Mudar segundo o Evangelho para mudar o mundo
NOSSO SER HOJE:
Do Evangelho à vida e da vida ao Evangelho
Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM
Faço aqui uma reflexão particular. Não se trata de um texto pedido, de um texto oficial. Senti-me instigado pelo assunto e resolvi colocar por escrito, sem erudição, o que me veio à mente. Estou convencido que será precisar mudar, mudar com toda urgência.
O autor
Em fraternidades, “os irmãos e as irmãs, impulsionados pelo Espírito a atingir a perfeição da caridade no próprio estado secular, são empenhados pela profissão a viver o Evangelho à maneira de São Francisco e mediante esta Regra confirmada pela Igreja” (Regra, 2).
1. “A vida nunca é plenitude nem êxito total. Precisamos aceitar o “inacabado”, o que nos humilha, o que não conseguimos corrigir. O importante é manter o desejo, não ceder ao desalento. Converter-se não é viver sem pecado, mas aprender a viver no perdão, sem orgulho nem tristeza, sem alimentar a insatisfação pelo que devíamos ser e não somos. Assim diz o Senhor no livro de Isaías: “Na conversão e na calma sereis salvos, na tranquilidade e na confiança está a vossa força” (Is 30,15)(José Antonio Pagola). Estamos sempre em estado de mudança e de transformação na busca do ideal. Não se pode parar de mudar.
2. Mudar, transformar, sair da repetição monótona e de caminhos batidos exige coragem e uma coragem que crie o novo. “Se a coragem moral é correção do que está errado, a coragem criativa é a descoberta de novas formas, novos símbolos, novos padrões, segundo os quais uma nova sociedade pode ser construída. Toda profissão pode exigir e exige coragem criativa. Nos nossos dias, a tecnologia e a engenharia, a diplomacia, o comércio, e sem dúvida o magistério, todas esses profissões e dezenas de outras, passam por mudanças radicais e precisam de indivíduos corajosos que valorizem e dirijam essas mudanças. A necessidade de coragem criativa é proporcional ao grau de mudança” (Rollo May).
3. A Ordem Franciscana Secular vai fazendo sua caminhada em todas as partes. Percorre caminhos luminosos e atravessa estradas de sombra. O Conselho Nacional do Brasil, ao longo dos anos, vem desenvolvendo um constante empenho de renovação e de mudanças: uma série de iniciativas no sentido de que os irmãos e as irmãs tenham uma profunda identidade franciscana, que se sintam efetivamente membros desse movimento de espiritualidade evangélica, que tenham, pois, um aguçado senso de pertença, que se façam presentes no mundo de maneira significativa, que revigorem suas fraternidades locais, que sempre voltem ao espírito da Regra. Recentemente andamos nos dedicando ao cumprimento de prioridades que giraram em torno da família, da juventude e da comunicação, sempre em comunhão com a Igreja e o grande mundo. Mais recentemente fomos sendo envolvidos com o tema da “novidade”, de alguma forma influenciados com a figura do Papa Francisco que veio como que retomar o sopro primaveril que vivemos no Concilio do Vaticano II. Em nível nacional e local andamos refletindo sobre Francisco, o homem novo, a novidade do Evangelho, criatividade lá onde hoje há traços de velhice. Continuamos a caminhada com o tema da mudança, consequência e desdobramento naturais do tema do novo.
4. Temos o costume de nos reunir muitas vezes para tomar o pulso da caminhada, de modo particular, por ocasião dos Capítulos eletivos e avaliativos realizados nos diferente níveis. Ali revemos os irmãos, ganhamos novo entusiasmo e realizamos um balanço dos passos dados e pensamos naqueles que ainda estamos ensaiando. Para o Capítulo eletivo de Castanhal, Pará, foi escolhido, pois, o tema da mudança. Queremos refletir sobre o mudar em nós para podermos colaborar na mudança à nossa volta. Sentimos claramente que a luz que esclarecerá nossas reflexões é a que vem do Evangelho. Mas, atenção. Não se trata apenas de referências a passagens do Novo Testamento. O Evangelho não é um texto impresso, mas uma pessoa vida, Jesus Cristo, vivo e ressuscitado, presente no mundo e na Igreja. O Evangelho que norteia a mudança é ele, o Senhor Ressuscitado que faz novas todas as coisas e não nos deixa, com seu Espírito, ficar percorrendo caminhos batidos. Novo e mudança caminham juntos. Somos convidados a fazer esse jogo que pede a Regra: do Evangelho para a vida e da vida para o Evangelho.
