Homenagem ao Frei José Ariovaldo marca aula inaugural no ITF
20/02/2020
Frei Augusto Luiz Gabriel
Petrópolis (RJ) – Uma manhã repleta de atividades marcou oficialmente o início das atividades acadêmicas no Instituto Teológico Franciscano de Petrópolis (RJ), nesta quinta-feira (20/02). Começou com a Santa Missa na capela da Fraternidade São Francisco de Assis e terminou com um “Talk show” em homenagem ao professor emérito, Frei José Ariovaldo da Silva, fechando com chave de ouro o evento.
A Celebração Eucarística, presidida pelo diretor do ITF, Frei Ivo Müller, foi concelebrada pelos frades e professores Frei Fábio César Gomes e Frei Antônio Everaldo. Contou também com a participação de docentes, discentes e colaboradores. Os seminaristas da Diocese de Volta Redonda e Nova Iguaçu (RJ), que atualmente estudam no Instituto, serviram o altar como acólitos e animaram os cantos da liturgia juntamente com os frades que residem na Fraternidade do Sagrado.
Na homilia, Frei Ivo afirmou que todos são chamados à missão de desvelar o mestre. “Somos provocados pelos nossos mestres a buscarmos com profundidade os fundamentos que todo o patrimônio da Teologia possui, para sermos jardineiros, discípulos e missionários da Boa Nova, tendo sempre Cristo junto de nós”, disse.
No Salão Acadêmico, Frei Marcos Andrade acolheu a todos e explicou que a temática de estudos seria em torno do tema da liturgia, tendo em vista a homenagem ao professor e liturgista Frei José Ariovaldo, que deixa as salas de aula neste ano. “Podemos falar do Frei Ariovaldo enquanto frade franciscano, presbítero, poeta, contador de histórias, dedicado cronista, mas na seção acadêmica de hoje queremos homenageá-lo como professor de liturgia”, apresentou Frei Marcos.
Frei José buscou fazer do ensino da liturgia uma missão. Professor no ITF desde 1981, quando retornou de Roma; foi também professor no Instituto Teológico de Juiz de Fora, na Pós-graduação da Faculdade de Teologia N. Sra. da Assunção, em SP, mais tarde membro do Centro de Liturgia “Dom Clemente Isnard”, ligado ao Instituto Pio XI (UNISAL – São Paulo), deu aulas também na Pontifícia Universidade Antonianum de Roma.
Foi membro fundador da Associação dos Liturgistas do Brasil (ASLI), da qual foi o primeiro presidente. Buscou no ensino, a partir da sua formação no Pontifício Instituto Litúrgico Santo Anselmo, um vigor acadêmico fundamentado nas Sagradas Escrituras, na patrística, na histórica buscando demonstrar a teologia, a espiritualidade e a missão própria de cada sacramento nas fontes litúrgicas, isto é, nos rituais. “As apostilas dos cursos poderiam se transformar em livros, pois tudo era bem pesquisado, citado, fundamentado, dentro do rigor próprio da ciência. Orientou diversos trabalhos científicos e participou de inúmeras bancas de defesa de teses da graduação ao doutorado”, revelou Frei Marcos.
Enquanto conferencista, viajou o Brasil de Norte a Sul, do Leste ao Oeste, para levar o aprofundamento litúrgico a fim de que houvesse uma renovação da prática celebrativa das comunidades. Prestou inúmeras assessorias em dioceses, paróquias, congregações e ordens religiosas. Contribuiu em diversos cursos, seminários, congressos, semanas de liturgia. Foi membro da Comissão Episcopal para a liturgia da CNBB, fazendo parte por muitos anos da equipe de reflexão da linha 4 (dimensão litúrgica da CNBB) e membro da Comissão para Acabamento da Basílica Nacional de Aparecida, “só para citar algumas dessas participações”, lembrou o moderador da seção. “Esteve inclusive por um período na nossa missão em Angola, contribuindo na formação litúrgica do povo, dos frades, das Clarissas”.
MINHA GRANDE SALA DE AULA É O POVO DE DEUS
Num bate-papo com os participantes, Frei José disse que se sentia emocionado por estar ali. “De repente, olhamos para trás e vemos quantas coisas fizemos. Ultimamente, venho curtindo um sentimento profundo de gratidão. Enfrentei muitas dificuldades, muitos problemas, mas tive muitas alegrias. Tudo foi superado e estou aqui!É pura graça de Deus! Ele, de fato, cuidou de mim”, disse o liturgista. Segundo Frei José, esse amor pela liturgia surgiu durante o tempo de estudante, quando na Baixada Fluminense, animava as celebrações. “Foi ali que praticamente nasceu este desejo. Fui cultivando e, com o passar dos anos, no final do meu tempo de Teologia, os professores fizeram uma reunião e, por meio de Frei Hermenegildo Pereira, me indicaram para estudar. Levei um susto no início, mas encarei e hoje me assusto comigo mesmo pela coragem que tive. Assim que começaram as aulas, fui me encantando cada vez mais e mais. Por isso, a partir dessa experiência vital, a liturgia que é o memorial da presença de Deus no meio de nós, passou a ser para mim uma verdadeira “cachaça”: sempre quis buscar mais e mais”, contou.
