Participantes do Curso de Verão refletem sobre migração e políticas públicas
18/01/2019
São Paulo (SP) – Com o tema “Por uma cidade acolhedora: somos todos migrantes”, o Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular (CESEEP) promoveu, de 9 a 17 de janeiro, a 32ª edição do Curso de Verão. Ao todo, 300 pessoas participaram da atividade. Para dez participantes, vindos de paróquias da Província Franciscana da Imaculada Conceição, a escolha do tema foi profética, justamente no ano em que o governo brasileiro decidiu sair do Pacto Global para Migração da Organização das Nações Unidas (ONU). Segundo eles, a participação foi fundamental para entender melhor o tema e exercitar uma consciência crítica a respeito das posturas pessoais e comunitárias aos migrantes.
Vindos da Paróquia Bom Jesus dos Perdões, em Curitiba (PR); Nossa Senhora da Boa Viagem, na Rocinha (RJ); São João Batista, em São João do Meriti (RJ); São Francisco e Santa Clara, em Duque de Caxias (RJ) e Nossa Senhora Aparecida, em Nilópolis (RJ); os participantes ficaram hospedados na Paróquia Santo Antônio do Pari, em São Paulo, de onde iam todos os dias para o Teatro Tuca, localizado no bairro de Perdizes. Para eles, este trajeto também foi uma forma de pensar na mobilidade urbana, um dos temas trabalhados no Curso de Verão. “Foi um curso desgastante porque saíamos daqui muito cedo, voltávamos muito tarde. Imagine como é a rotina do trabalhador de todos os dias, que passa pelo mesmo processo de trabalhar no centro ou numa zona mais nobre, que faz esse trajeto todos os dias? Aí tem a questão financeira, o cansaço mental e físico”, afirmou Tiago Antônio Badaró, de Duque de Caxias.
Um dos aspectos destacados por eles foi o formato do Curso de Verão e a diversidade. “Pude conviver com pessoas sem religião e com representantes da Umbanda, da Igreja Metodista e católicos. Foi uma troca muito boa. Isso me marcou muito porque consegui dialogar com o outro, que é diferente da gente, sem nenhum tipo de ofensa”, assinalou Geicy Kelly Pires Barboza, de Duque de Caxias.
Para Flávia Scalsavara e Márcia Nunes de Jesus, de Curitiba (PR), os quatro pilares do curso – educação popular, ecumenismo, mutirão e arte – ajudaram na vivência de cada momento e na troca de experiências. “O público era multicultural e intergeracional. Trabalhar com pessoas de 14, 30, 40 anos foi um choque de personalidade e, no final, agregou bastante. Percebemos uma renovação em relação aos anos anteriores. Tudo isso valoriza a troca de experiências, a aceitação das diferenças e como trabalhar isso positivamente”, afirmou Márcia. “Não havia uma postura hierárquica de professor e aluno. Foi uma troca de saberes. Isso foi o mais rico de tudo”, avaliou Flávia.
Além de diversos aspectos relacionados à questão da migração, os assessores e monitores trabalharam a questão da desigualdade territorial, social e mobilidade urbana, tendo presente o tema da Campanha da Fraternidade 2019: “Fraternidade e Política Públicas”. Para Manuel Gomes, do Rio de Janeiro, o tema das políticas públicas despertou seu interesse. “Pretendo agora conhecer melhor as Políticas Públicas e como abordar isso entre os jovens, através de rodas de conversas e participação nos fóruns territoriais”, assegurou.
“A proposta principal do curso é essa: nossa formação, depois levar o conhecimento para nossas bases e repassar o conteúdo para outras pessoas”, indicou Luiz Henrique da Silva, de Duque de Caxias. “Esse curso proporcionou muito embasamento para discutirmos qualquer coisa. Proporcionou a capacidade de formar um pensamento crítico, independentemente do tema do dia. Eles tocavam tanto na tecla de mutirão que no final todos nós, de alguma forma, éramos uma família. Podemos levar esse conceito de mutirão para nossas comunidades. Não ficarmos só no hierárquico, mas nos envolvermos e percebermos que sozinhos não chegarão a lugar nenhum”, afirmou Andressa da Fonseca Luiz, de São João do Meriti.
Para Márcia, que coordena o serviço Chá Fraterno, na Paróquia Bom Jesus dos Perdões, o curso é uma oportunidade de levar formação aos 2.500 participantes que são assistidos pelo projeto. “É preciso instrumentalizar as pessoas ao nosso redor, o público que a gente atende. Não adianta ficar na teoria. Se um destes acolhidos sair de lá sabendo o que são Políticas Sociais e como isso vai ajudar na mudança de sua vida, já vai ter valido a pena”, pondera.
Mudança de olhar para a realidade da migração
Para os participantes, um dos aspectos principais abordados no curso é ter um novo olhar para a questão da migração. Através das assessorias, das tendas e da convivência, eles puderam repensar e ter um novo olhar para os migrantes e para esta realidade global. “Foi bom para desmistificar o olhar de preconceito contra o migrante. A mídia constrói uma imagem negativa, de que eles irão roubar nossos empregos, ocupar nossos espaços. É preciso começar a refletir sobre aquilo que nos é falado”, alertou Flávia.
Segundo os dados apresentados, hoje no Brasil 80 mil migrantes estão esperando a documentação para regularizar a situação no país. Enquanto a situação não é regularizada, muitos acabam sofrendo abusos, como a escravidão, por exemplo. Com o novo governo, a tendência é de um maior fechamento na acolhida aos migrantes e refugiados, indo contra a política global e os incessantes pedidos do Papa Francisco.
Para os participantes, a saída do Pacto da Migração pode trazer graves consequências. “A saída traz não só um problema para os migrantes, mas para os próprios brasileiros. Outros países podem fechar as fronteiras para nós, mesmo que seja para o turismo”, explica Luiz Henrique. “Há uma utopia ao acreditar que fechar as fronteiras será o fim da crise no Brasil. Enquanto existir o pensamento de que o migrante é um problema, o país não consegue se desenvolver 100%”, concluiu Andressa.
O Curso de Verão terminou nesta quinta-feira (17). Durante todo o ano, o CESEEP promove diversas formações. Saiba mais no site: ceseep.org.br
Na foto no topo: Márcia, Manuel, Ataíde, Geicy Kelly, Flávia, Tiago, Luiz Henrique e Andressa.