Mediações humanas para crescer em fraternidade
Um dos documentos mais bem elaborados e mais “pé no chão” produzidos pelos responsáveis internacionais pela formação dos Frades Menores foi um subsídio para a formação permanente sobre o capítulo 3º das Constituições Gerais, que levou o título de “Todos vós sois irmãos”, publicado em 2004. O texto não perdeu sua atualidade. Aqui são feitas observações acertadas para levar os frades a uma autêntica maturidade. Tempo de capítulo. Tempo de balanços. Como crescer como gente e nos relacionamentos?
Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM
a) Chegar a ser homens
>>“Mesmo antes de chegar a ser homens, queremos ser semelhantes a Deus (Adversus Haereses, IV, 328, 4).
>> Esta frase que Santo Irineu dirigiu aos gnósticos de seu tempo (sec. III), pode muito bem servir-nos para falar das mediações humanas da vida comunitária.
>> Para chegarmos a ser homens é necessário adquirir uma série de convicções e aptidões.
>> Aceitar-se e amar-se na própria humanidade pessoal, no próprio corpo; desenvolver em si mesmo as dimensões masculinas e femininas que fazem parte de nosso ser. Em cada pessoa deve ser integrado o aspecto masculino e feminino: o animus (o espírito, a inteligência) e a anima (aberta ao mistério) devem integrar-se e conviver unidos.
>> Aprender a ser autônomos, independentes, capazes de viver e decidir sozinhos, nem necessidade de recorrer continuamente à aprovação e à opinião dos outros. Sobre esta autonomia baseia-se a capacidade de aceitar os próprios limites e os limites dos outros, de saber suportar em silêncio as inevitáveis carências e frustrações da vida.
>> A responsabilidade, a consciência do dever, a fidelidade a si mesmo e, sobretudo, a acolhida aos outros e ser aberto a eles, a possibilidade de viver e programar com eles um humano e evangélico projeto de vida, são outros tantos sinais de verdadeira humanidade que todos devemos buscar.
>> Abertura ao mundo em que vivemos e que é o lugar onde se constrói o nosso eu. O mundo, do qual não devemos fugir, que não devemos adular nem maldizer, mas, ao contrário, conhecer, amar, usar com discernimento em toda a sua complexidade cultural, científica, social, política, etc. Chegar a ser homens hoje, significa levar em conta o nosso mundo em toda a sua complexidade.
>>Domínio do relacionamento: chega-se a ser eu, pronunciando o tu. Progredimos na caminhada para a maturidade humana quando nos abrimos ao encontro com o outro. O homem maduro é aquele que sabe abrir-se ao outro e sabe aceitá-lo em sua diferença. O outro é o próximo, o homem, mas também, sem dúvida e em primeiro lugar, o Absoluto, Deus.
b) Aceitação do outro
>> O que é a aceitação do outro?
>> receber amorosamente a pessoa na sua singularidade única;
>> disponibilidade para valorizar seu modo de agir, seus sentimentos e intenções;
>>capacidade de perceber o que o outro sente na originalidade de seu mundo interior;
> >confiar na capacidade de crescimento da pessoa.
O que não é aceitação do outro?
>> concordar sempre com o modo de agir do outro;
>> justificar e aprovar sempre sua conduta;
>> estudar a pessoa à distância;
>> ter uma curiosidade excessivamente ávida da intimidade do outro;
>> ter uma atitude prevalentemente crítica;
>> julgar o outro segundo os próprios esquemas mentais e afetivos;
>>evitar o conflito ocultando os sentimentos negativos.
Como se facilita a aceitação do outro?
>> sendo autêntico e franco, porém, não a qualquer preço, mas calculando o que o outro pode assimilar;
>> reforçando os sentimentos positivos;
>> dando sinais de querer aproximar-se do outro;
>> mostrando interesse pelo outro;
>> sendo paciente na escuta;
>> sendo testemunha da esperança:
>>interessando-se pelas coisas do outro, especialmente por seus sentimentos.
O que dificulta a aceitação do outro?
>> :quando o julgamos somente em função de suas qualidades, eficiência e conduta edificante;
>> quando existe uma tendência excessivamente valorativa;
>> quando se tem pouca confiança no outro;
>> quando há desconhecimento do outro.
Fatores que estimulam a vida comunitária
>> encontrar espaços para se expressar livremente;
>> ambiente de certo calor afetivo;
>> indicar a cada pessoa tarefa e encargos significativos e adequados à sua competência, dando espaço à sua criatividade;
>> alimentar sem cessar um ideal generosamente vivo.
c) Clima comunitário
>> Para o frades chegarem à maturidade, nada se mostrou mais eficaz do que bom clima comunitário.
>> Entre outras coisas, um bom clima comunitário inclui:
>> um ambiente agradável e de mútua acolhida;
>> ausência de murmuração e crítica ao grupo fora da grupo;
>> alegria pelo encontro com os irmãos e sua presença;
>> disponibilidade à colaboração;
>> agilidade em compreender e desculpar o irmão;
>>suficiente nível de comunicação e de sentimentos;
>> relacionamento com certa intensidade entre os irmãos;
>> generosidade para o perdão mútuo;
>> cultivo da “mística grupal”.
Pequena frase conclusiva
Não é verdade que quem mais nos amou foi quem mais nos ajudou na vida? Ajudar no mútuo crescimento humano supõe a aceitação mútua, que nos leva a um amor simples, mas real, que nos liberta de nossas prisões e das imaturidades que nos danificam por dentro.
“Todos vós sois irmãos”, Subsídio para a formação permanente, Sobre o capítulo 3º das Constituições Gerais, Roma 2004, p. 69-73