Robson Ribeiro de Oliveira Castro
É preciso saber que a vida é um dom e que se deve tratar o outro também como um dom! O cuidado com o e o respeito já bastariam. O ser humano foi criado por Deus, e deve ter como primícias a sua condição de filho de Deus.
A repercussão do caso da jovem Mariana Ferrer, que alega ter sido estuprada pelo empresário André Aranha, como vimos nos noticiários e nas redes sociais, nos atinge diretamente.
Nos ajuda nesse momento buscar a filósofa Hannah Arendt em seu livro “A condição humana” e a sua afirmação: “O fato de que o homem é capaz de agir significa que se pode esperar dele o inesperado, que ele é capaz de realizar o infinitamente improvável”. (ARENDT. A Condição Humana, 2002, p. 191). A partir desta realidade, temos a necessidade de se falar de uma ética pautada no caminho de reciprocidade e cuidado com o outro.
Não estamos no mundo sozinhos, não nos construímos sozinhos, somos fruto da realidade e do ambiente em que vivemos. A nossa condição humana e a nossa conduta ético-moral devem ser pautadas em princípios, pois diante do outro e da sua dor, devemos considerar como nossa também a sua dor e sofrimento.
Destarte, o termo “banalidade do mal”, cunhado por Arendt, nos convoca a refletir e compreender o que acontece com a nossa sociedade. Não podemos negar os fatos e, acima de tudo, é preciso ter presente a dignidade da vida humana, pois vidas importam, sim!
O caso da jovem Mariana Ferrer e do empresário André Aranha repercutiu de tal maneira pelo vazamento do julgamento, principalmente pelo fato de o advogado do empresário tê-la humilhado, dizendo: “Jamais teria uma filha do nível dela”, além de insinuar que as roupas e fotos de Mari eram provocativas, tentando responsabilizá-la pelo estupro.
Aqui, diante da realidade apresentada, sugiro a leitura do capítulo 18 de São Lucas, o caso do juiz iníquo e a viúva importuna (vv. 1-8) e a parábola do fariseu e o publicano (vv. 9-14). Ambos tratam de um sentimento que leva a todos nós a pecar e a nos esquecermos do próximo, pela vaidade e desejo por poder.
No início do capítulo 18, as palavras do juiz, diante da viúva, são de descaso para sua causa, Jesus relata que: “Havia numa cidade um juiz que não termia a Deus e não tinha consideração para com os homens” (v.2); esta realidade apresenta a dureza do coração e o orgulho dos que deveriam lutar pela justiça em igualdade para todos.
Assim, para que houvesse uma transformação no caso e o juiz conseguisse atender ao chamado da viúva, ele precisava fazer o caminho de grande transformação e, com humildade, compreender sua relação com o poder e a justiça.
Já na realidade do publicano e do fariseu, algo de muito importante é observado: o fariseu não compreendia que estaria sendo mais honesto e correto se admitisse a sua condição e, acima de tudo, fosse humilde sem se apegar a questões vaidosas; por isso, o publicano, atento à sua realidade e condição pecadora, recolhe-se, faz suas orações sem levantar a cabeça em direção ao céu.
Assim, a realidade do próximo e nossa condição de vida em constante relação deve ser pautada nos ensinamentos de Jesus que queria exaltar os que eram humilhados, pois é com eles que se senta à mesa para comer.
Que possamos ser anunciadores da Justiça, e não propagadores de discursos vazios, como lembra Jesus ao falar dos fariseus: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! Sois semelhantes a sepulcros caiados, que por fora parecem belos, mas por dentro estão cheios de ossos de mortos e toda podridão” (Mt 23,27). Diante dos fatos narrados e sobre o caso em questão, precisamos mudar a nossa mentalidade e cuidar de todos, mesmo diante da realidade de cada um. A vida deve estar em primeiro lugar.
Robson Ribeiro de Oliveira Castro é leigo, casado. Mestre em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE). Atualmente leciona no Instituto Teológico Franciscano (ITF). E-mail: robsonrcastro@yahoo.com.br.