“A vocação é um dom precioso que Deus semeia nos corações, uma chamada a sair de si mesmo para trilhar um caminho de amor e serviço. E cada vocação na Igreja – seja laical, seja ao ministério ordenado, seja à vida consagrada – é sinal da esperança que Deus nutre pelo mundo e por cada um dos seus filhos”.

O trecho acima, da mensagem do Papa Francisco para o 62º Dia Mundial das Vocações, que celebraremos neste Ano Jubilar, é uma síntese do que representa o chamado de Deus para uma vida de doação.

Para percorrer esse caminho é necessário lucidez, esclarecimentos e experiências que serão determinantes para compreender o caminho que se pretende seguir na Igreja. Na Ordem dos Frades Menores, os vocacionados são convidados a percorrer uma trilha, seguindo os passos de Francisco, um jovem que viu nas criaturas de Deus e no Evangelho sua principal razão se ser e estar neste mundo. Ele abandonou sua vida de nobreza para entregar-se à vida em minoridade, baseada na humildade e na fraternidade.

Frei Massimo Fusarelli, Ministro geral da Ordem dos Frades Menores, no livro “Francisco de Assis, uma vida inquieta”, aborda os desafios de Francisco durante sua caminhada de santidade, revelando o jeito de ser do Santo Seráfico no seu encontro especial com Deus. “Francisco começa então a enxergar de maneira diferente a realidade das coisas. Poderíamos dizer que ele abre a porta para a inquietude, a deixa entrar e habitar dentro de si, exatamente como sua mãe havia feito quando o trazia no ventre. Não sabia ainda como canalizá-la. Mas ficou mais atento aos pobres e sente uma verdadeira compaixão por eles.”

Os jovens inquietos que chegam para viver a experiência franciscana oferecida pela Província da Imaculada Conceição do Brasil, são acolhidos pelos frades responsáveis pelo Serviço de Animação Vocacional (SAV), hoje composto por: Frei Edvaldo Batista Soares, Frei Evaldo Ludwig, Frei Felipe Medeiros Carretta, Frei Laurindo Lauro da Silva Júnior e Frei Marcos Prado dos Santos, Frei Gabriel Dellandrea e Frei Jeâ Paulo de Andrade, que conversou com o Site Franciscanos sobre esse importante momento do jovem vocacionado.

Segundo o frade, coordenador do Serviço de Animação Vocacional desde 2022, a animação vocacional sempre foi priorizada na Província. “Há um cuidado para que os jovens que nos procuram sintam uma boa acolhida e possam ser ajudados no processo de discernimento vocacional”.

Ele explicou que trabalha em parceria com os demais frades do SAV que estão em lugares estratégicos do território provincial (São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Santa Catarina e Paraná), especialmente nas capitais e locais onde tem surgido mais vocações. Frei Jeâ ainda esclareceu que, além dos vice-coordenadores, cada Fraternidade provincial tem um responsável para acompanhar localmente os jovens que manifestam o desejo de conhecer a Ordem.

Passos fraternos

Para o despertar da vocação religiosa as Fraternidade desenvolvem ações pastorais, a partir do testemunho de vida franciscana, individual e comunitária, a fim de que cada cristão siga o seu próprio chamado específico na Igreja e, de maneira especial, na proposta do carisma de São Francisco de Assis, como um projeto de vida. “A Animação Vocacional contempla a missão provincial de testemunho do carisma franciscano por parte de cada frade e de cada fraternidade, na vivência em fidelidade e integralidade do estado de vida religiosa na Ordem dos Frades Menores, que assumem em sua permanente formação e na evangelização, por meio das cinco Frentes de Evangelização, além das atividades e eventos do SAV e das etapas do acompanhamento e animação vocacional (FAVs e Ensino Médio) desenvolvendo a promoção vocacional, a presença entre os jovens, as missões vocacionais e a preparação de profissões e ordenações”, esclareceu.

Nesse ambiente de inclusão e valorização da vocações, os jovens são envolvidos em diversas atividades com a finalidade de fomentar a reflexão vocacional. No entanto, algumas ações são comuns a todos os frades envolvidos com a animação vocacional:

1- Criação e manutenção de formas eficientes de contato para que os jovens possam manifestar sua intenção de acompanhamento ou serem suscitados ao discernimento pessoal vocacional.

