Aquele que aprende a ungir e a abençoar fica curado da mesquinhez
18/04/2019
Cidade do Vaticano – O Papa Francisco presidiu a Missa do Crisma, nesta Quinta-feira Santa (18/04), na Basílica de São Pedro. Junto com o Papa, além de cardeais e bispos, concelebraram os sacerdotes da Diocese de Roma, significando a unidade da Igreja reunida em torno de seu bispo.
Em sua homilia, o Pontífice sublinhou que o Evangelho de Lucas “nos faz reviver a emoção do momento em que o Senhor assume a profecia de Isaías, lendo-a solenemente no meio do seu povo. A sinagoga de Nazaré estava cheia de parentes, vizinhos, conhecidos, amigos… e outros não muito amigos. E todos tinham os olhos fixos n’Ele”.
Com frequência, os Evangelhos nos apresentam “esta imagem do Senhor no meio das multidões, cercado e comprimido pelas pessoas que lhe trazem os doentes, pedem-lhe que expulse os espíritos malignos, escutam os seus ensinamentos e caminham com Ele. O Senhor nunca perdeu este contato direto com o povo, sempre manteve a graça da proximidade, com o povo no seu conjunto e com cada pessoa no meio daquelas multidões”, ressaltou Francisco.
Desejo de seguir Jesus
“Aqui, o termo «multidões» não é depreciativo”. Talvez para alguém, “poderia soar como uma massa anônima, indiferenciada; mas no Evangelho, quando as multidões interagem com o Senhor, que se coloca no meio delas como um pastor no rebanho, vemos que as multidões se transformam: no espírito do povo, desperta o desejo de seguir Jesus, brota a admiração, toma forma o discernimento”.
A seguir, o Papa refletiu com os fiéis sobre três graças que caracterizam o relacionamento entre Jesus e as multidões: a graça do seguimento, a graça da admiração e a graça do discernimento.
A graça do seguimento
Na primeira graça, a do seguimento, as multidões procuram e seguem Jesus, o empurram e o apertam. “Esse seguimento do povo não é calculista, é um seguimento sem condições, cheio de carinho. Contrasta com a mesquinhez dos discípulos, cujo comportamento com o povo se revela quase cruel quando sugerem ao Senhor que mande as pessoas embora para irem procurar algo para comer. Creio que o clericalismo começou aqui: nesta atitude de querer assegurar-se o próprio alimento e comodidade, desinteressando-se das pessoas. O Senhor cortou pela raiz esta tentação, dizendo-lhes: «Vocês é que têm de lhes dar de comer.» «Cuidem do povo!».
A graça da admiração
A segunda graça que a multidão recebe ao seguir Jesus é a graça da admiração, uma “admiração cheia de alegria. O povo fica admirado com Jesus, com os seus milagres, mas sobretudo com a sua própria Pessoa. O povo gostava muito de saudá-Lo ao longo da estrada, ser abençoado por Ele e bendizê-Lo, como aquela mulher que do meio da multidão bendisse a sua Mãe. E o Senhor, por sua vez, ficava admirado com a fé do povo, regozijava-Se e não perdia ocasião de o fazer notar”.
A graça do discernimento
A terceira graça, que recebe o povo, é a do discernimento. A multidão ficava impressionada com os ensinamentos de Jesus, porque Ele ensinava como alguém que tem autoridade, e não como os doutores da Lei. “Cristo, a Palavra de Deus feita carne, suscita nas pessoas este carisma do discernimento; certamente, não um discernimento de especialistas em assuntos controversos. Quando os fariseus e os doutores da lei discutiam com Ele, aquilo que o povo reconhecia era a Autoridade de Jesus: a força da sua doutrina, capaz de penetrar nos corações, e o fato de os espíritos malignos Lhe obedecerem; e ainda deixar sem palavra aqueles que urdiam diálogos insidiosos. O povo alegrava-se com isso”.
O evangelista Lucas indica quatro grandes grupos que são destinatários preferenciais da unção do Senhor: os pobres, os prisioneiros de guerra, os cegos e os oprimidos.
Segundo Francisco, “os pobres são aqueles que estão curvados, como os mendigos que se inclinam para pedir. Mas é pobre também a viúva, que unge com os seus dedos as duas moedinhas que constituíam tudo o que tinha naquele dia para viver. A unção daquela viúva para dar a esmola passa despercebida aos olhos de todos, exceto aos de Jesus, que vê com bondade a sua pequenez. Com ela, o Senhor pode cumprir plenamente a sua missão de anunciar o Evangelho aos pobres”.
