Vida Cristã - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

Centenário de Nascimento de Dom Paulo Evaristo Arns

Apresentação do Ano Jubilar

Para celebrar o 1º Centenário de Nascimento (1921-2021) de Dom Frei Paulo Evaristo Arns, teve início no dia 14 de setembro o Ano Jubilar na Arquidiocese de São Paulo e na Província Franciscana da Imaculada Conceição. Esse momento histórico foi vivido, às 10 horas, com a Missa de abertura na Catedral da Sé (VEJA COMO FOI).

Haverá, ainda, uma edição especial do jornal “O São Paulo”, destacando a vida, a obra e o legado deixados por Dom Paulo para o presente e o futuro da Igreja na cidade.

Entre os eventos programados estão debates, reflexões, a obra literária de Dom Paulo e as iniciativas pastorais que ele e seus colaboradores tomaram e que ainda hoje existem. Além disso, ao longo do ano, a Arquidiocese marcará presença em tantas outras iniciativas programadas pela Província Franciscana da Imaculada Conceição e de entidades ligadas aos direitos humanos.

O Ministro Provincial Frei Fidêncio Vanboemmel, que participou da Comissão do 1º Centenário da Arquidiocese de São Paulo, lembra que a Província se une à iniciativa da Arquidiocese, junto com outras entidades e organizações sociais.

“Juntos queremos celebrar este momento histórico para resgatar, conhecer e reconhecer o profetismo deste incansável Homem da Esperança. Dom Paulo, numa celebração festiva na Província, disse aos confrades que a história da sua vida pode ser resumida em três partes: a família, a vida franciscana e o pastoreio de bispo a serviço da Igreja”, disse.

Segundo Frei Fidêncio, celebrar o Centenário do nascimento de Dom Paulo é trazer para a realidade de hoje o desdobramento destes três eixos fundamentais da sua vida:

1º) Recordar a vida familiar deste 5º filho dentre 13 irmãos do casal Gabriel Arns e Helena Steiner Arns. Família que zelou pela vida cristã e procurou dar aos filhos aquilo que deve ser o direito de todas as famílias: oferecer qualidade de formação e estudos.

2º) Celebrar a vocação franciscana e a caminhada formativa de Frei Paulo Evaristo Arns na Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil, da Ordem dos Frades Menores, desde a sua entrada no seminário de Rio Negro (PR) 1934, o seu Noviciado em 1940, a sua formação filosófica-teológica e os seus estudos de pós-graduação na França, bem como os diferentes serviços prestados à Fraternidade Provincial: professor em Rio Negro, Agudos e Petrópolis, Mestre dos Clérigos e Vigário provincial, quando, em 1966, foi nomeado bispo auxiliar da cidade de São Paulo.

3º) Rememorar o pastoreio profético de Dom Paulo como bispo da Arquidiocese de São Paulo numa Igreja que, desde a sua nomeação como Bispo, começou a respirar os novos ares e as grandes transformações provindas do Concílio do Vaticano II. Um pastoreio e profetismo que, como fiel filho de São Francisco, fundado na radicalidade da vivência do santo Evangelho, foi voz dos sem voz em tempos difíceis de um regime de “Brasil nunca mais”.


Foto principal: Luciney Martins/ Jornal O SÃO PAULO

Mais eventos para celebrar a data

Segundo o Vigário Provincial, Frei Gustavo Medella, uma série na TV Franciscanos abre o Ano Jubilar para falar da vida deste frade franciscano da Província da Imaculada Conceição. Um banner comemorativo será entronizado no dia 14 de setembro de 2021 para ser utilizado em todas as instituições da Província (Paróquias, Santuários, Colégios, Universidade, Rádios, Obras Sociais, Casas de Formação, etc.). Outras iniciativas estão sendo alinhadas para serem lançadas durante o Ano Jubilar.

Na Arquidiocese será dado destaque à obra literária de Dom Paulo, com a possível reedição de um de seus livros, e uma exposição fotográfica mostrará momentos marcantes do seu pastoreio. Até mesmo um concerto musical na Sala São Paulo foi programado, faltando apenas confirmar a data.

Esses momentos celebrativos também já mobilizam entidades religiosas e civis da sociedade brasileira. Dom Paulo foi homenageado no Senado Federal (VEJA COMO FOI) e na Câmara Federal (VEJA COMO FOI).


O frade menor

Dom Paulo e Flávio são filhos do casal Gabriel Arns e Helena Steiner, pequenos agricultores descendentes de imigrantes provenientes da Alemanha (região de Rio Mosela), que tiveram treze filhos. O quinto filho foi Dom Paulo ao nascer no dia 14 de setembro de 1921 em Forquilhinha, Criciúma, SC.

Dom Paulo realizou seus estudos fundamentais em Forquilhinha e ingressou no Seminário Seráfico São Luís de Tolosa de Rio Negro (Paraná). Em 1940, entrou no noviciado da Província Franciscana da Imaculada Conceição, em Rodeio (Santa Catarina), onde fez os votos temporários na Ordem dos Frades Menores. Em seguida, cursou Filosofia em Curitiba e a Teologia em Petrópolis.

Foi ordenado presbítero no dia 30 de novembro de 1945, em Petrópolis, por Dom José Pereira Alves, arcebispo de Niterói. Por cerca de uma década exerceu seu ministério, assistindo a população desfavorecida da Baixada Fluminense e Petrópolis, onde também lecionou no Instituto Teológico Franciscano (ITF) de Petrópolis e na Universidade Católica de Petrópolis.

Depois disto, foi para a França para cursar Letras na Sorbonne, onde se doutorou em 1952. Retornando ao Brasil,  Frei Evaristo Paulo Arns trabalhou no interior de São Paulo, onde lecionou e cuidou da formação franciscana no Seminário Menor de Agudos. Mas foi em Petrópolis (RJ) que, além de cuidar da formação dos teólogos, ele dedicou parte do seu tempo ao trabalho pastoral e “se apaixonou pelo povo humilde”, como afirma Maria Angela Borsoi, que por mais de 40 anos foi secretária de Dom Paulo.

No pequeno livro “Um padre em sete morros abençoados”, de mais de 80 páginas, Dom Paulo conta como era o trabalho que realizava junto ao povo, desde o atendimento aos doentes, as catequeses para as crianças, a preocupação com a falta de escola e o alto índice de analfabetos da região. “O principal era a escola: de cem crianças, 91 não a frequentavam, como já contei. As escolinhas se resumiam a uma sala e a professora sacrificada, gritando entre as crianças sentada na terra batida. Preparei um projeto de reforma das escolas e fui apresentá-lo ao bispo local, homem de muita bondade. Aceitou logo a proposta, pois reconhecia os estudos e a experiência de seu frade amigo. Em que consistia? As salas de aula passariam, por um comodato, à Igreja. O município nomearia os professores e os pagaria. Mas só poderiam nomear aqueles que figurassem na lista do povo que descobre, indica e controla”, contou o frade franciscano.

Segundo recorda no livro, em 1966, quatro meses de chuvas provocaram uma calamidade na cidade. Rochas despencaram, rolando morro abaixo e por onde passaram, deixaram um rastro de morte, lama e destruição. Ao receber uma ligação pedindo socorro, Frei Evaristo convocou os estudantes. Todos trocaram os hábitos, por calças, camisas e botas. Os feridos foram encaminhados para o hospital, já os mais de 40 mortos foram velados no salão do convento franciscano. “Fizemos escala, e os frades, após o banho, trajando seus hábitos religiosos, passaram a noite ao lado dos mortos, no salão da Ordem Terceira. Rezaram e cantaram a noite inteira para evitar a confusão do choro e a reclamação contra Deus, que não havia evitado essa quase insuportável calamidade”.

Nesse aspecto, ela cita uma entrevista dada por Dom Paulo, em 1989, para a revista Grande Sinal, da Editora Vozes, onde Dom Paulo, na época comemorando 50 anos de vida religiosa, afirma que “foi a partir do momento que recebi como presente o texto completo do Novo Testamento. Gostei sempre da pessoa e da mensagem de Jesus Cristo, por isso afeiçoei-me com intensidade a todos acontecimentos que tanto empolgaram a São Francisco: o Natal de Jesus na vida terrena; a cruz como fonte de esperança; e a eucaristia como expressão plena de amor”.

Na sua autobiografia, descreve-se assim: “Qualquer coisa que eu tenha feito em minha vida ou ainda chegue a realizar explica o fato de eu ser padre. Fui por longos anos professor, mas sempre padre-professor, ao ensinar Literatura, Teologia ou Didática. Escrevi livros e milhares de artigos mesmo antes da ordenação sacerdotal. Trazem a marca de padre. Amei muito na vida e passei por situações humilhantes, por calúnias graves e muito difundidas, mas sempre como padre, porque desejei cumprir a missão que Cristo me confiou. Meu lema de bispo, arcebispo e cardeal – ‘De esperança em esperança’ – foi escolhido na época eu que eu era um simples padre”.

Em 2 de maio de 1966 foi eleito bispo titular de Respecta e auxiliar de São Paulo, aos 44 anos. Recebeu a ordenação episcopal em 3 de julho de 1966, na igreja matriz do Sagrado Coração de Jesus em Forquilhinha. Tinha início uma nova trajetória de vida na Igreja, sempre com as bases franciscanas: Profeta e pastor em defesa dos oprimidos e dos Direitos Humanos, contra a censura, a favor da liberdade, incentivando a organização do povo em comunidades de base, apoiando os movimentos sociais, denunciando a tortura e enfrentando militares, independentemente das patentes, oferecendo a Catedral da Sé para missas e cultos ecumênicos de repúdio à ditadura.

RESUMO BIOGRÁFICO

Nascido em Forquilhinha, Criciúma, SC, 14/09/1921.
Ordenação Sacerdotal: Petrópolis, RJ, 30/11/45.
Eleito Bispo Titular de Respecta e designado Bispo Auxiliar do Cardeal Rossi: 02/05/66.
Ordenação Episcopal: Forquilhinha, SC, 03/07/66.
Promovido a Arcebispo Metropolitano de São Paulo: 22/10/70.
Posse como Arcebispo: 01/11/70.
Criado Cardeal por Paulo VI: 05/03/73;

Como Bispo:

  • Arcebispo Metropolitano de São Paulo de 01/11/1970 a 22/5/1998;
  • Cardeal desde 1973;
  • Membro da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos;
  • Coordenador do Colégio Episcopal de São Paulo;
  • Grão Chanceler da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo;

FORMAÇÃO

Cursos

  • Seminário menor dos franciscanos em Rio Negro (PR), 1934-1939.
  • Noviciado em Rodeio, SC, 1940.

Formação Universitária

  • Filosofia: Curitiba, 1941-1943
  • Teologia: Petrópolis, 1944-1947

Especialização e pós-graduação

  • Licença em Letras: estudos brasileiros, latinos, gregos e história antiga; Universidade de Paris (Sorbonne), 1947 – 1950
  • Pedagogia: Instituto de Pedagogia de Paris, 1950 – 1952
  • Literatura Antiga: Instituto de Altos Estudos, Paris, 1950-1952
  • Estágios: 3 na Alemanha, 2 na Inglaterra, 1 na Holanda, 1 na Bélgica, 1 nos Estados Unidos e 1 no Canadá, 1948-1950
  • Doutorado em Letras: Universidade de Paris (Sorbonne), em 03.05.52, com a distinção maior, “très honorable” para a tese: La technique du livre d’après Saint Jérome
  • Teses secundárias: Les Confessions de Saint Augustin dans l’oeuvre de Saint Bonaventure; Thesaurus Linguae Latinae.

Serviços 

  • Professor no Ginásio de Rio negro (PR), 1946.
  • Professor de francês e letras clássicas; Seminário Santo Antônio, Agudos (SP), 1953-1955.
  • Fundador da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Bauru, 1954.
  • Professor de língua e literatura francesa: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Bauru, 1954-1955.
  • Professor e Orientador da Campanha de Aperfeiçoamento do Ensino Secundário, do Ministério da Educação e Cultura: Juiz de Fora e Curitiba, 1955-1957.
  • Professor de Literatura Cristã e História da Igreja Antiga: Instituto de Teologia de Petrópolis, 1956.
  • Mestre de Clérigos e prefeito de estudos: Ordem dos Frades Menores, Petrópolis, 1956-1966.
  • Capelão da Comunidade de São José Operário, Itamarati, Petrópolis, 1956-1966.
  • Professor de Didática geral: Faculdade de Filosofia de Petrópolis, 1958.
  • Jornalista (não-profissional): registro na 14º Delegacia Regional do Trabalho: Petrópolis, 1961-1966.
  • Vice-Provincial dos Franciscanos de São Paulo, 1962-1966.
  • Membro da Comissão internacional para reforma das constituições dos Frades Menores: Roma, Itália, 1966.

O Arcebispo

Foi indicado bispo auxiliar de Dom Agnelo Rossi, no dia 02.05.1966 e sagrado em 03.07.1966, como bispo titular de Respecta.

Atuou intensamente na Região Norte de São Paulo. Foi nomeado Arcebispo de São Paulo no dia 22.10.1970, tomando posse dia 01.11.1970.

Perante o núncio apostólico, vinte e oito bispos e arcebispos, diante do governador, do prefeito e cerca de cinco mil fiéis, Dom Paulo tendo a mãe presente, Sra. Helena Steiner Arns, com 76 anos, e seus quatorze irmãos, fez comovente exortação, da qual extraímos:

“Venho do meio do povo desta Arquidiocese a que já pertencia, do clero a quem amo e de quem sou irmão, dos religiosos que comigo se esforçam para serem sinal e esperança dos bens que estão para chegar, dos leigos que entendem o serviço aos irmãos como tarefa essencial de sua existência.”

Cardeal

Feito Cardeal por Paulo VI no consistório de 05.03.1973, com o título de Santo Antônio na Via Tuscolana.

Assim que assume a diocese incrementa fortemente a participação dos leigos nos passos do Concílio Vaticano II. Realiza a Operação Periferia, vendendo o palácio Episcopal e assume destemida defesa dos direitos humanos constantemente violados pela ditadura militar. Torna-se voz dos sem voz e arauto da justiça social em nossa pátria. É de sua responsabilidade a edição do livro e relatório “Brasil, nunca mais”, marco na luta contra a tortura.

Cria novas regiões episcopais, realiza amplo plano de pastoral urbana e lança as bases para a ação colegiada na grande metrópole de São Paulo. Criou as condições essenciais para a entre-ajuda do projeto “Igrejas-irmãs”. Em seu tempo Dom Paulo cria quarenta e três paróquias, incentiva e apoia o surgimento de mais de duas mil comunidades de base nas periferias da metrópole paulistana, particularmente nas atuais dioceses sufragâneas de São Miguel, Osasco, Campo Limpo e Santo Amaro, além das regiões de Belém e de Brasilândia. Esta era a resposta eficaz e efetiva ao crescimento desordenado, à miséria crescente e à migração constante e forçada para a capital de São Paulo.

Em 1975 tem como bispos auxiliares, Dom José Thurler, Dom Benedito de Ulhôa Vieira, Dom Francisco Manuel Vieira, Dom Mauro Morelli, Dom Joel Ivo Catapan e Dom Angélico Sândalo Bernardino, cada qual assumindo uma das seis regiões episcopais, divididas em setores de pastoral com autonomia e dinâmica próprias. Ainda serão escolhidos Dom Luciano Mendes de Almeida, Dom Alfredo Novak, Dom Antônio Celso Queiroz, Dom Fernando Penteado, Dom Antônio Gaspar e Dom Décio Pereira.

Cada setor deverá assumir e articular as quatro prioridades escolhidas pelo povo: Comunidades eclesiais de base, Direitos humanos e Marginalizados, Mundo do Trabalho e Pastoral da Periferia.

A arquidiocese começa a agir de acordo com planos de pastoral, nos moldes da CNBB, fixando a cada dois anos e depois a cada quatro anos objetivos e prioridades pastorais para garantir eficácia e unidade pastoral evangelizadora. Foram sete os planos de pastoral aplicados no tempo de D. Paulo, sempre motivados pelo lema: De esperança em esperança. As prioridades do 7° plano são: Saúde, Moradia, Mundo do Trabalho e Educação.

Depois de inúmeras divisões de seu território ao longo dos anos, a Arquidiocese tinha em 1997, a seguinte configuração:

♦ seis regiões episcopais,

♦ cinquenta setores de pastoral,

♦ três vicariatos ambientais,

♦ duzentos e sessenta e sete paróquias territoriais e pessoais,

♦ dez santuários,

♦ quatrocentos e sessenta e uma comunidades eclesiais de base,

♦ vinte e cinco pastorais articuladas pela cidade,

♦ trinta e seis movimentos de leigos,

♦ coordenados por dezenas de ministros e ministras leigas, com o apoio ministerial de 2337 religiosas,

♦ 771 sacerdotes diocesanos e religiosos,

♦ cinquenta e nove seminaristas,

♦ cinco bispos auxiliares e um vigário episcopal (D. Antonio Gaspar, Dom Joel Ivo Catapan, Dom Antonio Celso de Queiróz, Dom Angélico Sândalo Bernardino, D. Fernando José Penteado, Mons. Walter Caldeira) e o pastor diocesano, Dom Paulo Evaristo Arns.

A arquidiocese compreende somente 635,33 Km2 dos 1509 Km2 do Município. A população, em 1997, era estimada em 9 milhões de habitantes.

Dom Paulo é autor de 56 livros e recebeu mais de uma centena de títulos nacionais e internacionais.

