Notícias - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

As primeiras motivações e provocações

23/09/2014

Notícias

Frei Clauzemir Makximovitz

 AGUDOS (SP) – Irmãos menores nos nossos dias! Com a celebração eucarística de abertura do Capítulo das Esteiras 2014, os frades foram motivados para as reflexões do dia. O tema da Fraternidade é que deve motivar as discussões e partilhas durante o Capítulo.

O Salão Nobre do Seminário Santo Antônio, palco de tantas experiências e eventos, certamente na memória e no coração dos frades que ali encenaram, discursaram, declamaram, agora acolhe a todos mais uma vez para celebrar. Celebrar a vida, celebrar a vocação e a missão de frade menor.

Após os avisos de praxe, Frei Vitório Mazzuco, moderador do dia, convidou Frei Fidêncio Vamboemmel, Ministro Provincial, para as boas vindas e abertura oficial dos trabalhos do Capítulo das Esteiras 2014.

Frei Fidêncio expressou a alegria por estarmos reunidos e pela participação de tantos frades.  “Mais cedo, durante a celebração eucarística, na comunhão, eu pensava: ‘Haja pão para toda essa multidão!’ Sejamos bem-vindos e bom Capítulo para todos nós!”, disse Frei Fidêncio.

Um vídeo produzido pela equipe Preparatória do Capítulo abriu o momento e motivou a celebração do Capítulo das Esteiras, sua história, sentido, espiritualidade. Com o título, “O sentido do Capítulo das Esteiras”, o vídeo enfocava a precoce vocação à missão, dada a Francisco e a toda a Ordem. O retorno para casa não é fim de nada, é recomeço e celebração. Desde o início da Ordem, os momentos mais intensos de encontros fraternos iam desde a necessidade de tomar decisões até o simples desejo de estar juntos e celebrar com alegria. Francisco sempre tomou as decisões reunido com os frades. A memória dos capítulos passados, com fotos e vídeos, facilmente emocionou a todos, fazendo a memória tocar o coração.

Após o vídeo, Frei João Mannes foi convidado a expor o tema: “Frades entre nós”, uma das três motivações da manhã, ao qual se seguiriam “Frades entre as criaturas” e “Frades em estado permanente de missão”.

Frades entre nós

jmannes“Somos mais que indivíduos, somos uma corporação!”, ressaltou Frei João Mannes, tomando o sentido de corpo como modelo de organização e relacionamento. Não somos a somatória de números, mas necessitamos de relacionamento fraterno. Enquanto Província, constituímos uma Ordem, sempre em comunhão. Esses irmãos são menores, são pobres, como ressaltavam tanto Francisco e, talvez mais ainda, Santa Clara, que lutou até o fim pelo privilégio de ser pobre. Ser frade significa abertura ao outro, à alteridade: inerente ao ser frade está o ser confrade! Deus é comunhão, é comunidade, a relação é uma categoria que define a pessoa, e como tal, especialmente o frade.

A vida em Fraternidade não é acidental. Ser frade é viver em fraternidade, o que implica um contínuo êxodo de nós mesmos para seguir Jesus Cristo, que implica colocá-lo no centro de nossa vida. Essa não é uma opção que o frade pode ou não fazer, mas é o centro de nossa espiritualidade franciscana. O encontro com Cristo nos obriga a sair de nossa autorreferencialidade! Justamente essa tentação de centrar-se em si mesmo está diretamente relacionada à dificuldade de relacionamento interpessoal em nossa época.

Uma pesquisa feita em toda a Ordem aponta que a maioria dos Frades sente dificuldades de diálogo e relacionamento fraterno.  Lembrando as Constituições Gerais, Frei João destaca o espírito familiar, cortesia e cuidado tão necessários entre os frades (cf. CCGG 39). O sentido da vida religiosa, portanto, nas palavras do Papa Francisco, é ser profecia de fraternidade no mundo de hoje. Ao que Frei João encerrou com a pergunta: “Quais estratégias ou atividades deveríamos colocar em prática em nossas fraternidades para superarmos a autorreferencialidade e sermos “profecia de fraternidade no mundo de hoje”?

Frades entre as criaturas

atilioFrei Atílio Batistuz foi convidado a motivar a reflexão acerca do tema “Frades entre as criaturas”, e logo no início ressaltou que no coração da vida franciscana está a fraternidade, e que a experiência franciscana de fraternidade é universal, ou seja, extrapola as relações humanas. E essa relação está centrada em Cristo. Frei Atílio questionou se o nosso discurso não é muito interno, centrado em nós; e propôs uma expansão mesmo de nossos referenciais, ouvir mais estudiosos, cientistas, antropólogos e pessoas preocupadas com a concretude dos problemas atuais.

Viver a fraternidade é profecia, sim”, diz Frei Atílio, mas não conseguimos manter um discurso tão interno e sermos significativos em âmbito mais amplo. É preciso dialogar, se preocupar, se envolver com o contexto e o ambiente que muitas vezes não vê criaturas, mas recursos. A questão ambiental está na base de nossa vivência de fraternidade. Nossos discursos e colocações não podem ser só filosóficos, e teóricos, é preciso dar passos reais. É preciso deslocar o centro de importância do ser humano para a própria vida.

