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Dom José: “Não abandonem o coração franciscano!”

Moacir Beggo

 São Sebastião (SP) – Com exatos 361 anos de evangelização no Litoral Norte de São Paulo, os frades da Província Franciscana da Imaculada Conceição entregaram, neste sábado (10/08), o cuidado pastoral da Paróquia Nossa Senhora do Amparo à Diocese de Caraguatatuba, na pessoa do bispo diocesano Dom José Carlos Chacorowski, durante a Missa de Ação de Graças, às 19 horas. O Vigário Provincial, Frei Gustavo Medella, representou o Ministro Provincial, Frei César Külkamp, neste momento histórico, marcado pela emoção dos fiéis paroquianos e dos frades, especialmente da última Fraternidade, formada por Frei João Pereira da Silva, o guardião e pároco; Frei José Martins Coelho, vigário paroquial; e o irmão leigo Frei Virgílio Pereira de Souza. Estavam presentes Frei João Francisco da Silva, Definidor e Secretário da Formação e Estudos, e Frei José Raimundo de Souza, os dois da Fraternidade do Postulantado Frei Galvão de Guaratinguetá. Durante a Celebração também foram apresentados os novos padres: Pe. André Beghini Vilela, pároco, e Pe. Floriano Marcos da Silveira, vigário paroquial.

“Muito obrigado a vocês, obrigado à Paróquia de Nossa Senhora do Amparo! Continuem e não abandonem o coração franciscano, porque é um coração que ama o Evangelho como Jesus quer. Obrigado aos freis, que levam o nosso obrigado, o nosso voto de confiança a Frei César e à toda administração da Província. Também levam a nossa promessa que faremos o que está ao nosso alcance para continuar, neste cantinho da Igreja, o reino de Deus, para continuar essa missão. Que, para isso, São Francisco de Assis nos abençoe!”, animou Dom José, que durante toda a Missa demonstrou seu carinho ao trabalho dos frades e explicou ao povo o processo de redimensionamento que está fazendo a Província da Imaculada nas suas Frentes de Evangelização. “Não podemos, certamente, considerar como um presente de aniversário, mas acolher com humildade a missão que agora caberá aos diocesanos de manter uma belíssima tradição de seguimento de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo o coração de São Francisco de Assis. Os freis não estão indo embora; um cristão que assume sua missão de batizado e sua vocação de seguir a Nosso Senhor nunca vai embora, mas segue adiante, sendo Igreja em saída, buscando com humildade responder aos novos apelos e desafios dos tempos atuais. A história da evangelização do Litoral Norte de nosso Estado começa com São José de Anchieta e prossegue durante 361 anos com a presença destes inúmeros e bravos evangelizadores que foram os frades franciscanos menores. Nossa Diocese deverá ser eternamente agradecida pelo que realizaram aqui”, explicou Dom José ao povo.

Depois de 2 horas de celebração, as lágrimas chegaram com mais intensidade durante o hino franciscano “Doce é sentir”. O historiador Durval Ruiz falou pela comunidade, demonstrando todo esse sentimento. “Deveríamos, nesta Ação de Graças, falar aqui de todo histórico ocorrido desde que tudo começou com a fundação e inauguração desta casa franciscana a partir de 1658. Todavia, hoje, nossos corações se encontram com esse sentimento de perda. Uma perda inesperada, uma perda que não se trata simplesmente da troca de freis, porque a isso estamos todos nós, fiéis franciscanos, acostumados. A perda maior que pesou-nos sobre nossos ombros foi a perda de um costume tradicional religioso da Ordem Franciscana. Estávamos acostumados com o jeito de ser franciscano, o jeito de falar na linguagem franciscana. Até nossos coroinhas trajavam ornamentos franciscanos para servir o altar. O jeito de ser do sacerdote franciscano é diferenciado. Vemos neles uma doçura em suas palavras, vemos uma entrega total, uma pertença transparente naquilo a que eles se propuseram a realizar. Todos eles, sem exceção. Defeitos, todos nós o temos, uns mais, outros menos, mas todos nós o temos. Os freis não são diferentes, eles também os têm. Todavia, trazem consigo algo diferente que transcende, é algo de uma espiritualidade ímpar, que nos toca, nos modifica também nosso jeito de agir e pensar, e, por isso, não os esqueceremos jamais”, confessou o historiador.