5. Falar em carisma franciscano é pensar no Evangelho, na força do Evangelho, tão profundamente redescoberta por Francisco. A convivência com os textos do Novo Testamento certamente é de grande importância, no entanto, é preciso que essa força passe para a vida. Fundamental seria que os discípulos de Jesus pudessem reescrever o evangelho em sua história. Frei Antonin Alis, OFMCap, foi muito feliz em apresentar uma síntese da “mudança” que se operou em Francisco, mudança, conversão, transformação, de amargo para doce. Mudança do homem velho para o homem novo. O frade capuchinho comenta a famosa afirmação de Francisco: É isso que eu quero, isso que busco de todo o coração: “Por seu grito e por seu gesto, Francisco nos convida a levar a sério o Evangelho. Trata-se, antes de tudo, de uma postura de verdade com relação a si mesmo, e levando em consideração o que ele tem na conta de ser a vontade de Deus a seu respeito. O que ele deve fazer é uma evidência que brota do mais profundo de seu ser. Deixando tudo de lado, começa a percorrer um caminho de conversão. Despoja-se exteriormente dos bens, guardando nada mais que o essencial e, aos poucos, vai se despojando de seu orgulho, de sua suficiência e de seu narcisismo. Paulatinamente, e diga-se que isso durou toda a sua vida, entrará no caminho do serviço, do minorismo e da fraternidade, o que fará com que ele abandone todo desejo de poder, de dominação sobre quem quer que seja, imitando assim o Cristo servidor. Progressivamente vai se abrindo à ação do Espírito Santo e sua santa operação, deixando-se transformar a partir do interior. Tal despojamento, resultado da escuta da Palavra, vai acompanhá-lo purificando-o até sua morte, nu sobre a terra nua. Lentamente, a Palavra germina nele e torna-se tão fecunda a ponto de identificá-lo com seu Senhor e Mestre; a mesma Palavra vai se tornando fecunda para os outros, ou seja, para os que escutam Francisco e constatam o trabalho do Espírito nele. Francisco se deixa transformar por inteiro. Passa ser testemunha viva do Evangelho. Tudo leva à alegria, à verdadeira alegria, a alegria perfeita que enche seu ser e faz com que ele transborde em ação de graças” (Évangile Aujourd’hui 205, p. 38). Ora, Francisco reescreve em sua carne o Evangelho. O tema do Capítulo de Castanhal está sintetizado nestas linhas que acabamos de transcrever. Tudo o que segue nesta reflexão é aplicação destas reflexões à prática de todos os dias.
6. Nosso ser hoje... – Aí estão nossas fraternidades franciscanas seculares. Uns nelas ingressaram há muitos anos e outros estão ainda num momento de “namoro”. Uns tiveram boa ou razoável formação. Outros perderam o elã devido a circunstâncias da vida e à formação claudicante. Num determinado momento de sua caminhada seu propósito-promessa-compromisso de seguimento do Evangelho à maneira de Francisco foi acolhido por um Ministro. De onde vêm todos esses nossos irmãos? Eles precisarão se defrontar com o teor do texto-programa que acima transcrevemos, precisarão “encarnar” o carisma. Cada pessoa é um mistério. A história que vamos construindo está colada à nossa pele. Demos passos firmes aqui e ali, outros, cambaleantes. Os que chegam às nossas fraternidades trazem de seu passado, a família que tiveram, dos sucessos e vacilações de suas empreitadas. Há os que chegam depois de “terremotos”: uma doença séria superada, ou não superada; um casamento desfeito que deixou marcas de amargura; um filho morto na guerra do tráfico; desânimos e cálices amargos sorvidos. Chegam para encontrar força e pessoas que as ajudem a viver, a buscar a perfeição da caridade, a serem santas, a saírem de situações existenciais desesperantes. Querem trilhar o caminho do coração que se chama conversão. Desejam que as feridas do passado possam ser cicatrizadas.