O homem surgiu praticamente por último na natureza não porque é senhor da natureza, mas porque necessita da natureza, e não o inverso. Há várias compreensões bíblicas de criação, mas a compreensão franciscana de fraternidade universal é divergente da ideia bíblica de senhorio do homem. Fraternidade não é senhorio.

Hoje se fala tanto em direitos individuais e esquecemos dos direitos da sociedade, de ser preservada, direito dos povos, de bem viver. Não somos os últimos, nem os melhores, nem os senhores da criação! Agora, para contribuirmos com as questões ambientais, temos de estudar, conhecer não só o nosso próprio, nossa experiência religiosa, mas precisamos dialogar com a ciência, com a sociedade na linguagem dela.

E sobre a questão ambiental, cada tema deve ser considerado em particular e em relação com o todo. O carbono emitido na atmosfera, as florestas devastadas, os oceanos e rios que aumentam de temperatura… Por isso o nosso conhecimento e interesse precisam aumentar, o profetismo precisa assumir uma linguagem inteligível, e, claro, são necessárias práticas concretas, não em função de um desenvolvimento econômico predatório, mas em acordo com um projeto social em diálogo.

Frades em estado permanente de missão

evaristoPara o tema “Frades em estado permanente de missão, Frei Evaristo Spengler  assumiu a motivação, e iniciou esclarecendo que a religião hoje não é mais vista como portadora da verdade – como quem tem as respostas para tudo, que quando fala, tudo está resolvido –, mas como oferta de sentido, que quando fala, quem ouve, analisa e decide se essa proposta lhe tem sentido.

Hoje há muita oferta de propostas e respostas, ao que cada um vai acolhendo de acordo com o que lhe dá sentido. Essa situação pode levar ao desespero ou a uma mudança de atitude. Hoje, a Igreja toda é missionária, não apenas os que estão em áreas de missão, mas todos em permanente estado de missão!

Na Evangelii Gaudium, o Papa Francisco apontou uma transformação necessária em toda a Igreja: a passagem de uma pastoral de conservação para uma pastoral missionária! Frei Evaristo, citando um comentário à Encíclica do Papa Francisco, lembra que estamos hoje a poucos passos do fim do cristianismo sociológico, onde o cristão conhecia a fé por imersão.

 Ou seja, os valores e a fé eram transmitidos automaticamente, de forma segura na família. Depois a escola tinha aula de religião que ensinava o catolicismo. E, por último, a Igreja era apenas a sistematização catequética do que já se vivia na família e na escola. Hoje, os pilares da família e da escola já caíram, e resta apenas a Igreja, esta perde sua hegemonia.

Diante de um pluralismo, alguns ficam na nostalgia, querendo dar as mesmas respostas de antigamente. Mas isso não funciona mais. Na história do cristianismo, nascemos como fermento, um grupinho que fazia o todo fermentar. Aos poucos nos tornamos massa, cristianismo sociológico. Hoje, aos poucos rumamos para ser minoria, precisamos nos tornar fermento e não uma seita fechada em si mesmo. É preciso que a Igreja se torne uma minoria a favor da massa. A Carta a Diogneto (um testemunho de um cristão anônimo que responde a Diogneto, um pagão culto, a respeito da fé cristã) apresenta uma expressão interessante: “Os cristão são para o mundo aquilo que a alma é para o corpo”. Portanto, se os cristãos são minoria, mas estão para o corpo, podem fomentar valores que levem ao corpo todo melhorias.

Segundo Frei Evaristo,  diante da pergunta se devemos lamentar pelas transformações e diminuição do cristianismo, o Papa Francisco diz que não, pois o que há de vir ainda é muito melhor do que deixamos para trás! E mesmo Bento XVI já dizia que conquistar cristão por proselitismo não é nossa função. É preciso mesmo passar de um cristianismo de preservação para o profetismo. O Papa Francisco aponta que devemos ser uma Igreja em saída.

Alguns movimentos apostam na saída por opções que, na verdade reafirmam o ser católico na compreensão mais tradicional, o que não corresponde às necessidades atuais. Outra saída assumida por alguns é atrair fiéis através de celebrações cada vez mais midiáticas e verdadeiros shows.

Mas talvez a saída seja retomar o Vaticano II e nosso ser franciscano: uma Igreja que se solidariza, que sai e vai ao encontro do outro. Na Evangelii Gaudium, o Papa Francisco diz que prefere uma Igreja acidentada porque sai ao encontro do outro do que uma Igreja doente porque fechada em si mesma. Portanto, a saída também é uma Igreja não preocupada apenas com a conservação institucional, mas em diálogo, aberta ao outro. E uma Igreja que vai ao encontro não com respostas feitas, mas disposta a descobrir um caminho novo.

IMAGENS DO SALÃO NOBRE