Vida Cristã - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

Ajuda espiritual e ajuda psicológica

20/09/2002

Frei Hipólito Martendal

“De alguma forma o padre trabalha com dados mais objetivos que o psicólogo.
Enquanto isso, para o psicólogo é mais importante a subjetividade do cliente”.

Neste artigo quero abordar aspectos práticos de psicologia e religião no que se refere à ajuda que o indivíduo recebe, mas tendo em vista principalmente o psicológico e o religioso na mente daquele que oferece ajuda.

É muito comum pessoas religiosas procurarem padres para orientação em problemas que são claramente de ordem psicológica.

Claro que destas pessoas algumas há que imaginam sejam seus problemas de ordem espiritual e espera que o padre saiba lidar com todos os problemas espirituais, quando na realidade suas dificuldades podem ser claramente de ordem natural, psíquica e relacional. Nossos irmãos espíritas, praticantes do candomblé, de umbanda e outros; bem como cristãos pentecostais protestantes e católicos, com muita facilidade atribuem à invasão ou à presença de espíritos maus (demônios), almas de pessoas falecidas e que não estariam em paz e entidades africanas, principalmente exu, a causa de desordens de comportamento e de mudanças de personalidade. Tais pessoas vão procurar o padre, o centro espírita, o pastor ou o pai-de-santo, quando na verdade poderia ser muito mais proveitoso procurar um bom psicólogo e de preferência se ele conhecer este universo místico de nossa cultura religiosa.

Mas também é comum pessoas católicas que sabem estarem sofrendo de algum problema de ordem psíquica fazerem questão de encontrar um psicólogo padre, ou pelo menos bom católico, para ajudá-las. Eu costumo dizer que o psicólogo bem experimentado pode ajudar quem o procura, independente de suas convicções religiosas. Vamos explicar isto e estaremos justamente no centro da questão de hoje.

Demos agora uma rápida olhada para o trabalho do psicólogo, do padre e do religioso que tentam ajudar quem os procura. Em primeiro lugar percebemos que o padre e o religioso trabalham basicamente com dados da Fé, convicções religiosas e teológicas. Trabalham com dogmas, revelações divinas e valores. Eles não têm obrigação de serem cientistas. De outro lado, o psicólogo tem obrigação de ser bem versado em ciências. Quanto mais cientista ele for, melhor para seu cliente. Ele trabalha basicamente com convicções de ordem científica.

Contudo, é evidente que se o psicólogo entender a teologia que está na raiz das convicções religiosas de seu cliente isto pode ser uma qualidade a mais. Mas insisto em dizer que isto não é essencial. Já prestei ajuda a espíritas, protestantes, umbandistas, judeus e ateus e creio ter-me saído bem. Por quê? Porque sou um padre e psicólogo, ou seja, esforço-me para ser um teólogo e cientista ao mesmo tempo. Como padre (religioso e teólogo), quando procurado por alguém que tem a mesma religião que eu, depois de ouvir tudo o que ele tem a dizer e certificar-me de que entendi corretamente seu pensamento e suas dificuldades, posso então comparar sua realidade com aquilo que a nossa religião, a nossa Igreja tem a dizer e a esperar dele.

Trabalho com Fé, dogmas, mandamentos e doutrinas certas. Além desta correção doutrinária é de se esperar que o sacerdote, ou o conselheiro religioso, seja também um bom pastor, isto é: que ame aquele que o procura, que tenha por ele um coração cheio de compreensão e misericórdia, que represente tanto quanto possível a infinita bondade do coração de nosso Deus. De alguma forma o padre trabalha com dados mais objetivos que o psicólogo. Enquanto isso, para o psicólogo é mais importante a subjetividade do cliente. Interessa-se mais pela forma como a pessoa se relaciona com os dados de sua fé e, principalmente, como ele é tocado, afetado e modificado pelos dados religiosos.

A título de exemplo, se meu cliente é muçulmano, o conteúdo objetivo de sua fé não me interessa muito. Mas é fundamental compreender como a fé muçulmana, suas obrigações religiosas e sua comunidade de culto atingem sua mente, seus sentimentos e emoções. Em outras palavras, importa saber se a vida religiosa que leva está tornando-o mais saudável, mais feliz, ou se o contrário é a verdade.

O psicólogo é um agente de saúde. É a saúde, o bem-estar, a qualidade de vida que importam em primeiro lugar.