7. Há aqueles e aquelas que começaram a experimentar em seus corações uma misteriosa sede, uma insatisfação com os magros e medíocres resultados de suas vidas, uma vida de fé formal, rotineira, sem brilho, caracterizada por uma mesmice sufocante. Querem um espaço de aprofundamento de suas convicções, desejam que suas vidas sejam iluminadas por uma claridade mais densa. Desejam encontrar outras pessoas que fizeram uma boa caminhada no seguimento do Evangelho à maneira de Francisco. Querem viver em Fraternidades franciscanas seculares. Será que estas conseguem responder a seus anelos?
8. Nosso ser hoje...nesse mundo cheio de mudanças e transformações que nos preocupam.
Vivemos num tempo em que tudo tem que ser feito e alcançado rapidamente. Amanhã é tarde demais. O que queremos é para aqui e para agora. Essa rapidez louca não deixa as coisas se assentarem. Não há tempo para o amadurecimento humano e cristão. Nem sempre se vê o alcance de um compromisso a longo termo. Esse querer para já se assemelha às birras das crianças com caprichos e pirraças. Quero, porque quero agora.
A realidade é como um líquido que escorre por entre nossos dedos. Nada parece sólido. Tudo é líquido. Mesmo certas realidades que pareciam sólidas se tornaram líquidas: casamento, amigos, compromisso.
Vivemos num mundo descosturado. Nem sempre ligamos as coisas que fazemos umas às outras. Há muitas ocupações, tempo cheio, estudo à noite, muitas atividades extra-escola e extra-casa. Muitas solicitações. Não há tempo para se confabular em família. Aos domingos será preciso arrumar a casa, preparar-se para os trabalhos escolares ou universitários, distrair-se (afinal de contas ninguém é de ferro). As famílias não vivem as alegrias e a tipicidade do domingo. Os meninos varam a noite de sábado para domingo nas baladas. A vida vai sendo feita de “pedaços”, de “fragmentos” que não se costuram. Será que nossas Fraternidades poderiam ser espaços de reunir fragmentos dispersos e costurar o que anda descosido?
Vivemos um tempo do imanente e da cultura da intranscendência que fixa as pessoas, no aqui e agora. Não há necessidade da Transcendência.
Constituímo-nos pessoas através do relacionamento dos os outros. O jovem de hoje vive possibilidades de comunicação quase que ilimitadas. Vive “antenado”, “plugado”. Mas quase tudo não tem profundidade. Será que conseguimos relacionamentos em profundidade? Há amizades que surgem e que nem sempre são cultivadas. Há os que chegam aos 30 anos sem terem ideias claras de que poderia ser seu parceiro conjugal? Que vinculações profundas o Evangelho nos permite viver?
Fala-se de uma cultura da evasão que afoga a reflexão, que leva a pessoa a ausentar-se de si mesma, relativizando o imperativo da consciência, não avaliando a densidade do compromisso divino ou humano.
Temos ainda a ‘cultura do ter’ que desenvolve o espírito de posse das coisas e as pessoas tornando a própria pessoa incapaz de outra coisa senão seja o desfrutar imediato de tudo e usar coisas e pessoas.
Vivemos um tempo marcado pela curiosidade: saber o que se passa estar informado, mesmo que seja um conhecimento muito pequeno e de pequeno alcance, extremamente superficial. Amanha ocorrerão fatos novos que levarão para o esquecimento o que agora nos ocupa nossa mente com tanto interesse. Tudo passa. O que fica?
