Robson Ribeiro de Oliveira Castro
Aos 14 de setembro de 1981, o Papa João Paulo II, em comemoração ao 90º aniversário da Rerum novarum (RN), de Leão XIII, publicou a encíclica social Laborem Exercens (LE). Para compreender sua importância e sua atualidade, o debate se faz necessário nos dias de hoje.
Vivendo em um período de grandes desmontes e problemas causados pelos aspectos competitivos da vida, a encíclica de São João Paulo II tem seu desenvolvimento no tema do trabalho e a importância da vida humana.
Nesta ótica é necessário compreender que é mais do que urgente se falar da relação do homem com o trabalho e sua constante desvalorização frente à máquina que transformou tudo e todos em meros objetos.
Atuando neste contexto, a relação humana, frente às realidades advindas da modernidade, nos apresenta a condição singular de que somos parte da criação e que devemos nos atentar para a construção de um mundo mais relacional e comprometido com a causa de cada um e cada uma. No documento, João Paulo II assevera que o ser humano “é sujeito do trabalho. É como pessoa que ele trabalha e realiza diversas ações que fazem parte do processo do trabalho” (LE, n.6).
Destarte, é preciso compreender a função do homem e a realidade do trabalho. Uma constatação na encíclica social é a valorização do trabalhador: ‘O primeiro fundamento do valor do trabalho é o mesmo homem, o seu sujeito. E relaciona-se com isto imediatamente uma conclusão muito importante de natureza ética: embora seja verdade que o homem está destinado e é chamado ao trabalho, contudo, antes de mais nada o trabalho é ‘para o homem’ e não o homem ‘para o trabalho’.” (LE, n. 6)
E, diante desta realidade e contexto do trabalho, há uma máxima a ser observada: “a finalidade do trabalho, de todo e qualquer trabalho realizado pelo homem (…) permanece sempre o mesmo homem”. (LE, n. 6). Por isso, em tempos de pandemia, problemas sobre o trabalho e a grande desigualdade social que enfrentamos, precisamos saber viver o período de uma grande transformação social, política e econômica.
Embora comemorando-se 40 anos de sua publicação, é possível observar que o texto é bastante atual, pois vivemos uma realidade critica, principalmente com a pandemia. Nesta dura realidade, é urgente observar a condição dos trabalhadores, em 2021, com a situação pandêmica que estamos vivendo. Infelizmente, com o contexto da Covid-19 temos um país entregue ao descaso. Muitos dos brasileiros perderam seus empregos ou tiveram que adaptar a vida para fazer algum tipo de “bico” para completar a renda familiar.
Desta forma, diversos trabalhadores se sujeitam à exploração para manterem seus empregos. Na atualidade, a pandemia colocou o ser humano em uma realidade complexa e difícil. A crise do trabalho é resultado de uma opção social e mostrou a sua pior face: a fome! Para tanto, diante desta grave crise que nos assola, devemos voltar nossos olhares e nosso esforço para os desamparados. É urgente o zelo pelos mais pobres!
São João Paulo II apresenta que “o trabalho é um bem do homem”. E mais: “é não só um bem ‘útil’ ou que se pode usufruir, mas um bem digno, ou seja, que corresponde à dignidade do homem, um bem que exprime esta dignidade e que a aumenta”. (LE, n. 9). Com esta afirmação é possível observar que a condição digna do trabalhador, sua relação com o trabalho e a manutenção da família não estão no mesmo nível de importância.
Isso se apresenta na realidade de que os postos de trabalho são mais valorizados que as vidas que ocupam seus lugares, independente de qual função ou setor, o trabalhador sofre com as dificuldades enfrentadas ao longo dos dias e a precarização de diversos setores.
Por isso: “O trabalho é um bem do homem – é um bem da sua humanidade – porque, mediante o trabalho, o homem não somente transforma a natureza, adaptando-a às suas próprias necessidades, mas também se realiza a si mesmo como homem e até, num certo sentido, se torna mais homem” (LE, n. 9).
Élio Gasda, teólogo e professor da Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, afirma que “a desumanização do trabalho é a dimensão mais selvagem da economia. Desintegra a sociedade: explosão do desemprego, precariedade laboral, destruição ambiental, misoginia, xenofobia, racismo, destruição da saúde e da educação. A pandemia escancarou a brutalidade das desigualdades de classe, raça e sexo. A dimensão da brutal concentração da riqueza foi agravada pela pandemia”.
E sua crítica é certeira, pois são os menos favorecidos e as classes trabalhadoras mais pobres que sofrem com a pandemia e necessitam sair para trabalhar todos os dias correndo riscos. É preciso tentar entender os desafios do distanciamento social das classes e a ética social no desenvolvimento humano e as perdas pelo vírus ao longo dos dias.
Assim, com uma realidade dura e frágil, compromete o desenvolvimento humano e sua grande relação com os demais. É preciso atentar-se para o clamor dos sinais dos tempos e ouvir os mais pobres e marginalizados, dar a eles sustento e condições de vida digna; somente assim poderemos colher frutos bons e, acima de tudo, dar condições a cada um e cada uma.
Ao comemorar 40 anos de uma encíclica tão atual, resta-nos continuar na luta e não desistir de fazer a diferença entre os que mais precisam e estão mais fragilizados.
Robson Ribeiro de Oliveira Castro Chaves é mestre em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE), em BH, professor de teologia no Instituto Teológico Franciscano (ITF), em Petrópolis (RJ) e membro do Conselho Regional de Formação (CRF) – LESTE II do CNLB.