Vida Cristã - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

Saúde & Religião

20/09/2002

                                                                                                                                                  Imagem ilustrativa (fonte: Canva)

Frei Hipólito Martendal

Vivemos numa época realmente interessante e riquíssima em transformações e oportunidades. Não tenho espaço para deter-me longamente sobre este tema atraente. Mas uma coisa é certa. O ritmo de transformações está tão acelerado que assusta aos que disso têm mais consciência e em todos causa pelo menos forte ansiedade. Muitos sentem medo e até chegam a ataques de paranoia. Afinal, num passado tão próximo tudo caminhava tão lentamente. Por quantas dezenas de milhares de anos perambularam nossos antepassados pelas savanas da África, colhendo frutos silvestres, caçando e sendo caçados pelas feras, sem qualquer animal doméstico e sem saber cultivar nenhuma planta alimentícia! E depois de alcançar a Europa a Ásia, tendo chegado a última era glacial, por quantos milhares de anos tiveram de refugiar-se em cavernas para evitar o frio mortal e as feras agora mais do que nunca famintas e mortíferas? Nem sempre nossa realidade foi poética e romântica. Tennyson falava de uma “natureza, rubra em dentes e garras…”

Há menos de dez mil anos os primeiros homens começaram a cultivar os primeiros grãos para alimento e aí tudo começou a andar, lentamente de início, até chegar aos nosso dias, quando em 10 anos aparecem mais novidades do que nos 50 anos anteriores e em 100 mais do que em todos os milhares de anos que nos antecederam. Então tudo ficou tão pouco natural e complicado! A cidade cresceu e ficou estupidamente grande e insegura. Você não planeja e não vê a construção do apartamento que sonha um dia poder alugar ou comprar. Antigamente todo mundo entendia dos cuidados básicos da saúde e acreditava conhecer remédios, naturalmente, naturais que curavam quase toda a sorte de doenças. Agora, a Medicina ficou tão complicada e os médicos, de amigos da família, ficaram tão distantes, falam tão difícil e sua ciência já nem parece ser deste mundo.

Numa palavra, o ser humano de hoje voltou a sentir o medo. Não mais o pavor dos dentes das feras, mas das balas dos traficantes de drogas e outros bandidos comuns. (Talvez um dia eu ainda escreva sobre razões que nos trouxeram até esse ponto de insegurança e medos coletivos.) Somos agora movidos pelo medo e pela saudade. Medo da insegurança, do desemprego, da pobreza abjeta. E saudades de uma harmonia de convivência com a natureza (nem sempre tão harmônica assim). Pesticidas que permitiram a fantástica produção e indústria agrária nos países mais avançados e hormônios que permitiram o crescimento rápido e mais barato de animais de corte agora povoam a mente de nossa gente como fantasmas ameaçadores, pois, entre outras coisas, podem causar os mais diversos canceres…

Agora, a palavra de ordem é apenas um adjetivo, mas poderosíssima palavra: Natural. As informações mais lidas nos rótulos são: Produto Natural… Sem Defensivos Agrícolas… Sem Hormônios… Sem Colesterol. No campo da saúde até parece que o homem moderno produziu mais inimigos que benefícios. Muitos movimentos de Pastoral chegam até a mover guerra aberta a toda sorte de remédios de laboratórios. Só querem remédios naturais e, no máximo, homeopatia. Claro está que ocorrem muitos exageros. Entre todas as ciências, a Medicina e a bioquímica permitiram a tremenda explosão demográfica, reduziram a mortalidade infantil de 200 a 300 mortes por mil crianças nascidas para 05 ou 06 por mil em países prósperos e a expectativa de vida para algo em torno de 80 anos, na média, nestes mesmos países.

Lá falava-se de uma mania de procurar sempre o que é natural e denunciava-se até movimentos de pastoral que movem guerra aos remédios de laboratório e à medicina alopática. De medicina só aceitam a homeopática. Claro que isso é exagero. Não é correto fazer generalizações indevidas numa ciência mundialmente cultivada, admirada e tão seriamente estudada como a Medicina. Sua dedicação à pesquisa é um sonho fantástico e os resultados são absolutamente animadores. Calcula-se que cerca de 80% dos problemas de saúde que afligem os humanos são somatizações (= materialização) de problemas emocionais e do estresse. Esses males são eliminados com relativa facilidade pela fé, oração, visita a santuários e aos mais diversos curadores por toda parte. Em geral a cura é só ocasional, uma vez que a fonte geradora do estresse não é eliminado pelo curador.

Todas as enfermidades que têm como raiz problemas orgânicos, principalmente as doenças infecto-contagiosas, cânceres, AIDS e tudo o que pode pôr a vida em perigo, precisa de um bom médico, de medicina alopática e dos remédios produzidos nos melhores laboratórios. Em tais casos, em hipótese alguma, o recurso às mais diversas formas de “medicina alternativa” pode dispensar o tratamento clássico da medicina, do bom médico, do bom hospital. Por amor de Deus, não caia na tentação de ignorar a boa medicina, o bom médico, por causa das muitas denúncias de abusos praticados em farmácias, laboratórios e hospitais. Muitas empresas quebram por má administração financeira. Nem por isso você vai deixar de cuidar bem da administração de sua empresa, de suas finanças. O mesmo vale para a sua saúde e medicina.