Apesar de todos os avanços em todos os campos sentimo-nos vulneráveis: o ataque às Torres Gêmeas, todas as manifestações de terrorismos, aviões não pilotados, um clima de medo generalizado.
No campo interno da Igreja, dois aspectos chamam nossa atenção:
>> Normalmente as famílias católicas continuam batizando seus filhos, orientando-os em vista da comunhão eucarística, da prática da missa dominical. Há muitos católicos que se casam no “religioso”. Os ritos são colocados, mas o coração não acompanha. As pessoas, no dizer do “Documento de Aparecida”, precisam se tornar discípulos missionários. Há um certo ar de indiferentismo que a tudo perpassa.
>> Em muitas paróquias não são buscados caminhos novos. Há uma repetição das mesmas coisas. As coisas são ditas num linguajar desencarnado ou, quem sabe, emocionalmente afetado. Há um retorno a costumes revolutos. Não há espaços para um sólido aprofundamento da fé.
9. Mudar a si mesmo – Tudo começa com a renovação de cada pessoa, de cada irmão, de cada discípulo de Cristo. Mudar a pessoa segundo o Evangelho, examinar sua realidade interior. Ver onde está seu tesouro. Cada pessoa precisa ser responsável por sua formação. As pessoas tomam a decisão de ingressar numa Fraternidade Franciscana Secular porque foram informadas que ali se busca, efetivamente, a santidade. Desejam mudar o coração. Querem aceitar e acolher a graça da vida, tanto o positivo como o negativo, sem murmurações. Constantes exames serão feitos para ver se se está na rota. Firmeza de decisão. Querem seguir bem de perto o Sermão da Montanha (Mateus 5-7). Estão dispostos a sair do centro, não desfilar pelas passarelas que chamam muita atenção, discretamente colocar-se perto dos leprosos da vida, ter um gosto de privar da vida dos mais simples e abandonados. Não se cansam que formular e reformular a questão: “Senhor, o que queres de mim?” Escutando Paulo, unem-se aos sofrimentos de Cristo para que, sendo com ele crucificado, vivam uma vida. Procuram viver no seio de uma Igreja leve, simples, verdadeira. Tudo começa com a mudança de cada pessoa. Os que ingressam na Ordem “conformem o seu modo de pensar e de agir ao de Cristo, mediante uma radical transformação que o próprio Evangelho designa com o nome de conversão” (Regra 7). As reuniões gerais, os dias de recolhimento, as leituras não visam, de modo particular, renovar os irmãos, leva-los a esta transformação radical?
10. Mudar é visitar o seu interior – Este será um empenho pessoal e da fraternidade. Não deixar que os cantos do coração de cada um e da Fraternidade sejam marcados pelo vazio. Dar hospitalidade ao Espírito e tender à maturação espiritual e cristã. Não confiar nas aparências. O ser novo brota da fonte do coração.
11. Mudar a maneira de fazer oração – Tema vasto e amplo. Não se trata apenas de se fazer preces, realizar liturgias, pronunciar fórmulas. Temos que mudar o modo de nos colocar diante do Senhor, pessoal e comunitariamente. Lembrar-se sempre das palavras do Senhor: não basta honrar com os lábios. A oração será sempre boa quando tivermos o Senhor não tanto nos lábios quanto no coração. Quantas e tantas manifestações de oração! Ela será pessoal. Cada um tem que se organizar para estar pessoalmente com o Senhor em alguns densos momentos durante o dia. Procurar fazer com que uma vez por semana se possa fazer um deserto pessoal. As manifestações comunitárias de oração serão bem cuidadas: tempo de silêncio, de recolhimento, de clamar pela presença do Senhor, oração que seja resposta a uma Palavra, salmos pronunciados com unção. As orações públicas e pessoais serão resposta a um Deus que se busca com empenho e nos fala misteriosamente. Será importante, de alguma forma, aprender a santificar algumas horas do dia com a oração. Até que ponto nossos irmãos e irmãs vivem o espírito da Liturgia das Horas? Não esqueçamos uma célebre e tantas vezes repetida admoestação de Karl Rahner: Os cristãos do futuro ou serão místicos, ou não serão nada”.
