“Escutai-o!”: sob a voz do Pai, Frei Jeferson inicia seu ministério presbiteral
05/03/2012
Por Frei Alberto Eckel Junior
Guaratinguetá (SP) – O dia 4 de março, domingo, amanheceu com um sol radiante, talvez prenunciando os sentimentos que tomaram conta daqueles que participaram da Missa presidida pela primeira vez por Frei Jeferson Palandi Broca. De fato, ao chegar à capela da Comunidade Sagrada Família, notava-se a alegria e a vibração dos fiéis que lá estavam. A missa iniciou às 10 horas e transcorreu num clima de bastante tranquilidade.
Como de praxe, foi escolhido um pregador para a ocasião. Frei Gilberto da Silva, confrade de turma de Frei Jeferson, foi quem proferiu a homilia. No início, Frei Gilberto disse que é costume o neopresbítero escolher um presbítero mais experiente para pregar, mas que, no caso, ele não era presbítero nem mais experiente. Além disso, ele não ficou lembrando as obrigações de presbítero a Frei Jeferson, uma vez que ele se preparou para isso por mais de 10 anos.
Partindo das leituras do domingo, Frei Gilberto lembrou que a missão primordial do presbítero é ajudar a comunidade eclesial a ouvir o Filho amado, Jesus Cristo, e com Cristo transfigurar-se. Isso, no entanto, não com grandes pretensões, mas com pequenos gestos cotidianos, como um abraço, um colo que acolhe, um silêncio que respeita ou um olhar que conforta, conforme um poema de Cora Coralina que encerrou sua reflexão. Ainda, lembrando as duas figuras “sacerdotais” que emergiram no Vale do Paraíba, Nossa Senhora Aparecida e Frei Galvão, Frei Gilberto presenteou Frei Jeferson com uma pequena imagem da Senhora Aparecida, ou a Mama Muxima (expressão que significa a Mãe do coração e que designa Maria em Angola), confiando o ministério e a missão de Frei Jeferson ao amparo dela.
O final da celebração foi marcado por homenagens e, de certa forma, despedidas, visto que Frei Jeferson irá a Angola como missionário. Familiares, amigos e membros da comunidade local e de Imbariê – Duque de Caxias, onde ele morou nos últimos 2 anos, ofereceram rosas, mensagens e presentes. Neste momento, também, o neopresbítero lembrou o exemplo de sua avó que, apesar do sofrimento de estar debilitada em uma cama por vários anos, mantinha-se firme da fé, com o terço na mão e confiante em Deus.
Por fim, a Ceia do Senhor se “estendeu” num almoço organizado pela comunidade paroquial no salão da Paróquia Nossa Senhora da Glória e oferecido aos confrades, familiares e amigos de Frei Jeferson vindos de Imbariê e Nilópolis.
ÍNTEGRA DA HOMILIA
Primeiramente, quero saudar a todos, com nossa saudação franciscana de Paz e bem!
Estamos vivendo um tempo privilegiado na Igreja, hoje celebramos o 2º Domingo da Quaresma, período no qual nos preparamos de modo intenso para a Páscoa do Senhor. O tempo da quaresma nos leva ao caminho da conversão, do jejum e da caridade. A todos nós, que aqui estamos, foi-nos dado pelo Senhor e pela generosidade do Jeferson a graça de nos preparamos mais intensamente para a Páscoa do Senhor, tanto pela sua Ordenação quanto por sua primeira missa.
Normalmente, para esta festa, o novo presbítero convida um padre mais velho, mais experiente, para lhe dirigir algumas palavras. Neste caso, não sou presbítero, nem mais velho, e acredito que não será necessário lembrar o Jeferson dos direitos e deveres de um presbítero, pois para isso ele se preparou muito tempo estudando e está consciente da grandeza e da beleza, mas também dos desafios e das dificuldades, do serviço que ele assume na Igreja. O que posso afirmar é que todos nós viemos para esta liturgia com o coração grato a Deus, por esse momento tão significativo para o Jeferson, para a Paróquia nossa Senhora da Glória, para a Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil e para todos aqueles que buscam o sentido de sua vida no Senhor.
Pois bem, ouvimos dois relatos de sacrifício por amor. Na 1ª leitura, Deus pede a Abraão uma prova de fidelidade: entregar seu próprio filho ao sacrifício. Como ouvimos, Deus não aceitou o sacrifício de Isaac, mas recompensou seu pai Abraão pela fé e coragem, dando-lhe sua benção e multiplicando sua descendência. Na 2ª leitura, Paulo escreve aos Romanos reafirmando a bondade de Deus “Se Deus é por nós, quem será contra nós? Aquele que não poupou seu próprio filho, mas o entregou por todos nós, como não nos dará também ele todas as coisas?” (Rm 8,31-35).
No Evangelho, ouvimos o relato da transfiguração, onde Jesus toma consigo Pedro, Tiago e João, e os leva à parte, a sós, a um alto monte.
Para refletirmos evangelho da transfiguração, é necessário retomarmos o capítulo 8, onde o evangelista Marcos mostra Jesus inaugurando um tempo novo. Ele se dirige às multidões mediante sinais e ensinamentos que deixam transparecer a bondade de Deus. Nesta primeira etapa de sua vida, Jesus não é compreendido pelos fariseus, é acusado de blasfemo, de ser um possesso, louco e impuro.
