Vida Cristã - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

A democracia americana entre a sinodalidade e a Regra franciscana

11/01/2021

Pietro Messa

Os democratas venceram as eleições presidenciais norte-americanas de 2020; em 14 de dezembro, o eleitorado escolheu Joe Biden como presidente dos EUA; em 6 de janeiro, na sessão do Congresso dos Estados Unidos, proclamou-se sua eleição, enquanto em 20 de janeiro de 2021 começa oficialmente o mandato.

Alguns apoiadores do presidente cessante, Donald Trump, manifestaram-se no Capitólio e invadiram-no causando confrontos com até alguns mortos. Uma ferida que não é pequena para a democracia dos Estados Unidos, frequentemente alardeada como um modelo para outros países; um fato não extemporâneo e que, portanto, exigirá um trabalho paciente por parte dos republicanos e dos democratas, isto é, de todas as partes – das quais deriva o termo “partido” – da sociedade.

A este respeito vem à mente o documento “Sinodalidade na vida e na missão da Igreja” (http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/cti_documents/rc_cti_20180302_sinodalita_it.html), publicado pela Comissão Teológica Internacional em março de 2018 depois de receber o parecer favorável do Papa Francisco. Com efeito, o número 119 indica a sinodalidade não só como caminho eclesial, mas também como diaconia, ou serviço social: «A vida sinodal da Igreja oferece-se, em particular, como diaconia na promoção da vida social, econômica e política dos povos em sinal da justiça, da solidariedade e da paz. Deus, em Cristo, resgata não só a pessoa individual, mas também as relações sociais entre os homens. A prática do diálogo e a busca de soluções partilhadas e eficazes em que «compromete-se a construir a paz e a justiça como prioridade absoluta numa situação de crise estrutural dos processos de participação democrática e de desconfiança nos seus princípios e valores inspiradores, com o perigo de derivas autoritárias e tecnocráticas».

Em termos políticos, poderíamos dizer que uma visão sinodal é a capacidade de vencer sem oprimir, ou seja, deixar às minorias a oportunidade de dar a sua contribuição. Em nível eclesial podemos recordar as diferentes sensibilidades do Papa João XXIII e do Cardeal Alfredo Ottaviani, secretário do então Santo Ofício, que também resultaram em verdadeiras tensões; ainda assim, ele não foi removido por Roncalli, o papa que estabeleceu o Conselho Pontifício para a Promoção da Unidade dos Cristãos e criou seu primeiro presidente, o cardeal jesuíta Augustin Bea. A escolha de João XXIII poderia ser considerada uma estratégia da política eclesiástica, mas se se leem suas anotações, se entende que sob essas escolhas havia uma visão teológica da Igreja que é um único Corpo com muitos membros no qual se é chamado a viver a unidade na diferença.

Neste processo sinodal, cuja beleza é “a harmonia das partes excelentemente coloridas” (São Boaventura de Bagnoregio), ao qual a Igreja, mas também a sociedade e a política, é chamada, encontra neste 2021 um novo estímulo a partir do oitavo centenário da redação da “Regra não Bulada” dos Frades Menores. Na verdade, este texto – que após nova redação será definitivamente aprovado em 1223 pelo Papa Honório III – é o resultado do encontro, troca, e até confronto entre os frades reunidos em capítulo na Porciúncula, que é a pequena capela de Santa Maria dos Anjos na planície de Assis. Ali pode-se ver a contribuição do Frei Francisco de Assis, mas também a integração bíblica de Frei Cesário da Spira; há extensões, mas também inserções negativas com proibições de comportamentos não adequados à escolha evangélica.

Conforme destacado há alguns anos pelos estudos coordenados por Gert Melville sobre as instituições religiosas medievais da Universidade de Dresden, o estudo e a comparação com as regras religiosas podem revelar nelas elementos úteis para enfrentar os desafios e as ocasiões do momento presente.

Sem presunção, pode-se dizer que a situação política atual nos Estados Unidos, mas não só, pode encontrar impulsos e solicitações por uma vida democrática mais madura precisamente na Regra franciscana, cujo oitavo centenário se celebra neste 2021.


Pietro Messa, fadre da Província de Assis (Itália), é professor de Teologia e História do Franciscanismo na Pontifícia Universidade Antonianum, em Roma, com diversas publicações na área.

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