12. Mudar a maneira de ser viver com os irmãos – Estamos aqui no universo dos relacionamentos. Um dos mais belos e ternos mandamentos do Senhor foi o do amor fraterno. Por vezes nos perguntamos se era necessário uma ordem para amar. Não seria natural que tivéssemos atenções e cuidados com estes e estas com os quais somos filhos do mesmo Pai? A experiência de todos os dias, retratada também nas páginas das Escrituras, nos diz que o homem é lobo do homem. No relato do paraíso, o Senhor pergunta a Caim: Onde está o teu irmão. Num mundo de chacinas, de terrorismo, de lutas, de esquecimento de uns pelos que tudo querem, quando noticiário da manhã nos fala de mortes e mortes entramos em estado de choque. Ora, os franciscanos não se reúnem formalmente com outras pessoas. Parte fundamental de seu carisma é o fraternismo. Nossas fraternidades não se constituem em ninhos quentes, em refúgio dos fracos, mas são um sacramento da fraternidade querida por Cristo. Seus membros se tratam uns aos outros na qualidade de irmãos: são corteses, dão o lugar ao outro, evitam todo comportamento de competição, adivinham as necessidades dos outros, são sinceros de verdade. Procuram exercer-se na paciência quando os relacionamentos se tornam difíceis. Manifestam uns aos outros suas necessidades. Em hipótese alguma comentam defeitos dos irmãos e sempre acreditam que o ser humano é maior do que seu pecado. Rezam juntos, traçam estratégias juntos, juntos cuidam dos doentes. Sua oração comum é marcada pela união de pessoas pobres, despojadas, em caminho de conversão. Estão sempre dispostos em serem mensageiros da fraternidade no mundo, na vizinhança, na paróquia. O grande ( diria quase único) testemunho que os irmãos podem e devem dar é o do amor fraterno. Todos deveriam poder dizer dos franciscanos seculares: “Vede como eles se amam”. É sempre necessário mudar nosso modo de ver o irmão, sem nos esquecer que o perdão ao outro é prova de que queremos parecer com aquele que disse: “Pai, perdoai porque não sabem que fazem”. Um dos momentos de manifestação do amor fraterno mais significativo é aquele que os irmãos aceitam funções e cargos no seio dos conselhos para que a fraternidade seja assistida, fortalecida e robustecida. O amanhã de nossas fraternidades passa pela caridade dos irmãos, pelo amor, pelos irmãos individualmente e em grupo Mudar o modo de ver a fraternidade significa também um empenho dos irmãos em criarem, onde puderem espaços de manifestação do bem-querer, grupos de reflexão e de oração marcados pelo amor, empenho de que os irmãos sejam embaixadores da reconciliação nas querelas familiares, nas divergências paroquiais no engajamento em todas as inciativas em prol dos seres humanos mais abandonados. Já dissemos e repetimos: nossas fraternidades não se constituem em ninhos quentes, protegidos. No campo da vida fraterna e em nosso modo de olhar o irmão será preciso mudar e mudar. Será que nossos conselhos vivem um fraternismo ou são apenas instâncias?
13. Mudar a maneira de realizar nossos encontros – Temos como ponto de honra de nossa vida franciscana participar com o corpo e coração da reunião geral, espaço de escuta da Palavra, de revisão de vida, lugar de interesse carinhoso de uns pelos outros. Há anos estamos insistindo na necessidade de mudar nossas reuniões. A reunião geral será sempre um acontecimento humano e espiritual cheio de densidade. Se não for assim a vocação fenece. Não basta apenas a reunião formal. O bom sendo, o discernimento haverão de detectar a necessidade de uma formação extra, de um encontro de todos com os enfermos que ainda se locomovem, a participação da fraternidade em outros encontros. Nossos encontros não podem ser pesados e cansativos. Ninguém pode ficar alheio. Não se haverá de escolher o momento mais pesado do dia para a reunião, mas aquelas horas do dia em que todos estão realmente despertos Mudar nosso ser para mudar o mundo. Cada fraternidade tem o dever e o direito de criar modalidades de encontro, sempre respeitando o essencial, que sejam densos, suculentos e proveitosos para todos os irmãos. A rotina anda matando fraternidades. A comemoração dos aniversariantes e outros eventos não podem ser resumir ao canto do “parabéns” e uma mensagem colocada num envelope. Isso é muito pouco. “Os pagãos também fazem assim”.