O estímulo para a vivência também ocorre por meio da divulgação vocacional nas mídias sociais (Facebook, Instagram, X e YouTube), canais institucionais da Província, paróquias (Pascom) e obras (rádios, emissora de TV, editoras, colégios e universidades). Também pelos perfis pessoais dos frades. O objetivo é promover os valores franciscanos que falam mais alto aos jovens, salientando os princípios e dimensões do carisma franciscano mais atrativos ou que chamem mais a atenção dos vocacionados;

2-  Promoção vocacional local nas fraternidades e presenças evangelizadoras, fomentando a oração pelas vocações nas famílias, nas celebrações e encontros; criando um espaço para distribuição de materiais vocacionais e divulgação do contato com as equipes vocacionais; promovendo celebrações vocacionais; propondo ativamente aos adolescentes, jovens e adultos o convite ao acompanhamento vocacional; acompanhando aqueles que demonstram interesse em fazer seu discernimento vocacional;

3- Trabalho em equipe com leigos das atividades evangelizadoras, colaboradores, voluntários, catequistas, casais, jovens, religiosos (as) e irmãos (ãs) da OFS. Promoção de diálogos com a equipe de animação vocacional das dioceses e congregações para que se somem forças e se abra espaço para a divulgação do carisma franciscano em feiras vocacionais promovidas pela Igreja local;

4- Presença dos frades entre os jovens, promovendo localmente a criação ou aproximação de grupos de juventude por meio de atividades de serviço e evangelização, além de encontros formativos ou celebrativos. Estímulo à participação dos jovens nas atividades provinciais da Evangelização com as Juventudes (Missões Franciscanas das Juventudes, Caminhadas Franciscanas das Juventudes, Encontros Monte Alverne…), em parceria com a equipe provincial designada para este serviço;

5- Missões vocacionais, promovendo oportunamente atividades das presenças evangelizadoras voltadas aos adolescentes e jovens e em missões vocacionais nas escolas;

6- Ampliação da presença dos frades nos lugares onde os jovens estão presentes, como em escolas, universidades, periferias, entre outros espaços;

7-  Preparação de Profissões Solenes e Ordenações, intermediando os preparativos destas celebrações nas paróquias onde serão realizadas as cerimônias, de modo que sejam marcadas pela identidade franciscana e sejam melhor compreendidas pela comunidade eclesial local. Nesse período, os frades organizam atividades missionárias de promoção do carisma nas instâncias eclesiais e civis, especialmente aquelas onde há atividades voltadas aos adolescentes e jovens.

Olhar de acolhida e incentivo

Frei Jeâ relatou que os jovens chegam até os frades espontaneamente. “O testemunho de vida dos irmãos é a principal propaganda vocacional. Os jovens vendo nosso modo de vida em fraternidade localmente e aquilo que também compartilhamos no nosso site e redes sociais acabam chamando atenção. A maioria sente um carinho pela vida de São Francisco e ao estudar e pesquisar sobre a vida do santo chegam aos frades franciscanos. Além disso, os encontros e eventos com as juventudes da Província suscitam a curiosidade e o desejo dos jovens se juntarem à nós”.

Quando perguntado sobre o perfil do vocacionado, o frade esclareceu que existem dois grupos de jovens que podem iniciar acompanhamento vocacional:

“Primeiro temos os vocacionados adolescentes com idade mínima de 14 anos e, no máximo, 17 anos, que ainda não tenham concluído o Ensino Médio. Para vocacionados deste grupo não há exigências para iniciarem o acompanhamento periódico nas fraternidades próximas de suas casas. Também a eles são propostos períodos intensivos de convivência e formação, especialmente em períodos de férias em alguma fraternidade da Província. Um segundo grupo de vocacionados são os jovens e adultos, até 35 anos. São aqueles que já concluíram o Ensino Médio, estão fazendo graduação e já inseridos no mercado de trabalho. O jovem que deseja ser acompanhado precisa entrar em contato por email, WhatsApp ou diretamente com o SAV falar com algum frade e manifestar o interesse”.

No caso do vocacionado que está cursando o ensino médio, ainda partilha da vivência familiar e não tenha uma Fraternidade local que possa acompanhá-lo, são criadas formas de contato virtual, de forma que ele possa ser inserido em um grupo com situação semelhante. Na medida do possível, os candidatos acompanham a vida da Província, com o propósito de manter vivo o interesse pelo discernimento vocacional. Esse trabalho é realizado até o jovem concluir o
ensino médio.

