Notícias - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

O mundo pode mudar a partir do coração

27/06/2025

Notícias

“Diante do Coração de Cristo, peço mais uma vez ao Senhor que tenha compaixão desta terra ferida, que Ele quis habitar como um de nós. Que derrame os tesouros da sua luz e do seu amor, para que o nosso mundo, que sobrevive entre guerras, desequilíbrios socioeconômicos, consumismo e o uso anti-humano da tecnologia, recupere o que é mais importante e necessário: o coração.” (Papa Francisco – Carta encíclica Dilexit Nos)

Quando olho para o infinito, vejo o amanhã entre as frestas das guerras e das dores de centenas de milhares de homens, mulheres, idosos, jovens e crianças. Apurando um pouco mais os sentidos, é possível ouvir em seus sussurros sopros de esperança, que ganham vida pelas batidas de seus corações partidos e descompassados pelo medo, pela incerteza e pelo descaso.

São tantas afrontas contra a esperança da humanidade… Estamos ficando frios ou anestesiados diante das dores do mundo? Onde está o nosso caminho? Onde está o nosso coração?

Nesta sexta-feira, 27 de junho, celebramos a Solenidade do Sagrado Coração de Jesus, que, conforme esclarece Frei José Ariovaldo da Silva em um artigo publicado no site franciscanos, é como se entrássemos novamente nas solenidades pascais “e revivêssemos o imenso mistério do amor de Deus manifestado em Cristo, e o fazemos pela via simbólica do coração, do Coração de Jesus.”

Em tempos de guerra, onde está o Sagrado Coração de Jesus?

Podemos afirmar que Ele está no peito de nossos irmãos e irmãs que sofrem diante do mal e clamam pela paz em seus territórios devastados pelo ódio, seja ele motivado por guerra civil ou militar. Mas Ele também está no peito de quem não se conforma com tantas atrocidades e crê na graça divina.

Na encíclica Dilexit Nos (Ele nos amou), sobre o amor humano e divino do Coração de Jesus, o saudoso Papa Francisco diz: “É necessário recuperar a importância do coração quando nos assalta a tentação da superficialidade, de viver apressadamente sem saber bem para quê, de nos tornarmos consumistas insaciáveis e escravos na engrenagem de um mercado que não se interessa pelo sentido da nossa existência.”

É interessante essa reflexão inicial do documento feita por Francisco, visto que, na atualidade, as guerras, de forma ainda mais evidente, são movidas também pelo mercado da indústria bélica e pelos interesses econômicos. Não é um confronto entre o mal e o bem, mas uma batalha por interesses, na qual o povo paga muito caro por isso.

Mais uma vez, precisamos questionar… Por que querem que acreditemos numa visão simplista do mal e do bem em situações de guerra?

É nesse sentido que Francisco quis abrir nossos olhos e corações de forma didática, serena e elucidativa. Ele nos alerta para o risco de uma sociedade do consumo, na qual devoramos informações e notícias ora pela metade, conforme os interesses ideológicos dos veículos de comunicação, ora falsas, com as chamadas fake news. Na internet e nas redes sociais, assim como nas prateleiras, temos a opção de escolher as notícias que mais nos chamam a atenção e desejamos consumir. “‘O homem contemporâneo encontra-se com frequência transtornado, dividido, quase privado de um princípio interior que crie unidade e harmonia no seu ser e no seu agir. Modelos de comportamento, infelizmente bastante difundidos, exaltam a sua dimensão racional-tecnológica ou, ao contrário, a instintiva’. Falta o coração.”

Diante de tantas pressões e jogos de interesses, somos atraídos para um ambiente no qual nos afastamos do coração, espaço onde está a nossa serenidade e onde é possível encontrar a presença humana e divina de Jesus Cristo, que foi capaz de enfrentar seus medos para nos salvar de todo o mal. Ele nos amou com toda a força do seu Sagrado Coração e cumpriu a Sua missão.