Durval Ruiz, historiador e orador pela comunidade nesta Celebração

Segundo ele, não poderia falar de todos os frades dos 361 anos e fez uma emocionante homenagem à última Fraternidade. “Todos, sem distinção, deixarão saudades no coração de cada um dos paroquianos desta, pequena e humilde comunidade paroquial, mas que tem um coração imensurável para o amor ao próximo. E, com esse amor receptivo, e com toda certeza do mundo, saberá receber com calor humano e dignidade aos novos padres que por aqui passarão, agora, já na versão diocesana”, reconheceu, deixando a seguinte mensagem:  “Cada pessoa que passa em nossa vida, passa sozinha, porque cada pessoa é única e nenhuma substitui a outra! Cada pessoa que passa em nossa vida, passa sozinha mas não nos deixa, porque fica um pouco de si conosco e leva um pouquinho de nós consigo. Essa é a mais bela responsabilidade da vida, e a prova de que as pessoas não se encontram por acaso”.

Frei João, por sua vez, foi o porta-voz da Fraternidade. “Não sem dor. E dor só sente quem a sofre na pele, como se vê nas lágrimas que caem e nas que estão contidas. Sirvam estas lágrimas para regar o espírito franciscano que, aqui, foi semeado, o espírito da Paz e do Bem”, pediu. “Mas caros amigos não fiquem na saudade dos que vão e sim na alegria daqueles que vêm, pois tem hora de chegar e tem hora de partir… Compreendemos as dificuldades da Província Franciscana, mas a dor de partir é infinitamente maior”, confessou. Ele e seus confrades ganharam  sandálias como presentes da comunidade.

FREI MEDELLA: “É OBRA DO POVO DE DEUS”

Frei Gustavo disse que nesses 361 anos – de Frei Pantaleão, o primeiro guardião, até Frei João, o último – pelo menos uns 20 frades que moraram em São Sebastião ele conheceu. “Alguns até já partiram, como Frei Fábio Panini, Frei José Timmermann, Frei Lency Smaniotto. Muitos estão firmes na missão. Eu posso garantir a vocês, a Dom José e queridos padres e confrades: da boca de nenhum dos frades que por aqui passaram ouvi um comentário negativo, um lamento, uma reclamação. Todos têm lembranças de gratidão, de alegria. Foram felizes aqui com o povo, com o lugar. O que significa que, aqui, eles deixaram um pedaço do seu coração, como diz o Evangelho: ‘Onde está o teu tesouro, ali está o teu coração'”, acredita o Vigário Provincial, reforçando que isso é um motivo para render graças a Deus.

“Depois de 361 anos, deixar um lugar também é um exercício importante para nós, franciscanos – ainda que seja um exercício dolorido -, e que tem a ver com nosso modo de ser, que é por natureza itinerante, andarilho, viajante neste mundo, nesta vida que é uma viagem. Ao mesmo tempo que chegamos, chega a hora de partir, mesmo 361 anos depois. E, nesta partida, cumprindo também todos os trâmites, fazendo tudo direitinho na forma da lei canônica, da lei civil, nós deixamos para o cuidado dos irmãos e dessa comunidade de fé, o Convento, a Paróquia, todo o patrimônio imóvel, todos os objetos de culto, os móveis. Por quê? Porque tudo isso existe em função da evangelização e é obra do povo de Deus. Não nos pertence. Nós seguimos em frente, deixando com muita alegria e gratidão a Deus, tudo isso como legado, como herança, na certeza que um bom trabalho de construção do Reino continua com o mesmo vigor e com o mesmo entusiasmo”, desejou, informando que a Província entregou à Diocese, ontem à tarde, uma cópia do relatório e do inventário deste patrimônio.

Frei João (à esq.), Frei José e Frei Virgílio, a última Fraternidade Franciscana em São Sebastião