EFEMÉRIDES ECLESIÁSTICAS

29/11/44 – Ordenação Diaconal
30/11/45 – Ordenação Presbiteral
23/12/45 – Celebração da primeira missa
03/07/66 – Ordenação Episcopal
01/11/70 – Posse como quinto arcebispo metropolitano de São Paulo
05/03/73 – Investidura como terceiro cardeal de São Paulo

CIDADANIAS

♦ Cidadão Petropolitano, deliberação nº 1744 de 22.10.63, título recebido em 14.02.64

♦ Cidadão de Passa Quatro, resolução 158, de 15.06.76

♦ Cidadão Paulistano, decreto legislativo nº 9/77, 24.11.77

♦ Cidadão Mojimiriano, decreto legislativo nº 31, 12.04.78

♦ Cidadão Joseense, decreto legislativo nº 6, de 30.05.78, recebido em 24.08.83

♦ Cidadão Sanjoanense, decreto legislativo nº 10/78, de 28.11.78, recebido em 10.08.79

♦ Cidadão Jacareiense, decreto legislativo nº 10/78, de 03.07.78, recebido em 08.08.80

♦ Cidadão Honorário de Piquete, decreto legislativo nº 2/79, recebido em 24.08.83

♦ Cidadão Candidomotense, decreto legislativo nº 9/78, de 07.11.78

♦ Cidadão de Guarujá, decreto legislativo nº 119/79, de 08.08.79

♦ Cidadão Prudentino, decreto legislativo nº 65, de 28.06.79, comunicado em 19.09.79

♦ Cidadão Mineiro, honraria informal outorgada em desagravo por mineiros de São Paulo, em sessão solene na Assembléia Legislativa de São Paulo, 25.01.80

♦ Cidadão Francorrochense, decreto legislativo nº 2/80, de 25.08.80

♦ Cidadão Benemérico Aparecidense, decreto legislativo nº 4/80, de 20.10.80

♦ Cidadão Aguaiano, decreto legislativo nº 16/80, de 09.01.80

♦ Cidadão Honorário do Estado do Paraná, lei estadual nº 7477, de 08.07.81, recebido em 03.12.81. 17. Cidadão Ibiunense, decreto legislativo nº 1/83, de 07.04.83, recebido em 28.05.83

♦ Cidadão Livre de Galway, Irlanda, 16.06.83

♦ Cidadão Lindoiense, decreto legislativo nº 5, de 28.08.79, recebido em 02.07.84

♦ Cidadão Osasquense, decreto legislativo nº 1/84, de 02.02.84

♦ Cidadão Cruziliense, resolução de 10.02.84, recebido em 05.07.86

♦ Cidadão Paracambiense, RJ, recebido em 12.07.86

♦ Cidadão Ribeirãopretano, decreto legislativo nº 29/81, recebido em 11.11.91

♦ Cidadão Honorário e Benemérico de Cataguases, decreto legislativo nº 3/93, recebido em 06.09.93

♦ Cidadão Emérito de Santos, decreto legislativo nº 15/94, recebido em 26.01.95

♦ Cidadão Benemérito de Forquilhinha, decreto legislativo nº 13/95, de 02.11.95, recebido em 11.12.95

♦ Cidadão Honorário de Maceió, decreto legislativo nº 7/83, recebido em 18.12.95

♦ Cidadão Honorário de Belo Horizonte, resolução nº 1967 de maio de 1994, da Câmara Municipal de Belo Horizonte-MG, entregue em 17.11.99

♦ Cidadão Honorário de Juiz de Fora, Lei nº 9629 de 26.10.99 da Câmara Municipal de Juiz de Fora-MG, 25.11.99

♦ Cidadão Sorocabano, Decreto Legislativo nº 526 de 21.06.01 da Câmara Municipal de Sorocaba-SP, 10.08.01

♦ Cidadão Honorário do Município de Santo André, Decreto Legislativo n° 10, de 27.08.01, entregue em 21.09.01

♦ Cidadão Guarulhense, Decreto Legislativo n° 005/2001, aprovado em 20.11.01 e entregue em sessão solene realizada em 19.04.02

♦ Cidadão Honorário de Brasília, Câmara Legislativa do Distrito Federal, 17.12.02

♦ Cidadão Araraquarense, Decreto Legislativo nº 493 de 02.04.03, entregue em 02.08.03

♦ Cidadão Ferrazense, Decreto Legislativo nº 321 de 16.10.03, entregue em Ferraz de Vasconcellos, SP, 14.03.04

♦ Cidadão Honorário de Joinville, Decreto Legislativo nº 20/03, Joinville, SC, 17.06.04

♦ Cidadão Itaquaquecetubense, Decreto Legislativo nº 04, de 19.05.2004, entregue em 01.08.2004

♦ Cidadão Itapeviense, Decr.Legislativo Nº 014/2004 de 11.08.04, entregue em 03.12.2004

DOUTORADOS

♦Doutorados honoris causa
(títulos universitários conferidos a título de homenagem)

♦ Doutor honoris causa em Direito, Universidade de Notre Dame, Indiana, EUA, em 22.05.77, juntamente com o presidente Jimmy Carter.

♦ Doutor honoris causa em Sagrada Teologia, Siena College, Loudonville, EUA, em 17.05.81

♦ Doutor honoris causa em Direito, Fordham University, Bronx, New York, EUA, 24.05.81

♦ Doutor honoris causa em Direito, Seton Hall University, Newark, EUA, 06.06.82

♦ Doutor honoris causa em Teologia, universidade de Münster, Alemanha, 19.01.83

♦ Doutor honoris causa em Direito, Saint Francis Xavier University, Antigonish, Canadá, 04.05.86

♦ Doutor honoris causa em Ciências Humanas, Universidade de Dubuque, Iowa, EUA, em 07.09.88

♦ Doutor honoris causa, Universidade de São Francisco, Bragança Paulista, 08.03.89

♦ Doutor honoris causa, Universidade Metodista de Piracicaba, 08.08.90

♦ Doutor honoris causa em Ciências Humanas, Manhattanville College, Purchase, NY, EUA, 25.05.91

♦ Doutor honoris causa, Universidade do Sagrado Coração de Jesus, Bauru, 06.06.92

♦ Doutor honoris causa, Universidade Católica de Nimega, Holanda, 29.10.93

♦ Doutor honoris causa, Universidade Católica de Goiânia, GO, 05.05.98

♦ Doutor honoris causa, Universidade do Extremo Sul Catarinense, Criciúma, SC, 08.12.98

♦ Doutor honoris causa, Universidade Federal do Acre, Rio Branco, AC, 21.12.98

♦ Doutor honoris causa, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, 31.05.99

♦ Doutor honoris causa em Teologia, Pontifícia Faculdade de Teologia N.Sra. da Assunção, São Paulo, SP, 12.08.99

♦ Doutor honoris causa, Universidade Federal de Viçosa, MG, 02.09.99

♦ Doutor Honoris Causa, Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP, de acordo com deliberação do Conselho Universitário, sessão de 28.03.00, entregue em 20.10.00

♦ Doutor Honoris Causa, Universidade de Sorocaba, de acordo com deliberação do Conselho Universitário, sessão de 19.02.01, entregue em 10.08.01

♦ Professor Honoris Causa do Curso de Editoração Multimídia das Faculdades Integradas Alcântara Machado – UniFIAM-FAAM, São Paulo, pelos inestimáveis serviços prestados à Comunicação Social e pelo trabalho incessante como guardião dos Direitos Humanos, 28.05.02

♦ Doutor Honoris Causa da Universidade de Brasília, 17.12.02

♦ Doutor Honoris Causa da Universidade Estadual de Londrina, PR, 07.11.03

♦ Doutor Honoris Causa em humanidade, “por sua trajetória de autêntico cristão, cujo testemunho vivo e eloqüente marcou indelével e profundamente a história de nossa Universidade, em particular, e da sociedade brasileira em geral”. – Outorgado pela PUC-SP, por unanimidade e aclamação do Colendo Conselho Universitário na sessão de 29.10.2004, entregue solenemente em 01.11.2005

Prêmios, títulos e homenagens

PRÊMIOS

♦ Prêmio (informal) “Mahatma Gandhi” da Paz, em eleição coordenada pelo publicitário Carlito Maia e apuração referendada pela presidência da Associação Brasileira de Imprensa, 31.12.81

♦ Prêmio Internacional “Letelier-Moffitt de Direitos Humanos”, do Instituto de Estudos Políticos de Washington, EUA, fundado pelo presidente Kennedy, 21.09.82

♦ Prêmio “Governo do Estado do Rio de Janeiro”, com a grande personalidade brasileira, pela amplitude com que assumiu as responsabilidades sociais da Igreja, 28.02.85

♦ Prêmio Internacional “Medalha Nansen”, do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), recebido no Palácio das Nações Unidas em Genebra, Suíça, em 07.10.85

♦ 7º Prêmio “Wladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos”, do Sindicato de Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo e Comitê Brasileiro pela Anistia, 25.10.85

♦ Prêmio Internacional “Arcebispo Oscar Romero de Direitos Humanos”, da Fundação Ecumênica Menil-Rothko Chapel, Houston, EUA, 24.03.88

♦ 1º Prêmio Nacional de Direitos Humanos, da Coordenação Brasileira dos Centros de Defesa dos Direitos Humanos, 08.12.88

♦ Prêmio “Hélder Câmara de Direitos Humanos”, da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Pernambuco, 10.08.89

♦ Prêmio “Intelectual do Ano, 1990”, Troféu Juca Pato, da União Brasileira de Escritores e Folha de S. Paulo, 18.10.90

♦ Prêmio “10 Anos da Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP”, Ordem dos Advogados do Brasil, seção São Paulo, 12.12.90

♦ Prêmio “Oscar Romero de Serviços à Não-Violência e aos Pobres”, de Pax Christi, Portland, EUA, 25.05.91

♦ Prêmio “The Right Livelihood” conquistado na Europa pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra do Brasil e, por este, repassado a Dom Paulo em virtude do apoio emprestado, em 05.92

♦ Prêmio Graymoor e Afiliação à Ordem Primeira dos Franciscanos da Reconciliação, decreto de 08.09.93 e entrega em 21.04.94, New York, EUA

♦ 11º Prêmio Niwano da Paz, Tóquio, Japão, 11.05.94

♦ 1º Prêmio Direitos Humanos, categoria “Livre”, criado pelo decreto de 08.09.95 do presidente da República, conferido pelo presidente Fernando Henrique Cardoso em 05.12.95

♦ Prêmio Municipal de Direitos Humanos da Prefeitura Municipal de Maceió, lei nº 4367, de 15.12.95, entregue em 18.12.95

♦ Prêmio “Criança e Paz 1996”, do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Brasília, 13.11.96

♦ Prêmio PNBE de Cidadania, do Pensamento Nacional das Bases Empresariais, São Paulo, 03.12.96

♦ Prêmio Franz de Castro Holzwarth/1996, da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, seção de São Paulo, 10.12.96

♦ 1° Prêmio Santo Dias de Direitos Humanos, da Assembléia Legislativa de São Paulo, 15.12.97

♦ Prêmio “Ordem do Mérito da Fraternidade Ecumênica”, categoria Religião, da Legião da Boa Vontade (LBV), 03.12.98

♦ Prêmio “Brenda Lee”, categoria Direitos Humanos, do Centro de Referência e Treinamento em Doenças Sexualmente Transmitidas da Secretaria de Saúde do estado de São Paulo, pelo destaque alcançado no enfrentamento da epidemia de AIDS nos últimos 15 anos, São Paulo, 03.12.98

♦ Prêmio “Top Comunitário”, da 29a. Festa das Personalidades do Ano, do grupo 1 de Jornais, São Paulo, 20.09.99

♦ Prêmio “Teotônio Vilela”, do Instituto Teotônio Vilela de Brasília, por ocasião dos 20 anos de Anistia, Rio de Janeiro, RJ, 27.09.99

♦ 1° Prêmio “Liberdade e Democracia”, da Fundação Pública e Municipal “Ulysses Silveira Guimarães”, Rio Claro, SP, 08.10.99

♦ Prêmio Severo Gomes, da Comissão Teotônio Vilela de Direitos Humanos, “por sua extraordinária contribuição para a promoção e proteção dos direitos humanos, para a defesa das vítimas do arbítrio e para a consolidação do estado de direito no Brasil e na América Latina”, São Paulo, 17.05.00

♦ Prêmio Direitos Humanos 1999/Personalidade do Ano, da Associação das Nações Unidas-Brasil, São Paulo, 26.05.00

♦ Prêmio FASE – Solidariedade e Educação/2001, “porque presenças como a sua tornam possível um outro Brasil”, Rio de Janeiro, 14.09.01

♦ Prêmio IDEC de Construção da Cidadania (escolha por votação dos sócios, na Internet), por ocasião dos 15 anos do IDEC – Instituto de Defesa do Consumidor – São Paulo, 07.08.02

♦ VIII Prêmio USP de Direitos Humanos-2007, categoria individual, “em consideração à sua ampla e longa ação e voz em defesa do mais humilde, do mais oprimido, do perseguido político, contra a tortura e em defesa da Paz e da Dignidade Humana” – São Paulo, 07.12.2007

MEDALHAS

♦ Grão-Oficial da Ordem El Sol del Perú, do governo peruano, 06.03.72

♦ Jubileu de Prata da Fundação para o Livro do Cego no Brasil, pelos relevantes serviços prestados, 16.06.72

♦ Pero Vaz Caminha, do Instituto Histórico e Geográfico Pero Vaz Caminha, São Paulo, 05.09.72

♦ Cavaleiro da Grã-Cruz da Ordem Equestre do Santo Sepulcro de Jerusalém, 02.03.73

♦ Mérito Pessoal e Relevantes Serviços, da Sociedade Consular de São Paulo, 06.06.74

♦ Valor Cívico, do Governo do Estado de São Paulo, 06.05.75

♦ Carlos Gomes, da Sociedade Brasileira de Artes, Cultura e Ensino de Campinas, SP, 04.07.75

♦ Cívico – Cultural do Sesquicentenário do nascimento de D. Pedro II, do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, 24.08.76

♦ Reconhecimento à colaboração recebida, no 15° aniversário de constituição da CESP – Centrais Elétricas de São Paulo, 05.12.81

♦ Bicentenário do Pe. Diogo Antonio Feijó, do Governo do Estado de São Paulo, 30.08.85

♦ Comendador da Legião de Honra, do governo da França, entregue pelo embaixador da França no Brasil, presente a primeira-dama Danielle Mitterrand, em São Paulo, 09.05.87

♦ Medalha Chico Mendes de Resistência, do Grupo Tortura Nunca Mais, Rio de Janeiro, 07.07.89

♦ Medalha do Mérito Anita Garibaldi, categoria Ouro, do Governo do Estado de Santa Catarina, pelos relevantes serviços prestados ao Estado, 23.11.90

♦ Grã-Cruz da Ordem do Ipiranga, decreto nº 52.064 de 20.06.69, do Governo do Estado de São Paulo, em 30.11.95

♦ Medalha de Honra da Universidade de São Paulo, 08.02.96

♦ Medalha Brás Cubas, decreto legislativo nº 40/95, da Câmara Municipal de Santos, 06.03.96

♦ Comenda Maior da Ordem de Nossa Senhora do Ó, no bicentenário da fundação da Paróquia, São Paulo, 15.09.96

♦ Medalha Brigadeiro Tobias, da Polícia Militar do Estado de São Paulo, resolução do Comando Geral aprovada pela Comissão da Medalha, 04.10.96

♦ Medalha Sobral Pinto, da PUC-MG, pela relevante atuação em defesa dos direitos humanos, Belo Horizonte, MG, 29.04.99

♦ Grã-Cruz da Ordem do Pinheiro, do Governo do Estado do Paraná, Curitiba, PR, 30.05.99

♦ Comendador da Grã-Cruz da Ordem do Mérito Cívico e Cultural, em reconhecimento público pelos méritos de honra, caráter, civismo, dignidade e benemerência sempre colocados a serviço da educação e do ensino brasileiros, da Sociedade de Heráldica, Medalhística, Cultural e Educacional, São Paulo, 28.06.99

♦ Grã-Cruz da Ordem de Bernardo O’Higgins, do Presidente da República do Chile, outorgada em 04.10.00 e entregue em 29.07.01

♦ Cultural Dom Aguirre, considerando os relevantes serviços prestados – Sorocaba-SP, 10.08.01

♦ Comenda “Ordem do Rio Branco”, no grau de Grã-Cruz, condecoração oficial do governo da República do Brasil, por decreto de outubro de 2001, entregue em 17 de dezembro de 2001

♦ Insígnias do “Mérito Benjamin Colucci”, da 4a. subseção da OAB – Ordem dos Advogados do Brasil, pelos relevantes serviços às Instituições Jurídicas e Sociais – Juiz de Fora, MG, 10.08.02

♦ Comenda “D. Hélder Câmara – Ação, Justiça e Paz”, pro relevantes serviços prestados à sociedade – da SOCER – Sociedade Cearense de Cidadania, 23.09.02

♦ Mérito Legislativo Câmara dos Deputados, Câmara dos Deputados, Brasília, 27.11.02

♦ Grã-Cruz da Ordem do Mérito Cultural, Ministério da Cultura, Brasília, 17.12.02

♦ Medalha Barbosa Lima Sobrinho da Associação Brasileira de Imprensa, Rio de Janeiro, 06.04.04

♦ Comenda “Ordem do Mérito Anhanguera”, a mais alta Comenda Estadual de Goiás, pelos “relevantes serviços prestados ao Estado de Goiás”, Goiânia, 22.03.2006

♦ Comenda “Gran Cruz Orden del Libertador San Martin”, a mais alta do governo da Argentina, “em reconhecimento pela inestimável ajuda oferecida aos exilados argentinos no Brasil durante a ditadura militar (1976-83)”. São Paulo, 27.03.2006

SÓCIO HONORÁRIO

♦ Instituto Paranaense de Pedagogia, Curitiba, 31.01.58

♦ Sociedade Paulista de História da Medicina, 05.04.73

♦ Pontifícia Academia Mariana Internacional, Roma, Itália, 19.11.73

♦ Associação Paulista de Cirurgiões – Dentistas, regional São José dos Campos, 06.05.75 e 16.07.82 (2a. vez)

♦ Coral Eucarístico Comunicação de São Paulo, 1979

♦ Centro Catarinense Anita Garibaldi, São Paulo, 01.12.91

♦ Remido Honra ao Mérito da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), 09/94

♦ Benemérita Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Rio de Janeiro, 26.11.96

♦ ANCARC – Associação Nacional Católica de Rádios Comunitárias, 09.05.98

♦ 1° Sócio Eméritodo Centro de Estudos e Pesquisa em Direitos Humanos de São Paulo (CDH), pela construção dos valores de igualdade, liberdade e solidariedade na Sociedade Brasileira, São Paulo, 22.03.99

♦ Sociedade de Heráldica, Medalhista, Cultural e Educacional, São Paulo, 28.06.99

♦ Sócio Emérito do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – título estatutário – em homenagem à luta empreendida em prol da Democracia e Direitos Humanos – 09.11.2001

♦ Membro Honorário do PEN Clube do Brasil, Centro da Associação Mundial dos Escritores, Rio de Janeiro, RJ, 09.05.03

TÍTULOS, HOMENAGENS E DIPLOMAS DIVERSOS

♦ Diploma da Creche João XXIII de Guaianazes, pelos relevantes serviços à ação comunitária paroquial. São Paulo, 1972

♦ Diploma – Homenagem pelos relevantes serviços prestados à comunidade na defesa dos direitos humanos, da 60a. Turma de Medicina da Universidade de São Paulo, 02.04.78

♦ Certificado de Gratidão comemorando a visita ao Brasil do Papa João Paulo II e os 480 anos de descobrimento do Brasil e da 1a. Missa, do Instituto Histórico e Cultural Pero Vaz de Caminha, São Paulo, 1980

♦ Personalidade mais influente do Brasil, eleição do Forum Gazeta Mercantil, São Paulo, 1981

♦ Personalidade mais influente do Brasil, eleição do Forum Gazeta Mercantil, São Paulo, 1982

♦ Diploma Honra ao Mérito da Casa de Detenção Prof. Flamínio Fávaro de São Paulo, pela contribuição à ressocialização dos encarcerados, 08.05.87

♦ Diploma “Ordem dos Queixadas”, do Sindicato dos Trabalhadores de Perus, pelo testemunho de firmeza permanente e de ação não-violenta na busca da justiça, São Paulo, 29.05.87

♦ Menção honrosa da Comissão Nacional de Diálogo Religiosos Católico-Judaico/ CNBB, em reconhecimento pelo constante incentivo à aproximação entre os povos e apoio aos promotores da compreensão entre católicos e judeus no Brasil, 11.06.89

♦ Título “Uma das 50 personalidades que ajudaram a tornar este mundo melhor”, da entidade “The Christophers”, New York, EUA, 05.05.95

♦ Diploma de Honra pelos 50 anos de sacerdócio, da Câmara Municipal de Curitiba, PR – novembro de 1995

♦ Homenagem – Reconhecimento pela Educação para a Paz, Justiça e Ecologia, da Universidade São Francisco, Bragança Paulista, SP, 07.10.96

♦ Homenagem do Conselho Federal da OAB – Ordem dos Advogados do Brasil, Brasília – DF, 10.12.96

♦ Diploma Mérito Comunitário, da Sociedade Amigos da Polícia Militar / 4° BPMM, São Paulo, SP, 03.05.97

♦ “Negro Honorário”, título concedido por sete entidades de afro-descendentes de São Paulo,11.11.97

♦ Troféu – Homenagem da Congregação Israelita Paulista, São Paulo, 29.03.98

♦ Homeagem da Plenária dos Conselhos Gestores dos Centros de Referência em Saúde dos Trabalhadores do Município de São Paulo, no encerramento do Seminário Nacional sobre Política de Saúde do Trabalhador – São Paulo, 23.04.98

