Frei Luiz Iakovacz
Os cristãos de Jerusalém – tendo ainda na memória, os significativos fatos da Paixão, Morte e Ressureição de Cristo – celebravam a Páscoa com jejuns e penitências rigorosos, solidarizando-se, assim, com o Cristo sofredor e ressuscitado. Os últimos momentos de Jesus, vividos em Jerusalém, causaram impacto tão grande que, incialmente, só celebravam esta festa e, era este também, o conteúdo fundante da evangelização.
Nos quatro Evangelhos, igualmente, ocupam lugar de destaque (Mt 21,1 – 27,46; Mc 11,1 – 15, 57; Lc 19, 28 – 23,56; Jo 18,1 – 19,42). Com o passar dos anos, esse tempo ficou sendo conhecido como “Semana Santa”, por causa do Cristo e da salvação que trouxe à humanidade. Em si, é uma semana como as demais e, para nós, será “santa” na medida em cada um se aproximar dos exemplos que Cristo nos deixou. Caso contrário, será, apenas, mais uma entre as 52 do ano.
No Getsêmani, os evangelistas sinóticos relatam os sentimentos que se passaram no íntimo de Jesus: “Começou a entristecer-se e angustiar-se” (Mt 26,37), “ficou apavorado e angustiado” (Mc 14,33), “e, entrando em agonia, rezava com mais insistência” (Lc 22,44). Por isso, pedia aos apóstolos “fiquem comigo porque minha alma está em aflição mortal” (Mt 26,38). Sua oração era uma só: “Pai, afasta de mim este cálice, mas não seja feita a minha vontade, mas a tua” (Mt 22,42).
O retrato que podemos fazer de Jesus, a partir destes textos é de um homem, interiormente, perturbado e, exteriormente, abandonado. Onde foi buscar forças para deixar-nos exemplos de grandeza ímpar, quase irrealizáveis por um ser humano?! Chama de “amigo” quem o trai com um beijo (Mt 26,50); livremente, se apresenta para ser preso, para que os outros partissem em paz (Jo 18,8); não revidou às violências físicas, às humilhações e provocações (Mc 14,53-65); ao apóstolo que o negou, dizendo que não o conhecia, olha-o com misericórdia (Mt 26,69-75); consola o grupo de mulheres que foram solidarizar-se com seus sofrimentos (Mt 23,27-28); pede que cuidem da mãe (Jo 19,25-27). Acima de tudo, a grandeza de perdoar seus malfeitores (Lc 23,34) e, num grande grito de abandono, entregar-se nas mãos do Pai (Mt 27, 45-46).
Podemos insistir, novamente: onde Cristo foi buscar forças para, em nenhum momento, se perturbar e descontrolar-se, seja nas palavras ou gestos?! O caminho que Cristo percorreu é o mesmo que propõe aos discípulos: “Quem quer ser meu discípulo, renuncie-se a si mesmo, tome sua cruz e me siga” (Mt 16,24). Este itinerário é composto de três verbos conectados entre si, mas em sequência cronológica. O primeiro passo é a renúncia de si. Se esta não acontecer, por mais leve que seja a cruz, ela será sempre pesada. Ao contrário, quem sabe renunciar-se, por mais pesada que seja a cruz, o discípulo põe-se a caminho e vai até o calvário da sua morte/ressurreição.
O exemplo da renúncia está em Jesus Cristo, no Getsêmani. O seu íntimo estava perturbado, agitado e numa tristeza mortal. Pediu ao Pai para que o livrasse – e o Pai não atendeu. Mas o Filho repetia: “Pai, faça-se a tua vontade”. Aqui está a renúncia de si mesmo: não é desmerecer-se, mas reconhecer-se criatura, abandonando-se, totalmente, nas mãos do Criador. Ao abandonar-se, por inteiro, nas mãos do Pai, aquelas densas inquietações foram se dissipando e Ele, livremente, se oferece como Cordeiro Pascal.
Em todos os momentos, não se perturba nem se altera. Uma personalidade perfeitamente equilibrada. O centurião, que deverá ter acompanhado outros processos de morte, percebeu que Cristo fez a diferença e, na sua sapiência, percebeu que nenhum ser humano é capaz de chegar ao fim de sua missão, só com suas próprias forças. É preciso convencer-se que a obra é de Deus. O Pai de Jesus Cristo recompensa, infinitamente, aquele com quem pode contar e “sofre” quando encontra resistência à invocação “seja feita a vossa vontade, assim na terra como no céu”.