14. Mudar a mentalidade com a qual participamos dos Conselhos – Os irmãos escolhidos para cuidar da fraternidade haverão de fazê-lo com competência, responsabilidade e disponibilidades como ensinam nossos documentos. Importante que saibam e tenham consciência de que não são meros funcionários e administradores, mas irmãos colocados em estado de vigília pelo bem da fraternidade e das pessoas. O ministro saberá dinamizar e valorizar a reunião do Conselho. Notável quando os membros do Conselho, de quando em vez, passam uns momentos diante do Santíssimo ou quando participam juntos de uma Eucaristia suplicando as luzes do alto. Mudar a mentalidade daqueles que fazem parte do Conselho começa sempre com a conversão pessoal.
15. Mudar nosso modo de ver a natureza e os bens da criação – Partimos sempre dessa intuição privilegiada da criação vivida por Francisco. Olhar com carinho e preservar com pertinácia tudo o que o Senhor colocou no jardim do mundo e entregou aos nossos cuidados. O mundo é de todos e seus recursos são finitos. Olharmos para os bens da natureza não com desejo de possuí-los e, para tanto, desfigurando a criação : respeito pela criação, preservar os recursos naturais que nos permitem viver, não destruir a natureza pela vontade de construir, de ganhar dinheiro. Unimo-nos a todos os homens e mulheres de boa vontade para preservar o dom da natureza.
Conclusão
Muitas “mudanças” deveriam ainda ser elencadas, entre outras, mudar a maneira de se fazer pastoral e evangelização. Nada de darmos uma colaboração de mera conservação. O conservadorismo em matéria de pastoral é pecado contra o Espírito que quer o novo. Os franciscanos que vão pelo mundo criam uma maneira nova de se fazer de catequese, de encontrar os que não nos frequentam, de animar círculos bíblicos.
Ao termo destas reflexões temos a certeza de que muito foi dito e muito deixou de ser dito. Nossas fraternidades concretas haverão de completar o tema. Criar o novo é dar vida. Não se cria o novo como um capricho. Via de regra as mudanças sólidas são aquelas propostas por pessoas que se comprometem. Francisco foi essa pessoa da mudança traduzida em fatos.
Frei José Antonio Merino, frade menor espanhol, num texto publicado na revista Vida Nueva 2663 (12 de junho de 2009), escrevia: “Com um olhar realista e a sensibilidade de Francisco, as situações mais urgentes que os franciscanos e franciscanas precisam enfrentar em nosso tempo são as seguintes:
- Retorno a um evangelho mais puro e sem amenizações, quer dizer, vivenciar a mensagem de Jesus Cristo com audácia e alegria.
- Estabelecer um diálogo entre ateísmo e religião na perspectiva franciscana.
- Oferecer pressupostos culturais para a justiça e paz sociais.
- Relançar uma cultura e uma mística ecológicas.
- Promover valores humanos que leve à ética da frugalidade.
(…)
O franciscanismo é sempre inaugural, porque está aberto à força do Espírito que se manifesta de modo inacabado no aqui e no agora, porque o hoje é o ainda não”.
Questões:
1. O que se quer dizer, quando na formulação do tema, se diz “nosso ser hoje”?
2. Quais os campos sobre os quais deve incidir a conversão? Mas o que é conversão?
3. Quais as principais mudanças a serem operadas na vida concreta da OFS?
4. O que gostariam ainda de chamar atenção no tema acima desenvolvido?