18 de outubro – Festa de São Lucas evangelista
– Aos Ministros provinciais, aos Custódios e aos Presidentes das Fundações
– A todos os Frades da Ordem dos Frades Menores
Caros Irmãos, o Senhor lhes dê a paz!
No dia 14 de novembro próximo, se celebra a V Jornada Mundial dos Pobres, e exatamente dois dias antes, sexta-feira, 12 de novembro, o Papa Francisco será peregrino na Porciúncula, na Basílica de Santa Maria dos Anjos, para encontrar 500 pobres provenientes de diversas partes da Europa, para escutá-los e dialogar com eles. O Senhor Papa dá-nos ainda testemunho de um gesto muito eloquente.
Estarei presente com outros irmãos neste momento. Estarei lá em nome de todos vocês.
Recebida a notícia desta visita, juntamente com uma grande alegria, senti por todos nós, frades, a forte provocação de um gesto que será realizado exatamente no lugar onde todos nós nascemos.
O Papa não se limita a escrever uma mensagem, mas encontra a carne, o próprio corpo dos pobres, que é sacramento de Cristo, que por nosso amor se fez pobre e quis identificar-se com eles.
Na memória, voltei às palavras de São João XXIII, terciário franciscano, que um mês antes da abertura do Concílio, disse com espírito profético:
A Igreja apresenta-se como ela é e quer ser, como Igreja de todos, particularmente a Igreja dos pobres.
(Radiomensagem aos fiéis de todo o mundo, 11 de setembro de 1962)
Esta consciência da Igreja de cada tempo encontra uma testemunha extraordinária em São Francisco, como nos recordou o Papa em sua Mensagem ao nosso recente Capítulo Geral:
Renovar a própria visão: é isto que aconteceu ao jovem Francisco de Assis. Ele próprio o atesta, contando a experiência que, no seu Testamento, ele coloca no início da própria conversão: o encontro com os leprosos, quando “aquilo que era amargo se lhe transformou em doçura de alma e de corpo” (Test 1-4). Na raiz da vossa espiritualidade está este encontro com os últimos e com os sofredores, no sinal do “fazer misericórdia”. Deus tocou o coração de Francisco através da misericórdia oferecida ao irmão e continua a tocar os nossos corações através do encontro com os outros, sobretudo com as pessoas mais necessitadas. A renovação da nossa visão só pode partir de novo deste olhar novo com o qual contemplar o irmão pobre e marginalizado, sinal, quase sacramento da presença de Deus. Deste olhar renovado, desta experiência concreta de encontro com o próximo e com as suas chagas pode nascer uma renovada energia para olhar para o futuro como irmãos e como menores, como vocês são, segundo o belo nome de “frades menores” que São Francisco escolheu para si e para vocês.
Pergunto-me, na escuta da minha consciência e da voz do Senhor, o que faço com cada um de vocês:
– Até que ponto sou consciente de que o encontro com os pobres está no coração da minha vida de frade menor nos passos de Jesus, “Ele que era rico acima de todas as coisa e quis neste mundo, juntamente com a beatíssima Virgem, escolher a pobreza” (2Fi 5)?
– Quantos momentos e ocasiões de encontro, de partilha tive com pobres concretos? Sinto que isto me “perturbou” e recolocou no caminho? Ou não?
– Muitas vezes não me defendo, pensando que esta seja uma dimensão muito social e pouco religiosa? Mas, segundo a palavra dos profetas nas Escrituras, os pobres não são talvez o espelho no qual vemos se ainda somos crentes? Deus os amou e quis que o seu Filho fosse um deles. O mesmo vale para os apóstolos e para tantos amigos do Senhor ao longo da história, não últimos São Francisco e Santa Clara e Santa Isabel. Poderá o encontro com o rosto real de alguns pobres e sofredores concretos, com o odor, com a sua presença muitas vezes desagradável, com as perguntas que nos fazem, poderá finalmente mover-nos e comover-nos? Induzir-nos à conversão? Fazer-nos sair das nossas tocas, frequentemente muito cômodas?
