Papa: Os migrantes são o símbolo de todos os descartados da sociedade globalizada
08/07/2019
Cidade do Vaticano – “Os migrantes são hoje o símbolo de todos os descartados da sociedade globalizada”. Palavras do Papa Francisco ao presidir na manhã desta segunda-feira (08/07), na Basílica Vaticana, à celebração eucarística para recordar os seis anos de sua visita a Lampedusa.
A ilha ao sul da Itália foi a meta, exatamente em 8 de julho de 2013, da primeira viagem do Pontífice. Naquele ano, os desembarques de migrantes eram quase diários. Meses depois, em 3 de outubro, ocorreria a maior tragédia registrada nas imediações: num naufrágio de uma embarcação líbica, perderam a vida 368 pessoas.
“Penso nos últimos”
“Não se trata apenas de migrantes, mas de pessoas humanas”, reforçou hoje o Papa em sua homilia na missa celebrada para um restrito grupo de pessoas, cerca de 250, convidadas pelo Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral. A iniciativa do Papa é sem precedentes no Vaticano. Como se sabe, o Papa reservou o direito de presidir diretamente esta seção da Cúria Romana (outro evento sem precedentes). Mas a coisa extraordinária que deve ser imediatamente ressaltada é que a Missa presidida por Francisco aconteu em São Pedro, no Altar da Cátedra, o Altar central da Basílica construída sobre a Tumba daquele que foi escolhido pelo próprio Cristo como “pedra” sobre a qual edificar a sua igreja.
Neste sexto aniversário da visita a Lampedusa, disse Francisco, “penso nos ‘últimos’ que diariamente clamam ao Senhor, pedindo para ser libertados dos males que os afligem”.
“São os últimos enganados e abandonados a morrer no deserto; são os últimos torturados, abusados e violentados nos campos de detenção; são os últimos que desafiam as ondas de um mar impiedoso; são os últimos deixados em acampamentos de acolhimento”.
Estes são apenas alguns dos últimos que Jesus nos pede para amar e levantar. Infelizmente, prosseguiu o Papa, as periferias existenciais das cidades estão densamente povoadas de pessoas que foram descartadas, marginalizadas, oprimidas, discriminadas, abusadas, exploradas, abandonadas, de pessoas pobres e sofredoras.
Pessoas, não apenas migrantes
No espírito das Bem-aventuranças, portanto, somos chamados a acudir misericordiosamente às suas aflições; saciar a sua fome e sede de justiça; fazer-lhes sentir a solícita paternidade de Deus.
“São pessoas; não se trata apenas de questões sociais ou migratórias! ‘Não se trata apenas de migrantes!’”, repetiu Francisco, que é o tema do 105º Dia Mundial do Migrante e do Refugiado (DMMR), que será celebrado em 29 de setembro próximo. “Os migrantes são, antes de mais nada, pessoas humanas e que, hoje, são o símbolo de todos os descartados da sociedade globalizada.”
Neste contexto, o Papa propôs a imagem da escada de Jacob, proposta na primeira leitura da liturgia de hoje.
Em Jesus Cristo, explicou, está assegurada e é acessível a todos a ligação entre a terra e o Céu. Mas subir os degraus desta escada requer empenho, esforço e graça. Os mais frágeis e vulneráveis devem ser ajudados.
“Apraz-me pensar que poderíamos ser, nós, aqueles anjos que sobem e descem, pegando ao colo os pequenos, os coxos, os doentes, os excluídos: os últimos, que caso contrário ficariam para trás e veriam apenas as misérias da terra, sem vislumbrar já desde agora algum clarão do Céu.”
Trata-se de uma grande responsabilidade, da qual ninguém se pode eximir, advertiu o Pontífice.
O Papa concluiu sua homilia agradecendo aos migrantes que, mesmo recém-chegados à Itália, já ajudam os “irmãos e irmãs” que chegaram depois. “Quero agradecer-lhes por este estupendo sinal de humanidade, gratidão e solidariedade.”
SEIS ANOS DA VIAGEM A LAMPEDUSA
O Papa Francisco escolheu Lampedusa para a primeira viagem apostólica do seu Pontificado e a primeira de um Papa à ilha italiana do Mediterrâneo, ponto de passagem para milhares de imigrantes que tentam chegar à Europa.
O Sumo Pontífice quis manter a sobriedade dos atos para “chorar os mortos” dos naufrágios de embarcações que transportam imigrantes do Médio Oriente e Norte de África – os mortos que ninguém chora, disse. E para tal, fez-se acompanhar apenas dos seus secretários particulares, dos seus guarda-costas e do porta-voz do Vaticano Federico Lombardi, e sem responsáveis políticos num barco que percorreu parte da costa até à Porta da Europa, monumento erguido em memória de todas as vítimas de naufrágios.
O Papa lançou ao mar uma coroa de crisântemos (brancos e amarelos, cores do Vaticano) antes de se recolher em silêncio. Depois, saudou a multidão que o esperava no cais enquanto os navios ao largo da ilha faziam ressoar as suas sirenes em sinal de luto pelos mortos.
Apelou a um despertar das consciências para contrariar a “indiferença” relativamente aos imigrantes. “Perdemos o sentido da responsabilidade fraterna e esquecemo-nos de como chorar os mortos no mar”, lamentou. “Ninguém chora estes mortos”, criticando “os traficantes” que “exploram a pobreza dos outros.”
Fonte: Vatican News