Frei Bruno Linden: clamor do povo chega a Roma
25/02/2018
Frei Augusto Luiz Gabriel e Moacir Beggo
Joaçaba (SP) – Em 28 anos, a Caminhada Penitencial Frei Bruno levou multidões às ruas de Joaçaba no segundo domingo da Quaresma, pedindo o reconhecimento de santidade de Frei Bruno Linden, frade franciscano que viveu a maior parte de sua vida no Oeste Catarinense e Vale do Itajaí. Em muitas dessas demonstrações de fé, nem o sol forte ou as chuvas torrenciais, próprias do verão, esmoreceram esse clamor popular. Neste domingo histórico, 25 de fevereiro de 2018, coincidentemente o dia da morte de Frei Bruno, o povo voltou a lotar as ruas de Joaçaba – aproximadamente 60 mil pessoas segundo cálculos da Polícia Militar -, mas desta vez com uma motivação maior ainda: celebrar a conclusão do processo diocesano da Causa pela Beatificação de Frei Bruno. Às 8 horas, num dia de sol e céu azul de anil, os peregrinos testemunharam a última sessão solene do Tribunal Eclesiástico, que durante quase cinco anos analisou, documentou e julgou se o frade franciscano da Província da Imaculada Conceição demonstrou, em grau heroico, as virtudes da fé, esperança e caridade.
A última sessão não teve pompa e circunstância, e nem poderia ser diferente, pois apenas se cumpriu uma etapa no longo caminho para chegar à glória dos céus. Mas foi emocionante ver o bispo diocesano Dom Mário Marquez e notária Michelle Selig lacrarem as três caixas com as cópias do processo, das quais duas seguirão para a Congregação para a Causa dos Santos, em Roma, e a outra com os originais ficará em poder da Diocese de Joaçaba.
No Vaticano, agora começa uma nova fase do processo, quando a Congregação vai analisar se Frei Bruno terá o decreto de reconhecimento das virtudes heroicas assinado pelo Papa Francisco e ganhará o novo título de Venerável.
O rito em frente à Catedral Santa Terezinha, construída por Frei Edgar Loers, frade desta Província da Imaculada e que conviveu com Frei Bruno nos últimos anos de sua vida, começou com o comentário de Frei José Idair Ferreira Augusto, pároco da Igreja de Nossa Senhora do Rosário de Concórdia (SC), que fez uma explicação de todo o processo até esta última sessão solene do Tribunal. Depois foram apresentados os componentes deste Tribunal que foi instalado no dia 30 de outubro de 2013: Pe. Davi Lenor Ribeiro dos Santos, delegado do bispo, Pe. Clair José Lovera, promotor de justiça; Michelle Selig, notária (secretária); e Cláudio Orço, notário auxiliar. Eles foram chamados diante do povo para fazer o juramento atestando que tudo o que foi realizado neste processo estava dentro das orientações da Igreja.
Com as caixas dos documentos lacradas, os vice-postuladores Frei Estêvão Ottenbreit e Frei Alex Ciarnoscki foram chamados à frente para fazerem o juramento de que cumpririam “fielmente o encargo de transmitir” a Roma a documentação do processo diocesano e de entregá-la à Congregação para a Causa dos Santos, juntamente com a pasta contendo as credenciais do processo, do qual constam 33 depoimentos de pessoas que conheceram e conviveram com Frei Bruno; uma biografia completa, acompanhada de documentos históricos; e os escritos de Frei Bruno, acompanhados de avaliação teológica. “Todo esse trabalho tinha como finalidade comprovar que Frei Bruno viveu de forma extraordinária as virtudes cristãs, assumindo seu batismo como religiosos franciscano, sacerdote e missionário”, explicou Frei José Idair.
O Ministro Provincial, Frei Fidêncio Vanboemmel, fez um agradecimento eloquente ao povo no término deste processo. “Nós, Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil, principalmente os frades aqui presentes, queremos dizer hoje que estamos, de certa forma, muito agradecidos por uma resposta que estávamos devendo ao povo de Deus. O clamor por esse processo vinha há muitos anos. Muitos anos o povo de Deus pedia que iniciássemos o processo de pela causa de Frei Bruno e há cinco anos, graças ao sim de Dom Mário, a Província se sentiu animada iniciar este ardoroso trabalho em vista de uma futura beatificação e até a canonização de Frei Bruno. Então eu quero, mais uma vez, agradecer, em primeiro lugar, a Dom Mário, já que sem o sim dele nada seria possível (e pediu uma grande salva de palmas ao bispo). E assim que recebemos o sim de Dom Mário, a Província pôde dar os passos seguintes e Dom Mário instalou o Tribunal Diocesano como já foram mencionados todos os componentes. E também quero agradecer os padres e os leigos que compuseram esse Tribunal e agradecer aos dois vice-postulares Frei Estêvão e Frei Alex”, disse.
