“Que te fiz eu?”
Quando contemplamos a paixão de Jesus, lembramo-nos sempre do cântico da sexta-feira das dores em que o poeta coloca nos lábios de Jesus um dolente lamento: “Povo meu, dize em que te contristei?”
“Hoje sou vivo e ressuscitado. O mal não me atinge. Devo dizer que sempre estiveste em meu pensamento. Morri de amor para que tua vida fosse plenitude e ventura. Com pouco meses de tua existência passei a viver contigo. Pelo Batismo passaste a viver de minha vida, vida que veio do seio da Trindade e te ofereci na tarde das dores e na manhã da ressurreição.
Quando folheias as páginas das Escrituras tento falar ao teu coração. Muitas vezes quis que ouvisses a verdade de meus apelos e a veemência de meus pedidos. Quando te desviavas do caminho da vida e te mostravas arrependido, sempre estive pronto a te acolher, a ter dar o abraço do perdão.
Costumo te visitar por meio de meus enviados e embaixadores. Nem sempre prestas atenção às minhas visitas. Pena. Muitas vezes permiti que contradições e contrariedades tomassem conta de teu espírito. Pensei que talvez fosses acordar deste estado de tibieza e de torpor. Muitas vezes recusaste de me entregar o teu interior. Sempre disseste e continuas dizendo que tens muitas tarefas a realizar. Confesso que nesses momentos sinto ciúmes. Colocas teu coração na realização de tantas metas e para mim resta o que sobra. Divides teu coração. És meu sem seres meu.
Não forço tua liberdade, mas coloco-me diante de ti, postado ao teu lado como um vigia, como um soldado, como um sentinela, como o esposo que espera a esposa. Nunca te faltei.
Olha e contempla uma vez mais, até que ponto fui capaz de te amar. Vê a palidez de meu rosto, esses braços pregado ao madeiro, minha boca sem vida no alto da cruz. Que mais eu poderia ter feito? Dize em que te contristei? Por que tão pouco caso?”
Frei Almir Ribeiro Guimarães