Concerto de Finados: “Um sentimento humano de fé no descanso eterno”
03/11/2019
Frei Augusto Luiz Gabriel e Daniela Moreira
Petrópolis (RJ) – Pelo quarto ano consecutivo, o Instituto dos Meninos Cantores de Petrópolis (IMCP), em parceria com a Paróquia do Sagrado Coração de Jesus, oferece ao público da Cidade Imperial e região o “Concerto Espiritual de Finados”. E neste sábado (02/11), às 18h30, a Igreja do Sagrado ficou lotada mais uma vez para prestigiar os dois Corais dos Canarinhos e a Orquestra Filarmônica da cidade, que apresentaram um dos maiores clássicos da música: o réquiem do compositor francês Gabriel Fauré, versão em ré menor de 1893. O evento contou com a regência do maestro Marco Aurélio Lischt, além de solistas e músicos convidados.
A leitura da Carta de São Bráulio de Saragoça, bispo do século VII, deu logo de cara a tonalidade da noite contando com momentos de reflexão, oração e meditação. Lido por Frei José Ariovaldo da Silva, o texto retirado do Ofício dos fiéis defuntos apresenta a ideia de que Cristo ressuscitado é a esperança de todos os que crêem.
Segundo o diretor do IMCP, Frei Marcos Antônio de Andrade, este concerto faz parte da programação anual do Instituto. Para ele, o evento superou as expectativas. Frei Marcos acredita que a importância de se realizar um Concerto Espiritual justamente no dia dos fiéis defuntos, faz parte de uma história de muitos anos. “Diariamente os frades participam deste momento difícil na vida das pessoas, fazendo as exéquias e rezando pelos falecidos. Então, realizar um concerto assim aqui em nossa Igreja e Convento, é oferecer para as pessoas aquilo que temos de melhor, que é estar próximos de Deus”, revelou o frade.
João Gabriel Brusdzenschi, de 14 anos, participa do coral há quatro anos e foi um dos solistas da noite (VEJA O VÍDEO). Pare ele, foi muito bom e gratificante ter cantado a obra de Fauré. Afirma com convicção que não foi difícil, mas sim desafiador. “Tive que ensaiar bastante em casa e com o coral. Já faço solo há algum tempo, mas faz toda diferença ser solista num evento como este, nem sei como explicar a sensação, eu fiquei muito nervoso”, disse aos risos. É a 1ª vez que Gabriel fez solo com acompanhamentos de uma orquestra.
Manoela Carvalho de Barros tem 14 anos e participa do coral há cinco anos. Ela já cantou com a orquestra em outras apresentações tanto com os meninos como com as meninas do coro. Para ela, entoar o réquiem de Gabriel Fauré, foi emocionante e lindo. “É uma peça mais complicada para cantar por conta dos nuances que as composições possuem. Por outro lado, atuar juntamente com a orquestra requer bastante atenção e empenho, mas no final deu tudo certo”. A canção que Manoela mais gostou de cantar é a “Libera me”, que quer dizer: “Livrai-me Senhor” (VEJA O VÍDEO).
O barítono Marcelo Coutinho participa do Concerto de Finados há alguns anos. No ano passado ele cantou o réquiem de Mozart e neste ano o de Gabriel Fauré. Segundo ele, são dois extremos e dois estilos. “O réquiem de Mozart está dentro do classicismo que possui uma forma própria e importante, onde a música fala por si só. É um pouco mais contido, e apresenta outra linha melódica, que é acompanhada por um trombone. Então, por si só já diz que é uma área mais séria, mais reta. Já o réquiem de Fauré é pura emoção e sentimento. Com uma melodia que remete a passagem da morte para outra dimensão, através de um lirismo de melodias muito bem feitas e de uma orquestração específica, a música de Fauré possui um som muito mais redondo e introspectivo. O réquiem de Mozart marca a força própria das melodias e o de Fauré retrata a introspecção, mas sem dúvidas, os dois são maravilhosos, são dois gênios”, explicou. Para ele, cantar com os canarinhos, retrata a pureza. É algo angelical que ajuda a compor perfeitamente a proposta de Fauré. “Me sinto lisonjeado de ter participado”, destacou. (VEJA O VÍDEO)
Segundo o maestro Marco Aurélio Lischt, reger um concerto sempre é um desafio, independentemente de ser com coro ou com orquestra. “Ao final de um trabalho como este, a gente se sente tão leve e gratificante que vale a pena sempre enfrentar um desafio. Não importa qual seja, se tratando de música sempre é um desafio que tanto os meninos como as meninas gostam”, sublinhou.
O maestro ressalta que a novidade deste evento foi trazer ao público vários instrumentos diferentes, como a arpa, por exemplo, além da orquestra. Segundo o músico, diferente do réquiem do ano passado, o deste ano é um vislumbre do paraíso. “Promete a passagem para uma vida melhor, como o próprio compositor descreve, sendo uma obra que eleva o espírito e transcende o eterno”, refletiu.
Para ele, a importância da realização de um Concerto Espiritual de Finados no dia dos fiéis defuntos consiste na compreensão de que a vida não acaba com a morte. “Trazer a esperança e dizer para eles que a vida continua e nós estamos aqui para ajudar com a nossa música”, concluiu.
Embora o concerto tenha sido gratuito, ao final das apresentações, o público presente pode fazer contribuições que serão revertidas para a manutenção dos trabalhos do Instituto dos Meninos cantores de Petrópolis (IMCP). O próximo concerto dos Canarinhos será durante a abertura da exposição de presépios no dia 06 de dezembro.
SOBRE A OBRA DE GABRIEL FAURÉ
Gabriel Fauré compôs seu réquiem no fim do século XVIII e foi uma de suas maiores obras. Formada por sete movimentos, a obra foi concebida para coro misto, solistas – soprano e barítono – orquestra e órgão. Segundo o próprio compositor, a obra seria dominada por um sentimento muito humano de fé no descanso eterno.
O próprio compositor afirmou: “Dizem que meu Réquiem não expressa o medo da morte e alguns o chamaram canção de ninar da morte. Mas é assim que eu vejo a morte: uma alegre libertação, mais uma aspiração em direção à felicidade do que uma experiência dolorosa”.
Para atingir seu intento, Fauré omitiu o segmento da Sequência, que reporta à ira do Senhor e ao fogo do inferno e adicionou os textos Pie Jesu e In Paradisum (VEJA VÍDEO), que, se não fazem parte do réquiem, têm como meta enfatizar a certeza do repouso eterno.
Segundo Frei Marcos, a obra é descrita por muitos musicistas como uma canção de ninar da morte por conta de seu tom predominantemente suave. “Seu foco está no descanso eterno e consolo”.
Disse Gabriel Fauré: “Toda minha compreensão de religião coloquei no meu réquiem que, além disso, é dominado do começo ao fim por um sentimento muito humano de fé no descanso eterno”.