Mas, afinal, qual a área de interesse comum entre religião, medicina e saúde? Por que tantas paróquias têm Pastoral da Saúde? Tenho certeza de que muitos profissionais da saúde não vêem com bons olhos, ou pelo menos não acreditam muito nos resultados práticos da Pastoral da Saúde. Gosto de apontar uma pastoral ligada à saúde que dá resultados mundialmente reconhecidos e elogiados. É a Pastoral da Criança.

Mas aqui ocorre um fato interessante. A Pastoral da Criança tem uma profissional da saúde há muitos anos em sua direção. Trata-se de uma médica pediatra, Dra. Zilda Ars. Trabalha com bom embasamento em ciências sociais e ciências médicas. Creio que aqui está um exemplo a ser seguido. Onde quer que se tente organizar uma Pastoral da Saúde dever-se-ia contar com a colaboração, de preferência participando da direção, de elementos católicos com boa formação acadêmica na área de saúde. A religião por si só não aumenta nossos conhecimentos sobre saúde e doenças.

Aparentemente não existe nenhuma relação entre a religiosidade, a fé e o surgimento de doenças, principalmente os males com herança genética, como os cânceres, muitos problemas cardíacos, circulatórios e as assim chamadas doenças mentais. O mesmo vale para enfermidades infecto-contagiosas. Costumo brincar que vírus e bactérias não conhecem sua fé. Lembro também grandes homens de fé e caridade ceifados pela peste. Santa Isabel da Hungria foi ceifada aos 24 anos, cuidando pessoalmente dos doentes do hospital por ela construído com a quase totalidade de seus recursos materiais. São Luís de Gonzaga faleceu aos 23 cuidando dos empestiados de Roma!

Temos, contudo, que reconhecer a diferença entre a origem da doença e seu desenvolvimento depois de instalada. Há doentes que mais facilmente desanimam, entregam-se e morrem. Outros são firmes na esperança, creem na cura, lutam mais e, mesmo em doenças não-curáveis, vivem mais tempo. Aqui entram a fé e as devoções. Pesquisas dos Estados Unidos e Reino Unido comprovam que práticas religiosas simples como a oração do terço e sobretudo a meditação diminuem o consumo de oxigênio, o ritmo respiratório, o ritmo cardíaco, a pressão arterial e aumentam as ondas alfa do cérebro. Ora, isso significa diminuição do estresse e aumento na serenidade do espírito. Do sono e conseqüente bem-estar, o que é muito saudável. Mas isso não é suficiente para curar câncer, depressão, epilepsia, tuberculose e outras doenças sérias.

Outro assunto importante é a origem das doenças. Temos que deixar bem claro: todas as enfermidades começam por razões naturais e nunca por coisas do além, ou sobrenaturais. Mesmo assegurando a origem natural para todos os nossos males, temos ainda de excluir causas naturais que são fruto de superstições. Mau olhado, astrologia, pensamentos e sentimentos não têm o poder de causar malefícios nos outros. Pensar em, ou falar a palavra “câncer”, não atrai esse mal a ninguém. Também temos certeza de que trabalhos de macumba, vodu, ou qualquer ritual espiritual para prejudicar alguém são totalmente inúteis. A única coisa que podem causar é medo (com todas as suas conseqüências) em pessoas muito crédulas e supersticiosas. E atenção! Nenhum ser humano tem o poder de prejudicar aos outros através de maldição, sortilégios ou orações. Deus jamais aceitaria servir de vara de castigo para pessoas que não praticam a compreensão e a caridade para com o próximo. Todas as maldições são inúteis, mesmo que sejam pronunciadas por pais ou autoridades religiosas.

O diabo não tem poder de causar doenças. Deus não lhe daria tal força. É certo que antigamente, nos tempos bíblicos, praticamente todas as enfermidades eram atribuídas aos maus espíritos. Aliás, os antigos imaginavam o mundo povoado por espíritos maus e bons e praticamente tudo o que acontecia aos humanos era determinado por espíritos. Coisas boas como bons pensamentos, sentimentos nobres eram gerados por espíritos benévolos. Os ciúmes de Saul pelo sucesso de Davi, a febre da sogra de Pedro, assim como todas as enfermidades eram gerados por espíritos ruins. Nada se sabia a respeito da química das emoções, nem de micróbios, bactérias e vírus. Coisas semelhantes ainda pensam protestantes e católicos pentecostais, umbandistas, espíritas e outros.

Antes de terminar por hoje, quero ainda garantir que Deus não castiga nem prova a ninguém. Ele conhece tudo a nosso respeito. Não precisa de provas. Não é distribuidor de doenças. Se o fizesse, seria muito injusto. Basta comparar os níveis de saúde e a duração de vida nos países do Primeiro Mundo, bem menos religiosos e mais materialistas, com a mortalidade e doenças dos países pobres, mais religiosos e menos materialistas.

A maior parte dos problemas de saúde do Terceiro Mundo é causada pela pobreza, falta de investimento em educação e sistema hospitalar, ignorância, sujeira, desânimo… numa palavra, são fruto de nossas injustiças. Atribuir à vontade de Deus seria blasfêmia.

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