♦ Reconhecimento público do Governo Federal pela atuação heróica, abnegada e corajosa na defesa dos direitos humanos no país, publicado no Diário Oficial da União (Ministério da Justiça) n° 129, Brasília – DF, 09.07.98

♦ Tributo de Gratidão da Câmara Municipal de São Paulo, 15.08.98

♦ Homenagem da OAB – Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Osasco – SP e do CONDEPH – Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana / Núcleo Osasco, no 1° Tribunal de Direitos Humanos “Dom Paulo Evaristo Arns” de Osasco, SP, 16.10.98

♦ “Cardeal da Cidadania”, título outorgado pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo, pelos relevantes serviços prestados à causa dos direitos humanos no Brasil, inclusive por sua atuação no esclarecimento do assassinato de Vladimir herzog, São Paulo, 27.10.98

♦ “Voto de Louvor”, Homenagem do Senado Federal, por sua relevante luta pelo respeito aos direitos humanos e pela afirmação dos valores cristãos no Brasil – Brasília, DF, 10.12.98

♦ Homenagem pela Ação Pastoral do Idoso, do Comitê do Ano Internacional do Idoso, Ministério da Previdência Social, Brasília – DF, 27.09.99

♦ Homenagem ao Grande Porta-Voz dos Direitos Humanos no Brasil, da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia, Brasília-DF, 25.03.00

♦ Homenagem da X Conferência Municipal de Saúde de São Paulo, Secretaria Municipal da Saúde e Conselho Municipal de Saúde, pela luta em favor dos Direitos Humanos e Justiça Social, São Paulo, 13.11.00

♦ “Personalidade Brasileira dos 500 Anos”, título outorgado a 500 personalidades escolhidas pelo Conselho de Honrarias e Méritos do Centro de Integração Cultural e Empresarial São Paulo, 30.08.01

♦ “Trecheiro da Paz”, concedido pela Rede Rua e Povo da Rua, “por sua solidariedade e compromisso com todos os excluídos e excluídas da sociedade brasileira e do mundo”, 21.09.01

♦ “Idoso de Expressão”, pela atuação na área de direitos humanos, homenagem da Associação Nacional de Gerontologia/SP – 07.09.2001

♦ Homenagem do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, em solenidade realizada na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo. 16.05.02

♦ “Amigo do Idoso”, da Associação Forquilhense dos Grupos de Terceira idade, Forquilhinha, SC, 01.06.02

♦ Diploma de Benfeitor, pelos devotados serviços prestados na Reforma da Capela histórica do Menino Jesus e Santa Luzia, São Paulo – SP, 14.09.02

♦ Homenagem do XX Seminário de Estudos de Teologia, nos 40 anos de Concílio Vaticano II, em reconhecimento ao seu trabalho, amor, entrega, atenção na história do Brasil, na defesa dos direitos humanos e sendo fermento de uma Igreja renovada – da PUC – Campinas, SP, 27.09.02

♦ Diploma “Mérito Dom Bosco” Do V congresso salesiano de educação, homenagem dos educadores salesianos da inspetoria de SP, Águas de Lindóia, SP,14.06.03

♦ Homenagem da pontifícia Faculdade de Teologia N. Sra. Assunção, São Paulo por ocasião do Jubileu de Prata da fundação, por D. Paulo, do curso de graduação noturno, 09.10.03

♦ Reconhecimento e homenagem das Nações Unidas, pelo Alto Comissariado das N.U. para os Refugiados, pela defesa dos Direitos Humanos e dos Refugiados, pelo incentivo e apoio ao trabalho de integração assinando os Convênios de parceria com a FIESP-SENAI e SESI e a FCESP-SENAC e SESC. Sãp Paulo, Dia Mundial do Refugiado, 17.06.04

♦ Homenagem do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo, “por sua incansável luta pelos Direitos Humanos e pela preservação da vida”, São Paulo, 25.10.2004. 36. Homenagem do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça, instituindo o “Prêmio Dom Evaristo Arns” aos Vencedores do IX Concurso Nacional de Monografias, com o tema “Sistema Penitenciário: Saúde Mental e Direitos Humanos”, Brasília, 17.05.2005

Homenagem do Seminário Nacional “Crime Organizado e Direitos Humanos”, do Departamento de Ciências Humanas da PUCCamp, Campinas, SP, 18.05.2005

♦Homenagem da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, através da Liderança do PT e do Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia, Deputado Ítalo Cardoso, à Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo e a Dom Paulo, que exerceu um papel fundamental na história deste organismo, e que continua dando inestimável contribuição na defesa dos direitos fundamentais da pessoa em nosso país. 19.08.2005

♦ Homenagem do IV Congresso de Teologia de São Paulo, por ter sido “o grande profeta da luz, nas trevas do mundo” – Outorgado por seis Faculdades de Teologia de São Paulo e Grande São Paulo, 28.09.2005

♦ Homenagem da PUC-SP, por ocasião da abertura das comemorações dos 60 anos de fundação, “pela contribuição dada à história da Instituição”, São Paulo, 06/06/06

♦ Certificado Homenagem do Fórum de Ex-Presos e Ex-Perseguidos Políticos do Estado de São Paulo, “pelo seu trabalho em defesa dos perseguidos e por sua contribuição na luta contra os arbítrios cometidos pela ditadura militar” – São Paulo, 03.04.2007

♦ Homenagem intitulada “Há aqueles que lutam toda a vida, esses são imprescindíveis”(Brecht), do 1º Seminário Anistiados do Brasil, Anistia e Direitos Humanos, da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, com a Nota “Imprescindível é o título que lhe conferem os anistiados políticos do Brasil pela sua luta em favor dos Direitos Humanos” – Brasília, 15 e 16.08.2007

♦ Homenagem da Comissão Organizadora do XXIX Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos, “Por uma vida dedicada à causa dos desfavorecidos e cuja fé inabalável na justiça e na democracia tem servido de exemplo para a construção da cidadania”, Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo, 25.10.2007

♦ Homenagem da Arquidiocese de São Paulo, por ocasião das comemorações de seu Centenário de instalação, em solenidade realizada na Catedral Metropolitana, em 25/01/2008

♦ Homenagem da Fundação Memorial da América Latina, por ocasião do seminário “1968 – Ecos na América Latina”, “na sua relevante participação humanitária na história política Brasileira” – São Paulo, 09/06/2008

♦ Homenagem da Comissão do 30° Prêmio Wladimir Herzog de Anistia de Anistia e Direitos Humanos, do Sindicato de Jornalistas profissionais do Estado de São Paulo e da ONU, com outorga de réplica do Troféu Wladimir Herzog, de autoria do artista Elifas Andreato – São Paulo, outubro/2008


Fonte: Arquidiocese de S. Paulo

Artigo de D. Odilo Scherer

Comemorar significa, literalmente, trazer à memória juntos, lembrar juntos. Em 14 de setembro de 2021 estaremos comemorando o centenário do cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, quinto arcebispo metropolitano de São Paulo.

Nascido em 1921, em Forquilhinha (SC), Dom Paulo fez seus estudos preparatórios para a vida religiosa nos seminários da Ordem Franciscana dos Frades Menores, sobretudo em Petrópolis (RJ), e foi ordenado sacerdote em 30 de novembro de 1945. Em seguida, fez o doutorado em Letras na Universidade de Sorbonne, em Paris, com uma tese sobre “a arte do livro em São Jerônimo”, tornando-se especialista em literatura cristã antiga, ou patrística.

De volta ao Brasil, foi professor de Filosofia e Teologia em Petrópolis, até ser eleito bispo auxiliar da Arquidiocese de São Paulo, em 2 de maio de 1966, pelo papa Paulo VI. Trabalhou ao lado do cardeal Agnelo Rossi, arcebispo da época, até que, em 1970, Rossi foi chamado a Roma para assumir a condução da Congregação para a Evangelização dos Povos e acompanhar as frentes missionárias da Igreja Católica, sobretudo na África e na Ásia. Dom Paulo tornou-se, então, arcebispo de São Paulo, em 22 de outubro de 1970. Pouco tempo depois, em 5 de março de 1973, foi nomeado membro do Colégio Cardinalício pelo mesmo papa Paulo VI, com quem o cardeal Arns teve sempre grande proximidade e estreita sintonia.

Como arcebispo, Dom Paulo procurou renovar a vida da Igreja e dinamizar o trabalho pastoral na Arquidiocese, atendendo às circunstâncias e necessidades da cidade de São Paulo, que crescia vertiginosamente e carecia de atenção especial às imensas periferias. Arns procurou traduzir em novas práticas organizativas e pastorais as orientações do Concílio Vaticano II no que se refere à participação do povo na vida e na missão da Igreja. Dedicou atenção especial aos pobres e desvalidos, estimulando o surgimento de numerosas obras voltadas para a promoção da caridade e da dignidade humana.

Sua atuação pastoral em São Paulo se deu em pleno regime militar, quando as liberdades democráticas, o respeito à dignidade humana e aos direitos fundamentais da pessoa foram desrespeitados de forma preocupante. Dom Paulo foi voz firme e respeitada na denúncia desses males e na defesa da dignidade da pessoa e de seus direitos fundamentais. Sua atuação se somou à de muitos que clamavam pelo retorno à normalidade democrática no Brasil.

Não deve ficar em segundo plano a figura de Dom Paulo como bispo e pastor dedicado à Igreja. Ele amava seu rebanho e tinha alegria em estar com o povo. Promoveu a evangelização e a organização pastoral, a formação do clero e dos religiosos, incentivou o protagonismo dos leigos para ocuparem com coragem seu lugar na Igreja e na sociedade. Dom Paulo queria a liturgia celebrada com esmero e dignidade, a palavra de Deus anunciada com dedicação e fervor e que o Evangelho de Cristo fosse força e transformação para uma sociedade melhor.

Além da sua palavra fácil e calorosa, Dom Paulo escreveu numerosos livros e publicou frequentes artigos e entrevistas. Sua atuação em favor dos direitos humanos e das liberdades democráticas rendeu-lhe prêmios e reconhecimento nacionais e internacionais.

Tendo permanecido por quase 28 anos à frente da Arquidiocese de São Paulo, o cardeal Arns marcou-a profundamente com seu carisma pessoal e suas diretrizes pastorais. Foi um profeta da esperança, conforme o seu lema episcopal, “Ex spe in spem” – de esperança em esperança. Ele nunca renunciou ao sonho de ver um Brasil melhor e um mundo melhor.

Em 15 de abril de 1998, tendo já superando a idade canônica da renúncia ao seu encargo, tornou-se arcebispo emérito, retirando-se da cena pública. Viveu ainda longamente, vindo a falecer serenamente em 2016. Seu corpo repousa na cripta da catedral metropolitana.
Dom Paulo Evaristo Arns é um ilustre personagem que honra a Igreja Católica. Mas também é uma personalidade pública que teve protagonismo singular no seu tempo. Ele agora pertence à História. Na iminência da celebração de seu centenário, estes brevíssimos traços de sua biografia e da trajetória de sua vida têm o propósito de convidar para fazermos juntos a sua memória, daquilo que fez e significou para São Paulo e o Brasil. Muitas iniciativas poderão ser promovidas para lembrar dom Paulo e valorizar o seu legado.

A Igreja de São Paulo recordará o cardeal Arns no ano do seu centenário dando graças a Deus por sua vida e ação e para destacar novamente a herança espiritual que ele aqui deixou. Uma comissão da Arquidiocese de São Paulo está organizando a agenda de eventos e iniciativas para comemorar a efeméride ao longo de todo o ano. A abertura oficial será feita com uma solene celebração eucarística na Catedral da Sé no próximo dia 14 de setembro, às 10 horas, com a presença de representantes da Igreja, autoridades públicas, de outras instituições religiosas, sociais e culturais.

É preciso recordar Dom Paulo porque ele ainda tem muito a dizer ao nosso tempo.

Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo Metropolitano de São Paulo


Publicado no jornal “O ESTADO DE S. PAULO” no dia 14/08/2021

Encontro virtual recorda o Arcebispo dos direitos humanos

No dia 10 de agosto o Encontro Virtual sobre Dom Paulo reuniu o ex-ministro e ex-secretário estadual (de São Paulo) de Justiça, José Carlos Dias, atual presidente da Comissão Arns, o jornalista Juca Kfouri, a ativista Margarida Genevois – que recentemente ganhou biografia, escrita pelo jornalista Camilo Vannuchi – e o presidente do Conselho do Instituto Vladimir Herzog (IVH), Ivo Herzog. No texto de Vitor Nuzzi, da Rede Brasil Atual, Dias lembrou da formação da Comissão Justiça e Paz (CJP), na Arquidiocese de São Paulo. Ele recebeu convite para participar de reunião na residência do cardeal – “Uma casa modesta na rua Mococa, no Sumaré” – com outros advogados, como Dalmo Dallari, Fabio Konder Comparato, Mári Simas, José Gregori, Hélio Bicudo. “Dom Paulo falou da necessidade de ter um grupo de pessoas que pudesse dar apoio a ele na defesa dos direitos humanos e protegendo aqueles perseguidos políticos”, recorda. “Foi uma conversa tensa, mas muito forte, que mexeu com cada um de nós.”

Outra lembrança foi de uma viagem a Brasília, ao lado do cardeal-arcebispo, para uma reunião com várias famílias de presos políticos. Eles iriam se encontrar com o então poderoso ministro Golberi do Couto e Silva. “Chega Golberi, ele senta, aí dom Paulo fala: ‘Ministro, estas pessoas que aqui estão vão dar testemunho de violência praticada contra pessoas de sua família. Quero que o senhor ouça”. Então aconteceu um fato impressionante: o Golberi chorou. E disse: eu me comprometo a tentar achar essas pessoas. Claro que isso ficou só na promessa. Mas foi uma cena que eu guardo presente na minha lembrança de uma forma indelével.”

Ivo Herzog conheceu Dom Paulo quando criança, em circunstância triste: no ato ecumênico em memória de seu pai, morto sob tortura no DOI-Codi paulista em outubro de 1975. Lembra-se dele “acolhendo minha mãe, que tinha acabado de perder o marido, dois filhos pequenos… Sempre me senti muito acolhido por ele.”

Quando surgiu a proposta de criar o IVH, Ivo foi com a mãe, Clarice, e com o jornalista Ricardo Carvalho visitar o já “aposentado” cardeal, em Taboão da Serra, na Grande São Paulo. Dom Paulo, conta, já tinha ideias na cabeça sobre a futura entidade. “O instituto tinha que promover a paz, a liberdade, o respeito e a democracia. Essa é a nossa missão até hoje, contra essa cultura estabelecida de ódio e violência.”

Margarida conta que conheceu Dom Paulo por meio de convite feito por Comparato, que a convidava para integrar a CJP. Ela não sabia do que se tratava, e foi com o jurista para uma reunião com o cardeal. “Uma casinha pequena, modesta, um piso só, um portãozinho mínimo…” A reunião foi na cozinha, um lugar mais discreto da casa. Durante duas horas, ouviu relatos de prisões, torturas, desaparecimentos. “Eu nem desconfiava que aquilo fosse possível. Era proibido falar disso no jornal. A quem recorrer?” Depois de formada a comissão, “as pessoas contavam seus dramas, suas angústias, procurando as pessoas da família que tinham desaparecido”, recorda.

Uma dessas famílias era do atual presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz. “Eu me lembro dele, pequenininho, devia ter uns 2 anos, nos braços da mãe.” O pai do advogado, Fernando Santa Cruz Oliveira, militante político, desapareceu durante a ditadura.
Margarida lamenta que os jovens atualmente não se interessem tanto pelo assunto, pelas memórias desse tempo. “E isso me machuca muito, sabe? É preciso não esquecer essas dramas que vivemos”, pediu.

Livros publicados

♦ “La technique du livre d’après Saint Jérome” (tese doutoral da Sorbonne), Ed. de Boccard, Paris, 1953; : traduzido para o português sob o título “A Técnica do Livro segundo São Jerônimo”, Imago Editora, Rio de Janeiro, 1993: traduzido para o italiano sob o título “La tecnica del libro secondo San Gerolamo”, Edizioni Biblioteca Francescana, Milão, Itália, 2005. Versão portuguesa reeditada em edição artística e ilustrada pela Editora Cosac-Naify, São Paulo, setembro/2007.

♦ Liberdade de Ensino, Ed. Vozes, Petrópolis, 1960

♦ Por que escolas Católicas? Ed. Vozes, Petrópolis, 1963

♦ Rumo ao casamento, Ed. Vozes, Petrópolis, 1963

♦ A quem iremos, Senhor? Ed. Paulinas, São Paulo, 1968

♦ A humanidade caminha para a fraternidade, Ed. Paulinas, São Paulo, 1968

♦ Paulo VI: você é a favor ou contra? Ed. Paulinas, São Paulo, 1970

♦ Cartas de Santo Inácio de Antioquia. Introdução, tradução e notas, Ed. Vozes, Petrópolis, 1970

♦ A guerra acabará, se você quiser, Ed. Paulinas, São Paulo, 1970

♦ Carta de São Clemente Romano. Introdução, tradução e notas, Ed. Vozes, Petrópolis, 1971

♦ De esperança em esperança, na sociedade, hoje, Ed. Paulinas, São Paulo, 1971

♦ Os Sacramentos e os Mistérios, de Santo Ambrósio, Introdução e tradução do original latino, Ed. Vozes, Petrópolis, 1972

♦ Comunidade: união e ação, Ed. Paulinas, São Paulo, 1972

♦ Viver é participar, Ed. Paulinas, São Paulo, 1973

♦ Cristãos em plena vida, Ed. Loyola, São Paulo 1974

♦ Você é chamado a evangelizar, Ed. Loyola, São Paulo, 1974

♦ Nova forma de consagração da mulher, Ed. Paulinas, são Paulo, 1974; revisto e atualizado com novo título e editora: “Consagração da mulher para tempos novos”, Paulus, 2003.

♦ O evangelho: incomoda? inquieta? interessa? Sínodo da Evangelização, Ed. Loyola, São Paulo, 1975

♦ A família constrói o mundo? Ed. Loyola, São Paulo, 1975

♦ Cidade, abre as tuas portas! Ed. Loyola, São Paulo, 1976

♦ Qual é a sua vocação? Ed. Paulinas, São Paulo, 1976

♦ Sê Fiel! Ed. Loyola, São Paulo, 1977

♦ Em defesa dos direitos humanos. Encontro com o repórter, Ed. Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1978

♦ Convite para rezar, Ed. Paulinas, São Paulo, 1978

♦ Presença e força do cristão, Ed. Loyola, São Paulo, 1978

♦ Em favor do homem, Ed. Avenir, Rio de Janeiro, 1979

♦ Religiosas recomeçam sempre, Ed. do Autor, São Paulo, 1979

♦ Discutindo o papel da Igreja, Ed. Loyola, São Paulo, 1980

♦ Mulher Consagrada: identidade e relacionamento, Ed. Paulinas, São Paulo, 1980

♦ Os ministérios na Igreja, Ed. Salesiana Dom Bosco, São Paulo, 1980

♦ O que é Igreja, Ed. Brasiliense, São Paulo, 1981

♦ Meditações para o dia-a-dia, vol.1, Ed. Paulinas, São Paulo, 1982

♦ Meditações para o dia-a-dia, vol.2, Ed. Paulinas, São Paulo, 1982

♦ Pensamentos, Ed. Paulinas, São Paulo, 1982

♦ Olhando o mundo como São Francisco, Ed. Loyola, São Paulo, 1982

♦ Meditações para o dia-a-dia, vol.3, Ed. Paulinas, São Paulo, 1982

♦ A violência em nossos dias, Ed. Salesiana Dom Bosco, São Paulo, 1983

♦ Meditações para o dia-a-dia, vol.4, Ed. Paulinas, São Paulo, 1983

♦ Para ser jovem hoje, Ed. Salesiana Dom Bosco, São Paulo, 1984

♦ Santos e heróis do povo, Ed. Paulinas, São Paulo, 1985; Ed. Letras & Letras, São Paulo, 1996

♦ O evangelho de Marcos na vida do novo, Ed. Paulinas, São Paulo, 1987. Ed. Paulus, São Paulo, 1997

♦ I poveri e la pace prima di tutto, Ed. Borla, Roma, Itália, 1987

♦ Criança, prioridade absoluta, Ed. Loyola, São Paulo, 1987

♦ O rosário na Bíblia e na vida do povo, Ed. Vozes, Petrópolis, 1987

♦ Von Hoffnung zu Hoffnung. Vortragre, Gesprache, Dokumente, Patmos Verlag, Dusseldorf, Alemanha, 1988

♦ Clamor do povo pela paz, Ed. Paulinas, São Paulo, 1989

♦ Mulher: quem és? Que procuras? Ed. Santuário, Aparecida, 1990

♦ Evangelizar pelo coração, Ed. Loyola, São Paulo, 1991

♦ Da esperança à utopia – Testemunho de uma vida (livro autobiográfico), Editora Sextante, Rio de Janeiro, 2001.

