disse: ‘Frei, sei lá. Você poderia estar fazendo tantas outras coisas. Podia ser feliz. Ter uma família, filhos e netos. Ter uma vida realizada. ‘Dona Maria, eu poderia ter outra vida realmente, mas eu escolhi esse caminho, respondi ao chamado de Deus e sou plenamente feliz nessa vida que abracei. A vida religiosa não me tira possibilidades de realização, pelo contrário, ela potencializa’. Enfim, não sei se ela aceitou muito, e continuei rezando. Terminei e, quando estava saindo, ela me chamou: ‘Frei Diego – nessa hora até me deu um frio na barriga – o sr. pretende continuar frei até o fim da vida?’ Eu disse: ‘Olha, conto com graça de Deus, eu espero ser frei até o fim da vida’. Ela olhou para mim e disse: ‘Que dó!’. Eu pensei: o que se passa na cabeça de D. Maria? E de tantas outras pessoas quando pensam na vida de um religioso, de uma religiosa, de alguém que se dedica às coisas de Deus? Será que muitos de nossa sociedade não pensam assim?”, questionou o frade.
“Sempre quando a gente encontrar um vocacionado, nunca deveremos dizer ‘que dó’; sempre que encontrarmos alguém que está se dedicando a uma vida mais radical, cuidando das coisas de Deus, não vamos dizer ‘que dó!’ Mas vamos dizer: Que graça, que alegria! Portanto, irmãos e irmãs, que possamos sempre mais apoiar as vocações, rezar pelas vocações, incentivar as vocações e descobrir que essas vocações são sinônimo de uma vida beata, de uma vida feliz, de uma vida realizada. Dizer sim ao projeto de Jesus, dizer sim a uma vocação, seja ela qual for, de modo especial a vocação religiosa, é dizer sim a Deus, é descobrir a verdadeira e a perfeita alegria”, completou o frade.
Frei Leandro Costa pediu que todos rezassem pelos vocacionados e, na bênção final, todos estenderam as mãos em direção aos jovens que participaram do estágio.
POR QUE QUERO SER FRADE
Alguns candidatos dizem por que querem ser frade, como Marco Antônio de Morais, natural de Lençóis Paulista e atualmente morando em Agudos. Filho único, cursando o último semestre de História, ele está bastante seguro depois de fazer dois anos de acompanhamento. “Quero ser frade basicamente porque é uma forma completa de serviço. Um serviço pé no chão, um serviço que já fazemos em casa e pode ser integral dentro da Igreja. Então, o que me encantou na Vida Religiosa Franciscana é uma mística de serviço muito sóbria. A gente tem condição de ter uma vida eclesial saudável, uma formação muito pé no chão e não ficar divagando. Segue a Cristo naqueles que precisam de uma maneira integral e efetiva. Estou mais perto de Cristo não só na sua dimensão divina, mas na sua dimensão humana. Quanto Ele esteve na terra, foi pobre e esteve ao lado dos pobres”, enfatizou.
Aos 35 anos, Samuel Cavalcanti do Amaral amadureceu sua vocação nas Missões Franciscanas da Juventude. “Cheguei no momento de minha vida em que encontrei a imagem de Francisco como o exemplo que me completava. A minha vocação, como eu falei para o Frei Diego, veio quando eu vi as pessoas fazendo missão e eu queria estar lá. Queria estar perto das pessoas. Queria conhecer as suas histórias. Queria ser um com eles. Essa inspiração de ser o homem do encontro é que me fez querer ser franciscano. Quero me importar com aqueles que a sociedade esquece”, reforçou Samuel, que integra a Paróquia Nossa Senhora da Conceição de Nilópolis. Ele já participou de três Missões da Juventude.
Yuri de Oliveira Teles Sousa, de 24 anos, mora no Rio de Janeiro, mas nasceu em Volta Redonda. Segundo ele, seu chamado não foi muito linear. “Foi surgindo aos poucos. Nasci na Igreja Católica, depois me tornei espírita. Ali, as pessoas gostam muito de São Francisco e cultivam a dimensão da caridade. Acredito que a partir da vivência, dos estudos dentro do espiritismo, esses aspectos foram importantes para o retorno à Igreja Católica e para a minha vocação, que aconteceu quando me mudei para o Rio de Janeiro. Ali voltei a frequentar a Igreja Católica. Depois, no Convento do Sagrado Coração, em Petrópolis, tive o primeiro contato com os frades e pude perceber a dimensão da fraternidade, da acolhida, do serviço, do trabalho, que me chamaram a atenção e me fizeram a buscar um acompanhamento vocacional”, contou Yuri.
Ainda neste domingo no final da manhã, Frei Diego reuniu o grupo para dar as últimas orientações visando o ano de Aspirantado no Seminário São Francisco de Assis, em Ituporanga, SC. Esta etapa é feita de duas formas: até o final de maio, os seminaristas terão a formação conjunta em Ituporanga. Nos meses de junho a setembro, eles terão uma experiência em algumas das Paróquias e Conventos da Província que são escolhidas como Fraternidades de Acolhimento Vocacional. No início de outubro, retornam para o Seminário, onde concluem esta etapa. O próximo passo é o Postulantado, o ano que o candidato se prepara tendo em vista o ingresso no Noviciado. Em Ituporanga, no ano 2020, estarão quatro seminaristas concluindo o Ensino Médio.
Frei Diego tem boas expectativas com este estágio. Segundo ele, o Serviço de Animação tem insistido muito para que os frades que fazem acompanhamento local enviem somente aqueles jovens que já têm certeza do que querem. “De modo que a cada ano que passa tenho sentido que os estágios têm sido mais tranquilos, mais maduros. Então, isso é fruto do bom acompanhamento local”, confessou o frade. Nos últimos anos, uma média de 30 jovens fez o estágio, tendo uma média de ingresso no seminário de 20 a 25 candidatos.
O encontro de Guaratinguetá terminou com um abraço coletivo, a oração final e o almoço de confraternização.
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