Nessa etapa, também é feito acompanhamento periódico, presencial ou virtual. O Serviço de Animação Vocacional promove as experiências dos Tempos Fortes, períodos nos quais os vocacionados são reunidos em uma fraternidade para terem momentos de reflexão, convívio fraterno com os frades e outros vocacionados. Nesses encontros, todos participam de atividades de lazer, formação franciscana, humana e intelectual e atividades de evangelização. Sob a avaliação do SAV, cada vocacionado é avaliado individualmente, considerando sua aptidão e idoneidade para ser admitido ao Postulantado ou se deve continuar a animação vocacional, passando ao grupo dos Jovens e Adultos.

“O vocacionado jovem e adulto, após a manifestação do interesse de ser acompanhado em seu discernimento vocacional, é encaminhado, ou, se vier de nossas presenças, pede acompanhamento vocacional a um dos Animadores Vocacionais Locais, que deve organizar visitas periódicas e um olhar de perto e sistemático do vocacionado na fraternidade. Como o início desta etapa não possui uma data específica e é realizada a partir do primeiro contato entre o vocacionado e o Animador Vocacional Local, sua duração depende da avaliação individual, que será submetida ao julgamento do Animador Vocacional e do Serviço de Animação Vocacional provincial. Entretanto, consideramos o tempo de um ano como ideal para o vocacionado nos conhecer, e a Província orientar da melhor maneira possível”, detalhou.

Luzes para percorrer a estrada das vocações

Durante a etapa de acompanhamento vocacional, são propostas diferentes oportunidades para uma verdadeira imersão na vida franciscana:

• Momentos de formação e reflexão vocacional comunitários;
• Sugestão de livros e filmes que ajudem no amadurecimento da decisão vocacional, da consciência de Igreja e Povo de Deus, e da vida de São Francisco de Assis;
• Diálogos pessoais com o Animador Vocacional Local;
• Convivência com a fraternidade local, seja em refeições seja em outras atividades convenientes;
• Participação de momentos celebrativos importantes da Ordem junto à comunidade eclesial local ou na fraternidade;
• Participação em atividades pastorais ou de evangelização, com o povo, com a possibilidade de colaboração na organização, mas não na coordenação;
• Momentos de diálogo e apresentação da realidade provincial, com a diversidade de atividades evangelizadoras, presenças e realidades eclesiais nas quais interagimos. De forma concreta, haja orientações aos vocacionados quanto à vida interna de uma fraternidade local, com seus possíveis desafios e riquezas, evidenciando as posturas esperadas e alertando quanto aos cuidados necessários;
• Diálogo aberto com os vocacionados sobre as espiritualidades e experiências eclesiológicas que, possivelmente, não coadunem com o carisma franciscano; no entanto, manifestando respeito por tudo aquilo que tenha construído a personalidade e vocação do jovem até ali, e que precisa ser trabalhado em vista de um novo estado de vida e carisma a serem abraçados;
• Atividades de interação e trabalho comum entre os vocacionados, de modo que as diferenças possam ser percebidas e eles sejam auxiliados a reconhecer em quais aspectos devem cultivar maior paciência, senso de misericórdia, espírito de fraternidade e compreensão;
• Momentos conduzidos por profissionais da área de psicologia e/ ou pedagogia que possam verificar, através do contato, diálogo e testes, possíveis condicionamentos ou perfis psicológicos dos vocacionados, para ajudá-los em suas necessidades específicas;
• Momentos de partilha em grupo da própria experiência familiar, vocacional e de fé, e escuta do outro, de modo a reconhecer os elementos comuns da história sagrada de cada um.

Desafios dos tempos

O relógio do mundo gira freneticamente, dando ao tempo muita velocidade que, nem sempre, é possível acompanhar com tanta precisão. O tempo passa e os jovens são impactados pelo desenvolvimento tecnológico e pelas mudanças sociais. Diante disso, como o SAV se adapta?

“Recentemente tivemos a Assembleia do Serviço de Animação Vocacional. Percebemos que os perfis dos vocacionados sempre mudam ano após ano. Avaliamos que os frades precisam estar se atualizando sempre para poder responder de maneira eficaz as questões que os jovens nos apresentam”, disse Frei Jeâ.