Algumas expressões do capítulo 8 nos revelam um Jesus cansado de tanta incompreensão. Depois de ter realizado a multiplicação dos pães, os fariseus queriam tentar Jesus e pediam um sinal. Então Ele, dando um suspiro profundo, respondeu: “Por que essa geração pede um sinal? Eu garanto a vocês: a essa geração não será dado nenhum sinal” (8,12).
Até mesmo seus discípulos não compreendem muito bem quem é Jesus e qual é a sua missão. Ele mesmo lhes disse: “E vocês ainda não compreendem?” (8,21). E de uma maneira mais forte, diante da reação de Pedro no primeiro anúncio da paixão, diz: “Você não pensa as coisas de Deus, mas as coisas dos homens” (8,33b).
É neste contexto que Marcos insere o relato da transfiguração, tanto Jesus como seus discípulos parecem se encontrar em um momento de crise. Por isso, o Mestre vai em busca de Deus, precisa escutar sua voz, encontrar nele o seu refúgio para poder continuar sua missão.
Mas não vai sozinho… Leva consigo Pedro, Tiago e João. Quer que eles também participem de sua intimidade com Deus, quer fazê-los partícipes de sua oração, deseja abrir a eles o mistério da sua comunhão com o Pai (Jo 15,14-15).
Os discípulos deixaram tudo para seguir Jesus, porém, ainda não tinham compreendido sua missão. Vós, quem dizeis que sou eu? Responderam: O Cristo, o Messias. Em outra ocasião Jesus diz a Pedro: Você não pensa as coisas de Deus, mas as coisas dos homens. Até aqui parece que os discípulos seguiam o Cristo, o Messias, Rei e Glorioso, o esperado pelos judeus. Os Discípulos querem conformar Jesus às suas próprias expectativas. Não querem ter um trabalho árduo de se tornarem conformes à proposta de Jesus. Querem recriar Jesus à sua própria Imagem.
No monte da transfiguração aparece a figura de Moisés e Elias, como reforço ao projeto messiânico de Deus. Moisés é o protótipo do Messias, e Elias é o tipo de precursor de Cristo. Hoje com facilidade, frei Jeferson, podemos conservar o modelo sacerdotal do antigo testamento, onde as leis e as normas podem significar coisas mais importantes do que a vida. No entanto, Jesus se transfigura diante de Pedro, Tiago e João. Os discípulos viram o Messias tal como ele é. Quando de repente uma nuvem os cobriu e veio uma voz que dizia: esse é meu filho amado escutai-o.
O tempo em que vivemos nos desafia a escutar, pois as mudanças são aceleradas. Com apenas um clique do mouse podemos nos conectar com o mundo ou, ao mesmo tempo, fugir para uma zona de conforto. Com a Provocação de Jesus neste evangelho, não podemos conservar antigas matrizes, é hora de Transfigurar. A Igreja clama por uma contínua renovação, essa renovação está acontecendo, porque aprendemos e queremos continuar sendo seguidores do Cristo servidor, na gratuidade do Amor, não no poder, mas no serviço. Somos Seguidores do Cristo sofredor, servo, que se coloca, lava os pés. Somos chamados a sermos eminentes na fé, cuja a fé dá consistência na vida dos nossos irmãos e irmãs.
Olhando para o Cristo Servidor podemos perguntar: quem pode assumir o serviço Presbiteral na Igreja? Certamente se essa pergunta fosse feita a Jesus ele diria: quem tem um coração grande, envolto na caridade, um amor generoso, que eleve a comunidade a transfigurar-se, a olhar a realidade com os olhos de Deus.
Frei Jeferson, filho do vale do Paraíba: certamente vai levar para sua vida dois modelos sacerdotais: o Primeiro da mãe de Deus, com o título de Aparecida. Surge das águas para transformar a escravidão e a opressão em libertação, fé, esperança. Outro modelo é nosso confrade Frei Galvão: o Missionário da paz e da caridade, verdadeiro propagador do evangelho.
Agora Frei Jeferson será missionário em Angola e como um bom franciscano ele não vai levar o Evangelho para Angola, ele vai fazer brotar, ou vai fazer multiplicar o evangelho que está lá. Sabemos que um bom seguidor de Francisco faz o evangelho se multiplicar, pela penitência, na caridade e em fraternidade.
Para terminar esta partilha, gostaria de citar a poetisa Goiana Cora Coralina:
Não sei se a vida é curta ou longa para nós, mas sei que nada do que vivemos tem sentido, se não tocarmos o coração das pessoas.
Muitas vezes basta ser: colo que acolhe, braço que envolve, palavra que conforta, silêncio que respeita, alegria que contagia, lágrima que corre, olhar que acaricia, desejo que sacia, amor que promove.
E isso não é coisa de outro mundo, é o que dá sentido à vida. É o que faz com que ela não seja nem curta, nem longa demais, mas que seja intensa, verdadeira, pura enquanto durar. Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina.
Frei Jeferson, gostaria ainda de lhe presentear com uma pequena imagem da mãe de Deus. Aqui a veneramos como Aparecida. Em Angola ela é conhecida como “Mama Muxima” (A mãe do Coração) – Que a mãe do coração do povo brasileiro Nossa Senhora da Conceição Aparecida, te acompanhe pelas estradas da vida, sobretudo, no trabalho pelo Reino Deus, Que a Senhora Santa te proteja hoje e sempre. Amém!
Frei Gilberto da Silva, OFM