Vida Cristã - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

Ação missionária permanente

19/10/2020

Frei Robson Luiz Scudela

Há tempos, num contexto cristão, estávamos acostumados a restringir a palavra missão a uma realidade bem específica. A compreendíamos como aquela ação evangelizadora realizada em terras “infiéis”, onde o cristianismo ainda não havia chegado. Derivado desta palavra, tínhamos “o missionário”, isto é, o apóstolo, o cristão que realizava a missão. Atualmente, a palavra missão (missionário) tomou um novo sentido.

É possível justificar esta mudança por duas razões. A primeira é que a sociedade atual não se encontra mais na era da cristandade com a sua regra “o homem nasce cristão”. Com isso, é possível encontrar, em todos os lugares, alguém a quem o anúncio da Boa Nova não lhe tenha chegado. A segunda, a mais relevante para a nova evangelização, é que o cristão de hoje redescobriu que o ser missionário é dimensão fundamental do ser cristão.

Podem-se ver hoje homens e mulheres que estampam em camisetas seus atestados de batizados com afirmações do tipo “eu sou cristão”, ou ainda, “eu sou católico”, mas que estão distantes da vivência missionária. Este é um dos vírus do cristianismo hodierno que causa apenas sintomas leves. Um vírus que não permite ao cristão uma relação pessoal com Jesus Cristo, de onde surge e se fundamenta a ação missionária cristã.

A relação pessoal com Jesus Cristo leva o cristão a um amor totalmente pessoal e íntimo com Ele, não sendo esse amor mera ideologia ou vago estágio de ânimo, mas sim um constante amadurecimento na identidade cristã, inovada diariamente, pois, de fato, “sempre somos cristãos para nos tornarmos cristãos”, como diria Karl Rahner. Sendo assim, diante dos atuais sinais dos tempos e da relação pessoal com Jesus Cristo, a dimensão missionária é retomada como expressão necessária do cristianismo, daquilo que cada cristão é e daquilo que é chamado a ser, o que poderia ser resumido na expressão do Papa Francisco: “Eu sou sempre uma missão”.

Deus: origem da missão

A missão cristã tem sua origem em Deus e em sua manifestação em Jesus Cristo. É ele o missionário por excelência, Aquele que por primeiro se doa ao outro para lhe comunicar algo. Essa é uma das bases da fé e da experiência cristã. Deus, em seu amor e em sua autocomunicação, desejou “missionar-se” em direção à humanidade e o desejou enquanto criatura, tornando-a livre para que, nesta liberdade, pudesse-lhe dar um sim, e nesta sua resposta se colocar ativamente em sua missão de criatura.

A dinâmica missionária de Deus, evento no mistério do amor trinitário, sinaliza à criatura o modo de se concretizar a missão. A Trindade, comunicando-se mutuamente e em unidade, manifesta-se à criatura humana numa missão que não se faz fechada em si, a partir de uma comunidade isolada, mas aberta à toda criação.

Diante deste desejo de Deus de se comunicar e tornar-se próximo, a criatura humana é convidada a sair de si, de seu isolamento e aproximar-se do Mistério. Aqui, encontra-se a mística missionária, onde Deus vem ao encontro da criatura humana, manifestando-Se a ela, e a ascese missionária, onde a criatura sai de si e vai ao encontro de Deus. Uma experiência concreta de fé.

Crise missionária como “hora de Deus”

A consequência deste encontro com o ser missionário de Deus é a crise missionária da criatura. Essa ajudará a criatura a realizar uma missão que parta da experiência de Deus, privada dos interesses pessoais. Não conta mais a “minha missão”, mas a experiência missionária de Deus.

Uma experiência neste sentido leva a criatura a rever a sua vida e perceber qual é o envio missionário que lhe é dirigido. A criatura humana se dá conta de que Deus a estima e lhe pede algo que somente ela lhe pode dar. Tal experiência, todavia, nunca será um fechamento entre Deus e a criatura individual. Isso seria criar um Deus muito pessoal, um ídolo, muito distante do Deus que tem uma história com o seu povo e foi revelado de maneira tão clara em Jesus Cristo.

A ação missionária, que passa pela crise como hora de Deus, chega ao anúncio do verdadeiro Deus. Leva a criatura humana a passar do “deus-ídolo”, criado facilmente pelos seus quereres humanos, para reconhecer que Deus é quem age em toda a ação missionária. E faz, ainda, a criatura sair do “de-eus” (eu fiz, eu construí, eu, eu…) para reconhecer que é Deus quem age através dela (Adm 12).

“E depois que o Senhor me deu irmãos”

A condição fundamental para se realizar a missão desejada por Deus, e não aquela querida pela criatura individual, é a presença da fraternidade. A fraternidade não permite que Deus se reduza a um ídolo pessoal e nem mesmo que a missão seja condicionada a quereres pessoais. É a presença do irmão que purifica a experiência pessoal, visto que Deus se revela a todos e na partilha desta revelação individual, pode-se compreender melhor o Mistério.

Para isso é necessário sair da chamada “pobre comunicação fraterna” porque esta não abre espaços para a confiança nem para a liberdade de partilhar entre os irmãos o rosto de Deus, revelado a cada um dos membros da fraternidade. Será isso que permitirá à fraternidade purificar cada vez mais a sua experiência de Deus, levando-a ao encontro de toda a criação, tornando-a missionária, direcionada àqueles que são os preferidos de Deus, os últimos. Em resumo, pode-se constatar que o diálogo fraterno prepara os irmãos para traduzirem aos últimos a experiência de Deus.

Surge aqui uma fraternidade missionária sensível para perceber que Deus não faz distinção, mas chama a todos para que se aproximem Dele. Perceber isso em fraternidade abre caminhos à participação de todos na missão. Algo experimentado inicialmente na vida Fraterna e que passa a ser partilhado com toda a humanidade, ou seja, com os leigos que entram em contato com a fraternidade missionária. A fraternidade missionária, por sua vez, se torna cada vez mais capaz de traduzir para a realidade local a mensagem do Evangelho que conduz todos ao encontro de Deus.

Ação missionária como formação permanente

A ação missionária torna-se, deste modo, lugar de formação permanente, ou, ainda, termômetro da formação permanente, uma vez que ela revelará três realidades: a primeira é de como cada um dos irmãos se encontra em sua experiência de Deus; a segunda é o quanto o diálogo fraterno é a marca da fraternidade; e a terceira é de como a fraternidade é sinal de Deus para o mundo. Ou seja, a ação missionária evidencia como se encontram as três realidades da vida fraterna: o remetente, o destinatário e a mensagem.

No remetente, tem-se o cristão missionário (o religioso) que é o portador da mensagem própria da ação missionária, no caso, Jesus Cristo e a experiência de Deus. Ao remetente caberá sempre um questionamento sobre seu próprio modo de se relacionar com a mensagem e com o destinatário. Provocações que não apenas exigem esforços racionais, mas fazem com que o emissor questione também sua sensibilidade missionária em relação à mensagem e ao destinatário. O destinatário, de início, são os membros da fraternidade, que o ajudarão a discernir se tal mensagem já estaria traduzida para chegar ao destinatário final: o pobre.

Toda a ação missionária em fraternidade é formação permanente, pois através dela os irmãos aprendem a celebrar e a agradecer juntos pelo dom comum da vocação e da missão. Aprendem a aceitar o caminhar lento dos mais fracos, levando a Fraternidade ao respeito e à solidariedade. E, por fim, levando a fraternidade a realizar sua missão conforme os seus próprios dons, conduzindo todos ao crescimento na experiência de Jesus Cristo que conduz a Deus.

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