“Isso no que diz respeito à parte material. Agora, aquilo que o metro não consegue medir, aquilo que não cabe numa conta bancária, que não cabe em sala nenhuma, o patrimônio imaterial, esse é muito grande e levamos conosco. Tanta gente de fé, tantas Eucaristias celebradas, tanto espírito de solidariedade, tanta partilha pelo Reino, tantos confrades, tantas lideranças que doaram a vida por esta comunidade. E por tudo isso, nossa imensa gratidão a Deus. À nossa Ordem Franciscana Secular, o nosso muitíssimo obrigado de coração! A nossa comunhão espiritual e fraterna permanece firme na assistência espiritual, na caminhada comum. A cada liderança, a cada fiel batizado, ministros, coroinhas, liturgia, pastorais, a nossa gratidão. O que vocês deixaram de herança para nós não existe valor que possa fazer jus. Todos esses frades que por aqui passaram levam um tesouro no coração. Por isso, muito, muito obrigado!”, frisou Frei Medella, que, acrescentando mais uma pitada de emoção ao momento, fez o seguinte pedido a Dom José, aos padres e ao povo: “Peço a nós, frades franciscanos, a bênção de envio, porque como diz a música, ‘o trem que chega é o mesmo da partida’. Para que nós permaneçamos fiéis ao propósito de evangelizar, que sigamos firmes no caminho pelo qual o Senhor nos dirige”, explicou, pedindo a seus confrades que se ajoelhassem diante do altar. E eles foram abençoados!

IGREJA AO ESTILO DO POBREZINHO DE ASSIS

Dom José, antes da bênção final, falou com carinho ao povo e aos frades. “O coração dos freis estão unidos ao Sagrado Coração de Jesus e da Virgem Santíssima. Nesse coração se baseia nossa esperança, a nossa força para prosseguir. Eu, como bispo desta Diocese, traria ainda em destaque o que Durval falou. Sim, não podemos dizer que é uma perda, porque é. A Diocese de Caraguatatuba tem 20 anos de criação. Nos últimos dez anos, ela perdeu a presença de quatro congregações. É uma perda. É uma perda de um carisma de vida consagrada. Não é que a vida diocesana seja menos importante. Ela tem seu caminho e ela deve testemunhar o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo. Seguir a Cristo obediente, pobre e casto, da mesma forma. Mas o carisma de vida religiosa é um dom único que Nosso Senhor confere à Igreja. Nós prosseguiremos com a presença de quatro, apenas quatro comunidades de vida consagrada em toda a Diocese. Eu estou acostumado com a vida missionária também e isso me chamou a atenção quando fui chamado a assumir a Diocese.  A pouca presença de vida consagrada é o desafio que nós temos enquanto Diocese”, reconheceu o bispo.

Dom José falou, então, sobre os novos padres que chegam. “Tenho certeza que o Pe. André e o Pe. Floriano,  entenderam o que aqui foi testemunhado. Eu peço muito a eles que olhem com carinho o que aqui foi declarado. Eles não têm a consagração franciscana, mas o Pe. André tem toda a sua formação franciscana. Ele é sacerdote diocesano mas é franciscano de formação. Então, acredito que não haverá problema nenhum e nem conflito em compreender a comunidade que tem um coração franciscano e viveu 361 anos neste estilo de vida. E, de fato, o Papa Francisco, assume pelo próprio nome a necessidade que a Igreja volte a viver o Evangelho de forma mais concreta e mais presente neste mundo. E uma dessas formas, sem dúvida alguma, é ao estilo do Pobrezinho de Assis, de São Francisco de Assis”, destacou.

Pe. André (à esq.) e Pe. Floriano assumem a Paróquia Nossa Senhora do Amparo

“Igual como os discípulos, lá se vão eles para outras terras de missão. Os freis não estão indo embora. Estão passando para nossas mãos a missão de continuar anunciando o Reino e o faremos graças ao Espírito Santo que eles imploram sobre nós. O testemunho de vidas missionárias que por aqui passaram não vai embora, mas permanecerá para sempre nos corações daqueles que acolheram a mensagem e hoje se responsabilizam em continuar com o mesmo zelo, com a mesma dedicação. Os freis nos ensinaram a sermos grão de trigo que não se fecha em si mesmo, guardando suas energias para si, mas morre no silêncio da terra e produz muito fruto. Nossa eterna gratidão à Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil”, enfatizou.

“Então, Durval, eu concordo com você. É perda, mas que o Senhor abençoe nossa Diocese, nossos sacerdotes, para que a gente não perca, na esteira da evangelização, esse jeito de viver o Evangelho. Na simplicidade, e no total despojamento, como é o exemplo dos freis que nos estão deixando em nossas mãos essa responsabilidade. Muito obrigado a vocês, obrigado à Paróquia de Nossa Senhora do Amparo. Continuem e não abandonem o coração franciscano, porque é um coração que ama o Evangelho como Jesus quer”, exortou, terminando com um “Paz e Bem”.


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