Vida Cristã - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

Os desafios da cidade no século XXI – Final

18/12/2019

 

                                                                                                                   Imagem ilustrativa (fonte: Canva)

COMBLIN, José. Os desafios da cidade no século XXI. São Paulo: Paulus, 2002. 51 p.

Pe. Ademir Guedes Azevedo, cp

Na segunda parte da obra, o autor desenvolve o tema dos Desafios da Igreja na cidade atual. Recorda que o modelo de cristandade dominou a vida eclesial durante muitos séculos. Seu método era impositivo. Misturou o Evangelho com as várias tradições religiosas e culturais existentes. Exemplo clássico foram os monges enviados à Inglaterra, pelo Papa São Gregório. Trocaram as imagens dos deuses pagãos por imagens dos santos católicos. Os povos foram obrigados a prestar culto aos santos católicos se adaptarem a nova liturgia imposta pelos monges. Mas em tal modelo, o Evangelho não sobressaia, pois a adesão era pela força, não pela experiência pessoal com Jesus.

Diante disso, o autor entende que no momento atual reside forte sentimento religioso nos sujeitos. Porém, predomina uma nova religião que compete com o catolicismo oficial. Tal religião, plasmada a partir dos efeitos da cultura pós-moderna, possui o bem-estar como deus absoluto. As pessoas, para entrarem em comunhão com este deus, praticam rituais de cuidado com o corpo, técnicas de meditação que fornecem uma sensação de interação com todo o cosmo. O espírito não é importante, pois a felicidade que o deus da cultura atual transmite é sempre pela via material. Priorizam-se as férias, passeios, contato com a natureza. O compromisso com o Evangelho e suas causas não atrai porque este é exigente e, para muitos, acaba sendo um peso. O individualismo cresce à medida que cada pessoa se sente livre para cuidar de si mesma e desfrutar das oportunidades do sistema que rege a economia.

Outro fator deste contexto é o marketing, o qual incentiva de todas as formas o direito a adquirir aquilo que se produz. O pentecostalismo se utilizou desta ciência de propaganda para convencer e aglomerar pessoas em torno dos produtos divulgados pelas igrejas dessa corrente, tais como saúde, emprego, bens materiais, etc. Pagando e cumprindo com os rituais, acredita-se que uma vida próspera nascerá. Comblin pensa que o modelo neopentecostal substituiu o regime de cristandade, pois este se impunha pela força e poder, enquanto que o regime atual da cultura pós-moderna conquista pela propaganda e persuasão, considerando os produtos da fé que são oferecidos livremente. Basta apenas o crente comprar e acreditar. E isso é feito em total liberdade.

Por fim, o autor indica algumas proposições de como se pode viver o Evangelho na cultura atual. Para ele, as religiões atuais que se pautam no marketing e na aquisição do bem-estar, se distanciaram radicalmente do Evangelho. A Igreja Católica, para evidenciar o compromisso evangélico deveria assumir uma vida alternativa, sem nenhum compromisso incondicional com as práticas de consumo da nova cultura.

Se o Evangelho não compactua com as novas formas de religião, então há que se formar pequenas comunidades no mundo urbano que priorizem a fraternidade e uma vida de unidade. Como os sujeitos das cidades tendem a unir-se em pequenas comunidades afins, então é para elas que se deve voltar a atenção da Igreja.

O modelo de paróquia é homogêneo, pois usa um discurso para multidões, mas as comunidades são plurais porque se unem por afinidades, por isso é urgente uma pedagogia que possa transmitir o Evangelho em linguagem moderna. Cada vez mais se constata a vivência da fé em pequenas comunidades porque é nelas que as pessoas podem ser ouvidas, compartilham seus problemas e há espaço para exporem suas experiências. Nas grandes Igrejas, típicas do modelo paroquial, isso já não é possível, uma vez que as liturgias são homogêneas e não dão espaço para as partilhas individuais. Por isso “[…] em lugar da paróquia, o centro da vida cristã será a pequena comunidade: lugar da iniciação, da formação, dos sacramentos, da educação do discernimento moral, da preparação para o agir dentro da sociedade. A paróquia sobreviverá até que desapareçam os últimos representantes da antiga cristandade” (COMBLIN, 2002, p. 48).

Esta obra teológica de Comblin pode ser considerada um instrumento de confronto entre a Igreja e os dramas da cidade atual. Da mesma forma, nos provoca a buscarmos novas alternativas de anúncio do Evangelho nas várias formas de cultura de hoje. Como o homem do pós-moderno ainda cultiva o sentimento religioso, representado na constante busca de sentido, o Evangelho é a chave que abre a vida para um horizonte mais profundo.

LEIA A PRIMEIRA PARTE DESTE ARTIGO


Pe. Ademir Guedes Azevedo, cpé missionário passionista e mestre  em Teologia Fundamental na Pontifícia Universidade Gregoriana. Atualmente colabora com a missão passionista de Montevidéu, no Uruguai.

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