Autor do livro “O Movimento Litúrgico no Brasil – Estudo Histórico”, publicado há 37 anos, Frei José Ariovaldo recorda que uma das coisas que lhe chamaram atenção foi o estranhamento que a reforma da liturgia trouxe dentro da comunidade eclesial. “Houve muitos conflitos, pois era uma coisa nova. Em junho de 1933, foi celebrada a primeira missa do “padre virado” para o povo numa fazenda do interior do estado do Rio. O movimento litúrgico surgiu por conta de grandes descobertas que foram surgindo no século XIV dentro de escritos da Patrística. Iluminados por essas descobertas surgiu o movimento para renovar a liturgia, tendo em vista a experiência de nossos primeiros irmãos. Tenho a impressão que a própria sociedade está se encarregando de desconstruir certos padrões, e ao mesmo tempo ajuda a construir coisas novas”, avalia.
Para ele, entre os desafios para o estudo de liturgia hoje, está um ego coletivo tentando combater o novo, o diferente. “O grande desafio é não deixar que os conservadores tomem cada vez mais espaço. A gente sabe que existem. O próprio Papa Francisco está sofrendo com ameaças. Eles são muito poderosos, inclusive economicamente, e hoje em dia parecem que estão em voga. Isso, confesso, me assusta. E aí, o que se fazer? Acho que de nossa parte, primeiro precisamos perceber que isso existe. Percebendo, vamos construindo dentro de nós algo novo, isto é um aprofundamento espiritual e teológico. É preciso começar por nós!”, ensina.
No final, Frei Fábio agradeceu pela influência positiva que o frade exerceu sobre a sua vida e ministério sacerdotal. Depois o moderador da seção, Frei Marcos, leu duas cartas em homenagem ao religioso. Encerrando as homenagens, Frei Ivo, entregou um presente ao liturgista e pediu que ele continue expressando todo seu conhecimento com sua presença e participação junto de todos os estudantes pelos corredores e espaços do Instituto Teológico Franciscano. Por sua vez, Frei José Ariovaldo agradeceu imensamente pelas homenagens e leu uma poesia de própria autoria.
AULA INAUGURAL – UMA REFLEXÃO TEOLÓGICA-PASTORAL
A palestra da aula inaugural foi conduzida pelo Padre Patrick Brandão, da Diocese de Duque de Caxias e São João de Meriti (RJ), que é reitor do seminário propedêutico, assessor da escola diaconal, assessor das escolas de formação para os leigos e leigas e membro da comissão de liturgia diocesana. Foi aluno do Instituto entre os anos de 2012 a 2015. Mestre em teologia litúrgica pelo Instituto de Liturgia Pastoral Santa Justina, Pádua é doutorando pelo mesmo Instituto.
Pe. Patrick falou sobre “A Ministerialidade Laical nas assembleias litúrgicas da Igreja Latino-Americana: Uma reflexão teológica-pastoral”. Iniciou agradecendo o convite e dedicou a aula inaugural aos alunos e, de forma particular, aos professores de liturgia que teve durante o período da sua graduação: Frei Marcos Andrade, Frei José Ariovaldo e de saudosa memória Frei Alberto Beckhäuser.
O palestrante apresentou, de forma resumida, aspectos de sua tese de mestrado em três partes: Primeiro ofereceu um panorama geral da ministerialidade laical não ordenada na América Latina. Por segundo, discorreu sobre a prática celebrativa. E, por fim, falou sobre a convergência simbólica dos ministérios na assembleia que celebra. Segundo ele, para analisar os ministérios laicais ou ministérios não ordenados na ação celebrativa, parte-se da assembleia celebrante. Para ele, a correlação entre religiosidade popular e liturgia consiste no protagonismo de todos com uma ministerialidade diversificada, sobretudo em serviços laicais. “É preciso um tempo determinado para as festas, procissões e danças; também da direção de leigos nas comunidades”, salientou.
“Um seminarista que estuda Teologia, e que é um excelente aluno, mas que não consegue ter a relação do olhar para as pessoas, não conseguirá celebrar o Mistério Pascal. Não é o conteúdo mais importante e sim a forma em que se celebra”, revelou o sacerdote que voltou de Roma recentemente.
Ofereceu ainda alguns critérios para a criatividade celebrativa: “Respeitar as estruturas celebrativas que os livros rituais contém; celebrar bem todas as ações como primeira atividade criativa; ter atenção em relação às diversas linguagens; valorizar as diversas possibilidades e oportunidades ofertas nos livros litúrgicos; reconhecer o valor da linguagem não verbal e uma equilibrada linguagem verbal; saber distinguir ao que pertence ao âmbito litúrgico e aquilo que pertence à linguagem catequética”.
Segundo ele, todas as linguagens devem ser respeitadas nas celebrações. “A ministerialidade é circular e a Igreja é ministerial, sendo que sem um ministério falta uma parte. A forma litúrgica dá forma a Igreja. A liturgia se interessa pela sinodalidade, por isso todos, homens e mulheres, consagrados e consagrados, ordenados e leigos, estão envolvidos na celebração e na comunhão eclesial”, finalizou sendo aplaudido pelos participantes.
A manhã encerrou-se com uma confraternização no refeitório do instituto.
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