Aquele que tem sede aproxime-se; e o que deseja beba gratuitamente da água da vida
(Apocalipse 22,17).
Ano novo, vida nova, novo entusiasmo, vontade de recuperar o que se foi perdendo ao longo da peregrinação devido às nossas indolências. O tempo que nos é dado percorrer no tempo da vida é limitado. Dias hão de vir em que não veremos mais o explodir dos fogos nem poderemos brindar a chegada do ano novo com uma garrafa de espumante na Praia de Copacabana, na Avenue des Champs Elysées e no Central Park de Nova York. Ano novo e vida nova. Alento, coragem. E coragem vem de coração. Vem também do peito rasgado do Senhor Jesus.
Como anda nosso viver? Até que ponto o Cristo Jesus vai acompanhando as etapas de nosso existir e as estações de nossa caminhada? Temos sede Cristo ou já nos acomodamos a tudo, achando que tudo está bem assim e pronto, sem mais, sem questionamentos, sem o perfume da novidade de Deus?
Quando nos auscultamos de verdade notamos que temos sede de plenitude. Não queremos e não podemos nos contentar com um relacionamento correto, mas sem alma, com o Mistério da Beleza que anda sempre a nos seduzir e cativar. Ele quer nos levar para o deserto, para a verdade de nós mesmos, para satisfazer uma sede de plenitude, do amanhã, de uma vida esplendidamente humana e parecida com a de Jesus.
Os satisfeitos com tudo e com a vida não atingem a plenitude humana e cristã. Costumamos, muitas vezes, nos dar por satisfeitos com as coisinhas da vida de todos os dias. Não podemos, no entanto, domesticar o Evangelho. Nada de catolicismo de manutenção. Jesus amou até o fim e, lá no alto da cruz, “inventou” uma fonte de viço e de vida de seu coração, de seu lado aberto pelo soldado. Um fonte que vem saciar essa bendita sede de plenitude.
“Precisamos redescobrir a bem-aventurança da sede. A pior coisa para um crente é estar saciado de Deus. A vida espiritual na rotina das suas expressões, torna-se uma dose suficiente e tornarmo-nos conformistas, não queremos mais. Dizemos para conosco: já fomos ao templo, já subimos a Jerusalém, já rezamos, já oferecemos o sacrifício, e isso nos desobriga dos encontros fundamentais com a fantástica e desconcertante surpresa de Deus. Talvez tenhamos criado imagens equívocas da vida cristã: um crente não aquele que está saciado de Deus; o crente é aquele que tem sede e fome de Deus. A experiência da fé não é para resolver a sede, mas para ampliá-la, para dilatar nosso desejo de Deus, para intensificar nossa busca. Talvez precisemos nos reconciliar com nossa sede, dizendo mais vezes: “a minha sede é minha bem-aventurança” (José Tolentino Mendonça, Elogio da Sede, Paulinas, p. 146).
Há uma fonte jorrando do alto da cruz, da brecha aberta em seu peito pela lança do soldado!
Frei Almir Guimarães