Seja feita a Tua vontade: Frei João Zechinatto será Ordenado Presbítero
29/08/2025

“Uma vocação não é patrimônio de uma só pessoa, uma vocação é resultado da vida de fé de uma comunidade e de tantas pessoas que são ‘história’ e são ‘participantes’ na vida de um vocacionado.”
Assim, Frei João Zechinatto iniciou sua resposta quando lhe foi pedido que deixasse uma mensagem aos jovens vocacionados durante a entrevista que pode ser acompanhada nesta publicação.
Este conteúdo foi produzido para que possamos conhecer um pouco mais desse jovem que, em breve, se tornará presbítero, mas que sempre será o servo de Deus que, como frade franciscano, cumprirá sua missão em favor da paz e do bem.
Inspirados pelo lema “Seja feita a tua vontade” (Mt 6,10), a Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil e Frei João convidam a todos para sua Ordenação Presbiteral, no dia 6 de setembro, às 17h, na Igreja Matriz de São Benedito, em Amparo (SP).
Depois de percorrer uma importante etapa formativa e de encontro com Deus no ambiente provincial, o frade está pronto para confirmar mais um sim a uma vocação já marcada pela vida fraterna, pela minoridade e pelo seguimento do Cristo pobre e crucificado, pelas mãos de Dom Luiz Gonzaga Fechio, Bispo Diocesano de Amparo.
Mas ele não estará sozinho em sua cidade natal, pois, além de seus confrades, seus familiares, convidados e amigos estarão todos unidos para celebrar este momento único da Ordenação Presbiteral, que marcará ainda mais profundamente a escolha pela caminhada religiosa de Frei João.
A fala do frade aos vocacionados, mencionada logo no início deste texto, reflete o que está em seu coração e em seu espírito franciscano, pois o presbiterado não retira o frade da vida comum, mas o insere ainda mais profundamente nela, oferecendo seus dons para animar a fraternidade e fortalecer a missão evangelizadora.
Na entrevista, Frei João Zechinatto apresenta mais detalhes sobre sua escolha de vida e sobre sua missão franciscana. Acompanhe abaixo.
Site Franciscanos – Na sua vida, qual o sentido do seu lema de Ordenação, tirado do Evangelho de Mateus: “Seja feita a tua vontade” (Mt 6,10)?
Frei João Zechinatto – Houve um frade alemão que viveu muitas décadas em Amparo, minha cidade natal, Frei Wenceslau Schepper. Era muito amigo da minha família e muito querido pelo povo da minha Comunidade de origem. Em muitos almoços nos domingos, ouvi atento suas histórias da Alemanha, das guerras, das dificuldades e desafios do passado e aquilo me marcou profundamente. Ele devia perceber o meu interesse e quando me tornei coroinha, na missa de Natal de 2000, ele me convidou para ser frei. Fiquei com esse convite na cabeça e sem nem muito entender passei a dizer para quem me perguntava o que eu queria ser quando crescer, que eu queria ser “frei”. Vim a descobrir que o lema de ordenação presbiteral de Frei Wenceslau foi esse “Seja feita a tua vontade”. Passei a tomar esse trecho da oração do Pai-Nosso como um norte e uma inspiração ao longo da formação inicial como frade menor e, agora, próximo da Ordenação Presbiteral escolhi esse versículo como lema para este ministério. É uma homenagem a este frade que tanto me inspirou e ainda me inspira, mas também, um propósito que busco, com muita sinceridade e luta, como norte para este serviço à Igreja, ao povo de Deus e a Jesus Cristo, nosso Senhor.
Site Franciscanos – No dia 6 de setembro será sua Ordenação Presbiteral. O que esse momento significa para você?