♦ Corintiano, Graças a Deus! – Editoria Planeta do Brasil, São Paulo,2004.

♦ Conversa com São Francisco, Paulinas, São Paulo, 2004.

♦ Mulheres da Bíblia, Paulinas, 2004.

♦ Dez caminhos para a perfeita alegria, Editora Santuário , 2005.

♦ Um padre em sete morros abençoados, Editora Santuário, Aparecida, 2005.

♦ Estrelas na noite escura – Pensamentos , Paulinas, 2006.

♦ O Rosário na Bíblia e na vida do povo (edição revista e atualizada), Editora Ave-Maria, São Paulo, 2006.

♦Vamos a Aparecida – Com Maria, pela paz, Editora Santuário -2007.

BIOGRAFIAS PUBLICADAS

♦ Getúlio Bittencourt e Paulo Sérgio Markum, O Cardeal do Povo, Ed. Alfa-Ômega, São Paulo, 1979.

♦ Mauro Santayana, No meio do povo, Ed. Salesiana Dom Bosco, São Paulo, 1983.

♦ Michael Albus, Ich trage Keinen Purpur, Patmos Verlag, Dusseldorf, Alemanha, 1985.

♦ Horst Goldstein (org), K ardinal der Ausgebeuteten, Walter Verlag, Olten, Suíça, 1987.

♦ Helcion Ribeiro (org), Paulo Evaristo Arns, cardeal da esperança e pastor da Igreja de São Paulo, Ed.


Fonte: Arquidiocese de S. Paulo

Brasil Nunca Mais - Prefácio

BRASIL NUNCA MAIS

Prefácio do Cardeal-Arcebispo de São Paulo Dom Paulo Evaristo Arns

TESTEMUNHO E APELO

As angústias e esperanças do Povo devem ser compartilhadas pela Igreja. Confiamos que esse livro, composto por especialistas, nos confirme em nossa crença no futuro.

Afinal, o próprio Cristo, que “passou pela Terra fazendo o bem”, foi perseguido, torturado e morto. Legou-nos a missão de trabalhar pelo Reino de Deus, que consiste na justiça, verdade, liberdade e amor.

As experiências que desejo relatar no frontespício desta obra pretendem reforçar a idéia subjacente em todos os capítulos, a saber, que a tortura, além de desumana, é o meio mais inadequado para levar-nos a descobrir a verdade e chegar à paz.

  1. Durante os tempos da mais intensa busca dos assim chama­dos “subversivos”, atendia eu na Cúria Metropolitana, semanalmente, a mais de vinte senão cinquenta pessoas. Todas em busca do paradeiro de seus parentes.

Um dia, ao abrir a porta do gabinete, vieram ao meu encontro duas senhoras, uma jovem e outra de idade avançada.

A primeira, ao assentar-se em minha frente, colocou de imediato um anel sobre a mesa, dizendo: “É a aliança de meu marido, desaparecido há dez dias. Encontrei-a, esta manhã, na soleira da porta. Sr. padre, que significa essa devolução? É sinal de que está morto ou é um aviso de que eu continue a procurá-lo?”

Até hoje, nem ela nem eu tivemos resposta a essa interrogação dilacerante.

A senhora mais idosa me fez a pergunta que já vinha repetindo há meses: “O senhor tem alguma notícia do paradeiro de meu filho?” Logo após o sequestro, ela vinha todas as semanas. Depois reaparecia de mês em mês. Sua figura se parecia sempre mais com a de todas as mães de desaparecidos. Durante mais de cinco anos, acompanhei a busca de seu filho, através da Comissão Justiça e Paz e mesmo do Chefe da Casa Civil da Presidência da República. O corpo da mãe parecia diminuir, de visita em visita. Um dia também ela desapareceu. Mas seu olhar suplicante de mãe jamais se apagara de minha retina.

Não há ninguém na Terra que consiga descrever a dor de quem viu um ente querido desaparecer atrás das grades da cadeia, sem mesmo poder adivinhar o que lhe aconteceu. O “desaparecido” trans­forma-se numa sombra que ao escurecer-se vai encobrindo a última luminosidade da existência terrena.

Para a esposa e a mãe, a Terra se enche de trevas, como por ocasião da morte de Jesus.

  1. Numa noite singular, chegou à minha residência um juiz militar, que estudara em colégio católico e demonstrava compreensão para a ação da Igreja de São Paulo, empenhada na defesa de presos políticos.

A certa altura, a conversa toma rumo oposto. O magistrado, aparentemente frio e objetivo, se comove. Acaba de receber dois documentos – diz ele – provenientes de fontes diversas e assina­dos por pessoas diferentes. Dois presos políticos afirmam terem assassinado a mesma pessoa, em tempo e circunstâncias totalmente inverossímeis. E ele, juiz, a concluir: “Imagine o senhor a situação psicológica, e quem sabe física, de quem chega ao ponto de declarar-se assassino, sem o ser!”

O inquérito sob tortura, ou ameaça de tortura, no entanto, chega a absurdo e inutilidade ainda maiores:

  1. O engenheiro, antes de prestar depoimento à Comissão Justiça e Paz, me relata o seu drama.

Nada tinha a temer, quando foi preso. Como, no entanto, ouvira que a tortura era aplicada a quem não confessasse, ao menos, alguma coisa, foi preparando a mente para contar minuciosamente tudo que pudesse, de qualquer forma, ser interpretado como sendo contrário ao regime. Diria até mais do que numa confissão sacra­mental. Não conseguiu.

Após tomarem seus dados pessoais, fizeram-no assentar-se, de imediato, na cadeira do dragão e, a partir desse momento, conta-me ele: “Tudo se embaralhou. Não sabia mais o que fizera, nem mesmo o que desejava contar ou até ampliar, para ter credibilidade. Confundi nomes, pessoas, datas, pois já não era mais eu quem falava e sim os inquisidores que me dominavam e me possuíam no sentido mais total e absoluto do termo”.

Como e quando há de recompor-se um homem inocente, assim aviltado?

  1. O que mais me impressionou, ao longo dos anos de vigília contra a tortura, foi porém o seguinte: como se degradam os torturadores mesmos. Esse livro, por sua própria natureza, não pode dar resposta plena à questão. Daí o meu testemunho:

Quando foram presos os líderes da Ação Católica Operaria, em fins de janeiro de 1974, tive ocasião de passar quatro tardes intei­ras, no interior do DEOPS, na esperança de avistar-me com eles. Eu havia sido chamado para tanto, de Curitiba, onde passava os dias com todos os irmãos, que confortavam a mãe em seus últimos dias de vida.

Durante a longa espera, nos corredores da cadeia, pude entreter-me com delegados que presidiam a inquéritos, semelhantes aos que virão descritos nesta obra. Cinco deles me contaram de seus estudos em colégios católicos e um deles na Universidade Católica de São Paulo. Cada qual com problemas sérios na família e na vida particular, que eles próprios atribuíam à mão vingadora de Deus. Instados a abandonar esta terrível ocupação, respondiam: “Não dá. O senhor sabe por quê!”

Na sexta-feira à tardinha pude afinal avistar-me com dois dos nossos agentes de pastoral, em situação lastimável, na presença mesmo dos delegados que encarei firmemente.

Um deles, meses após, me esperava, ao final da missa, sozinho, na igreja da Aclimação. Abordou-me, num grito de desespero: “Tem perdão para mim?”

Só onze anos depois, em março de 1985, fiquei sabendo que, na manhã de 12 de fevereiro de 1974, um delegado fizera subir os presos para anunciar-lhes, com ar triunfante e cínico, que minha mãe havia morrido no dia anterior. Os presos baixaram os olhos e nada disseram.

Lembrei-me então da advertência de um general, aliás contrario a toda tortura: quem uma vez pratica a ação, se transtorna diante do efeito da desmoralização infligida. Quem repete a tortura quatro ou mais vezes se bestializa, sente prazer físico e psíquico tamanho que é capaz de torturar até as pessoas mais delicadas da própria família!

A imagem de Deus, estampada na pessoa humana, e sempre única. Só ela pode salvar e preservar a imagem do Brasil e do mundo.

De Médici a Fernando Henrique

ARNS, Paulo Evaristo

*religioso; arceb. São Paulo 1970-1998.

Paulo Evaristo Arns nasceu em Criciúma (SC) no dia 14 de setembro de 1921, filho de Gabriel Arns e de Helena Steiner Arns. Seu pai foi negociante e proprietário de serrarias, tendo chegado a criar uma cooperativa para a venda de madeira. Desenvolveu essa atividade até a época em que Paulo Evaristo tinha oito anos de idade, quando, devido a dificuldades financeiras, viu-se forçado a vender seu negócio. Daí em diante, toda a família passou a ajudar nos trabalhos da roça, inclusive o menino Paulo Evaristo. Tanto seus avós paternos quanto maternos eram imigrantes alemães.

Fez o curso primário em sua cidade natal, prosseguindo os estudos no Paraná, onde frequentou o Colégio São Luís, em Rio Negro. Ainda nessa cidade estudou no seminário dos franciscanos de 1934 a 1940, e em seguida cursou a Faculdade de Filosofia de Curitiba. Em 1944 ingressou na Faculdade de Teologia de Petrópolis, no estado do Rio de Janeiro. Ordenou-se sacerdote em novembro do ano seguinte e concluiu o curso de teologia em 1947. Entre esse ano e 1952 estudou em Paris, onde, após licenciar-se em letras pela Universidade da Sorbonne, doutorou-se pela Academia de Paris com a tese A técnica do livro em São Jerônimo, com a qual obteve o grau máximo. Fez ainda cursos de especialização em pedagogia na Escola Superior de Pedagogia de Paris e em literatura na École des Hautes Études da Sorbonne.

De volta ao Brasil, lecionou no Seminário Menor de Agudos, em São Paulo, de 1953 a 1955, fundando ainda a cadeira de língua e literatura francesa na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Bauru (SP). Em seguida trabalhou durante dez anos e meio em Petrópolis, como professor de teologia no seminário onde estudara, e de didática geral na Universidade Católica. Nessa mesma cidade dedicou-se à atividade apostólica no bairro operário de Itamarati, ocupando-se das escolas e da promoção social, o que lhe proporcionou estreito contato com a população. Foi também vice-provincial dos franciscanos, desenvolvendo ainda outras atividades, como a de redator da revista Vozes e de outras publicações da editora dos franciscanos.

Em maio de 1966 foi nomeado bispo pelo papa Paulo VI, que o indicou para trabalhar com o cardeal dom Agnelo Rossi na Arquidiocese de São Paulo. Desse ano até 1970, atuou como vigário episcopal em Santana, distrito localizado na zona norte da cidade de São Paulo. Lá trabalhou integrado com padres, religiosos e leigos, preocupado com a formação permanente do clero e do povo. Criou a Missão do Povo de Deus, passando um tempo em cada paróquia da região com uma equipe para multiplicar os ensinos do Concílio Ecumênico Vaticano II. A partir dessa missão, avançou na evangelização das ruas da Arquidiocese, estimulando a formação das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs).

Como bispo auxiliar de São Paulo, foi designado em abril de 1968 membro do secretariado do Vaticano para os não-crentes, e foi eleito secretário nacional de educação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), entidade que congrega todos os bispos brasileiros e que centraliza as principais resoluções relativas à atuação da Igreja. Pertenceu também à comissão teológica da CNBB. Em 22 de outubro de 1970, devido à nomeação de dom Agnelo Rossi para a prefeitura da Sagrada Congregação para a Evangelização dos Povos, no Vaticano, foi nomeado arcebispo metropolitano de São Paulo, e em 1º de novembro seguinte tomou posse.

Governo Médici (1969-1974): contra as prisões e as torturas

Em sua atuação à frente da Arquidiocese de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns guiou-se pelo princípio da defesa dos direitos humanos. Assumindo o arcebispado num momento em que a vida política nacional era marcada pela luta armada movida por grupos de oposição ao regime e pela repressão por parte dos órgãos de segurança do governo do presidente Emílio Garrastazu Médici, manifestou grande preocupação com as vítimas das torturas e dos abusos policiais. Logo no início de seu arcebispado, começou a desenvolver esforços no sentido de apurar denúncias de prisões e de torturas. Assim, interferiu no caso dos frades dominicanos presos em 1969 sob a acusação de envolvimento com Carlos Marighela, dirigente da organização clandestina Ação Libertadora Nacional, fazendo-lhes uma visita de apoio, a primeira desse tipo da parte de uma autoridade da Igreja.

Ainda em novembro de 1970, por ocasião da prisão e da denúncia de torturas infligidas ao padre Giulio Vicini e à assistente social Iara Spadini, exigiu das autoridades militares que ambos fossem examinados por três membros da Associação Médica de São Paulo. Diante da recusa do comandante do II Exército, general Humberto de Sousa Melo, chegou a recorrer ao governador do estado, Roberto de Abreu Sodré, com resultado igualmente desfavorável. Impedido pelas autoridades de visitar presos políticos que faziam greve de fome num presídio paulista, por ocasião das comemorações do dia de Pentecostes, em 1971, fez afixar em centenas de igrejas de São Paulo uma carta na qual lamentava que “neste país cristão, quando estão em jogo vidas humanas, aquele que de Deus recebeu o múnus de pastor seja impedido de cumprir sua missão específica, aliás garantida por nossa Carta Magna”.

Em junho de 1972, ocupando o cargo de presidente regional da CNBB, esteve à frente do lançamento pelo episcopado paulista, reunido em Brodósqui (SP), do documento Testemunho de paz, em que eram de denunciadas as formas pelas quais se vinham processando as prisões políticas — muitas delas revestindo-se “do aspecto de verdadeiros sequestros” — e os métodos de tortura utilizados nos interrogatórios. O documento tornou-se alvo de forte censura por parte do governo federal, sendo proibida sua divulgação no semanário da Arquidiocese, O São Paulo, que, como os demais órgãos de imprensa, se encontrava submetido à censura prévia.

Chamado ao Rio de Janeiro para um encontro com autoridades militares, ouviu do general Antônio Carlos Muricy, ex-chefe do Estado-Maior do Exército (EME), que o documento fazia uma acusação “muito grave” e que poderia ser processado por isso. Respondeu que “aceitava o processo, contanto que fosse público e que ele pudesse dar garantia às testemunhas que, nos hospitais e outros lugares, acompanharam pessoas que foram torturadas e morreram”.

Logo no início de 1973, em 2 de fevereiro, foi feito cardeal com o título de Santo Antônio de Via Tuscolana, sendo sagrado no consistório de 5 de março do mesmo ano. Devido às suas atitudes pessoais em defesa dos direitos humanos, prosseguiram os confrontos com autoridades do governo, o que suscitou reprovações dos setores mais conservadores da Igreja. Cogitava-se de que pressões estariam sendo feitas também junto ao Vaticano. Ao procurar averiguar o fato, obteve garantias contrárias.

Em 30 de março, junto com dom José Melhado Campos, bispo de Sorocaba (SP), e mais 24 padres, reuniu cerca de três mil pessoas na Catedral da Sé para a celebração da missa de sétimo dia do estudante Alexandre Vanucchi Leme, assassinado pelas forças de segurança do governo, em ato que representou a primeira grande manifestação política de estudantes desde 1969, e que foi considerado pelo brasilianista Kenneth Serbin o despertar da Igreja Católica para a luta pelos direitos humanos no país.

Também em 1973, criou na Arquidiocese de São Paulo a Comissão de Justiça e Paz, organismo encarregado de cuidar dos assuntos jurídicos em defesa dos direitos da pessoa humana, especialmente dos que competiam aos presos políticos, e que se constituiria em um dos principais instrumentos de proteção às vítimas da repressão policial no país. Assumiu também a prelazia de Itacoatiara, no Amazonas, enviando padres e agentes de educação para desenvolver projetos com as comunidades predominantemente indígenas da região.

Ainda em maio de 1973, efetuou a venda do palácio episcopal em São Paulo e mudou-se para uma residência no bairro do Sumaré. O dinheiro obtido com essa transação imobiliária seria utilizado na chamada Operação Periferia, que idealizou com o objetivo de criar centros comunitários nos bairros mais afastados da cidade, consolidando assim as bases do trabalho pastoral voltado para os pobres. Em outubro seguinte, promoveu em São Paulo a Semana dos Direitos Humanos, divulgando-a através de 150 mil folhetos e da Rádio 9 de Julho, que pertencia à Arquidiocese e teve sua concessão logo cancelada pelo governo. A semana foi de grande importância para a denúncia das prisões e torturas que, segundo se afirmava, continuavam a ser executadas pelos órgãos de repressão.

Também nesse período, participou de dois dos encontros da chamada Comissão Bipartite, fórum de discussão secreto que se reuniu entre 1971 e 1974 com o objetivo de impedir a deterioração das relações Igreja-Estado e que era integrado por importantes lideranças da Igreja Católica, como dom Aluísio Lorscheider, secretário-geral e depois presidente da CNBB, dom Ivo Lorscheiter, dom Avelar Brandão, vice-presidente da CNBB, dom Lucas Moreira Neves, bispo auxiliar de São Paulo, e por oficiais das forças armadas, do Serviço Nacional de Informações (SNI) e do Centro de Informações do Exército (CIE). Nessas reuniões, o primeiro escalão do clero cobrou da cúpula militar a investigação dos casos de violação de direitos humanos e o fim do cerceamento da liberdade de expressão e da perseguição política.

Entre setembro de 1974 e o início do ano seguinte, obteve dois cargos no Vaticano: em setembro foi eleito membro da Sagrada Congregação para o Culto Divino e, em janeiro de 1975, foi nomeado consultor da Comissão Pontifícia para a América Latina, organismo do Vaticano cuja finalidade é dar assistência aos programas religiosos do continente.

Governo Geisel (1974-1979): pela liberdade de expressão

Entre julho e agosto de 1975 foram efetuadas numerosas prisões em São Paulo. Em outubro, foi preso o jornalista Vladimir Herzog, que poucos dias depois morreu nas dependências do II Exército, comandado pelo general Ednardo D’Ávila Melo. Desde que recebera denúncias da prisão e das torturas que o jornalista estaria sofrendo, dom Paulo Evaristo se encarregara de apurá-las pessoalmente, exigindo mais uma vez o posicionamento das autoridades responsáveis. Procurou estabelecer contato direto com o chefe do Gabinete Civil da Presidência da República, general Golbery do Couto e Silva, com o qual já se avistara em outras ocasiões semelhantes. Recebeu, todavia, através do governador do estado, Paulo Egydio Martins, a recomendação do general de que utilizasse o “escalão normal” para aquele contato, ou seja, o próprio governador.