Mas fez um agradecimento especial a Frei Clarêncio Neotti e Dona Iraci, da Comissão Histórica. “Ao trazer para nós a história de Frei Bruno, trouxeram muito mais do que a história de um frade ou de um religioso. Eles, através da história, resgataram um pouco aquilo que foi a grande evangelização franciscana, seja no Vale do Itajaí, seja aqui no Vale do Peixe ou no Oeste Catarinense. Resgatar a vida, a história desse homem de Deus chamado Frei Bruno, foi trazer um pouco daquilo que foi a evangelização franciscana nessas lindas terras de Santa Catarina”, enfatizou.
Frei Fidêncio lembrou também a importância de continuar rezando para pedir a intercessão de Frei Bruno. “De todo coração, peço para que continuemos a rezar muito, meus irmãos e minhas irmãs, a pedir Deus a graça que nós mais estamos desejando: a beatificação de Frei Bruno. Vamos a pedir ao bom Deus para que esta Causa possa prosseguir para que, quem sabe, num tempo breve possamos nos reunir – claro vamos continuar com as caminhadas – para louvar, bendizer a Deus a graça pela vida e santidade de Frei Bruno”.
MANIFESTAÇÃO DE FÉ
O rito terminou com a Oração pela Beatificação de Frei Bruno e deu-se início à 28ª Caminhada Penitencial Frei Bruno, por volta das 8h30.
Toda a praça em frente à Catedral estava tomada de peregrinos que vieram de cidades distantes, como Rodeio, Gaspar, São José, Xaxim, Não me Toque, Indaial onde a presença de Frei Bruno Linden foi muito marcante, e das cidades próximas de Joaçaba e do Vale do Rio do Peixe. Na vizinha Luzerna, outra Caminhada percorreu 6 quilômetros até o Cemitério Frei Edgar. Presentes, além de Dom Mário Marquez e de Frei Fidêncio Vanboemmel, o bispo emérito Dom Osório Beber, e o Pe. José Avelino Zanella, representante do bispo de Chapecó, Dom Odelir José Magri, o Visitador Geral Frei Miguel Kleinhans, os vice-postuladores Frei Estêvão e Frei Alex, o Vigário Provincial Frei César Külkamp, os membros do Tribunal Eclesiástico, o pároco da Catedral Santa Terezinha, Pe. Pedro Ângelo Manchini, os frades da Província da Imaculada, entre eles os noviços, sacerdotes da Diocese, religiosos (as) e seminaristas.
Os noviços franciscanos da Província da Imaculada vieram especialmente da cidade de Rodeio, onde Frei Bruno viveu muitos anos, para celebrar este momento histórico.
Ao longo do trajeto de 3 quilômetros, muitas manifestações de fé foram traduzidas em cartazes, como “Papa Francisco, queremos Frei Bruno santo”, faixas e fotos. Muitos devotos fizeram o percurso de pés descalços. A Celebração Eucarística teve início já na Caminhada com o Ato Penitencial e as primeiras leituras. No Cemitério Frei Edgar, o povo se acomodou como pôde para participar da Santa Missa, mas uma grande multidão pacientemente esperou para visitar e rezar no túmulo de Frei Bruno, o frade franciscano que faleceu nesta cidade no dia 25 de fevereiro de 1960. Outra grande maioria de fiéis só participa da Caminhada.
Desde o início do processo, Frei Estêvão tem vindo sempre a Xaxim e Joaçaba e toda vez se impressiona com a manifestação de fé do povo vista na Caminhada. “Isso é um ponto positivo para a nossa Causa. Dificilmente vocês vão encontrar um candidato com esse apoio popular. É Impressionante. O próprio postulador da Ordem, Frei Giovan Giuseppe Califano, sempre se refere a isso como nunca ‘vi algo semelhante'”, explicou o Vice-postulador.
HOMILIA
Depois de saudar religiosos, sacerdotes, seminaristas, autoridades civis e militares, D. Mário ressaltou as virtudes e a vida de santidade de Frei Bruno nestas terras catarinenses partindo da primeira leitura. “Os planos de Abraão e Sara mudaram ao ouvirem os apelos de Deus. Pela fé, Abrãao abraçou um novo desafio, um novo caminho. E todos nós somos chamados a abraçar esse novo caminho, na fé e no amor a Deus. Frei Bruno, pela fé, deixou sua terra natal e veio como missionário franciscano para o Brasil, percorrendo muitos lugares do nosso Estado, onde exerceu seu ministério. Joaçaba foi sua última trajetória e há 58 anos, no dia de hoje, lembramos a sua partida deste mundo. Sua passagem deixou marcas de santidade, amor e carinho para com todos. Essa gratidão o povo manifesta hoje com sua fé e sua confiança na sua intercessão”, disse D. Mário.