“Os cegos são representados por um dos rostos mais simpáticos do Evangelho: Bartimeu, o mendigo cego que recuperou a vista e, a partir daquele momento, só teve olhos para seguir Jesus pela estrada. A unção do olhar!”
“Para designar os oprimidos, Lucas usa um termo que contém a palavra «trauma». Isto é suficiente para evocar a parábola do Bom Samaritano, que unge com azeite e enfaixa as feridas do homem que fora espancado deixando-o meio morto na beira da estrada. A unção da carne ferida de Cristo! Naquela unção, está o remédio para todos os traumas que deixam pessoas, famílias e populações inteiras fora de jogo, como excluídas e supérfluas, à margem da história.”
“Os prisioneiros são os cativos de guerra, aqueles que eram conduzidos À ponta de lança. Hoje, as cidades são feitas prisioneiras não tanto À ponta de lança, como sobretudo com os meios mais sutis de colonização ideológica. Só a unção da nossa cultura própria, forjada pelo trabalho e a arte dos nossos antepassados, é que pode libertar as nossas cidades destas novas escravidões.”
A unção do Senhor levanta e vivifica
Nesta Quinta-feira Santa em que os sacerdotes renovam na missa do Crisma as promessas sacerdotais pronunciadas no dia da ordenação, o Papa disse: “Queridos irmãos sacerdotes, não devemos esquecer que os nossos modelos evangélicos são este «povo», esta multidão com estes rostos concretos, que a unção do Senhor levanta e vivifica. São aqueles que completam e tornam real a unção do Espírito em nós, que fomos ungidos para ungir. Fomos tomados dentre eles e podemos, sem medo, identificar-nos com esta gente simples. Cada um de nós tem a própria história. Recordar nos fará muito bem. Eles são imagem da nossa alma e imagem da Igreja. Cada um encarna o coração único do nosso povo. Não somos distribuidores de azeite em garrafa. Ungimos, distribuindo-nos a nós mesmos, distribuindo a nossa vocação e o nosso coração. Enquanto ungimos, somos de novo ungidos pela fé e pela afeição do nosso povo. Ungimos, sujando as nossas mãos ao tocar as feridas, os pecados, as amarguras do povo; ungimos perfumando as nossas mãos ao tocar a sua fé, as suas esperanças, a sua fidelidade e a generosidade sem reservas da sua doação que muitos ilustrados qualificam como superstição”.
O Santo Padre disse que quando crisma e ordena, gosta de espalhar bem o Crisma na testa e nas mãos daqueles que são ungidos. “Ungindo bem, experimenta-se que ali se renova a nossa própria unção. Enquanto ungimos, somos de novo ungidos pela fé e pela afeição do nosso povo. Aquele que aprende a ungir e a abençoar fica curado da mesquinhez, do abuso e da crueldade”, concluiu o Papa.
ENTENDA A LITURGIA DESTE DIA
A Quinta-feira Santa nos insere no âmago do Mistério pascal de Cristo. Neste Dia santo, pela manhã, o bispo e os sacerdotes concelebram a “Missa do Crisma” nas Igrejas catedrais. Constituídos, na última Ceia, “servos do Mistério”: realizam eles a unidade do seu sacerdócio no único grande Sacerdote, Jesus Cristo.
Unidade dos presbíteros com o bispo
Renovação das promessas sacerdotais
De fato, renovam-se nela as promessas sacerdotais pronunciadas no dia da ordenação, sendo assim também chamada “Missa da Unidade”. Nesta missa manifestam-se o mistério do sacerdócio de Cristo, participado pelos ministros constituídos em cada local, que renovam seu compromisso ao serviço do povo de Deus.
Crisma, catecúmenos e enfermos
O bispo, cercado pelos outros sacerdotes, abençoa os óleos, que serão usados nos diversos sacramentos: o crisma (óleo misturado com perfumes), para significar o dom do Espírito no batismo, na crisma, na ordem; o óleo para os catecúmenos e o óleo para os enfermos, sinal da força que liberta do mal e sustenta na provação da doença.
O óleo e a unção
Através de uma realidade terrena já transformada pelo trabalho do homem (o óleo) e de um gesto simples e familiar (a unção), exprime-se a riqueza da nova existência em Cristo, que o Espírito continua a transmitir à Igreja até o fim dos tempos.
Conclusão da Quaresma
A Quaresma – período litúrgico de 40 dias –, tempo forte de oração, jejum e penitência em que nos preparamos para a celebração da Paixão, Morte e Ressurreição de nosso Salvador, conclui-se justamente na Quinta-feira Santa pela manhã com a Missa do Crisma – prelúdio do Tríduo Pascal.
Fonte: Vatican News