Com a morte do jornalista, realizou-se ato ecumênico na Catedral da Sé, tendo dom Paulo concordado em celebrá-lo, apesar das pressões contrárias do governo federal. O presidente Geisel, que se encontrava na ocasião em São Paulo, designou dois secretários do governo estadual para tentar dissuadi-lo, mas o arcebispo manteve sua decisão. Ainda em outubro de 1975, o episcopado paulista, reunido em Itaici (SP), lançou o documento Não oprimas teu irmão, condenando os atos de violência dos órgãos de repressão e “sobretudo os graves acontecimentos” que vinham “estarrecendo e inquietando a população de São Paulo”.

Em maio de 1976, foi empossado como jornalista militante pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI) em São Paulo. Em março de 1977, assinou nota prestando a solidariedade dos bispos de São Paulo a dom Tomás Balduíno, bispo de Goiás (GO), e a dom Pedro Casaldáliga, bispo de Conceição do Araguaia (PA), e expressando ao mesmo tempo a descrença do episcopado paulista em relação às acusações de subversão que teriam sido feitas àqueles religiosos por dom Geraldo Proença Sigaud, bispo de Diamantina (MG). Ainda nessa oportunidade, fez-se portador da carta dos dois bispos endereçada ao papa Paulo VI, reiterando assim seu incondicional apoio a ambos.

Em maio de 1977, juntamente com o presidente dos EUA, Jimmy Carter, o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Kurt Waldheim, e mais quatro religiosos de outros países, recebeu em Washington o título de doutor honoris causa pela defesa dos direitos humanos, conferido pela Universidade de Notre-Dame. Durante a solenidade, declarou que recebia a honraria “em nome de muitos que mereciam muito mais, como o cardeal dom Henriques”, que criara o Vicariato da Solidariedade em Santiago do Chile, organismo de defesa dos direitos humanos naquele país. Em seu discurso, referiu-se à situação de grande parte da humanidade que vivia sem a garantia de seus direitos fundamentais, exortando à construção de sociedades baseadas na justiça e na paz na América Latina e no mundo. Destacou também a violação dos direitos humanos no Brasil, chamando atenção para três pontos que o vinham preocupando: a inconstitucionalidade, as torturas e a diferença na distribuição de renda.

De volta ao Brasil, encontrou no plenário do Congresso a discussão sobre o divórcio. Fiel à posição da Igreja, pronunciou-se contrário ao projeto que instituía a medida, adotando porém uma atitude de reserva e insistindo no aspecto pouco relevante da questão para a sociedade brasileira naquele momento, ao mesmo tempo que advertia para “os reais problemas da grande maioria da população”.

Em setembro de 1977, a Comissão de Justiça e Paz, com o apoio da Arquidiocese de São Paulo e juntamente com outras entidades religiosas e leigas, lançou o documento Pela justiça e pela libertação em ato público realizado na praça da Sé. O documento anunciava as perseguições e agressões praticadas contra religiosos no exercício de suas funções pastorais, apresentando um dossiê completo, até aquela data, dos acontecimentos ocorridos. No mesmo mês de setembro, a invasão da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) pela polícia do estado suscitou enérgica atitude do arcebispo em defesa da instituição e dos estudantes. Dom Paulo responsabilizou os policiais pelos tumultos registrados na universidade. Quanto aos estudantes enquadrados na Lei de Segurança Nacional, garantiu-lhes o apoio da Comissão de Justiça e Paz. Ainda nesse mês, apoiou a Ato da Penha, em solidariedade aos perseguidos pela ditadura militar, organizado por 20 entidades laicas que produziram o documento Epístola dos leigos pela justiça e libertação.

Em novembro de 1977 perdurava ainda a censura prévia ao jornal da Arquidiocese, O São Paulo. Dom Paulo recorreu à Justiça, impetrando mandado de segurança contra o veto que havia sido imposto à circulação de um número do semanário. Acompanhou-o na ação judicial o senador oposicionista André Franco Montoro, já que os trechos censurados faziam parte do discurso por ele proferido no Congresso. Entretanto, o recurso não recebeu parecer favorável da Justiça, sendo mantida a censura prévia ao jornal por mais algum tempo.

Ainda em novembro, dom Paulo manifestou sua incredulidade quanto ao processo de abertura política no país, deixando clara a pouca esperança que depositava no diálogo que o senador governista Petrônio Portela vinha desenvolvendo com representantes da sociedade civil. Para o cardeal, “a proposta de diálogo só seria útil se feita amplamente com o povo”. Em dezembro, redigiu a apresentação do documento Violência contra os humildes, elaborado pela Pastoral dos Marginalizados e divulgado pela Comissão dos Direitos Humanos da Arquidiocese de São Paulo. O documento denunciava a violência cometida por setores da polícia, especialmente contra a população dos bairros mais pobres, advertindo que “a violência contra os humildes é o mais pesado sintoma de estruturas sociais inteiramente falhas”.

Ainda no ano de 1977, foi o primeiro cardeal a visitar o Paraguai, para conhecer o trabalho do Comitê Ecumênico de Igrejas. Nesse período, cedeu uma sala da Cúria Metropolitana de São Paulo para o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, a fim de atender ao crescente fluxo de perseguidos políticos vindos de países vizinhos (Argentina, Chile e Uruguai, principalmente) onde também havia repressão militar.

Em março de 1978, por ocasião da visita do presidente dos EUA, Jimmy Carter, ao Brasil, dom Paulo foi convidado a participar no Rio de Janeiro de um encontro restrito com o presidente norte-americano e outras cinco personalidades brasileiras. Na ocasião recebeu de Carter o assentimento para que tornasse pública a carta que anteriormente lhe enviara, relacionando os nomes de 27 brasileiros desaparecidos, e além disso entregou ao visitante um memorando em que abordava três questões: a segurança nacional, as multinacionais e as minorias oprimidas.

Em junho do mesmo ano foi suspensa a censura prévia a O São Paulo, última publicação a ser liberada desse tipo de controle oficial. Imediatamente, o cardeal iniciou uma campanha para recuperar a Rádio 9 de Julho.

Em meados de 1978 tramitava no Congresso o projeto de anistia do governo, excluindo os envolvidos em ações armadas. Essa restrição gerou protestos dos presos políticos, que realizaram várias greves de fome entre setembro e outubro desse ano. A situação era tensa, mas dom Paulo afirmou não acreditar em radicalização, primeiro porque “o povo não quer” e, depois, porque “precisamos estar unidos no momento em que a volta ao estado democrático se anuncia para logo”. Em outubro, ao comentar a sentença declaratória proferida em favor da família do jornalista Vladimir Herzog, o cardeal declarou ser hora de “todos os parentes de pessoas desaparecidas iniciarem processo semelhante para responsabilizar o Estado por aqueles que desapareceram” e “para que não se repitam mais tais coisas na história da nação”. Ainda em outubro, foi eleito presbítero das Congregações Gerais dos Cardeais, entidade que seria responsável pela preparação do conclave que elegeria o novo papa, em substituição a João Paulo I (Albino Luciani), eleito em agosto e falecido menos de dois meses depois. No conclave de outubro foi eleito Karol Wojtyla (João Paulo II).

Nos últimos meses de 1978 especulava-se que a candidatura do general João Batista Figueiredo à sucessão presidencial poderia significar a viabilização do projeto de abertura iniciado durante o governo Geisel. Em novembro realizaram-se também eleições para cargos legislativos, cujos resultados, nos principais centros do país, foram favoráveis aos candidatos da oposição. Dom Paulo manifestou seu otimismo diante dos resultados eleitorais, afirmando que os candidatos eleitos poderiam chegar “a uma nova Constituinte”, assim como “a uma reformulação de todo o sistema político e econômico”. Ao mesmo tempo, tornou público um pedido aos candidatos vitoriosos dos dois partidos para que “se mantivessem em contato com as bases”.

Nos primeiros meses de 1979 ultimavam-se os preparativos para a realização da III Conferência Episcopal Latino-Americana (Celam) em Puebla, no México. Os resultados desse encontro eram esperados com grande expectativa pelos setores mais progressistas da Igreja, que ansiavam por uma confirmação das teses da II Celam, realizada em Medellín, na Colômbia. Dom Paulo Evaristo participou da reunião, tendo apresentado o documento Repressão à Igreja no Brasil, com o objetivo de “servir de subsídio aos grupos de trabalho” que discutiriam “os diversos aspectos da evangelização”. Durante sua permanência no México, manteve contatos com exilados brasileiros residentes nesse país.

Governo Figueiredo (1979-1985): pela justiça social

Em 15 de março de 1979, o general João Figueiredo tomou posse como presidente da República, reiterando seu propósito de promover o retorno do país à normalidade democrática. Paralelamente, iniciou-se um período de constantes movimentos reivindicatórios populares, destacando-se as greves sindicais. Em maio, dom Paulo divulgou o documento A Igreja e as reivindicações populares em resposta às acusações do delegado regional do Trabalho de São Paulo, Vinícius Ferraz Torres, de que o clero estaria dando “cobertura exagerada” aos movimentos grevistas. O documento, subscrito pelos bispos de São Paulo, defendia a reformulação da legislação social, a negociação direta entre patrões e empregados e o direito de greve dos operários, reafirmando ainda o direito do clero de “estar presente ao lado dos mais humildes e desprotegidos”.

Em agosto seguinte, dom Paulo lançou uma campanha mundial para a localização de cerca de cem menores, principalmente argentinos e uruguaios, sequestrados e desaparecidos juntamente com seus pais ou sozinhos. A campanha foi lançada através do Comitê de Defesa dos Direitos Humanos para os Países do Cone Sul, órgão vinculado à Comissão Arquidiocesana de Direitos Humanos e Marginalizados. Na ocasião, o cardeal divulgou uma lista parcial de 45 menores desaparecidos na Argentina, no Uruguai e na Bolívia.

Em setembro, dom Paulo se pronunciou a favor de uma reforma agrária, advertindo que ela não poderia ser feita “sem sindicatos autônomos, bem estruturados”, nos quais, “em vez de apoio às grandes empresas e às multinacionais”, haveria “o apoio às empresas pequenas e médias” em todos os setores, “tanto na agricultura como na indústria”.

Ainda em setembro de 1979, às vésperas da aprovação do projeto de reformulação partidária do governo, que extinguiria o bipartidarismo, acirraram-se os debates em torno da formação dos novos partidos, ao mesmo tempo que se especulava acerca da legalização do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Em 29 de setembro, a Aliança Renovadora Nacional (Arena), situacionista, e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), de oposição, foram afinal extintos. Quanto à legalização do PCB, dom Paulo considerou-a “inevitável” no processo de redemocratização em curso no país, afirmando que não se devia “ver fantasmas onde eles não existem”. Em sua opinião, “o povo brasileiro não quer[ia] comunismo ou marxismo”, almejando apenas “viver em paz e dignamente”. Sobre a criação do Partido dos Trabalhadores (PT), agremiação que reunia lideranças expressivas do movimento sindical, declarou considerar “normal a articulação de um partido operário”, acrescentando que entendia “ser necessário que todos os setores da sociedade se articulassem” para que “não se perdesse o bonde no momento em que o país passava por uma situação que exigia mudanças reais e não apenas reformismo”.

No início de 1980 registrou-se forte movimento grevista na região do ABC de São Paulo. Os metalúrgicos iniciaram um processo reivindicatório de aumento salarial junto à Justiça do Trabalho e sustentaram uma greve demorada. Todo o clero paulista — e, em especial, os padres e freiras ligados à pastoral operária — prestou ajuda aos grevistas. Em apoio às greves operárias, foi realizado no mês de abril um ato litúrgico que reuniu cerca de sete mil pessoas na Catedral da Sé, oficiado pelo cardeal dom Paulo Evaristo Arns e nove bispos auxiliares. Em decorrência da greve, as diretorias dos sindicatos do ABC, entre elas a do sindicato de São Bernardo do Campo, encabeçada por Luís Inácio da Silva, o Lula, foram destituídas, sendo alguns de seus membros enquadrados na Lei de Segurança Nacional.

Ainda em 1980, com o estímulo de dom Paulo, estudantes, professores e funcionários da PUC de São Paulo realizaram a primeira eleição para escolha do reitor da universidade.

Em abril de 1981, quando se publicou a decisão do governo de incluir alterações na Lei dos Estrangeiros — conjunto de normas que regulam as atividades públicas dos estrangeiros no Brasil —, dom Paulo se pronunciou contrário às propostas anunciadas pelo ministro da Justiça, Ibraim Abi-Ackel, afirmando que elas “não favoreciam aqueles que já se encontravam entre nós, sofrendo sem poderem contar com o apoio do país onde se exilaram”. Na ocasião pediu, ainda, “uma ampla anistia para todos os estrangeiros que viviam no Brasil em situação irregular”.

Também nesse mês, ao ensejo da Páscoa, dom Paulo divulgou uma mensagem cujos temas centrais foram a inflação e o desemprego. Aludindo à crise econômica por que passava a sociedade brasileira, chamou a atenção para “a injustiça na distribuição de seus encargos, que vinham pesando, em primeiro lugar, sobre as famílias que já viviam com o estritamente necessário”. Por outro lado, alertou para a responsabilidade “das grandes empresas”, salientando a “estratégia perigosa” de “retirar-se de onde o lucro é menor e investir em outros lugares”.

Ainda em abril, foi a Roma participar da sessão plenária do secretariado dos não-crentes. Nessa oportunidade avistou-se com o papa João Paulo II e discorreu sobre os problemas da sociedade brasileira que mereciam maior atenção no momento. A propósito da posição da Igreja frente aos sindicatos, declarou ao papa que julgava necessário “salvaguardar a unidade sindical, dar maior atenção aos que ganham menos, dando-lhes preferência nas negociações”. Relatou ainda ao sumo pontífice seu projeto de subdividir a diocese da capital paulista em dez ou 11 dioceses metropolitanas, cada qual com seu próprio bispo, mas com uma administração comum, “para que os bairros mais ricos possam auxiliar os mais pobres”.

No mês de maio, a série de atentados que vinham ocorrendo desde meados de 1980 culminou com o episódio do Riocentro, no Rio de Janeiro, durante as comemorações do Dia do Trabalho. Na ocasião, uma bomba explodiu no interior de um automóvel, causando a morte de um sargento e ferindo gravemente um capitão do Exército que se encontravam dentro do veículo. Como das vezes anteriores, as investigações policiais se desenvolviam sem que fossem indicados os responsáveis. A gravidade do acontecimento — a imprensa aventou a hipótese de os autores do atentado serem suas próprias vítimas — fez com que se considerasse sob ameaça o projeto de abertura do governo, o que suscitou manifestações de apoio dos partidos de oposição ao presidente João Figueiredo. Dom Paulo reiterou esse apoio, acrescentando, porém, que ele devia significar também “um ultimato sério e definitivo para que a verdade fosse publicada” e para que “terminasse esta fase de combate covarde à redemocratização”.

Em agosto de 1981, apresentou aos padres os 149 slides do trabalho Fé e política — povo de Deus e participação política, destinado às CEBs, que haviam tido grande desenvolvimento desde a década de 1970, especialmente junto à população mais pobre, e a outros núcleos cristãos, como subsídio para incentivar a discussão sobre o assunto. Criticou as matérias que vinham sendo publicadas na imprensa sobre o caráter político-ideológico do trabalho, explicando que “o decisivo é despertar o povo para a grande política e incentivar a ação partidária dos leigos a partir dos critérios apresentados”, sempre com o cuidado de “não se deixar instrumentalizar, nem instrumentalizar a Igreja”.

Em 1982, foi membro fundador da Comissão Independente Internacional das Nações Unidas para Questões Humanitárias, criada em decorrência da Assembléia Geral da ONU de 1981, sendo o único religioso em todo o mundo eleito para compô-la.

Em janeiro de 1983, divulgou na Cúria Metropolitana de São Paulo a mais completa lista até então elaborada de desaparecidos políticos na Argentina, durante o regime militar naquele país. O trabalho, prefaciado pelo próprio dom Paulo e intitulado Desaparecidos en Argentina, fora realizado pelo Comitê de Defesa dos Direitos Humanos no Cone Sul (Clamor) e relacionava os nomes de 7.791 pessoas desaparecidas entre 1977 e 1982, englobando cidadãos de 27 países, sendo 13 brasileiros. Na mesma ocasião, divulgaram-se os nomes de três brasileiros desaparecidos no Chile em 1973, além da lista de 128 brasileiros desaparecidos no Brasil a partir de 1964. O dossiê foi enviado à ONU e à Organização dos Estados Americanos (OEA), sendo encaminhado indiretamente ao governo argentino por intermédio de sua representação diplomática na Dinamarca. Em audiência privada no Vaticano, o próprio dom Paulo o entregou ao papa João Paulo II.

Em março do mesmo ano, ao ensejo da Páscoa, dom Paulo proclamou a necessidade de se fortalecer o processo de redemocratização do país, com a realização de eleições diretas em todos os níveis, e a distribuição de terras para permitir a volta do homem ao campo. Afirmou que uma política voltada para a terra seria também “uma política voltada para a Justiça”, defendendo a continuidade da luta das instituições da sociedade civil em prol dos direitos humanos, mesmo após a consolidação da abertura democrática.

Em setembro de 1984, dom Paulo Evaristo Arns, dom Aluísio Lorscheider e dom Ivo Lorscheiter solidarizaram-se com o teólogo brasileiro Leonardo Boff, acusado pela Santa Sé de cometer erros teológicos em seu livro Igreja: carisma e poder, ao afirmar que a Igreja nos países do Terceiro Mundo deveria contribuir para a “libertação dos oprimidos”, e não limitar-se ao papel de “espectadora dos dramas sociais”. Os prelados intercederam por Boff junto ao papa João Paulo II, mas no início de 1985 o teólogo foi compelido ao silêncio por um período de 11 meses.

Governo Sarney (1985-1990): pela reforma agrária

O início do ano de 1984 foi marcado por uma intensa mobilização popular em favor da aprovação da emenda Dante de Oliveira, que previa a realização de eleições diretas para a presidência da República ainda naquele ano. Com a derrota da proposta na Câmara dos Deputados em abril, tiveram início os entendimentos que culminaram na eleição pelo Colégio Eleitoral, em janeiro do ano seguinte, da chapa formada por Tancredo Neves e José Sarney. A posse de Sarney em 15 de março de 1985, determinada pela doença Tancredo, e confirmada em abril pela morte deste, foi um marco do processo de transição democrática no país, com o retorno de um civil à presidência da República.

Dom Paulo Evaristo Arns tornou-se então um dos principais interlocutores da sociedade civil junto ao novo governo. Assim, foi procurado pelo presidente Sarney com vistas à discussão de um “entendimento nacional” — expressão escolhida pelo palácio do Planalto para substituir “pacto social” — envolvendo empresários, trabalhadores, Igreja e intelectuais a fim de viabilizar medidas econômicas e sociais em face da situação de crise do país. Sarney afirmou reconhecer a influência da Igreja Católica, em especial da ala progressista representada pelo cardeal Arns, sobre muitos dos sindicatos filiados à Central Única dos Trabalhadores (CUT), através das CEBs. No período que se seguiu, dom Paulo destacou-se sobretudo por sua atuação na defesa da luta pela terra, apontando em diversas ocasiões a necessidade de realização da reforma agrária no país.