Somos novamente chamados, na encíclica Dilexit Nos, a imergir na intimidade do nosso coração humano à procura do Sagrado Coração de Jesus. “Se o ‘coração’ leva ao mais íntimo da nossa pessoa, permite também que nos reconheçamos na nossa integralidade e não apenas num mero aspecto isolado.” Isso significa que, enquanto humanidade e filhos de Deus, estamos unidos numa só carne.

No decorrer de sua reflexão teologicamente atual, Francisco nos inspira a partir de outros pensadores, ao aproximar o humano do divino, quando diz:

“São Boaventura dizia que, no final, se deve perguntar ‘não à luz, mas ao fogo’. E ensinava que ‘a fé está no intelecto, de tal modo que provoca o afeto. Por exemplo: saber que Cristo morreu por nós não permanece (somente) conhecimento, mas torna-se necessariamente afeto, amor’.[18] Nessa linha, São John Henry Newman tomou como lema a frase Cor ad cor loquitur, porque, além de toda dialética, o Senhor salva-nos falando ao nosso coração a partir de seu Sagrado Coração. Seguindo ele, grande pensador, esta mesma lógica fazia com que o lugar do encontro mais profundo consigo mesmo e com o Senhor não fosse a leitura ou a reflexão, mas o diálogo orante, de coração a coração, com Cristo vivo e presente.”

E ele continua nos conduzindo e mostrando o caminho, inclusive por meio da Eucaristia:

“É por isso que Newman encontrava na Eucaristia o Coração de Jesus Cristo vivo, capaz de libertar, de dar sentido a cada momento e de derramar a verdadeira paz sobre o ser humano: ‘Ó Coração Sacratíssimo e Amorosíssimo de Jesus, estás escondido na Sagrada Eucaristia, e continuas a bater por nós […]. Eu te adoro, então, com todo o meu melhor amor e temor, com meu carinho fervoroso, com a minha vontade mais conquistada e resolvida. Ó meu Deus, quando tu te rebaixas a sofrer para (que eu possa) receber-te, para comer e beber a Ti, e Tu por um tempo fazes a tua morada dentro de mim, ó faze meu coração bater com o teu Coração. Purifica-o de tudo o que é terreno, de tudo o que é orgulhoso e sensual, tudo o que é duro e cruel, de toda a perversidade, de toda a desordem, de todo amortecimento. Então, encha-o de Ti, que nem os acontecimentos do dia, nem as circunstâncias do tempo possam ter o poder de perturbá-lo, mas que em teu amor e temor possa ter paz.’”

Diante de tantas evidências dos fatos que envolvem nossa realidade e aquelas contidas no Evangelho, devemos pensar, assim como Francisco, que “o mundo pode mudar a partir do coração”.

“Só a partir do coração é que as nossas comunidades serão capazes de unir e pacificar os diferentes intelectos e vontades, para que o Espírito nos possa guiar como uma rede de irmãos, porque a pacificação é também uma tarefa do coração. O Coração de Cristo é êxtase, é saída, é dom, é encontro. N’Ele, tornamo-nos capazes de nos relacionarmos uns com os outros de forma saudável e feliz, e de construir neste mundo o Reino de amor e de justiça. O nosso coração unido ao de Cristo é capaz deste milagre social.”

E ele reforça seu apelo, nos mostrando que, enquanto imagem e semelhança de Deus, temos a graça de, mesmo diante de nossas fragilidades, sermos propagadores do amor e da esperança por meio do coração, pois “‘esse Coração Sagrado é o princípio unificador da realidade, porque ‘Cristo é o coração do mundo; a sua Páscoa de morte e ressurreição é o cerne da história que, graças a Ele, é história de salvação’.”

Para este dia da Solenidade do Sagrado Coração de Jesus, propôs-se trazer um trecho da encíclica Dilexit Nos, do Papa Francisco, como inspiração para um caminho que nos conduza ao encontro verdadeiro com o Coração que deve pulsar em sintonia com o mundo, rumo à esperança, ao bem e à paz.


Adriana Rabelo Rodrigues