Frei Medella e o jeito franciscano de comunicar
08/08/2018
Moacir Beggo
São Paulo (SP) – Uma tarde franciscana. Foi assim o 7º encontro do Programa de Formação Permanente da Frente de Evangelização da Comunicação nesta quarta-feira, 8 de agosto. Através do tema “A Comunicação de Francisco”, Frei Gustavo Medella, coordenador da Frente da Comunicação, conduziu a reflexão por videoconferência com os colaboradores do Colégio Bom Jesus e FAE, de Curitiba (PR); Fundação Frei Rogério, de Curitibanos (SC); Fundação Celinauta, de Pato Branco (PR); Universidade São Francisco, de Bragança Paulista (SP); Serviço Franciscano de Solidariedade – Sefras (SP) e da Sede Provincial (SP).
Para Frei Gustavo, este momento formativo teve como proposta identificar elementos da vida, dos ensinamentos de São Francisco que possam nortear a “nossa comunicação” enquanto comunidades ligadas ao modo franciscano.
Primeiro, observa o frade, é preciso entendermos a comunicação como possibilidade de encontro, como relação e como “construção de pontes”, expressão que o Papa Francisco gosta muito de usar. “Nós podemos nos inspirar em diversos encontros durante a vida de Francisco, mas aqui vamos nos ater especialmente a dois: o chamado encontro de Francisco com Cristo, que lhe falou no Crucifixo de São Damião, e o abraço ao leproso”, adiantou.
“No primeiro, Francisco em oração diante do Crucifixo foi capaz de ouvir os apelos que Cristo lhe fez. Também podemos ouvir os apelos de nossa realidade. De que maneira temos elementos, maneiras para ouvir os apelos que nossa realidade nos faz?”, questionou o frade. “Nós sabemos que o bom comunicador é necessariamente também um bom ouvinte. Ouvinte no sentido de alguém que busca compreender, receber, elaborar e dar significado aos sinais da realidade e, a partir desses sinais, orientar sua prática, orientar inclusive o conteúdo da sua comunicação. Nossos ouvidos estão treinados para identificar os apelos que nos chegam?”, reforçou.
Profissionais da Fundação Frei Rogério de Curitibanos (SC)
No segundo exemplo, Frei Medella explicou antes o que significava ser leproso no contexto da Idade Média. “Primeiro era uma doença que não tinha cura. Hoje temos tratamentos e profilaxias para a chamada hanseníase. Mas naquele tempo, a lepra de fato degenerava a pessoa, que apodrecia em vida. Uma vez acometida por essa enfermidade, ela era totalmente isolada do convívio social. As pessoas portadoras dessa doença viviam fora do contexto da cidade, viviam nas florestas, à margem da sociedade e abandonadas. Suas feridas cheiravam mal e elas não tinham meios de subsistência, de higiene. Então, eram figuras que causavam repulsa. Inclusive em Francisco. No entanto, no seu processo de conversão, ele foi capaz de vencer esse nojo, esse asco em relação à figura do leproso e, motivado por um ideal maior, depois de perceber que aquele leproso podia ser a figura do Cristo que sofreu na cruz e que continua sofrendo na figura das pessoas mais desamparadas, foi capaz de abraçar e beijar aquele leproso e se colocou no meio dos leprosos. E, a partir desse momento, ele descreve no seu Testamento assim: ‘Depois daquele gesto, o que era amargo para mim se tornou doce’. O leproso não deixou de cheirar mal, não deixou de ser aquela figura, mas Francisco conseguiu dar esse passo. Conseguiu ir ao encontro e perceber, naquele ser humano, um filho amado de Deus, digno de sua atenção, de seu carinho e da sua solidariedade”, situou, fazendo novos questionamentos: Como expressamos em nossa comunicação o compromisso com os últimos de nosso tempo? Quem são os leprosos de hoje? E de que maneira eles são atendidos, são contemplados em nossa comunicação, seja pelos meios tradicionais de rádio e televisão, seja em nossas ações comunicativas em nossas diferentes presenças, em outras entidades, e na vida da educação?
Frei Gustavo, num segundo momento, questionou o que se pretende transmitir nos telejornais e programas, na internet ou redes sociais? Francisco vivia em comunicação íntima com Deus e, já em vida, tornou-se capaz de comunicar, àqueles que com ele estavam, a presença viva do Senhor pois, conforme descreve um de seus biógrafos, “trazia Jesus no coração, na boca, nos ouvidos, nos olhos, nas mãos, nos sentimentos e em todos os demais membros (cf. I Cel 9,115)”.
Depois, falando do texto de São Francisco no qual ele faz uma saudação às diferentes virtudes, entre elas a sabedoria, a simplicidade, a pobreza, a humildade, a caridade e a obediência, lembrou que elas não são apenas ideias abstratas, mas tomam corpo à medida que se encarnam em histórias reais de pessoais reais. “Temos procurado privilegiar a história e o exemplo de pessoas virtuosas que se destacam pela ousadia, pelo entusiasmo, pela generosidade e pelo desprendimento? Onde e como podemos encontrar tais pessoas?”, emendou.
Marília, Marina e Juliano, profissionais do Colégio Bom Jesus e FAE (PR)
Juliano Zemuner, da equipe de comunicação do Bom Jesus, lembrou um exemplo no Colégio Bom Jesus de Vacaria (RS), onde um professor, ao falar sobre São Francisco de Assis aos alunos, promoveu uma ação comunitária, que cresceu e se expandiu além do campo educacional. Já Ari Ignácio de Lima, coordenador de Jornalismo TV Sudoeste, contou que recentemente fez uma reportagem num assentamento de “sem terras”, em Mangueirinha (PR), onde há 26 anos tinha registrado o começo do trabalho para a formação da nova comunidade. “Hoje ela é organizada, com famílias estruturadas, filhos na universidade ou já formados, até médicos já saíram de lá….. Uma reportagem que me realizou como profissional e que vem ao encontro da nossa missão de promover boas práticas. Como eu gostaria de ter uma dessas por dia…”, desejou o comunicador.
Dentro dessa sintonia com o fundador da Ordem Franciscana, Frei Medella também abordou o compromisso com a ecologia, o cuidado do meio ambiente, a cultura da paz e também da promoção do diálogo. “Francisco possuía uma incrível habilidade de dialogar e promover o diálogo”, lembrou o frade. “Como nossa comunicação tem contribuído para a construção da paz no trânsito, nas famílias, nos ambientes de trabalho, etc?”, perguntou Frei Medella. Ana Paula Moreira, jornalista da Universidade São Francisco, lembrou as atividades da USF com a comunidade, destacando a VII Semana Jurídica sobre os 70 Anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, sobre o tema “O Direito de todas as faces. As faces do Direito”, que será realizada no Campus Itatiba, de 22 a 23 de agosto, das 09h30 às 11h, e no período noturno e de 21 a 24 de agosto, das 19h30 às 22h.
Frei Medella frisou a importância de discutir a questão dos direitos humanos, exatamente quando a sociedade brasileira dissemina discursos de ódio, preconceito e violência. “A nossa evangelização não pode passar ao largo. Nosso exercício profissional de comunidades franciscanas não pode desconsiderar o tema. No caso, se nós nos fechamos ou não damos atenção a esse tipo de temática, não estamos fazendo como Francisco que soube ouvir o Crucifixo de São Damião e, de certa maneira, estamos nos tornando até indiferentes aos apelos que a vida nos apresenta”, completou o frade.