Frei João Zechinatto – Nestes últimos dias, estive em Retiro de preparação para a Ordenação e um frade já mais idoso me disse: “está pronto para servir ainda mais?” Isso ressoou profundamente em mim. Embora estejamos felizes por celebrar esse momento, é fundamental recordar que o ministério ordenado, enquanto desdobramento da vocação batismal, é uma forma de profundo serviço que se espelha do exemplo do próprio Cristo. O Senhor Ressuscitado e o seu Evangelho são inspirações indispensáveis aos serviços na Igreja, todos devemos ser servos dos mistérios de um Deus da vida e de um Deus que busca acolher a todos no seu projeto de salvação. Creio que a Ordenação Presbiteral acentua uma vocação acolhida a pedido da Igreja, da Província e do Povo de Deus e reforça a responsabilidade de uma missão em profunda intimidade com o Mistério Pascal do Senhor. E aqui, penso “responsabilidade” na raiz da palavra latina “respondere”, somos provocados a uma resposta no hoje, também com um olhar para o que veio antes. Celebrar essa Ordenação é responsabilizar-se para algo novo e profundo, mas é também a resposta da história de uma comunidade de fé, dos frades, familiares e amigos; e ao olhar para essa “atrás” busco a garra de iniciar o amanhã que desponta no horizonte, tendo como fundamento o serviço humilde e esperançoso; sempre rezando o lema proposto para esse momento: “seja feita a Tua vontade”!
Site Franciscanos – O que significa ser um frade franciscano?
Frei João Zechinatto – São Francisco é uma pessoa que exala “entusiasmo”, toda a sua vida é marcada por uma profunda obstinação por aquilo que a partir de Jesus Crucificado e o seu Evangelho iluminaram o seu coração e o seu existir. Entusiasmo é paixão, é animação, é perseverança, mas não podemos perder de vista a etimologia dessa palavra. “Entusiasmo”, do grego, é “estar cheio de Deus”, assim foi São Francisco, um homem entusiasmado, um homem cheio de Deus. Creio que o frade menor seja alguém chamado a ser cheio de Deus e se nos enchermos d’Ele, temos a missão de dividir o que de graça recebemos com os nossos irmãos e irmãs. Ser frade menor é buscar esse entusiasmo pela vida, nas mais simples e singelas coisas, poder maravilhar-se pelo viver e pelas coisas que nos rodeiam. Inspirados em São Francisco, ser um frade menor é dar sentido à vida, porque cheios de Deus vamos nos dando conta de que só Ele é o sentido pleno e só com Ele as coisas da vida têm suas cores mais belas.
Site Franciscanos – Frei João, sua ordenação como presbítero ocorre num ano cheio de significados, estamos no Ano Jubilar da Encarnação, ano dos 800 anos da composição do Cântico das Criaturas e dos 350 anos de Criação da Província da Imaculada Conceição do Brasil. Qual o impacto desses acontecimentos em um momento tão significativo da sua vida religiosa?
Frei João Zechinatto – Eu tenho uma profunda admiração pela “história” enquanto fenômeno e suas implicações simbólicas na nossa vida. Acho sempre interessante e formidável esse fato tão humano de entrelaçar as questões da nossa vida e dar significados a elas. O Ano Santo é um tempo de graça por excelência, tempo de lembrarmos da encarnação do Senhor, algo tão singular na história e no tempo que precisamos anunciar e vivenciarmos com intensidade para assim estarmos mais próximos do próprio Evangelho, núcleo das Escrituras. Nesses tempos de crises e incertezas com relação ao futuro do próprio planeta é o canto de um santo do tempo medieval a poesia que sintetiza um modo de ser necessário e urgente para a história de quem estamos nos fazendo e de quem queremos ser. O “Cântico das Criaturas” é no meu ver o nosso “canto mais atual”, pois é a mudança da nossa relação com a Criação que dirá do nosso futuro. Francisco deu o tom: somos todos irmãos e irmãs numa Fraternidade Universal! E os 350 anos da nossa Província é a oportunidade de celebrar essa história de séculos de irmãos que construíram o sonho de uma fraternidade de Paz e de Bem entre o nosso povo. Se vivemos num tempo conturbado e tumultuoso, reforço que essas datas fortes nos lembram algo fundamental: nossas celebrações são respostas ao mundo! Celebrar a fé, nossa história e nosso carisma é uma resposta para o nosso tempo. Nessas celebrações recobramos a força, a esperança e qual o sentido daremos a história que queremos escrever!
Site Franciscanos – O seu convite traz uma ilustração do artista colombiano Julían García. O que o motivou na escolha desta imagem?