Ainda em 1985, no mês de junho, dom Paulo foi impedido de viajar para a África do Sul por se recusar a assinar um documento comprometendo-se a não participar de manifestação contra a política racista do apartheid, exigido pela representação diplomática daquele país. O incidente gerou a divulgação de uma nota do Itamaraty lamentando a atitude do governo da África do Sul, já que, para a concessão do visto de entrada do cardeal arcebispo, havia sido exigida uma carta de apresentação do próprio ministro das Relações Exteriores do Brasil, Olavo Setúbal.

Em julho seguinte, foi divulgado pela Arquidiocese de São Paulo o mais amplo dossiê sobre a tortura política praticada no Brasil entre abril de 1964 e março de 1979, consolidado no livro Brasil — nunca mais. Sob a coordenação do próprio dom Paulo Evaristo Arns, uma equipe de 30 pessoas — cujos nomes foram mantidos em segredo — pesquisou 707 processos envolvendo presos políticos analisados no Superior Tribunal Militar (STM) em Brasília. Todo o material obtido junto ao STM foi coligido, selecionado e microfilmado, tendo o projeto previsto, a princípio, a organização de uma enciclopédia da tortura no Brasil e de uma biblioteca formada por cerca de dez mil publicações da esquerda brasileira (jornais, panfletos e manifestos) que haviam sido anexadas aos processos da Justiça Militar, além do próprio livro. Quando do lançamento de Brasil — nunca mais, dom Paulo negou qualquer ânimo revanchista que pudesse ser atribuído à publicação e ressaltou o objetivo do livro, de realizar um registro histórico e objetivo dos fatos políticos do país. Três anos depois, a Arquidiocese paulista lançaria um novo dossiê intitulado O perfil dos atingidos, com o objetivo de apresentar os exemplos típicos das pessoas que haviam sido vítimas da repressão durante os governos militares, resgatando o conteúdo das publicações de oposição então existentes.

A publicação de Brasil — nunca mais levou à abertura, em janeiro de 1986, de um processo contra a Editora Vozes, responsável pela edição do livro, movido pelo médico-legista Elias Freitas, do Instituto Médico Legal (IML) do Rio de Janeiro. Citado no dossiê como um dos médicos que forneciam laudos falsos para acobertar mortes sob tortura durante o regime militar, Freitas apresentou queixa-crime com base na Lei de Imprensa, que previa a condenação dos responsáveis por publicações caluniosas, com pena de detenção de até três anos. Dom Paulo foi convocado a depor em agosto, e seus advogados, Hélio Bicudo e Mário Simas, impetraram um habeas-corpus junto à Justiça de Petrópolis. Em outubro seguinte, o Tribunal de Alçada do Rio de Janeiro determinou o arquivamento da ação penal, por entender que a queixa-crime não era a medida adequada para o caso, tendo em vista que os processos por abuso do exercício da liberdade de manifestação pressupunham crimes cometidos em publicações periódicas, não se enquadrando nessa categoria o livro Brasil — nunca mais.

Ao longo de 1986, com a definição do tema da Campanha da Fraternidade daquele ano, “Terra de Deus, terra de irmãos”, dom Paulo intensificou sua campanha em favor da realização de uma reforma agrária profunda, radical e pacífica. Lembrou que o Brasil figurava entre os países de maior concentração fundiária do mundo e, utilizando-se de dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) que informavam sobre a morte de 115 lavradores em 1984 e 189 em 1985, propôs a mobilização das comunidades para obter das autoridades “o que lhes compete por direito”. Em novembro do mesmo ano, declarou acreditar que o quadro criado com os conflitos no campo e com a crescente violência urbana poderia ser revertido, se o governo promovesse o assentamento das cem ou duzentas mil famílias acampadas, que se ofereciam para produzir alimentos. Reconhecendo que havia ocorrido um aumento efetivo dos crimes contra a pessoa humana e também contra o patrimônio, reafirmou a defesa dos direitos humanos movida pela Arquidiocese paulista — ação que vinha sendo responsabilizada pelo aumento da criminalidade —, atribuindo as causas do fenômeno à falta de polícia preventiva, à política carcerária vigente e também à situação do povo mais pobre, agravada pela crise econômica. A posição da Igreja Católica sobre a reforma agrária suscitou reações de Ronaldo Caiado, presidente da União Democrática Ruralista (UDR), entidade fundada no final de 1985 que congregava os grandes proprietários de terras no país, o qual acusou os membros do clero de utilizar o tema para promover a discórdia e o confronto no campo.

Em outubro de 1986, às vésperas da eleição para governador e para o Congresso Nacional — que assumiria também as funções de Congresso Constituinte —, dom Paulo afirmou ter considerado “um erro histórico de consequências incalculáveis para o nosso futuro” não se ter convocado uma Assembleia Constituinte pura e independente da eleição geral. Manifestou seu temor de que a prevalência do poder econômico desvirtuasse a composição do Congresso e que, em consequência, o texto constitucional não respeitasse “os anseios do povo mais sofrido”. Em seu modo de ver, a Constituição deveria seguir o exemplo de brevidade da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, abordando apenas pontos num nível de fácil compreensão popular. Embora a Igreja Católica tenha reafirmado sua posição de não apoiar abertamente candidatos, creditou-se a dom Paulo o apoio aos candidatos ao Senado Mário Covas, do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), e Hélio Bicudo, do PT, aos postulantes à Câmara dos Deputados José Gregori, do PMDB, Plínio de Arruda Sampaio, Luís Eduardo Greenhalgh e Valdemar Rossi, do PT, bem como ao candidato a deputado estadual Mário Simas, do Partido Democrático Trabalhista (PDT).

No início de 1987, dom Paulo manifestou seu otimismo em relação à presença popular, diretamente ou por organismos intermediários, nos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte que se iniciariam em 1º de fevereiro próximo, reiterando mais uma vez a urgência da reforma agrária. Na mesma época, condicionou seu apoio à Nova República à realização de reformas efetivas nos campos social e econômico, criticando os pacotes econômicos conhecidos como Plano Cruzado I e Plano Cruzado II, elaborados pela equipe econômica do governo de José Sarney em 1986-1987, com o objetivo principal de controlar a inflação. Reconheceu, na ocasião, que o processo de transição política iniciado com a Nova República teria sido certamente difícil, e aconselhou o empenho do governo na solução dos principais problemas socioeconômicos do país.

Ainda em 1987 lançou na Arquidiocese de São Paulo o Projeto Esperança, campanha de conscientização sobre a AIDS. Em maio, recebeu do governo francês o título de Comendador da Legião de Honra, entregue na Cúria pelo embaixador da França no Brasil. Em janeiro de 1988, foi nomeado para o Comitê Honorário da Campanha Européia pela Interdependência e Solidariedade Norte-Sul, mantida pelo Conselho da Europa, a convite do rei da Espanha, Juan Carlos I.

Em maio de 1988, lamentou a derrota da reforma agrária na Assembleia Constituinte, o que considerou um retrocesso, e previu que, se a Constituição a ser promulgada fosse contrária aos interesses do povo, certamente teria curtíssima duração. No mês seguinte, divulgou seu repúdio à aplicação da Lei de Segurança Nacional contra os acusados de envolvimento nas agressões sofridas pelo presidente José Sarney durante distúrbios verificados na cidade do Rio de Janeiro. Apoiou a proposta de paralisação imediata dos trabalhos da Constituinte, apresentada pelo senador José Richa (PMDB), e a convocação do Congresso Nacional para que se manifestasse sobre o assunto. Preocupado com o arrocho salarial embutido no mais recente pacote econômico, conhecido como Plano Bresser, divulgado em junho de 1987 pelo ministro da Fazenda Luís Carlos Bresser Pereira, defendeu na mesma ocasião a concessão de um imediato aumento de salários.

Ainda no ano de 1988, foram retomadas as discussões em torno da divisão da Arquidiocese de São Paulo, considerada então a maior arquidiocese do mundo e principal referência, nos últimos 18 anos, para outras igrejas locais, pela introdução de pastorais como a dos direitos humanos e as de periferia. A proposta original nesse sentido havia sido apresentada pelo próprio dom Paulo ao papa Paulo VI em 1974, e consistia em promover a divisão da Arquidiocese em regiões episcopais, com bispos auxiliares trabalhando de forma autônoma, sob a coordenação de um arcebispo. O projeto agora em tramitação na Cúria Romana, preparado pela Congregação Vaticana de Bispos, previa, diferentemente, a criação de quatro dioceses autônomas, vinculadas diretamente ao Vaticano. A iniciativa de proceder à divisão fora do modelo proposto pelo arcebispo foi recebida com reservas na Arquidiocese paulista, tendo sido considerada pelo sociólogo Pedro Ribeiro de Oliveira como parte de “uma ampla estratégia de setores da Cúria Romana para diminuir a colegialidade episcopal e destruir a proposta da Igreja como comunidade, ligando cada diocese mais diretamente ao papa”. Em abril do mesmo ano, outra medida que procurou atingir diretamente a ação de dom Paulo foi a designação de dom Luciano Mendes de Almeida — então presidente da CNBB e bispo-auxiliar da região episcopal de Belém, na Zona Leste de São Paulo, além de um dos principais colaboradores do arcebispo — para dirigir a diocese da cidade de Mariana, em Minas Gerais.

A divisão da Arquidiocese de São Paulo seria concretizada pelo Vaticano em março de 1989, quando foram criadas as novas dioceses de Campo Limpo, Osasco, Santo Amaro e São Miguel Paulista. As novas dioceses passavam a contar com 155 paróquias, para uma população de 6,8 milhões de habitantes, enquanto, sob a influência direta do arcebispo, permaneciam 244 paróquias, servindo a 7,9 milhões de habitantes. A influência do cardeal, além de reduzida praticamente à metade, passou a concentrar-se nas áreas privilegiadas da capital, nas quais, segundo observadores, restavam poucas possibilidades para a expansão da linha pastoral progressista. As antigas regiões, agora transformadas em dioceses, ao contrário, reuniam o maior contingente de população de baixa renda da Grande São Paulo, em grande parte morando em favelas e conjuntos habitacionais, e com graves problemas sociais, como invasões de terras e criminalidade. A pretensão manifestada por dom Paulo de que os antigos bispos auxiliares fossem mantidos tampouco foi atendida pelo Vaticano, tendo sido designados para as novas dioceses prelados não vinculados diretamente ao arcebispo.

Ainda em 1989, dom Paulo deixou de exercer funções no Vaticano — apenas seis cardeais em atividade na Igreja Católica em todo o mundo encontravam-se na mesma situação — depois que a Congregação do Culto Divino, da qual fazia parte, foi integrada à Congregação dos Sacramentos, por reforma da Cúria Romana. Contudo, mais tarde, em março de 1990, voltaria a ocupar praticamente o mesmo cargo no Vaticano, nomeado pelo papa João Paulo II para a Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos.

Em janeiro de 1989, fora divulgada uma carta de dom Paulo a Fidel Castro, cuja transcrição fora publicada no Granma, órgão oficial do Partido Comunista Cubano. No documento, entregue ao chefe de Estado pelo teólogo frei Beto, dom Paulo elogiva as conquistas da Revolução Cubana e saudava o povo daquele país pelos 30 anos da revolução. O incidente gerou protestos por parte de setores conservadores da Igreja Católica e de bispos cubanos exilados nos Estados Unidos, que alegaram desconhecimento do arcebispo brasileiro sobre a realidade do país e sobre as violações aos direitos humanos praticadas pelo regime comunista. Segundo declarações de dom Paulo, que já se havia correspondido com Fidel Castro em outras ocasiões, o objetivo da carta teria sido favorecer o diálogo entre a Igreja e o Estado em Cuba, bem como contribuir na preparação da visita do papa àquele país, então prevista para 1992.

Também em 1989, foram realizadas no Brasil as primeiras eleições diretas para presidente da República após o regime militar, o que assinalou o encerramento da transição democrática no país. A primeira etapa do processo eleitoral, em 15 de novembro, concentrou a disputa entre Luís Inácio Lula da Silva, da Frente Brasil Popular, e Fernando Collor de Melo, do Partido da Renovação Nacional (PRN), tendo a campanha se caracterizado por uma aguda polarização entre os dois candidatos. A confirmação da vitória de Collor se verificou no segundo turno do pleito, realizado em 17 de dezembro.

Nesse mesmo dia, foi libertado pela polícia de São Paulo o empresário Abílio Diniz, do grupo Pão de Açúcar, que havia sido sequestrado dias antes. Os dez sequestradores, entre os quais se incluíam os canadenses Christine Lamont e David Spencer, haviam sido cercados pela polícia em uma casa da Zona Leste de São Paulo, e exigiram a presença de dom Paulo, que compareceu ao local para negociar a libertação do empresário. Na ocasião, tentou-se imputar uma conotação política ao episódio, tendo a polícia paulista divulgado ter sido encontrado material de propaganda do PT em posse dos sequestradores. Anos depois, em 1993, o arcebispo se declararia convencido da inocência dos canadenses, ainda presos em São Paulo, e manifestaria apoio à sua libertação, fazendo constar seu nome num abaixo-assinado que reuniu cerca de 20 mil assinaturas. Mais tarde, em abril de 1998, concordaria em intermediar as negociações com o governo brasileiro visando à expulsão dos prisioneiros estrangeiros, para que seus processos fossem reavaliados pelos governos de seus respectivos países.

Ainda em 1989, foi organizado o Movimento Nobel da Paz D. Paulo, proposta de iniciativa do argentino Adolfo Pérez Esquivel, em nome do Serviço Paz e Justiça na América Latina (Serpaj). Cerca de 30 entidades participaram da campanha, destacando-se a Frente Nacional dos Trabalhadores, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a Comissão de Justiça e Paz, e quase quatrocentas entidades em todo o país prestaram apoio à indicação do arcebispo de São Paulo para a premiação.

Em 1990, dom Paulo recebeu o Prêmio Juca Pato de intelectual do ano, pelo livro Clamor do povo pela paz.

Governo Collor (1990-1992): denúncias de corrupção

Em maio de 1992, a partir da divulgação das denúncias do empresário Pedro Collor, irmão do presidente Fernando Collor, sobre a existência de um grande esquema de corrupção no governo, teve início uma grave crise política no país. Tendo em vista que as declarações de Pedro Collor envolviam o próprio presidente da República e o tesoureiro da campanha presidencial, Paulo César Farias, no mesmo mês foi instalada uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para averiguá-las. Dom Paulo Evaristo Arns teve participação ativa no movimento então iniciado em favor da ética na política, tornando-se um dos mais severos críticos do governo.

Em setembro do mesmo ano, quando das comemorações da Semana da Pátria, lançou o manifesto intitulado “A pátria merece melhor sorte”, publicado em O São Paulo e divulgado na Cúria Metropolitana daquela cidade, que foi considerado um dos mais duros ataques desfechados por um membro da hierarquia católica contra um presidente da República no país. Nas palavras do arcebispo, os que sobrevivessem à “crise total” iriam “maldizer a geração que levou dois anos e meio para abrir os olhos e denunciar a farsa, o roubo e a degradação moral”. Amplos setores da Igreja apoiaram a averiguação das denúncias e a punição dos envolvidos, tendo o Conselho Permanente da CNBB convidado os católicos a fazer jejum e orações “pelo bem da nação” nas comemorações do Dia de Independência. No final de setembro, o cardeal Arns saudou a decisão do Congresso Nacional de aprovar a abertura do processo de impeachment de Fernando Collor, declarando estar “certo e confiante que o Brasil vai melhorar afastando de vez a corrupção de todos os níveis da vida pública”.

Em outubro seguinte, um conflito com policiais na prisão do Carandiru, em São Paulo, causou a morte de 111 presos. Diversas entidades de defesa dos direitos humanos condenaram a ação e exigiram o afastamento do secretário de Segurança Pública do estado, Pedro Franco de Campos. A missa de sétimo dia em intenção aos mortos foi celebrada na Catedral da Sé, em São Paulo, por dom Paulo, que exigiu na ocasião a apuração rigorosa dos fatos e determinou o acompanhamento dos trabalhos de investigação pela Comissão de Justiça e Paz e por outros órgãos da Arquidiocese.

Ainda em outubro, dom Paulo Evaristo sofreu um grave acidente de carro na República Dominicana, que trouxe prejuízos para seu estado de saúde, gerando especulações sobre uma possível renúncia à direção da Arquidiocese.

No início de 1993, ao completar 20 anos como cardeal, dom Paulo divulgou a intenção da Igreja Católica de esclarecer a população sobre o plebiscito sobre o sistema de governo, convocado para 21 de abril. Dedicou-se então à defesa da opção pelo parlamentarismo, que na sua opinião havia trazido “mudanças favoráveis” para os países que o adotaram. Em junho do mesmo ano, publicou artigo intitulado “No Brasil sobrevive a escravidão” no L’Unitá, órgão oficial do Partido Democrático de Esquerda (antigo Partido Comunista Italiano), no qual fazia dura análise da realidade brasileira, com a apresentação de fatos e estatísticas, e com críticas violentas às elites do país e ao Estado. Também em 1993, construiu a Casa do Clero de São Paulo, para receber os padres aposentados e até então desamparados.

Com o desenvolvimento da campanha eleitoral de 1994, creditou-se a dom Paulo o apoio à candidatura de Fernando Henrique Cardoso à presidência da República na legenda do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). O arcebispo havia defendido anteriormente o Plano Real, desenvolvido pela área econômica do governo do presidente Itamar Franco e implementado por Fernando Henrique durante sua gestão como ministro da Fazenda. Embora não tenha declarado publicamente seu voto — seguindo orientação geralmente adotada pela hierarquia católica —, dom Paulo lembrou em diversas oportunidades seus vínculos de amizade com o sociólogo, nascidos da convivência na fase da luta pelos direitos humanos e pela abertura política do país. Ao longo da campanha, entretanto, dom Paulo reafirmou também sua admiração pelo candidato Luís Inácio Lula da Silva, do PT, e chegou a sugerir a união entre os dois partidos após as eleições.

Governo Fernando Henrique (1995-2002): sob a égide do neoliberalismo

Logo após a vitória e a posse de Fernando Henrique Cardoso, em 1º de janeiro de 1995, dom Paulo revelou seu desapontamento diante de uma das primeiras ações do novo governo: o veto do presidente da República ao reajuste do salário mínimo para cem reais, aprovado pelo Congresso Nacional. Declarou na ocasião ter a impressão de que “o cargo de presidente está mudando as idéias de um homem” e destacou a necessidade de “manter os salários dos pobres à altura da dignidade humana”.

Em agosto de 1995, manifestou-se sobre o encaminhamento da questão dos desaparecidos políticos durante o regime militar, defendendo a adoção de medidas no sentido de localizar os corpos para que os restos mortais pudessem ser devolvidos às famílias, bem como a abertura de processo contra os responsáveis pelas mortes e desaparecimentos.

Em 3 de dezembro de 1995, por ocasião dos 50º aniversário da ordenação de dom Paulo Evaristo Arns, foi celebrada missa no Ginásio do Ibirapuera, em São Paulo, a que compareceram oito mil pessoas. Estiveram presentes, entre outras autoridades, o vice-presidente da República Marco Maciel, o governador do estado Mário Covas e os ministros de Estado Paulo Renato de Sousa, da Educação, Sérgio Mota, das Comunicações, e José Serra, do Planejamento. Na mesma ocasião, foram comemorados os 250 anos da criação da Diocese de São Paulo.