“Lançando, por onde passava, sementes de fé, esperança, gestos de fraternidade, misericórdia e caridade, marcou sua trajetória entre nós. Foi um homem de Deus exercendo o ministério sacerdotal, reconciliando famílias, consolando pessoas, visitando os doentes, andando a pé, de dia ou de noite como um peregrino, instruindo e orientando pessoas em suas diversas situações. Este perfil de Frei Bruno é o que o Papa Francisco deseja de todo aquele que se dedica ao pastoreio em nossa Igreja. Frei Bruno tem essa característica que o Papa pede a nós, religiosos e religiosas, leigos e leigas”, enfatizou.
Como frade franciscano, Frei Bruno, andando por vales e montanhas, soube se relacionar fraternalmente com a criação, respeitando, contemplando e cuidando da Casa Comum. “É nossa responsabilidade também cuidar do bem comum deste mundo, como lembra a encíclica Laudato Sí“, disse D. Mário. Citando a Campanha da Fraternidade e a busca por uma cultura de paz, lembrou que Frei Bruno pode ensinar como nos tornarmos instrumentos de paz.
Como São Paulo pede na segunda leitura, sejamos imitadores de Cristo. “Frei Bruno foi um testemunho para nós de vida cristã: viveu a santidade, tendo como inspiração o Evangelho e São Francisco de Assis”, lembrou.
“Nós viemos participar desta 28ª Caminhada Penitencial Frei Bruno porque reconhecemos verdadeiros sinais de santidade em sua vida. A multidão do povo de Deus, os que estão conectados conosco através dos meios de comunicação, demonstram profunda devoção e carinho por nosso Frei Bruno. E isso é muito bonito. É um grande sinal de amor de nossa parte. Aprendamos com o nosso Servo de Deus as lições de simplicidade, de desprendimento, de doação do seu tempo às pessoas, ouvindo, socorrendo, abençoando, rezando numa Igreja em saída. Ele foi um frade que não ficou dentro da sacristia mas ia ao encontro das pessoas”, pediu, lembrando ao falar do evangelho da Transfiguração de Jesus, o homem de oração que era Frei Bruno. “Sem uma vida de oração, não é possível ter contato com Deus e transfigurar a vida”, ensinou.
AGRADECIMENTOS
Dom Mário foi enfático em agradecer a todos que estiveram envolvidos na organização da Caminhada Penitencial mas agradeceu especialmente ao Tribunal Eclesiástico pelo trabalho concluído neste dia.
Frei Fidêncio também ressaltou a boa organização da festa e agradeceu ao pároco Pe. Pedro Angelo. “Muito obrigado pela sua organização, pelo empenho envolvendo tantas e tantas pessoas. Então, nós, Província Franciscana, queremos nos colocar à disposição para tudo o que for necessário para conseguirmos o bom êxito desta causa de Frei Bruno”, agradeceu.
O pároco de Santa Terezinha, Pe. Angelo destacou a ajuda de voluntários e as doações que garantiram a montagem da estrutura da Caminhada.
DEPOIMENTO
“Por que o povo é tão devoto de Frei Bruno mesmo não sendo santo?” Foi essa pergunta que levou a estudante de Jornalismo, Luana Amorim, a escolher para o trabalho de conclusão do curso a história da vida do frade franciscano. Luana está cursando o sétimo período do curso de Jornalismo da Univale, em itajaí. “Sou natural de Joaçaba mas por causa do curso estou residindo em Itajaí. Desde pequena sempre ouvi falar de Frei Bruno. E quando criança, a minha mãe pediu uma graça a ele porque eu tinha problemas de saúde. Por isso, sempre tive curiosidade em saber por que as pessoas têm tanta fé num homem que ainda não é santo. Quando pensei num tema para concluir o curso, imaginei que poderia escrever sobre Frei Bruno. Foi aí que nasceu a ideia de um livro-reportagem sobre a sua vida. Apresentei a proposta para o meu professor orientador, Gustavo Zonta, e, para minha surpresa, ele disse que sua mãe é muita devota do frade franciscano. Ele é de Ascurra, próxima de Rodeio, onde Frei Bruno viveu muito. Foi uma coincidência muito boa e por isso esse será meu tema”, contou Luana, que vai atrás das pessoas para tentar entender por que Frei Bruno desperta tanta fé nas pessoas.
VEJA IMAGENS DA ÚLTIMA SESSÃO SOLENE DO TRIBUNAL DIOCESANO PARA A CAUSA DE FREI BRUNO