Frei João Zechinatto – No final do ano passado vi essa pintura e ela me prendeu a atenção. Notei que dos muitos elementos presentes na arte, estão os três principais da espiritualidade franciscana: o Presépio, a Cruz e a Eucaristia. Creio que a um frade, essa tríade é fundamental para a atualização do nosso carisma e ajuda-nos a intuirmos nossa mensagem espiritual para os nossos tempos. Nesta arte, o Senhor da Vida vem como menino, cheio de uma ânsia esperançosa de futuro, sua manjedoura é uma árvore, símbolo da vida que luta por frutificar. O pão e o vinho estão próximos a Ele. Maria e José o envolvem e apontam para Ele, mas o vislumbre da Cruz já o adorna. As cores são também vivas, muito próprias do nosso povo latino. Foi uma pintura que me chamou a atenção pela riqueza dos detalhes e é aquela máxima: “percebemos na arte muito mais a nós mesmos, do que as intenções do artista”.
Site Franciscanos – Como é para você voltar à sua terra natal para esse momento especial de sua caminhada vocacional na Igreja e na Ordem?
Frei João Zechinatto – Uma vocação não é patrimônio de uma só pessoa, uma vocação é resultado da vida de fé de uma comunidade e de tantas pessoas que são “história” e são “participantes” na vida de um vocacionado. É lindo a resposta litúrgica que dizemos no início da Celebração Eucarística: “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo”. É o amor de Cristo que nos une e nos reúne; é ele também que nos chamou a essa vida, nos sustentou até aqui e nos conduzirá pelos caminhos a serem seguidos! Voltar para junto dos meus familiares, amigos e da minha comunidade natal é voltar para onde aprendi a celebração do amor, da fé e da esperança. É celebrar com eles uma vocação que nasceu com eles e se tornou o que é, graças a eles! É estar em união com a Igreja, porque não nos fazemos para nós mesmos, mas para um projeto universal, assim como a tradição define a Vida nova em Cristo. É estar junto dos meus confrades, meus irmãos que me ensinam sempre que o sonho de Francisco de Assis é possível e real! Reunidos todos nesse amor de Cristo, sinto-me honrado e com o coração cheio de gratidão, mesmo também me sentindo tão pequeno e não merecedor de tantas graças, mas é olhando além que repito com o salmista: bendirei o Senhor em todo o tempo!
Site Franciscanos – Qual mensagem você deixaria para os jovens que são vocacionados à vida religiosa franciscana e, assim como você, querem que também seja feita a vontade de Deus em suas vidas?
Frei João Zechinatto – Uma das questões que vejo no presente em que vivemos é talvez a dificuldade de compreender o que é o todo do “tempo da nossa vida”. Vivemos “momentos” e “instantes”, mas eles dizem de um recorte da vida e não da vida pensada em sua inteireza. Discernir uma vocação é buscar ler os instantes e os momentos, porém, já vislumbrando o quê do todo da vida pode ser empreendido. A vida franciscana é bela, profunda e grandiosa e ela fala à vida, na sua máxima grandeza. Se eu desse um conselho aos jovens em processo de discernimento vocacional, ele seria: “aonde você, lá na frente, quer estar? Quando você olhar para as décadas da sua vida, o que você imagina ou gostaria de ver? Veja além do agora e pensando no todo, como você o vê? ” A vida é uma construção e, facilmente, nos esquecemos disso, por isso, os instantes e momentos estão à serviço de um tempo de vida muito maior. Assim, uma vocação acertada é uma vocação que vê além das questões menores, que não se prende às dificuldades. Gosto do pensamento do Guimarães Rosa que diz: “o que tem de ser tem muita força”. Não desanimemos nas adversidades e tropeços, pois o Reino de Deus está sempre acontecendo. Ele não é um evento distante, mas é a presença viva de Deus que já germina no coração do mundo. Para percebê-lo é preciso tempo e vida: tempo para silenciar, escutar e discernir os sinais; vida para se gastar em amor, justiça e misericórdia. O Reino cresce na simplicidade dos gestos de paz, na partilha que vence a indiferença e na esperança que resiste ao desânimo. Quem se abre a esse mistério descobre que o Reino não é apenas instante futuro, mas realidade que pulsa aqui e agora, em cada momento e instante do pulsar dos nossos corações.
Adriana Rabelo Rodrigues


