Pe. Renato e D. Beth: a esperança na desesperança
18/07/2019
Rio de Janeiro (RJ) – O segundo dia das Missões Franciscanas da Juventude, nesta quinta-feira, 18 de julho, foi dedicado à formação dos 600 jovens que estão presentes no Rio de Janeiro. Dois testemunhos de vida prenderam a atenção dos jovens. Primeiro D. Beth, que era uma moradora de rua, tornou-se a fundadora do Lar Dona Beth para acolher pessoas em vulnerabilidade social; depois, Pe. Renato Chiera veio como missionário da Itália para a Diocese de Nova Iguaçu, mas logo se deparou com realidade de violência na Baixada: “Não vim da Itália para ser coveiro”. Essa inquietação o levou a fundar a Casa do Menor, um lar que já acolheu milhares de crianças e adolescentes. Testemunhos de vida e de esperança.
O TESTEMUNHO DE D. BETH
A alegria e simplicidade de D. Beth conquistaram os jovens e serviu como grande aprendizado para suas vidas. Ela tem uma história de superação na vida. Dona Beth já foi moradora de rua e quando estava nessa situação “prometeu a Deus que se ela melhorasse as condições de vida ajudaria a toda e qualquer pessoa que precisasse”. Quando estava casada, um dia saiu cedo para comprar açúcar, pois naquela época andava em falta, e viu uma mulher jogando seu filho no mar. Ela impediu que essa mãe o matasse, criou este menino e fundou o Lar Dona Beth. Os filhos de Dona Beth, de diferentes idades e tamanhos que circulam pela casa, são a prova de que ela cumpriu com rigor a promessa feita anos atrás. Dona Beth conta que já teve dois infartos e um AVC e continua firme e forte. Como a maioria das instituições, ela passa dificuldades para manter o seu projeto na Rua Padre Pedro Martinotti, nº 2, Largo da Batalha, Pendotiba (Facebook.com/lar de Beth).
A CASA DO MENOR
Em 1978, Padre Renato Chiera deixou a Itália para ser missionário na Baixada Fluminense, na circunscrição da Diocese de Nova Iguaçu. Aos 76 anos de vida, 52 anos de sacerdócio e 42 anos de Baixada Fluminense, ele é o fundador da Casa do Menor, uma instituição que já atendeu milhares de crianças e adolescentes em Miguel Couto.
Surpreso, pois segundo ele esperava encontrar um “grupinho de jovens”, Pe. Renato confessou que estava assustado por falar para tantos jovens e nem tinha preparado nada. Seu testemunho, contudo, foi um grande aprendizado nesta manhã. “Estou contente por ver jovens apaixonados por Deus e atraídos por Francisco de Assis. Ele foi um jovem que se despiu de tudo aquilo que não era dele. Ele cantava a alegria, a liberdade, a felicidade. Para alguns, era chamado de louco. “Eu queria fazer essa loucura como Francisco, mas tinha medo. Até que um dia sofri um acidente e cheguei à conclusão de que Deus poderia fazer o que quisesse com a minha vida, pois era dele. E Deus me trouxe para o Brasil”, contou.
“A Baixada é o lugar mais bendito do mundo, porque lá Jesus está crucificado e grita abandono e precisa de amor”, falou aos jovens. Segundo o padre, Deus entrou na sua vida através dos mais sofridos. “A Baixada Fluminense é um santuário com o Cristo Crucificado. Eu cheguei ali e logo me encontrei com a realidade sofrida. Me atraía as periferias. Naquele tempo não se falava em ‘Igreja em saída’, mas eu sentia isso no coração. Eu nasci pobre, de uma família que tirava o sustento da roça. Embora pobre, meu pai partilhava o que tinha com os mais pobres”, recordou, completando: Eu me tornei padre para ajudar os outros.
Para ele, é uma tragédia o que acontece com os jovens hoje, mas esse problema começou lá atrás. “Cheguei em 78. Na minha casa chegou um garoto negro, sem um olho, que roubava aqui e lá e usava maconha. Se sentia como um cão vira-lata. Um dia ele entrou na minha casa e pegou o meu rádio. Mas depois restituiu-o. Uma noite estava entrando na minha garagem, vi um jovem. Era o ‘Pirata’. Havia levado um tiro no pescoço e sangrava muito. Ele dizia: ‘Pe. quero ficar aqui. Aqui sou amado’. Ficou e se tornou um trabalhador. Até que um dia sua vida foi ceifada com um tiro na cabeça pelo Esquadrão da Morte”, recordou relatando sua tristeza. “A minha dor não pôde salvá-lo. Aí perguntei: ‘O que eu vim fazer no Brasil? Ser padre coveiro? Porque no primeiro dia que cheguei encontrei três mortos. Nunca tinha visto uma pessoa assassinada”, disse.
“Troquei de paróquia e fui para Miguel Couto. Periferia da periferia. Lá, uma noite, veio um garoto de 17 anos. Ele estava muito agitado. “Padre, na tua paróquia já mataram 36 pessoas. Tem uma lista de marcados para morrer. O sr. está vendo este primeiro nome? É o meu. O sr. não vai fazer nada? Nó estamos errados, sim. Nós roubamos, nos cheiramos, não prestamos. Mas vocês resolvem tudo nos matando. Ninguém quer saber por que nós somos assim? Vocês nos matam e não fazem nada. Esse ninguém faz nada entrou no meu coração”, confessou.
Segundo Pe. Renato, à noite não conseguiu dormir. Via o rosto desse garoto se misturando com o rosto de Jesus. “A frase ‘Pe. você prega o amor e não faz nada?’ não saía da minha cabeça”, disse, revelando: Eu percebi que aquele garoto era Jesus!
Segundo o Pe. Renato, esses jovens precisam de amor, acolhimento. “Os meninos pulavam o muro e dormiam na minha garagem. Dormiam em posição fetal. Depois descobri que queriam voltar ao calor do ventre da mãe. Inconscientemente à noite, voltavam para o seio da mãe. Aí entendi que precisavam de um útero de mãe, de um útero de pai, de um útero de comunidade”, ressaltou, contando que a ajuda veio de uma garotinha do grupo de crisma no seu projeto de ajudar os adolescentes.
A Casa do Menor, fundada em 12 de outubro de 1986, tem como objetivo reescrever as suas histórias com novos valores humanos inspirados ao Evangelho. Para ele, contudo, não é preciso muita pregação. Basta a Pedagogia da Presença, tema de um de seus livros. Hoje, a sua entidade, está presente, com programas de acolhimento, integração e desenvolvimento comunitário, nos estados do Rio de Janeiro ( Miguel Couto, Tinguá, Guaratiba, Rosa dos Ventos, Vila Claudia, Shangri-lá), Alagoas ( Santana de Ipanema) e Ceará (Fortaleza, Pacatuba).
Pe. Renato trouxe dois jovens que se reintegraram e hoje são orgulho da entidade: Émerson era traficante e hoje é missionário; Órfão, o moçambicano Radul se tornou professor de Filosofia.
Contato: https://casadomenor.org
Equipe de Comunicação das Missões