Imediatamente após a divulgação da Exortação Apostólica Amoris Laetitia (A Alegria do Amor), o padre jesuíta e teólogo Antonio Spadaro, SJ, diretor da Revista La Civiltà Cattolica, publicou uma análise muito pertinente e perspicaz sobre o documento, a partir da qual proponho esta breve reflexão.
Como primeira observação, cabe ressaltar o contexto que deu origem ao documento. A Exortação é fruto de um processo sinodal, no qual a Igreja – através da reunião de seus pastores, devidamente assessorados por peritos e outros convidados – se debruça sobre um tema relevante da atualidade. Em relação à família, foram dois sínodos: um extraordinário, com o tema “Os desafios pastorais em torno na família no contexto da Evangelização” (05-19/10/2014), e outro ordinário, “Jesus Cristo revela o mistério e a vocação da família” (04-25/10/2015), este segundo contando com a assessoria direta de Frei Antonio Moser, OFM, confrade de saudosa memória morto tragicamente numa tentativa de assalto no dia 09 de março. Merece também menção o documento preparatório, composto por um amplo questionário enviado às Igrejas particulares e que abordava questões delicadas em torno da situação das famílias em nosso tempo.
Segundo elemento a ser destacado é que se trata de um documento com abordagem predominantemente pastoral, marcado por uma profunda preocupação de ir ao encontro de situações e pessoas concretas, sempre numa postura de escuta, misericórdia e acolhida, na esperança de abrir a todos o caminho da Salvação e do encontro com Jesus Cristo. “É uma exortação sobre o amor, não sobre a doutrina do matrimônio”, explica o Padre Spadaro. Sendo assim, uma das palavras-chaves é discernimento, levando-se em conta a consciência e a historicidade, ou seja, pressupondo-se o chão da realidade, a experiência concreta, os sofrimentos e as vitórias de cada pessoa. Para além de insistir em questões doutrinais, bioéticas e morais, o Papa sonha que a Igreja apresente o matrimônio como um caminho dinâmico de crescimento e realização, deixando espaço à consciência dos fiéis (Cf. AL 36). No Capítulo VIII, no qual convida à misericórdia e ao discernimento pastoral diante das situações que não respondem plenamente à proposta do Senhor, Francisco destaca três verbos que devem nortear a postural eclesial: acompanhar, discernir e integrar.
A terceira e última observação diz respeito ao tom positivo e propositivo do Papa Francisco. Mais uma vez ele convida a Igreja a sair de si e erguer a cabeça para, junto com os homens e as mulheres da atualidade, contemplar um caminho de esperança, percebendo na família e na vocação matrimonial uma opção realizadora e cheia de sentido, um caminho seguro para o encontro com o Deus de Jesus Cristo. É um documento longo (09 capítulos e 325 parágrafos), mas merece ser lido e estudado com paciência, carinho e atenção por nossas comunidades.
Frei Gustavo Wayand Medella, OFM
Artigo publicado na Revista “Vitória”, da Arquidiocese de Vitória, ES