Por isso, como ministro e servo de vocês e em comunhão com o Definitório geral, por meio desta carta, amadureci na oração a ideia de pedir a todos os Frades da Ordem e às diversas fraternidades do mundo que se realize no mês de novembro pelo menos um momento concreto de encontro com os pobres. Não sozinhos, mas como fraternidade, ao menos dois a dois (cf. Lc 10, 1), para buscar um simples encontro de presença, proximidade e serviço com algum deles, para bater à porta deles, como escreveu o Santo Padre na sua Mensagem para esta V Jornada. Ouçamo-lo:
Não podemos esperar que os pobres batam aa nossa porta, é urgente que os alcancemos nas suas casas, nos hospitais e nas residências de assistência, pelas estradas e nos cantos escuros onde às vezes se escondem, nos centros de refúgio e de acolhimento… É importante compreender como se sentem, o que experimentam e quais desejos eles têm no coração. Fazemos nossas as palavras de Dom Primo Mazzolari: “Eu gostaria de pedir-vos para não perguntar se há pobres, quem são e quantos são, porque temo que semelhantes perguntas representem uma distração ou o pretexto para escapar de uma precisa indicação da consciência e do coração. […] Eu nunca contei os pobres, porque não se podem contar: os pobres se abraçam, não se contam” (“Adesso” n. 7 – 15 de abril de 1949). Os pobres estão no nosso meio. Como seria evangélico se pudéssemos dizer com toda a verdade: também nós somos pobres, porque só assim conseguiremos reconhecê-los realmente e fazer com que eles se tornem parte de nossa vida e instrumento de salvação.
No Capítulo geral, nós nos interrogamos de novo sobre a nossa identidade e a reconhecemos na fraternidade e na minoridade. Podemos discutir longamente e encontrar-nos sempre no mesmo ponto.
Estou e estamos felizes pela presença do Santo Padre na Porciúncula: certamente é uma honra àquele lugar e a todos nós e, ao mesmo tempo, nos impulsiona a sair de nós mesmos e das nossas casas e atividades ordinárias ao encontro dos pobres, e descobrir que a nossa identidade está ali, nos espera, nos dá nova luz, é possível vivê-la hoje com alegria, também no meio das fadigas.
Creio que a todos nós é possível um passo do gênero: aos ministros e a todos os irmãos, aos jovens como aos anciãos, aos frades empenhados na pastoral como aos que estudam, aos noviços e candidatos à vida franciscana como aos seus formadores, aos evangelizadores como aos missionários, a todos os que se sentem firmes na vocação e aos que se fazem tantas perguntas e talvez olhem além.
Isto, porque encontrar os pobres não é uma atividade nem uma ideologia? É uma porta de misericórdia, sempre aberta. Escolhamos atravessá-la juntos, e creio que virá ao nosso encontro uma grande surpresa do Espírito, um importante novo início na nossa vida evangélica. Não importa quão santos ou pecadores sejamos: os pobres acolhem aquele pobre que está em cada um de nós, reconhecem-no e, se nos aproximar-nos deles sem arrogância ou temor, nos ajudam, são eles a fazernos caminhar e a sustentar-nos.
Se o Papa Francisco sonha com uma Igreja dos pobres, eu sonho que na nossa Fraternidade universal saibamos redescobrir e deixar-nos encontrar pelo rosto dos pequenos e dos pobres, com os seus nomes e condições diversas. Creio que, deste encontro vivido a partir de dentro de nossa vocação, nós, frades, receberemos a graça e ainda poderemos escolher de novo tornar-nos novamente pobres, revendo a nossa relação com as coisas, com o dinheiro, com o poder e com os afetos. Deus sabe quanto precisamos disso, para não extinguir-nos em uma vida muito cômoda e garantida, tão distante da condição dos pobres, de modo a não fazer-nos mais sentir a sede de Cristo e de uma humanidade viva e genuína, capaz de gastar-se.
“Os pobres são nossos mestres” (CCGG 93,§ 1): deixemo-nos evangelizar por eles O Senhor espera-nos junto deles e está pronto a presentear-nos com grandes surpresas. Deixemos com que ele o faça, irmãos amados no Senhor, não oponhamos resistência a este desejo, a este sopro do carisma que o Espírito ainda suscita com uma força que nós, sozinhos, não sabemos encontrar. Peço e pedimos a todos por isto.
Peço-lhes em nome de São Francisco: façamos esse passo em direção aos pobres no mês de novembro e ficaremos surpresos! O Senhor precede-nos e espera-nos neste caminho: escolhamos um gesto, andemos a uma casa, a um abrigo, uma enfermaria dos frades doentes, um cárcere, um hospital, um centro de migrantes, uma periferia, uma comunidade de acolhimento e tantos lugares ainda, para visitar Cristo nos seus vigários, os pobres. E deixar-nos encontrar por ele, que quer ainda atrair e acender a nossa vida.
De boa vontade receberei, de quem de vocês que o quiser, uma restituição, um pequeno relato deste encontro com alguns pobres, sobre como isso manteve viva a chama da fé e da vocação: poderemos começar a narrar e escrever o traço da vida franciscana que nos é dado e pedido para este nosso tempo, de modo a poder transmiti-lo, com a vida e com a palavra, à próxima geração.
O Senhor nos abençoe, e São Francisco sustente, neste tempo abençoado e difícil, o nosso desejo de uma nova partida na vocação como irmãos, menores e pobres, à busca do rosto do Senhor nas estradas dos homens e das mulheres de hoje, capazes de encontro e de testemunho.
Abraço-os com grande afeto e fraternidade
seu ministro e servo