Vida Cristã - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

Encíclica “Centesimus annus” de João Paulo II e a realidade do trabalho em tempos de pandemia

13/05/2021

                                                                                                                                 Imagem: Vatican Media

Robson Ribeiro de Oliveira Castro

Em 1º de maio de 1991, o Papa João Paulo II lança a Encíclica Centesimus Annus em comemoração ao centenário da Encíclica Rerum novarum (“Das coisas novas”) de Leão XIII. A encíclica Leonina é a primeira a ser considerada um documento social da Igreja, incorporando o que hoje denominamos Doutrina Social da Igreja.

João Paulo II inicia seu texto, na Encíclica Centesimus Annus, com uma realidade importante: “Desejo agora propor uma ‘releitura’ da Encíclica Leonina, convidando a ‘olhar para trás’, ao próprio texto, para descobrir de novo a riqueza dos princípios fundamentais nela formulados sobre a solução da questão operária. Mas convido também a ‘olhar ao redor’, às ‘coisas novas’, que nos circundam e em que nos encontramos como que imersos, frequentemente muito diversas das ‘coisas novas’ que caracterizavam o último decênio do século passado” (Centesimus Annus , n. 3).

Fato determinante é que a Encíclica Centesimus Annus de São João Paulo II, publicada em 1º de Maio de 1981 foi promulgada pouco tempo após a queda do Muro de Berlim, em 9 de novembro de 1989, evento considerado por alguns como símbolo da derrocada do comunismo.

João Paulo II retoma alguns tópicos da Rerum Novarum para demonstrar que Leão XIII já havia afrontado em seu tempo o conflito capital-trabalho, que ele chamava de “questão operária”. A esse propósito, ele apresentou algumas indicações, tais como aquelas da dignidade do trabalho e do trabalhador, que permanecem válidas até hoje (n. 5).

E diante deste contexto e desta realidade, é possível observar que o texto é bastante atual, como João Paulo II afirma ao lamentar a realidade de sua época. “Infelizmente ainda hoje é frequente encontrar casos de contratos entre patrões e operários, nos quais se ignora a mais elementar justiça, em matéria de trabalho de menores ou feminino, dos horários de trabalho, do estado higiênico dos locais de trabalho, e da legítima retribuição”.

Nesta dura realidade é urgente observar a condição dos trabalhadores em 2021 com a situação pandêmica que estamos vivendo. Infelizmente, no contexto da Covid-19 temos um país entregue ao descaso. Muitos dos brasileiros perderam seus empregos ou tiveram que fazer algum tipo de “bico” para completar a renda familiar.

O texto da Centesimus Annus aparenta ser tão atual que o discurso de João Paulo II pode ser facilmente encaixado em nossa realidade, 30 anos depois: “O homem é reduzido a uma série de relações sociais, e desaparece o conceito de pessoa como sujeito autónomo de decisão moral, que constrói, através dessa decisão, o ordenamento social. Desta errada concepção da pessoa, deriva a distorção do direito, que define o âmbito do exercício da liberdade bem como a oposição à propriedade privada.” (n. 13)

Desta forma, diversos trabalhadores se sujeitam à exploração para manterem seus empregos. Na atualidade, a pandemia colocou o ser humano em uma realidade complexa e difícil. A crise do trabalho é resultado de uma opção social e mostrou a sua pior face: a fome!  Para tanto, diante desta grave crise que nos assola, devemos voltar nossos olhares e nosso esforço para os desamparados. É urgente o zelo pelos mais pobres!

João Paulo II não apresenta a realidade de se falar de uma sociedade que escraviza o ser humano e o coloca refém da máquina social e o controle das grandes empresas: “O homem, de fato, privado de algo que possa ‘dizer seu’ e da possibilidade de ganhar com que viver por sua iniciativa, acaba por depender da máquina social e daqueles que a controlam, o que lhe torna muito mais difícil reconhecer a sua dignidade de pessoa e impede o caminho para a constituição de uma autêntica comunidade humana.” (n. 13)

Para tanto, é preciso observar o que está visível em termos de pandemia. A crise que nos assola fez aumentar o distanciamento das classes sociais. É necessário lutar pela valorização da vida e do trabalhador, principalmente em uma sociedade individualista, gananciosa e narcisista. Que seja possível ressoar o clamor desses textos em tempos tão sombrios.


Robson Ribeiro de Oliveira Castro  é leigo. Mestre em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE). Atualmente leciona no Instituto Teológico Franciscano (ITF). E-mail: robsonrcastro@yahoo.com.br.

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