Diante de tantas mudanças e necessidades de adaptações ao tempo e aos momentos de nossa sociedade, o Serviço de Animação Vocacional permanece atento em sua missão de depertar novas vocações e mostrar o caminho para jovens que desejam seguir os passos de São Francisco de Assis como frades menores.

“O vocacionado considerado apto para aprofundamento da experiência de conhecimento e vivência do carisma franciscano, após o acompanhamento local, é acolhido para morar em uma das Fraternidades de Acolhimento Vocacional (FAVs), fazendo a experiência do “Vinde e Vede”, em comunhão com os frades daquela fraternidade. Não há uma fraternidade definida, mas o vocacionado poderá viver em uma das 40 fraternidades da Província. As FAVs oferecem aos vocacionados espaços de aprofundamento da fé cristã, vivência da espiritualidade franciscana, convivência fraterna, serviço aos irmãos e ao povo, assim como oportunidades para evangelizar e serem evangelizados”, salientou o frade coordenador do SAV.

Desafios dos tempos

Diante das mudanças nas estruturas familiares, do impacto das novas tecnologias que apresentam formas variadas e muitas vezes deturpadas de ver e sentir o mundo, as vocações também são impactadas, mas a esperança se mantêm firme e confiante, conforme explicou Frei Jeâ.

“A animação vocacional franciscana enfrenta desafios e oportunidades em nossa atualidade. Vivemos um tempo em que os jovens estão em constante busca de sentido para a vida, mas também são influenciados por um mundo que valoriza a instantaneidade e a superficialidade. Nossa missão, como frades animadores vocacionais, é apresentar o carisma franciscano de forma autêntica e acessível, demonstrando que a vida fraterna, a simplicidade e a entrega a Deus ainda são caminhos válidos e profundamente realizadores. A internet e as redes sociais são hoje um campo fértil para a evangelização e promoção vocacional, permitindo que alcancemos jovens que, de outra forma, talvez nunca tivessem contato com nossa espiritualidade. No entanto, nada substitui o testemunho de vida e o contato pessoal, que são as maiores forças da animação vocacional. Por isso, precisamos estar próximos, acolhendo, escutando e caminhando junto aos jovens que batem à nossa porta.

Ao final da entrevista, foi solicitado a Frei Jeâ que deixasse uma mensagem aos vocacionados, imaginando que estivesse diante de um deles:

“Se sente no coração um desejo de seguir Cristo no caminho de São Francisco, não tenha medo. O chamado de Deus é sempre um convite ao amor e à liberdade, nunca uma imposição. O discernimento vocacional não é um peso, mas uma oportunidade de descoberta e amadurecimento. Deus não escolhe os perfeitos, mas aqueles que estão dispostos a caminhar e se deixar moldar por Ele. Se o desejo de seguir a vida franciscana ressoa dentro de você, dê um passo adiante, abra-se à experiência, conheça a fraternidade, mergulhe na oração e no serviço aos irmãos. Só assim poderá descobrir se esse é o caminho que Deus sonhou para você. Não tenha medo de confiar. São Francisco dizia: ‘O Senhor me deu irmãos’; tenho certeza que nesse caminho, o vocacionado nunca estará sozinho”.

Seguindo a linha de reflexão de Frei Jeâ, e as experiência oferecidas ao vocacionados pela Província da Imaculada Conceição citdas no texto, voltamos novamente ao livro de autoria do Ministro geral, quando ele descreve o encontro de Francisco com a sua vocação:

“Francisco vê agora que naquele contato com os pobres havia começado a perceber dentro de si os sinais de uma presença que i atrai sempre mais. A sua companheira, aquela inquietude que lhe é familiar, o toma pela mão e o leva ao encontro com os humilhados, e com eles em direção a Alguém que ele ainda não pode dizer que conhece pessoalmente”.

Que a inquietude dos vocacionados franciscanos seja sempre o combustível para conhecer profundamente o carisma e a espiritualidade franciscana, para que, assim como Francisco, percorram a caminhada religiosa ao encontro Daquele que desejam construir uma relação de profunda intimidade, obediência e doação.

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Adriana Rabelo Rodrigues