Notícias - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

“Esta deve ser a Igreja da inclusão e não da exclusão”

26/10/2015

Notícias

FREI ANTÔNIO MOSER

Sábado, após 4 horas de leitura do texto final, os sinodais passaram a votar parágrafo por parágrafo. Pode-se dizer que 90% das proposições tiveram 90% de aprovação. Umas 5 proposições sofreram resistências. E três passaram raspando. O texto no seu todo teve uma redação final fluente, que corria como as águas de um rio para um mar…. Não para um mar morto, mas para um mar de acolhida e de misericórdia. De alguma forma se pode caracterizar este Sínodo como sendo um empenho na busca da integração de todos que batem às portas da Igreja.

Claro que aqui não é o lugar para tentar resumir o relativamente longo texto ao qual todos têm acesso. Mas convém ressaltar alguns dos pontos mais positivos e sinalizar alguns pontos que poderiam ter sido mais bem abordados. O primeiro ponto positivo foi o do ambiente fraterno que reinou do começo ao final. Os 30 casais convidados, os representantes de outras confissões, os assessores, transitavam como velhos amigos durante os intervalos e sobretudo nos círculos de debates. Também não era para menos, uma vez que até o Papa, presente em todas as sessões solenes, vinha tomar café com todo mundo, cumprimentava todos que se aproximavam e até fazia pose para fotos. Ninguém viu seguranças, mas se eles andavam por ali, deviam estar bem disfarçados. Ora, isto contribuiu enormemente para um primeiro milagre do Papa Francisco: em pouco tempo conseguiu derrubar os poderosos de seus tronos. Até Cardeais antes posudos, não admitiam ser chamados de Excelência, nem Eminência. Faziam-se presentes como qualquer mortal e cônscios de que vivemos outro clima de Igreja.

Este clima fraterno propiciou que a dinâmica prevista já desde a consulta popular das célebres 30 questões, e concretizada no “Instrumento de Trabalho”, não só seguia o esquema do escutar, discernir e agir, mas permitiu uma verdadeira participação em todos os momentos. Basta dizer que houve mais de 500 intervenções em plenário e nada menos do que 1.500 propostas de emendas ao texto base. Por incrível que pareça, mesmo após a leitura do texto final, foi aberto espaço para novas intervenções. É bem verdade que no decorrer das plenárias houve algumas intervenções “educadas”, mas que o Papa na fala conclusiva classificou como sendo duras, de quem esteve repetindo a pose dos fariseus, que se assentaram na cátedra de Moisés para colocarem pesos sobre os ombros dos que já sofrem por circunstâncias várias. Mas o fato é que se tratava de observações meio maldosas, mas escondidas por trás de uma pretensa doutrina da Igreja. Também é verdade que, como todo mundo sabe, o parágrafo referente ao acessos de alguns recasados à Eucaristia, na linha ampliada da Familiaris Consortio 84, teve apenas 1 voto as mais do que os dois terços previstos. Mas mesmo assim o Papa deixou claro que o texto deveria ser imediatamente liberado e nem falou em uma possível Exortação posterior. Ademais insistiu na presença do Espírito Santo…. e autorizou a publicação imediata do texto assim como foi aprovado. E então como fica? O bom senso diz que as pessoas em tais condições devem ser acompanhadas e progressivamente integradas na vida da liturgia e da Igreja. Para bom entendedor…

moserOutro ponto que apresentou resistências se refere à questão dos homoafetivos. Claro que a ideologia do gênero, assim como nós a conhecemos, foi pura e simplesmente rejeitada, como também a adoção de filhos por homossexuais que vivem juntos. O objetivo do Sínodo era a família, definida como comunhão de vida e de amor entre um homem e uma mulher, e não fazer uma abordagem direta do complexo problema da homossexualidade. Daí, além de se insistir que não há termo de comparação com o matrimônio, também se pressupõe a não adoção de filhos e filhas por estas pessoas. Entretanto, além de ser voltar a já tanta vezes rejeição de qualquer tipo de discriminação, se insiste que os familiares deverão ser capazes de acolher pessoas com tendência homossexual, como se acolhe qualquer outra pessoa.

No que se refere ao planejamento familiar também se perceberam restrições tanto nas falas quanto Nos votos ao texto que foi lido em plenário. Uns queriam simplesmente que se repetisse a Humanae Vitae tal como foi interpretada, por certos setores da Igreja, quando da sua publicação. O texto final se manifesta mais preocupado com a reprodução assistida em laboratório e naturalmente com procedimentos de cunho abortivo. Novamente se pressupõe que o casal busque formar sua consciência para poder evitar o que se traduz por uma mentalidade contraceptiva. Novamente se percebe que o assunto foi abordado com lucidez e realismo, evitando todo tipo de moralismo.

Outro ponto que deve ser ainda ressaltado é o da sensibilidade para com os problemas de ordem antropológica, econômica, social e política. Como acontece com a Laudato Sí, também este documento sinodal tem tudo a ver com o que há de melhor nos ensinamentos sociais da Igreja, antes denominados de Doutrina Social da Igreja. A Igreja quer participar ativamente da criação de uma família que vai além dos laços de sangue, ao ponto de abrir-se às mais diversas culturas e situações por vezes dramáticas em que vive a humanidade. Por isso mesmo mostra especial sensibilidade para as multidões dos prófugos e imigrantes. Uma igreja peregrina só pode ser uma Igreja que caminha e acolhe a todos que não encontrar lugar para viverem com dignidade.

Afora estes pontos sinalizados, pode-se dizer que os aplausos finais de toda a assembleia mostraram que o texto no seu todo foi muito bem recebido e que conseguiu evitar certas pedras que estavam no caminho. No mais, o Papa Francisco, numa breve conclusão, deixou claro que todos devem acreditar na ação do Espírito Santo e não fechar os corações atirando pedras contra os que se encontram em situações difíceis, seja na vida particular, seja na vida conjugal. Ficou claro para ele e para todos que, escuta, acompanhamento e acolhida misericordiosa, são palavras chaves da missão da Igreja e das famílias, primeiros agentes da evangelização. A nova eclesiologia que se esboça e vai tomando rosto primaveril se conecta com as intuições profundas do Concílio Vaticano II. Essa Igreja, pautada pela pedagogia de Jesus, deverá ser como uma casa que abre suas portas para todos que queiram entrar para ali encontrar irmãos e irmãs. O pluralismo não empobrece, mas enriquece a Igreja, que não mais deve ser auto-referencial, mas aberta ao mundo que vive entre dores e alegrias. Esta deve ser a Igreja da inclusão e não da exclusão. Por tudo isso se vê que uma Igreja do “não” vai dando sempre maior espaço para uma Igreja do “sim” de Maria.