Julgo importante voltar a este tópico e aprofundá-lo. Realmente estou convencido de que não só o psicólogo, mas também o padre precisa ter a qualidade de vida das pessoas às quais serve como objetivo número um de sua atividade.

O bem-estar no seu todo deve ser objeto de cuidados de quem serve o irmão, tanto no psicólogo, no sacerdote, como em qualquer religioso. Como afirmava anteriormente, preocupo-me com a forma pela qual a religião afeta o espírito, a mente, o pensamento, as atitudes, ou seja, o modo de viver da pessoa.

Por si mesmo, o bem-viver é excelente alimentador da saúde. Minha impressão é a de que muita gente imagina que a religião só pode fazer bem. Ouço muitas vezes a observação: “Está faltando religião”, quando pessoas se referem a situações de famílias desagregadas, de conflitos, de dependência de drogas etc.

Mas tenho observado também que muitas vezes as convicções religiosas podem ser pouco saudáveis, ou até diretamente prejudiciais. São frequentes as notícias de pessoas religiosas fanáticas e intransigentes, de brigas e divisões em famílias por religião, de perseguições e condenações e até à morte de pessoas religiosas dissidentes. A praga maior que ataca as religiões, as guerras, ainda não desapareceu. Durante muitos séculos cristãos e muçulmanos combateram-se com imensa violência e ferocidade, chegando às
vezes ao verdadeiro genocídio, isto é, ao aniquilamento de populações inteiras.

Os dois lados se entregavam às piores formas de violência de que o ser humano é capaz – o genocídio – em nome de Deus, pela grandeza de sua religião. Aqui, a religião toma o lugar de Deus e se toma a pior das idolatrias. Não acredito que se possa imaginar algum mal pior que isso.

Nunca podemos esquecer: qualquer religião, para ser boa, necessita estar a serviço do bem-estar das pessoas, de todas as pessoas. Só através desta via, a religião serve a seu Deus, pois Ele sempre ama por meio de “serviços” que presta às suas criaturas.

Ao mesmo tempo que é criador da vida, Deus é também seu mantenedor e alimentador. Hoje ainda vemos guerras religiosas, ou guerras políticas e étnicas com conteúdo também religioso. Entre nós, ainda temos os exemplos deploráveis de católicos e protestantes às turras na Irlanda do Norte.

Na ex-lugoslávia brigam católicos croatas, cristãos ortodoxos sérvios e muçulmanos bósnios e albaneses. Em países árabes, muçulmanos e xiitas não se entendem. Entre nós, cristãos, quase todas as igrejas pentecostais e também grupos católicos falam muito mal de outras igrejas, principalmente das religiões afro-brasileiras e do espiritismo.

Temos igualmente muitas igrejas que exploram demais o bolso de seus fiéis, levando muitos a contribuir com mais do que poderiam. Isso é injusto e desumano, pois apela-se para Deus e pessoas, movidas por profundas emoções religiosas, sacrificam a si e aos seus familiares além do bom senso. São pastores a servirem-se do rebanho e não a serviço das ovelhas. É a inversão do próprio sentido da religião. Tudo se faz em nome de Deus. O Deus da vida, da misericórdia e compaixão infinitas transformam-se, na cabeça de pobres irmãos nossos, num Deus marcial (de Marte, deus da guerra) da vingança e da morte.

Não se pode imaginar maior blasfêmia. Todos estes religiosos confundem o que há de mais importante e de autêntico em qualquer religião. Ao invés de servir para o bem-estar de toda criatura humana, o ser humano é sacrificado, muitas vezes cruelmente, à religião. A religião se toma ídolo que exige sacrifícios humanos, sangue, lágrimas e morte.

Uma de minhas convicções básicas é a de que o modo de ser do próprio Deus deve determinar o modo de eu organizar minha vida pessoal e minha forma de relacionar-me com as outras pessoas. Tudo o que desvia deste princípio vem do Mal e causa males a muitos. Toda forma de religião que traz transtornos à vida das pessoas, que as desune e gera ódio, deve ser mudada, ou abandonada. Esses tipos de religião são piores que religião nenhuma.

Como recomendação de leitura indico os Evangelhos de São Mateus, 12, 1-21 e João, 10, l -18. A figura que Deus aplica a si próprio é a do Pastor bom que trata, cuida e defende a ovelha. Vale a pena meditar também Jeremias, 23, 1-6 e Ezequiel , 34, 2-6. Cuidar, ajudar e defender é função de qualquer pessoa que tem alguma religião, que acredita em Deus.

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