Carisma Franciscano – IV
Enamoramento por Cristo Jesus
Francisco enamorou-se da pessoa de Jesus. Um tal enamoramento pertence ao cerne da espiritualidade franciscana. Os biógrafos nos fazem entender que Francisco desejava apreender e traduzir o segredo desse personagem que tomou inteiramente conta dele. A essência do cristianismo, sabemo-lo, não é uma doutrina teológica, nem uma filosofia, nem um sistema moral, nem um dinamismo revolucionário. Sua essência é uma pessoa, a pessoa de Jesus. Aquilo que é decisivo para que alguém seja cristão é sua relação com Jesus. Só na medida em que a pessoa vai se enamorando de Cristo, se vai tornando verdadeiramente cristã.
Diante da pessoa de Cristo a atitude de Francisco é toda do amor. Não e de curiosidade, nem de temor. Quando depois da proeza de beijar o leproso, Cristo lhe aparece na capelinha de São Damião, crucificado, mendigo, pedindo-lhe ajuda, alma de Francisco fica verdadeiramente e para sempre “colada” à pessoa de Jesus. Toda sua vida é um processo de enamoramento.
Nesta altura de nossa reflexão cabe a transcrição do famoso e tantas vezes citado texto de Celano: “Os irmãos que com Francisco viveram sabem bem como a toda hora aflorava aos lábios a recordação de Jesus e com que enlevo e ternura sobre discorria. Da abundância do coração falava a boca e a fonte do amor iluminado que por dentro o enchia extravasava aos borbotões. Que intimidades as suas com Jesus, Trazia Jesus no coração, Jesus nos lábios, Jesus nos ouvidos, Jesus nos olhos, Jesus nas mãos, Jesus presente sempre em todos os seus membros” (1Celano 115).
Legenda Maior de Boaventura: “Consagrava a Cristo um amor tão vivo, e o Bem Amado, em troca, mostrava para com ele uma ternura tão familiar, que o servo de Deus parecia sentir fisicamente diante dos olhos a presença continua do Salvador, como por várias vezes confidenciou a companheiros” (Legenda Maior 9, 2).
Encarnação, Paixão e Eucaristia são mistérios que encantam o Poverello. Aquilo que enche a alma de Francisco é o espanto perante a humildade de Deus, pelo amor que se fez humilde até se esconder num bocado de pão, que se entregou de tal maneira que se fez comida para o homem. No presépio eram os membros frágeis e ternos de uma criancinha; no Calvário, os tormentos de um Crucificado; na Eucaristia, umas pobres migalhas de pão. Por detrás deles ele vê a inesperada Loucura de Amor. Os mistérios cristãos são, pois, na maneira de sentir de Francisco, iniciativas de amor da parte de Deus, antes que seja qualquer outra coisa. Há que sublinhar duas palavras: iniciativa e amor. Em todo o mistério da criação e em toda a história da salvação, tanto na humanidade em geral como na de cada indivíduo em particular, o que está em primeiro lugar é a iniciativa de Deus.
Na pregação, na catequese, na formação dos jovens frades, na teologia será necessário encontrar métodos que visem despertar e alimentar o encanto por Jesus. Será necessário privilegiar as doutrinas, os acontecimentos e as cenas evangélicas capazes de porem o coração a vibrar.
Inspirado em “S. Francisco. Fé e Vida”, Ed. Franciscana, Braga, p.27-30
Texto seleto
Sonho com uma vida franciscana mais contemplativa, na qual nos movamos com paixão, abertos ao sopro do Espírito. Uma vida enraizada no encontro encantador e entusiasmado com Jesus Cristo, que nos chama a segui-lo com todo o coração, o tempo inteiro e a pleno risco. Sonho com uma vida franciscana que se converta em grito profético do Absoluto de Deus, num mundo onde se multiplicam os ídolos e a fé se dilui ou tergiversa.
José Rodriguez Carballo, OFM
Frei Almir Guimarães