Lições para a comunicação nesse tempo de pandemia
21/08/2020
São Paulo (SP) – A Frente de Evangelização da Comunicação fez o terceiro encontro de formação permanente este ano, reunindo nesta quinta-feira, 20 de agosto, os frades e colaboradores que atuam na Fundação Frei Rogério, em Curitibanos (SC); Rede Celinauta, em Pato Branco (PR); Editora Vozes, em Petrópolis (RJ); Universidade São Francisco, em Bragança Paulista (SP); Colégio Bom Jesus, em Curitiba; Serviço Franciscano de Solidariedade e Sede Provincial, em São Paulo (SP). O encontro foi conduzido por Frei Neuri Francisco Reinisch, coordenador da Frente.
O Vigário Provincial e Secretário para a Evangelização da Província da Imaculada Conceição, Frei Gustavo Medella, trouxe para a reflexão um questionamento: O que esse tempo de pandemia tem significado para a comunicação? Para isso, tomou como base alguns pontos de uma palestra do Cardeal português, José Tolentino de Mendonça, sobre “espiritualidade e pandemia” para uma faculdade de Teologia de Belo Horizonte.
Segundo Frei Medella, primeiro Tolentino destaca que estamos vivendo um tempo de improviso. “O improviso faz com que vivamos aquilo que está aberto diante de nós. Não há propriamente uma rota traçada, um caminho a seguir. O futuro chega de sopetão e nos pega despreparados”, disse. “E por isso estamos mais fragilizados e vulneráveis. Muitos historiadores têm dito que esse evento da pandemia seria a entrada definitiva do século 21, embora cronologicamente ela tenha ocorrido há mais tempo. Mas agora parece que a humanidade sente os efeitos de uma mudança de época”, acrescentou Frei Medella.
Estamos vivendo também um tempo de perguntas. “Vocês que fazem a cobertura jornalística diária, percebem o modo como as autoridades lidam com a pandemia. Têm mais perguntas que respostas. E as respostas são muito provisórias e parciais. As decisões são mudadas de uma hora para outra”, observou o frade. “E aí o convite do Cardeal é que nós vivamos as perguntas na sua profundidade, a fim de provocar em nós um questionamento que nos leve a mudanças e transformações profundas”, emendou.
É também um tempo de esvaziamento e de silêncio (kenosis). “É um tempo de buscar brechas de esperança nesse cenário muito desafiante que se apresenta diante de nós’, indicou Frei Medella.
É tempo de criar. “Não é tempo apenas de cancelar, suspender, suprimir, fechar e tardar. Mas de repropor, reorganizar, acelerar, inventar e abrir-se ao novo”, disse o frade, recordando as muitas matérias gravadas na sala de casa, as aulas remotas, as celebrações on-line. “É tempo de criar e se abrir ao novo”, ressaltou.
Outro ponto destacado é o tempo de cuidar e de aprender. “Não é só uma câmera que está na minha frente, ou um aparato de tecnologia que está diante de mim, mas é um ambiente, um lugar, uma extensão dos ambientes onde vivemos, onde criamos nossas relações, onde testemunhamos nossos valores. A rede não é um entrelaçado de fios, mas de pessoas”, observou.
Frei Medella citou a encílica Laudato Si’ do Papa Francisco: “Tudo está interligado e agora mais do que nunca podemos perceber que o vírus foi registrado pela primeira vez a muitos quilômetros de distância do Brasil e, em pouquíssimo tempo, estava aí tomando todas partes do planeta”, lembrou. Ele também exemplificou que a exigência de usar máscara é uma adesão pessoal. No entanto, essa decisão não atinge somente a pessoa, mas afeta toda uma comunidade.
“É um momento de vencermos a ilusão de que a humanidade não precisa de limites. De que é onipotente, onipresente e pode tudo. Aprendemos que precisamos baixar um pouco a bola, que é preciso viver de forma mais simples, mais quieta. Tudo isso foram desafios e aprendizados que esse tempo trouxe para nós”, disse Frei Medella.
Por último, Frei Medella falou do Tempo dos Bem-aventuranças. Tomou como base um material preparado pelo Serviço de Apostolado Digital, da Diocese de Turim, na Itália. Para cada bem-aventurança, foi elaborada uma reflexão relativa à comunicação, lembrando que a tarefa daquele que pretende ser um discípulo de Cristo é buscar o Reino e não um lugar de destaque nesse reinado.
Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o Reino dos Céus – Preferir estar com outros do que com as coisas. Buscar o fortalecimento e não saciedade. Bater à porta daqueles com quem nos relacionamos virtualmente e com os que estão sob o mesmo teto que nós. Que a superexposição digital e midiática não prejudique nossa capacidade de escolher e discernir.
Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra – Habitar um lar em vez de iniciar incêndios; Lembrar a mansidão de Jesus na prisão, quando pede a Pedro para guardar a espada; vencer a tentação de se lamentar, de agredir, atacar, agir com cinismo ou por raiva e vingança – a tentação de mostrar ao mundo que existimos pela polêmica ou pelo fundamentalismo. A mansidão é o que torna a casa um lar, e a rede um espaço não hostil, lugares habitados por pessoas pacientes e humildes como Jesus.
Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. Buscar o essencial e selecionar os conteúdos – Exercer nossa liberdade de escolha com responsabilidade, pautados no bom senso, na inteligência e nos valores que buscamos cultivar.
Bem-aventurados os misericordiosos, porque encontrarão misericórdia. Deixar-nos encontrar pelo Cristo em nossas fragilidades. Vencer a ilusão de onipotência e onipresença que a tecnologia pode criar em nós.
Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus – Uma nova e mais forte socialidade.
Bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus. Ficar em casa oferecendo o próprio coração como casa.
Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus. Bem-aventurados são vocês quando lhes injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo mal contra você por causa de mim: ficar em casa oferecendo esperança para o futuro e não revanche pelo passado.
Cristo nunca ostentou as suas razões, mesmo sendo ele a razão e, diante de Pilatos, ele simplesmente ficou em silêncio. Se, no passado, você sofreu pela sua fé pisoteada e zombada, hoje não pisoteie nem zombe de ninguém pelos seus medos, pela corrida um pouco supersticiosa ao sagrado e à oração, a formas de devoção talvez imaturas. Antes, vá ao encontro dessas pessoas, alegre-se e exulte com elas, porque o Reino dos céus também é para elas, porque o Pai também é delas. Seja justo, não para que o mundo lhe faça justiça, mas porque o seu Pai que está nos céus é perfeito e justo.
Terminada a reflexão de Frei Medella, seguiu-se um momento de partilha entre os participantes. No final, o Vigário Provincial e Frei Neuri agradeceram a participação e animaram a todos a continuar buscando “relações além das conexões”.