Em fevereiro seguinte, durante a missa de abertura da Campanha da Fraternidade de 1996, dom Paulo lançou um apelo pela libertação dos líderes do MST presos no Pontal do Paranapanema, no extremo-oeste do estado de São Paulo. Aproveitando o ensejo da solenidade, voltou a recomendar uma política voltada para as pequenas empresas e para a realização da reforma agrária. Em abril, manifestou seu apoio à pretensão das famílias de Carlos Marighela e Carlos Lamarca de obter o reconhecimento oficial do assassinato dos dois militantes de esquerda pela ditadura militar. Considerou o reconhecimento do governo e a indenização das famílias uma “questão de justiça”, declarando-se satisfeito com o acolhimento do caso do jornalista Vladimir Herzog pela Comissão Especial de Desaparecidos Políticos, formada por membros da sociedade civil e do governo federal.

Em setembro de 1996, tendo completado 75 anos, dom Paulo encaminhou ao Vaticano pedido de renúncia à Arquidiocese de São Paulo. O procedimento é previsto pelo Código de Direito Canônico, que determina que, ao chegar a essa idade, os bispos devem apresentar sua renúncia, podendo o papa aceitá-la ou solicitar ao religioso que permaneça no cargo. Ainda em 1996, a Rádio 9 de Julho foi devolvida à Arquidiocese paulista pelo presidente Fernando Henrique Cardoso.

Em fevereiro de 1997, dom Paulo e seus cinco bispos auxiliares divulgaram carta em apoio à marcha pela reforma agrária promovida pelo MST, iniciada em Governador Valadares (MG), São Paulo e Rondonópolis (MT), em direção a Brasília. O documento foi considerado uma resposta a declarações do presidente Fernando Henrique Cardoso, que afirmara ter reclamado ao papa João Paulo II do comportamento de alguns padres em relação ao seu governo. Ainda nesse ano, foi concluída a Casa da Oração do Povo da Rua.

Em abril de 1998, dom Cláudio Hummes foi nomeado arcebispo de São Paulo, em substituição a dom Paulo Evaristo Arns, verificando-se a cerimônia de transferência do cargo em 23 de maio seguinte, na Catedral da Sé. Em 24 de maio dom Paulo tornou-se arcebispo emérito de São Paulo e passou a se dedicar às atividades de jornalista e religioso. Em 28 anos de arcebispado, criou 43 paróquias, construiu 1.200 centros comunitários, incentivou e apoiou o surgimento de mais de duas mil CEBs na periferia da metrópole paulistana, e assinou sete Planos de Pastoral, com prioridades sempre eleitas democraticamente pelas comunidades.

Em 1999 coordenou, a convite do Ministério da Previdência Social, a parte religiosa dos eventos do Ano Internacional do Idoso, com destaque para a celebração multirreligiosa que ocorreu na igreja da Consolação em 18 de novembro. Participou, em março, da pré-inauguração das instalações da nova fase da Rádio 9 de Julho e da reinauguração da emissora em outubro, 26 anos após o silêncio imposto pela ditadura militar e a árdua luta da Arquidiocese para reaver a sua rádio.

Em 2005, sofreu um infarto e se recuperou em sua residência no Jaçanã, em São Paulo. Em agosto de 2009, em meio à crise política que atingiu o Senado brasileiro, enviou um telegrama a seu sobrinho, o senador Flávio Arns, parabenizando-o pela “atitude coerente” de se desligar do PT depois que o partido decidiu retroceder de sua posição favorável ao afastamento temporário de José Sarney (PMDB-AP) da presidência do Senado durante as investigações das denúncias que haviam sido feitas ao senador.

Prêmios, títulos e publicações

Dom Paulo Evaristo Arns foi grão-chanceler da PUC-SP e da Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção entre 1970 e 1998. Nesse mesmo período, foi também presidente do Amparo Maternal, maternidade mantida pela Arquidiocese de São Paulo para acolher as mães carentes ou solteiras que não eram assistidas por nenhum tipo de previdência social pública ou privada.

Durante sua longa permanência na direção da Arquidiocese de São Paulo, foi homenageado em diversas oportunidades por sua atuação na luta pelos direitos humanos. Em 1983, recebeu o título de doutor honoris causa da Faculdade de Teologia Católica da Universidade de Münster, na Alemanha Ocidental. Em 1985, foi agraciado com o Prêmio Nansen, em Genebra, concedido anualmente pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, e passou a fazer parte, em junho, do comitê de direção da organização católica Pax Christi, com sede na Holanda, dedicada a promover a reconciliação entre os povos e a defender a justiça e a paz mundial. Em março de 1988, recebeu em Houston, nos Estados Unidos, o Prêmio Oscar Romero, assim denominado para homenagear o arcebispo de El Salvador, assassinado em 1980 por forças paramilitares de direita em seu país. Em dezembro de 1988, recebeu o 1º Prêmio Nacional de Direitos Humanos, concedido pelo Movimento Nacional de Defesa dos Direitos Humanos (MNDDH), entidade fundada em 1982, com sede em Brasília, que reúne cerca de 350 entidades de direitos humanos de todo o país.

Ainda em 1988, recebeu o título de doutor honoris causa das universidades Católica de Goiânia, do Extremo Sul Catarinense (Criciúma) e Federal do Acre (Rio Branco), e em 1999, das universidades Federal do Paraná (Curitiba) e Federal de Viçosa (MG), e ainda da Pontifícia Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção (São Paulo). Voltou a receber o mesmo título em 2000, das universidades Estadual de Campinas (Unicamp) e de Sorocaba (São Paulo), e entre os anos de 2001 e 2005, das Faculdades Integradas Alcântara Machado (São Paulo), Universidade de Brasília (UnB), Universidade Estadual de Londrina (PR) e PUC-SP.

Em 2001, foi nomeado representante da sociedade civil no conselho deliberativo e membro titular do conselho da Cátedra Unesco do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da Universidade de São Paulo (USP). Em 2004, recebeu o prêmio Luta pela Terra, destinado àqueles que defenderam a reforma agrária e as lutas sociais no Brasil nos últimos 20 anos. Em 2006, foi condecorado pelo governo argentino com a Orden del Libertador San MartinA homenagem foi um reconhecimento à sua contribuição na luta em favor dos direitos humanos naquele país e ao apoio aos que sofreram perseguições durante a ditadura argentina, de março de 1976 a dezembro de 1983.

Dom Paulo Evaristo Arns publicou as seguintes obras: La technique du livre d’après Saint Jerôme (1953); Liberdade de ensino (1960); Por que escolas católicas?  (1963); Rumo ao casamento (1965); A quem viemos, Senhor? (1968); A humanidade caminha para a fraternidade (1968); Paulo VI: você é a favor ou contra? (1970); De esperança em esperança na sociedade, hoje (1971); Comunidade: união e ação (1972); Viver é participar (1974); Cristãos em plena vida (1974); Você é chamado a evangelizar (1974); Nova forma da consagração da mulher (1974); O Evangelho: incomoda? Inquieta? Interessa? Sínodo da evangelização (1975); Sê fiel (1977); Em defesa dos direitos humanos, encontro com o repórter (1978); O rosário na Bíblia e na vida do povo (1988); Corintiano, graças a Deus (2004); Conversa com São Francisco (2004); Mulheres da Bíblia, (2004); La tecnica del libro secondo San Gerolamo (2005); Dez caminhos para a perfeita alegria (2005); Um padre em sete morros abençoados (2005); Estrelas na noite escura: pensamentos (2006); Vamos a Aparecida: com Maria, pela Paz (2007). Em 2001, lançou sua autobiografia Da esperança à utopia: testemunho de uma vida.

A seu respeito, foram publicadas as obras de Getúlio Bittencourt e Paulo Sérgio Markum, O cardeal do povo (1979); Mauro Santayana, No meio do povo (1983); Michael Albus, Ich trage Keinen Purpur (1985); Horst Goldstein, Kardinal der Ausgebeuteten (1987); Helcion Ribeiro (org.), Paulo Evaristo Arns, cardeal da esperança e pastor da Igreja de São Paulo (1989); Marilda Ferri e Evanize Sydow, Dom Paulo Evaristo Arns: um homem amado e perseguido (1999), e Elza Ajzenberg, Paulo Evaristo Arns, pastor dos pobres, cardeal da Igreja (1999).


Maria Letícia Correia/ Bruno Marques (atualização) – FGV CPDOC


FONTES:AGOSTINE, C. Evaristo.; ALBUQUERQUE, F. Governo; ARNS, P.E. Depoimentos; Arquidiocese de São Paulo. Disponível em: <http://www.arquidiocese-sp.org.br>. Acesso em: 10 set.2009; CIMI. Disponível em: <http://www.cimi.org.br/?system=news&action=read&id=2550&eid=376>. Acesso em: 10 set. 2009; CONFERÊNCIA NAC. BISPOS DO BRASIL; Dia (22/5/88); Encic. Mirador; Estado de S. Paulo (24/2 e 1/3/77, 25/4, 28/6, 23/10/80, 4, 16/4, 10/5, 17, 22, 24/7 e 5/8/81, 17/3/89, 23/3/90, 10/1 e 31/3/94, 4/12/95, 3/3 e 4/4/96, 15/2/97, 16/4/98); Folha de S. Paulo (5/6/77, 1/12/80, 10, 16/4, 1, 13/5, 19/7 e 4/9/81, 14 e 20/1/83, 20, 27/6, 11/8 e 12/10/85, 11/1, 13/2, 12/7, 10/8 e 31/10/86, 1/1, 15/2, 7/4 e 21/10/87, 26/4, 7, 8/5, 3, 30/9, 16/11 e 12/12/88, 23, 25/1, 17/3, 7 e 28/7/89, 8, 30/9 e 6/10/92, 9/3 e 6/7/93, 16/4 e 22/12/95, 22/2 e 11/9/96, 30/3/97, 16/4 e 7/6/98); Globo (7/5/87, 31/3 e 7/10/88, 20/1, 18 e 22/12/89, 5/7 e 10/10/92, 1/3/93, 27/9/94, 19/2/97); Grande encic. Delta; INST. NAC. LIVRO. Índice; Jornal do Brasil (17/1/75, 23, 25/5, 26 e 28/9/77, 1/4, 6/5/78, 23/7, 24, 29/10, 3, 8, 21, 28, 30/11, 12, 30/12/79, 22, 24/4, 25, 30/7, 21/9, 21 e 26/10/80, 11/3, 17/7 e 22/9/81, 18/1/83, 28/7/85, 7/8 e 9/11/86, 6/7/87, 25/3, 31/5 e 12/6/88, 16/3 e 27/7/89, 30/6, 5/11 e 24/12/93, 17/3, 14 e 23/12/94, 6/2 e 10/8/95, 4/4/96, 26/4/98, 10/11/99); MST; NASCIMENTO, G. Angústia; Pasquim (4/78); PINTO, L. Antologia;Portal Algosobre. Disponível em: <http://www.algosobre.com.br/biografias/dom-paulo-evaristo-arns.html>. Acesso em: 10 set. 2009; Senhor (23/9/88); Súmulas; Veja (5/10/77, 24/7 e 27/11/85, 8/5/88, 14/3/90); UnB; Who’s who in Brazil.

Dom Arns: um gigante da resistência democrática

“Brasileiros são beneficiários dos que resistiram à ditadura.”

O artigo é de Luís Corrêa Lima, sacerdote jesuíta, historiador e professor da PUC-Rio, publicado pro Dom Total,  08-09-2021.

Celebra-se neste mês o centenário de nascimento de dom Paulo Evaristo Arns, que foi arcebispo de São Paulo e cardeal. A lembrança de dom Arns me remete ao tempo de minha adolescência e juventude nesta cidade. Sempre o admirei muito, mas com o tempo a admiração aumenta ao conhecer mais sobre sua vida, obra e importância na história do Brasil.

Muito pode ser dito sobre este franciscano que amou os pobres, organizou a Igreja nas periferias paulistanas, zelou pela liturgia e incentivou a protagonismo do laicato. Era também intelectual, pessoa de fácil comunicação e promotor de pastorais e obras sociais. Foi um dos idealizadores da Pastoral da Criança, desenvolvida brilhantemente por sua irmã Zilda Arns. As diversas faces de sua vida estão registradas no belo documentário Coragem! As muitas vidas do cardeal Dom Paulo Evaristo Arns.

Nos tempos atuais, é muito importante lembrar a síntese feita por ele entre fé e política, ligando o Evangelho ao compromisso social e ao profetismo. Quando o Brasil viveu os tempos sombrios da ditadura civil-militar e da torturadom Arns visitou inúmeros presos políticos e organizou a Comissão de Justiça e Paz em sua arquidiocese, para dar-lhes assistência. Na morte do jornalista Vladimir Herzog, executado no Dops em 1975, Arns realizou um culto ecumênico na Catedral da Sé. Herzog era judeu e o culto teve a presença do rabino Henry Sobel. Na época, imperava a censura à imprensa e a informação oficial era que Herzog tinha se suicidado na prisão. Na catedral lotada com 9 mil pessoas, incluindo a imprensa estrangeira, dom Arns desmascarou a farsa ao dizer publicamente: “Basta! Vladimir Herzog foi assassinado“.

A repercussão foi grande e o governo destituiu o chefe militar daquela região. Foram as primeiras fissuras no edifício de uma ditadura impiedosa. Dois anos depois, a CNBB com a participação de dom Arns lançou o documento Exigências cristãs de uma ordem política, um primoroso manifesto em favor dos direitos humanos e do Estado Democrático de Direito. Em 1979, dom Arns engajou-se em um projeto ambicioso com o Conselho Mundial das Igrejas e o pastor presbiteriano Jaime Wright: uma ampla pesquisa nos arquivos da Justiça Militar sobre a repressão política e a tortura no Brasil, entre 1964 e 1979. Durante seis anos, uma equipe de pesquisadores, revezando-se discretamente, fez um levantamento de mais de 700 processos com depoimentos de presos políticos nos tribunais militares. Cerca de 850 mil páginas foram fotocopiadas. Eram provas irrefutáveis de torturas com requintes de crueldade. Em 1985, um resumo foi publicado na forma do livro Brasil nunca mais. Todo o material da pesquisa foi depois digitalizado e disponibilizado gratuitamente (aqui).

Dentre os momentos dramáticos da vida dom Arns, vale relatar o que ocorreu horas antes do culto ecumênico em memória de Herzog. O próprio Arns descreveu:

À 13 horas, chegam em minha residência dois secretários do governo. Emissários do governador. Talvez, do presidente da república, que se encontrava entre nós:

— O senhor não pode ir. Ele não é católico.

— Ele é meu irmão. E é irmão de todos os católicos. E eles lá estarão.

— Mas pode haver tiroteio, morte, e o senhor será o responsável.

— Lá estarei, para evitar mortes. O pastor não abandona as ovelhas, quando ameaçadas.

— Haverá mais de quinhentos policiais, na praça, com ordem de atirar, ao primeiro grito.

— É assim que tratam o povo? Quando grita de dor, vocês atiram?

— É um apelo. O senhor, não vá. Mande outro.

— Digam ao governador que o arcebispo estará com aqueles que Deus lhe confiou. Custe o que custar, ele cumprirá o dever. Agradeço a visita, mas digam ao governador que o povo se manterá calmo. Portanto, todo o mais correrá por conta dele.

Hoje, os brasileiros são beneficiários dos que resistiram à ditadura e se mobilizaram pela redemocratização do país. Mas a democracia brasileira está ameaçada. Nas últimas décadas, nunca se viu tantas pessoas defendendo abertamente intervenção militarfechamento do congresso e do Supremo Tribunal Federal. A memória de dom Arns, sua luta e coragem hão de inspirar e fortalecer os que defendem o Estado Democrático de Direito, esta grande conquista civilizatória.

O falecimento no dia 14 de dezembro de 2016

Aos 95 anos, faleceu no dia 14 de dezembro de 2016 (Festa de São João da Cruz) o cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, Arcebispo Emérito da Arquidiocese de São Paulo. Ele estava internado no Hospital Santa Catarina em decorrência de uma broncopneumonia.

“Comunico, com imenso pesar, que no dia 14 de dezembro de 2016 às 11h45, o Cardeal Paulo Evaristo Arns, Arcebispo Emérito de São Paulo, entregou sua vida a Deus, depois de tê-la dedicado generosamente aos irmãos neste mundo”, informou o Cardeal Dom Odilo Pedro Scherer, Arcebispo Metropolitano de São Paulo, em nota divulgada hoje às 13 horas. “Louvemos e agradeçamos ao “Altíssimo, onipotente e bom Senhor” pelos 95 anos de vida de Dom Paulo, seus 76 anos de consagração religiosa, 71 anos de sacerdócio ministerial, 50 de episcopado e 43 anos de cardinalato. Glorifiquemos a Deus pelos dons concedidos a Dom Paulo, e que ele soube partilhar com os irmãos. Louvemos a Deus pelo testemunho de vida franciscana de Dom Paulo e pelo seu engajamento corajoso na defesa da dignidade humana e dos direitos inalienáveis de cada pessoa. Agradeçamos a Deus por seu exemplo de Pastor zeloso do povo de Deus e por sua atenção especial aos pequenos, pobres e aflitos. Dom Paulo, agora, se alegre no céu e obtenha o fruto da sua esperança junto de Deus!”, acrescentou D. Odilo, convidando a todos a elevarem preces de louvor e gratidão a Deus e de sufrágio em favor do falecido Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns e  também a participarem do velório e dos ritos fúnebres, que serão realizados na Catedral Metropolitana de São Paulo.

O Papa Francisco recebeu a notícia da morte do “venerado irmão Cardeal Paulo Evaristo Arns” com grande pesar e enviou um telegrama ao Cardeal-arcebispo de São Paulo, Dom Odilo Scherer, na manhã desta quinta-feira (15/12).

O Pontífice expressa a todo o clero, comunidades religiosas e fiéis da Arquidiocese de São Paulo, bem como à família do falecido, os seus pêsames pelo desaparecimento desse intrépido pastor que no seu ministério eclesial se revelou autêntica testemunha do Evangelho no meio do seu povo, a todos apontando a senda da verdade na caridade e do serviço à comunidade em permanente atenção pelos mais desfavorecidos.

“Dou graças ao Senhor por ter dado à Igreja tão generoso pastor e elevo fervorosas preces para que Deus acolha na sua felicidade eterna este seu servo bom e fiel enquanto envio a essa comunidade arquidiocesana que chora a perda do seu amado pastor e à Igreja do Brasil, que nele teve um seguro ponto de referência e a quantos partilham esta hora de tristeza que anuncia a ressurreição, uma confortadora bênção apostólica”.

Dom Paulo Evaristo Arns: mestre, intelectual refinado e amigo dos pobres

Leonardo Boff

Perdi um mestre, um mecenas, um protetor e um amigo entranhável. Coisas importantes vão ser ditas e escritas sobre o Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, falecido dia 14 de dezembro. Não direi nada. Apenas dou meu testemunho.

Conheci-o no final dos anos 50 do século passado em Agudos-SP quando ainda era seminarista. Voltou de Paris com fama de ser doutor pela Sorbonne. No seminário com cerca de 300 estudantes introduziu metodologias pedagógicas novas. Fez-nos conhecer a literatura grega e latina, línguas que dominava como dominamos o vernáculo. Fez-nos ler as tragédias de Sófocles e de Eurípedes em grego. Sabíamos tanto grego que até representamos a Antígona em grego. E todos entendiam.

Depois vim a conhecê-lo em Petrópolis como professor dos Padres da Igreja e da história cristã dos dois primeiros séculos. Obrigava-nos a ler os clássicos em suas línguas originais, São Jerônimo, seu preferido, em latim e São João Crisóstomo, em grego. Quando o visitei há dois anos no convento de religiosas na periferia de São Paulo o encontrei lendo sermões em grego de São João Crisóstomo.

Foi nosso Mestre de estudantes durante todo o tempo da teologia em Petrópolis de 1961-1965. Acompanhava com zelo cada um em suas buscas, com um olhar profundo que parecia ir ao fundo da alma. Era alguém que sempre procurou a perfeição. Até entre nós estudantes disputávamos para ver quem encontrava algum defeito em sua vida e atividade. Cantava maravilhosamente o canto gregoriano no estilo de Solemnes, mais suave do que o duro de Beuron que predominava até a chegada dele.

Durante quatro anos o acompanhei na pastoral da periferia. Nas quintas-feiras à tarde, no sábado à tarde e no domingo todo, acompanhei-o na capela do bairro Itamarati em Petrópolis. Visitava casa por casa, especialmente as famílias portuguesas que cultivavam flores e horticultura. Onde chegava logo fundava uma escola. Estimulava os poetas e escritores locais. Depois da missa das 10h os reunia na sacristia para ouvir os poemas e os contos que haviam produzido durante a semana. Estimulava intelectualmente a todos a lerem, escreverem e a narrarem para os outros as histórias que liam.

Era um intelectual refinado, conhecedor profundo da literatura francesa. Escreveu 49 livros. Instigava-nos a seguir o exemplo de Paul Claudel que costumava cada dia a escrever pelo menos uma página. Eu segui seu conselho e hoje já passei dos cem livros.

O que sempre me impressionou nele foi seu amor e seu afeto franciscano pelos pobres. Feito bispo auxiliar de São Paulo ocupou-se logo com as periferias, fomentando as comunidades eclesiais de base e empenhando pessoalmente Paulo Freire. Como era tempo da ditadura, especialmente férrea em São Paulo, logo assumiu a causa dos refugiados vindo do horror das ditaduras da Argentina, do Uruguai e do Chile. Sua missão especial foi visitar as prisões, ver as chagas das torturas, denunciá-las com coragem e defender os direitos humanos violados barbaramente. Correu riscos de vida com ameaças e atentados. Mas como franciscano, sempre mantinha a serenidade como quem está na palma da mão de Deus e não nas garras dos policiais da repressão.

Talvez seu feito maior foi O Projeto Brasil: Nunca Mais desenvolvido por ele, pelo Rabino Henry Sobel e pelo Pastor presbiteriano Jaime Wright com toda uma equipe de pesquisadores. Foram sistematizadas informações de mais de 1.000.000 de páginas contidas em 707 processos do Superior Tribunal Militar. O livro publicado pela Editora Vozes “Brasil Nunca Mais” teve papel fundamental na identificação e denúncia dos torturadores do regime militar e acelerou a queda da ditadura.

Eu pessoalmente sou-lhe profundamente grato por me ter acompanhado no processo doutrinário movido contra mim pelo ex-Santo Ofício em 1982 em Roma sob a presidência do então Card. Joseph Ratzinger. No diálogo que se seguiu ao meu interrogatório entre o Card. Ratzinger, o Card. Lorscheider, o Card. Arns com a minha participação, ele corajosamente deixou claro ao Card. Ratzinger: “Esse documento que o Sr. publicou há uma semana sobre a Teologia da Libertação não corresponde aos fatos que nós bem conhecemos; essa teologia é boa para os fiéis e para as comunidades; o Sr. assumiu a versão dos inimigos desta teologia que são os militares latino-americanos e os grupos conservadores do episcopado, insatisfeitos com as mudanças na pastoral e nos modos de viver a fé que este tipo de teologia implica” E continuou: “cobro do Sr. um novo documento, este positivo, que valide esta forma de fazer teologia a partir do sofrimento dos pobres e em função de sua libertação”. E assim ocorreu, três anos após.

Tudo isso já passou. Fica a memória de um cardeal que sempre esteve do lado dos pobres e que jamais deixou que o grito do oprimido por seus direitos violados ficasse sem ser ouvido. Ele é uma referência perene do bom pastor que dá sua vida pelos pequenos e sofredores deste mundo.


Leonardo Boff, teólogo, filósofo, escritor e ex-aluno de Dom Paulo Evaristo Arns.

Dom Paulo Evaristo, apóstolo da justiça e da paz

Dom Mauro Morelli

Com o coração agradecido uno-me a tantas vozes louvando a Deus pela vida do mestre, pastor e profeta arrebatado hoje para o Reino da Vida.

Em 1968 ocorreu de fato a efetiva separação e ruptura da Igreja com o Estado. Neste contexto o Papa Paulo VI, em 1970, convoca o Cardeal Rossi a Roma para assumir a Congregação para a Evangelização dos Povos e designa dom Paulo como arcebispo da capital paulista.

Franciscano enamorado da Senhora Pobreza e irmão de toda a criatura, historiador e profundo conhecedor da Teologia dos Padres da Igreja dos primeiros séculos, o bispo catarinense Paulo Evaristo fora providencialmente escolhido para um pastoreio que exigiria firmeza na Fé, capacidade de leitura da realidade e determinação. Paulo VI tinha um olhar penetrante.

Com a presidência de dom Paulo, a regional paulista da CNBB reveste-se de estrutura colegiada promovendo o ministério da coordenação que provoca intenso intercâmbio entre as dioceses, com a participação dos presbíteros e leigos, casais e jovens.

Um processo de planejamento pastoral foi inaugurado e instalado como exercício da colegialidade pastoral e da sinodalidade eclesial como instrumento de resposta adequada da evangelização às exigências e provocações da realidade dominada pela ferocidade do Poder Econômico.

Como fruto do diálogo dos bispos com religiosos e religiosas, em assembleia conjunta, firmado o documento “Vida Religiosa na Igreja Particular”. Superando a si mesmo, o episcopado paulista assume a defesa da vida e da dignidade humana com o pronunciamento pastoral contra a tortura: Testemunho de Paz (Documento de Brodosqui), posteriormente reeditado como “Não oprimas teu irmão”.

À frente da arquidiocese de São Paulo, dom Paulo Evaristo por recomendação do papa Paulo VI, aplicando os princípios da colegialidade pastoral e da sinodalidade encaminha um projeto inovador de Igreja nas grandes cidades em que autonomia e comunhão seriam marcas das estruturas eclesiásticas, não a independência e o isolamento.

O colégio episcopal por ele presidido assume a tarefa da formação de nove dioceses com regime especial de comunhão de bens e de responsabilidades. A sinodalidade é vivenciada no processo de planejamento pastoral em que se definiam diretrizes e prioridades. Assim em todas as regiões e em todos os níveis da Igreja Arquidiocesana quatro prioridades tornam-se compromisso da igreja em sua vida e missão: Comunidades Eclesiais de Base, Operação Periferia, Mundo do Trabalho e Direitos Humanos.

O testemunho pessoal de dom Paulo foi a força que aglutinou as energias da cidadania que não se dobrou diante da repressão violenta e cruel. A coerência de dom Paulo abrindo mão do palácio por uma simples casa, a comunhão de bens por ele praticada e incentivada, a determinação de caminhar de esperança em esperança sem se abater, de tranco em tranco com ousadia e muita coragem, fez dele o pastor amado pelos pobres, oprimidos e perseguidos. Em longos anos como emérito, sem desmerecer os que o sucederam, permaneceu sendo o bispo de São Paulo.

Com a morte de Paulo VI novos ventos sopraram e agitaram a Barca de Pedro. Em tempo de crise a busca de refúgio e de preservação da espécie dá ensejo ao surgimento da centralização e do conservadorismo. A crise atual é mais séria e profunda do que muitos imaginam! Crise civilizatória. Assim perdemos a oportunidade de ser Igreja nos grandes centros urbanos sem esquartejar bairros e ruas, reféns de nossos feudos e estruturas inadequadas.

Sinto-me honrado e privilegiado pelos dez anos de fraternidade e companheirismo com o saudoso franciscano pastor das periferias geográficas e existenciais, intrépido defensor da dignidade humana e promotor de democracia, Paulo Evaristo Arns que me ordenou bispo.

Nossa jornada começou numa carona que lhe dei em 08.12.69 para o almoço depois da ordenação episcopal do capuchinho Dom Daniel Tomasella, segundo bispo de Marília. Inúmeras viagens e memórias do meu mestre e irmão bispo Paulo Evaristo. Na comunhão dos santos interceda pela Terra da Santa Cruz nesta tempo de trevas. Paz e Bem.


Dom Mauro Morelli, bispo emérito da Diocese de Duque de Caxias e missionário na Serra da Canastra.

A lição de Dom Paulo segundo Fábio Comparato

Fábio Konder Comparato

D. Paulo Evaristo Arns, exemplo de coragem e firmeza na defesa da dignidade humana, assim que assumiu as funções de bispo auxiliar da arquidiocese de São Paulo, deu-se conta do caráter terrorista do regime empresarial-militar instaurado com o golpe de 1964. Ao tomar posse do cargo de arcebispo metropolitano de São Paulo, em 1º de novembro de 1970, ele fez da Cúria Metropolitana o centro de resistência à política de sequestros, assassinatos e tortura de presos políticos. A Cúria passou a ser visitada quotidianamente por dezenas de perseguidos, bem como por familiares de presos e desaparecidos, independentemente da orientação política ou da fé religiosa de cada um deles. O pai de Ana Rosa Kucinski, por exemplo, de tradição judaica, vinha quase todos os dias buscar uma palavra de consolo junto a D. Paulo, lamentando-se desesperadamente do desaparecimento de sua filha, que foi assassinada na Casa da Morte de Petrópolis e cujo cadáver, ao que consta, foi queimado.

D. Paulo foi o primeiro a organizar, na Cúria Metropolitana de São Paulo, a lista dos desaparecidos políticos.

Para entender todo o sentido de sua posição em defesa da dignidade humana, é preciso lembrar que a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil deu apoio oficial ao golpe militar de 1964, em declaração de 29 de maio, na qual os bispos brasileiros afirmaram que, vendo “a marcha acelerada do comunismo para a conquista do poder, as forças armadas acudiram em tempo, e evitaram que se consumasse a implantação do regime bolchevista em nossa terra”.

Em 1972, ele criou a Comissão Justiça e Paz de São Paulo, da qual tive a honra de ser um dos membros fundadores. Durante aqueles anos de regime de terror, nossa missão principal consistia em anotar pormenorizadamente todos os fatos relativos à prisão de opositores políticos ao regime. Periodicamente, tais fatos eram levados por D. Paulo ao conhecimento do General Comandante do II Exército, de modo a desfazer a costumeira explicação oficial de que tais pessoas haviam desaparecido sem deixar vestígios, ou que haviam morrido em tiroteio com as forças policiais.

Documentos guardados pelo Conselho Mundial das Igrejas, em Genebra, mostram que D. Paulo tomou a iniciativa de liderar um movimento internacional de denúncia dos crimes contra a humanidade praticados pelos dirigentes militares em nosso país.

Não foi, portanto, surpreendente que em pouco tempo D. Paulo tenha se tornado o maior adversário do regime militar aqui instalado. Conscientes disso, os chefes militares buscaram fechar um cerco em torno dele, cerceando seus pronunciamentos através dos meios de comunicação social. Fecharam a Rádio 9 de Julho e instalaram a censura na redação do jornal O São Paulo, ambos pertencentes à arquidiocese.

D. Paulo, que à época já fora nomeado cardeal, pediu-me então que procurasse, na qualidade de seu advogado, o delegado da Polícia Federal encarregado de supervisionar essa censura ao jornal. Na entrevista com o delegado, manifestei minha estranheza com o fato de que os veículos da imprensa, do rádio e da televisão, aqui sediados, falassem abertamente de D. Helder Câmara, arcebispo de Olinda e Recife, e silenciassem o nome do cardeal arcebispo de São Paulo. Ao que ele me retrucou: – “Em cumpro instruções, meu caro senhor. D. Helder Câmara pode ser mencionado, toda vez que falem mal dele. Não é o que ocorre no jornal O São Paulo com a pessoa do cardeal”.

Não tendo obtido grande êxito em silenciar D. Paulo com o fechamento da Rádio 9 de Julho e a censura ao jornal da arquidiocese, decidiram então os chefes militares buscar apoio na cúpula eclesiástica, a fim de isolar o “rebelde”. Procuraram, com esse intuito, o cardeal arcebispo do Rio de Janeiro, D. Eugenio Salles, que timbrava em manter um “comportamento prudente”, como se dizia na caserna, e era o responsável, junto ao Vaticano, pelo funcionamento das Comissões Justiça e Paz no âmbito nacional. Instado pelos militares, D. Eugenio, alegando instruções recebidas de Roma, decidiu transformá-las todas em simples “comissões de estudos” (commissiones studiorum), e mandou que um emissário comunicasse essa decisão a D. Paulo.

Ao recebê-lo durante uma reunião da nossa Comissão, D. Paulo declarou que, ou ela manteria a mesma linha de atuação, ou deixaria simplesmente de existir.

Após as despedidas do emissário de D. Eugenio Salles, D. Paulo nos pediu para que preparássemos, desde logo, a transformação da Comissão Justiça e Paz em uma associação civil, dotada de personalidade jurídica e, portanto, independente da autoridade eclesiástica. O que foi feito. Com isso, pudemos prosseguir em nossas atividades, seguindo unicamente as instruções de D. Paulo.

Permito-me, agora, falar de minhas relações pessoais com D. Paulo, pois ele transformou minha vida, operando aquilo que no linguajar cristão tradicional costuma ser denominado uma conversão.

Em 1972, eu atuava como professor de direito e advogado. A família de meus pais habitava uma casa em frente ao Palácio Pio XII, que era, à época, a residência episcopal. Surpreendentemente, lá fui chamado por D. Paulo, sendo convidado para integrar a Comissão Justiça de Paz da arquidiocese. Muito embaraçado, respondi que não me considerava um bom católico, no sentido de cumprir religiosamente os deveres eclesiásticos, para aceitar tal convite. D. Paulo olhou-me firme nos olhos para dizer serenamente: “Isso não tem a menor importância; quero apenas saber se o Sr. está disposto a atuar em defesa das vítimas do regime militar em vigor”.

Graças a essa lição, passei a compreender que a essência da verdadeira vida cristã não está no cumprimento dos rituais religiosos, mas em servir o próximo, sem nada procurar ou esperar para si próprio. Ou, como ensina a sabedoria budista, nas palavras do Dalai Lama, “quanto mais nos importamos com a felicidade de nossos semelhantes, mais felizes nos sentimos”.

Não creio que tenha cumprido fielmente essa lição, mas de qualquer modo mudei o rumo de minha vida.


Fábio K. Comparato é doutor em Direito pela Université Paris. Professor Emérito da Faculdade de Direito da USP e Doutor Honoris Causa da Universidade de Coimbra, e especialista em Filosofia do Direito, Direitos Humanos e Direito Político. É também titular da Medalha Rui Barbosa, conferida pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, em artigo.

Francisco, modelo de paz

Por D. Paulo Evaristo Arns

A festa de São Francisco, em 4 de outubro, transformou-se em símbolo do esforço da Igreja pela Paz. Todos nos lembramos com gratidão da viagem de Paulo VI às Nações Unidas e do pedido humilde, mas corajoso, do Pontífice, de se transformarem os canhões de guerra em arados para a construção da paz duradoura.

Nos tempos de São Francisco, não havia homem que não andasse armado, e homens armados podem transformar-se facilmente em homens de guerra. Como nos dizia certa vez um mexicano: “Em minha Juventude, carregava-se sempre o revólver no cinto e morriam muitos homens pela violência. Hoje, andamos desarmados e já são poucos os que assim morrem”.

Para conseguir um movimento de paz, São Francisco fundou sua Ordem Terceira, que obrigava a todos os membros a andarem sempre com a expressão “Paz e Bem” sobre os lábios e com o cinto e o ânimo desarmados.

Esse movimento provocou tamanha simpatia entre os homens, que se alastrou por sobre o mundo inteiro, conquistando adeptos entre todas as classes e transformando-se em autêntico fermento da ideia “PAZ”.

No entanto a educação para a paz tinha que partir do exemplo daqueles que podem fazer guerra, das autoridades. E havia o que mudar.

O próprio Bispo de sua terra e a autoridade civil se guerreavam. São Francisco não se acovardou, e com sua simplicidade costumeira foi pedir a ambos que fizessem as pazes. Conseguiu-o, mais por persuasão pessoal, do que por argumentos históricos.

Quando, já moribundo, é transportado para sua terra, Assis, abençoa-a do alto de uma colina, desejando-lhe a paz e oferecendo sua serenidade diante do maior inimigo – a morte – como exemplo a todas as gerações. A morte assim se transformou em irmã, que conduz ao desabrochar total na paz eterna.

Mas antes de morrer, já enviara seus arautos da paz, os Frades Menores, dois a dois, a todos os pontos cardiais do mundo, com a mensagem evangélica da Paz: contínua conversão interior; vida em favor dos outros; renúncia aos bens que podem provocar a guerra, e carinho em favor daqueles que não vivem em paz porque estão marginalizados.

“Deixo-vos a paz, dou-vos minha paz”, havia dito Jesus.

Paz significa, segundo os textos evangélicos, um incentivo para todos aqueles a quem Deus ama. Ter paz interior é olhar para os outros com o respeito e o amor de quem olha para Jesus. Ter paz interior não é outra coisa senão identificar-se a tal ponto com os sofrimentos dos outros “que não haja quem sofra, sem que eu sofra com ele”. Por que não dizê-lo, paz interior significa também ter liberdade de falar a Deus como a um amigo e fugir a tudo que possa empanar esta amizade.

Neste ponto, São Francisco é o grande mestre da paz. A tal ponto assimilou a mensagem de Jesus, que na hora da morte, ele próprio confessou: “Não existe um termo no Evangelho que eu não tenha decorado – isto é, que eu não tenha posto no coração – com os pontos e virgulas”.

A mensagem de paz de São Francisco foi assunto para pincéis e penas. Artistas e escritores celebraram a cena do lobo de Gubbio, o ladrão que não deixava paz à sua cidade.

O lobo que fazia vítimas contínuas na comunidade. São Francisco dirigiu-se a ele, e firmou o contrato de que ele não sofreria fome, caso não maltratasse mais os outros.

Os historiadores estão todos de acordo em dizer que São Francisco criou uma alegoria, e nós hoje teríamos a grande tentação de aplicá-la ao nosso meio. Mas preferimos confiar esta tarefa ao leitor: Como faremos para que o lobo deixe de devorar-nos? Qual é a comida que lhe oferecemos, para que não tenha mais fome nem maldade?

Quando visitamos as Pirâmides do México, o arqueólogo nos explicava: “Reparem naquelas pessoas que sobem; quanto se identificam com o monumento, na medida em que vão atingindo o alto; e como no final são uma coisa só com o monumento e o céu”.

Agora imaginem-se os antigos sacerdotes, que subiam com suas oferendas, e assim identificavam a terra e o céu, numa só visão para todos os crentes. As pirâmides se casam com a natureza e o homem mexicano.

Quando o peregrino percorrer Assis, sentirá apenas falta do homem Francisco, totalmente identificado com a natureza. Talvez com um cordeirinho nos braços, cordeirinho que recebeu em troca do manto, amando a água “pura e casta”, amando a lua, o fogo e o sol, amando, sobretudo, o homem, pobre e desprezado, chamando a tudo e a todos de Irmão, de Irmã.

Como à paisagem mexicana se devolve a paz completa, ao unir as pirâmides com o sacerdote e o céu, assim a Humanidade inteira se reconcilia em São Francisco, com aquilo que é e deve ser.

A Paz significa, em última análise, reconhecer a Deus como Pai e a toda a natureza como irmã. A evocação de São Francisco exige de cada um de nós um gesto e uma súplica de paz.

Texto do livro “Olhando o Mundo com São Francisco”, de D. Paulo Evaristo Arns, Edições Loyola, 1982.