Guardiães e Coordenadores das Fraternidades se encontram em Agudos
08/05/2025
Agudos (SP) – A Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil reuniu de 5 a 7 de maio de 2025, no Seminário Santo Antônio de Agudos (SP), os Guardiães e Coordenadores de Fraternidades para um encontro marcado pela escuta, pela partilha e pela formação em todas as dimensões do serviço fraterno. Ao longo de três dias, frades de diversas casas partilharam desafios, memórias, rezaram juntos e receberam formações canônicas, espirituais, econômicas e pastorais, preparando-os para servir com misericórdia e comunhão as fraternidades a eles confiadas. Confira, a seguir, os principais momentos vividos ao longo desses dias.
Encontro com os novos guardiães
No dia 5, no período da tarde, o primeiro momento do encontro foi reservado aos novos guardiães do triênio, que, em breves relatos, traduziram em palavras a missão que abraçaram: “Atenção constante”; “Desafio e confiança”; “Mútuo conhecimento e paciência”; “Escuta e convivência fraterna”; “Fraternidade com o diferente”; “Desafio e cuidado de si mesmo”; “Escutar, dialogar, discernir”. Destacou-se ainda a tarefa de animar a todos para a santidade: “Ajudar todo mundo a ser melhor; responsabilidade que todos se santifiquem”.
Esse bloco inaugural evocou os escritos de São Francisco que mencionam os Guardiães – da Carta a um Ministro (vv. 12, 14), da Carta a toda a Ordem (v. 17) e do Testamento (vv. 27, 30) – sublinhando que o “serviço da guardiania com a obediência” e o gesto do lava-pés modelam uma autoridade que brota da comunhão e do serviço mútuo.
À noite, já com todos os frades presentes, Frei Paulo Roberto Pereira, Ministro Provincial, descreveu o encontro como um espaço de formação permanente com recordação das celebrações e de tudo aquilo que já foi vivenciado. “Este é também um espaço de escuta, de reflexão e de fecundas partilhas. É preciso escutar os clamores, as urgências”, disse.
Favorecer o bem da fraternidade e dos frades
Já no dia 6, a Santa Missa, às 7h, na capela interna do Convento, foi presidida por Frei Gabriel Dellandrea, frade mais jovem, que é Guardião e Reitor do Convento da Penha. Em sua homilia, para refletir sobre o Evangelho do dia (Jo 6,30-35) ele partilhou uma experiência que vivenciou no Convento São Francisco (SP):

Frei Gabriel
“Certa vez, no Convento São Francisco em São Paulo, percebi que apenas um frade não usava óculos. E era justamente o mais idoso da casa. Eu me aproximei dele e comentei isso. A resposta foi: ‘não estou ouvindo direito, estou sem o aparelho do ouvido’. Concluí: quando nos faltam ou são limitados os sentidos, precisamos de recursos para ajudá-los. A experiência de fé é justamente isso. Sob o olhar sem a perspectiva da fé a Eucaristia é só pão. Sem o aparelho de audição da fé a Sagrada Escritura é só um livro. Mas nós vemos e ouvimos essas duas realidades sob a ótica de quem crê. E assim também queremos, como Guardiães, olhar nossos irmãos sob a perspectiva da fé: são irmãos necessários, companheiros de caminhada”, refletiu.
Em seguida, já na sala do encontro, Frei Rodrigo Silva Santos conduziu a formação sobre “Ministério e Autoridade Local”, fundamentada nos Cânones das Constituições Gerais que recordam ao guardião seu poder ordinário, porém sempre condicionado ao voto de obediência e à consulta ao Capítulo Local. Foram ressaltados: “A natureza evangélica da obediência, ‘entrega da própria vontade’ que imita Cristo servo (CCGG, art. 185); o ofício do guardião como “favor de bem da fraternidade” (CCGG 237, cân. 618), que exige ‘vigilância sobre a vida e disciplina religiosa’ e ‘promoção da obediência responsável’.
- Frei Rodrigo
Organização e tarefas fraternas
Após o almoço, o grupo debruçou-se sobre a “Distribuição das tarefas da fraternidade”: cronista, secretário do capítulo, bibliotecário, ecônomo local, animador do SAV, além de deveres relacionados à cozinha, jardins, obras e acompanhamento de irmãos enfermos. Discutiu-se a importância de esclarecer quem é referência em cada ofício e de promover transparência e corresponsabilidade, garantindo que todos tenham voz e apoio.
No encerramento do dia, Frei Robson Luiz Scudela, Ecônomo e Definidor provincial, fez a apresentação contábil da Província com a prestação de contas e compromisso de caridade. Frei Rafael Spricigo, presidente do Conselho Fiscal, leu a ata e atentou para a necessidade de transparência contínua.
Evangelização, minoridade e proteção
No último dia do encontro, 7 de maio, Frei Estevão Otenbreit presidiu a Celebração Eucarística às 7h. Na homilia, baseou-se no discurso de Jesus que afirma ser o “Pão da Vida” (Jo 6), dividindo sua reflexão em duas partes: fé e Eucaristia:

Frei Estevão
“Eis que diariamente [Jesus] se humilha. Diariamente ele vem a nós em aparência humilde. Assim como ele se manifestou aos santos apóstolos na verdadeira carne, do mesmo modo também nós, vendo o pão e o vinho com os olhos do corpo, vejamos e creiamos firmemente que é vivo e verdadeiro o seu santíssimo corpo e sangue”, refletiu.
“Ver, vir, crer. Para que nossa Eucaristia seja realmente frutuosa, devemos primeiro entrar nessa dinâmica de aceitação de Jesus Cristo, de adesão à sua forma de vida. A Eucaristia tem um significado pleno quando é celebrada na fé e movida por essa fé. E ambas devem durar por toda a vida segundo Cristo. Crer em Cristo. Comer Cristo. Viver como Cristo”, proferiu o frade que é o guardião mais experiente.
Já na sala de reuniões, os frades receberam Frei Daniel Alejandro Fleitas Zeni, por videoconferência, que conduziu uma formação que retomou o cerne da espiritualidade franciscana: a fraternidade como dom e missão.

Frei Daniel
Inspirando-se no Testamento de São Francisco, ele lembrou que o santo reconheceu “a graça, dom dos irmãos” entre as maiores graças recebidas de Deus. Segundo Frei Daniel, “para Francisco, neste contexto e depois de quatro ou cinco anos de busca solitária, os irmãos eram verdadeiramente ‘a graça do Senhor’. Dessa forma, o Senhor concedeu a Francisco a Igreja, uma comunhão de irmãos na fé, para que ele pudesse seguir o caminho do Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo. Francisco não só recebeu companheiros de viagem para amenizar a dureza e a angústia de sua solidão; além disso, Francisco recebeu irmãos para compartilhar o caminho evangélico e isso é duplamente ‘graça’.”
Em seguida, o frade franciscano destacou a inevitabilidade do conflito na vida comunitária, lembrando que a fraternidade “nasce à sombra da cruz de Jesus. De fato, na entrega kenótica de Jesus na cruz, todos nós nos reconhecemos como irmãos.” Para Frei Daniel, conflitos, dores e cruzes não contradizem a graça, mas a atestam: “o conflito não nega essa interpretação gratificante de nossas vidas: ele a torna possível, ele a canaliza precisamente porque o conflito verifica a graça, ele a torna credível”.
O encontro prosseguiu com a ênfase na alegria e no caráter festivo da vida fraterna. Frei Daniel evocou a “doçura do corpo e da alma” e a celebração como sinal da presença do Senhor Ressuscitado entre os irmãos, antes de afirmar que “ser e fazer irmãos, viver como irmãos e acolher nós, como irmãos, é a primeira e a última coisa que fazemos em nossas vidas.” Para ele, essa identidade não se desliga ao fim do dia: mesmo fora da fraternidade, “sempre serei um irmão e somente um irmão”.
No encerramento, o formador sublinhou a dimensão processual e permanente do chamado franciscano, lembrando que “bater às portas da fraternidade significa chegar sem pressa, sem querer passar imediatamente ao ‘nível superior’, permanecendo sempre abaixo, no aprendizado humilde e cotidiano da fraternidade e da minoridade”. E concluiu com o eco do Espelho da Perfeição: “Não existe irmão mais novo sozinho: todos precisamos uns dos outros, e a presença do irmão me complementa, e minha presença, embora eu a considere pobre e desprezível, possibilita ao outro seguir o caminho de sua vocação; O encontro harmonioso (ou contrastante) de muitas liberdades torna possível a fraternidade”.
Logo após, houve uma partilha sobre o Fundo de Solidariedade da Província, que destina 10% dos rendimentos do trabalho dos frades à caridade. Citou-se alguns recentes projetos aprovados, como para a XIII edição da Caminhada Franciscana da Juventude, que fomenta a participação de jovens com dificuldades financeiras.
- Frei Gustavo
- Frei Paulo
Em seguida, Frei Gustavo Wayand Medella, Vigário provincial e Secretário para a Evangelização, apresentou diretrizes para o Secretariado de Evangelização, sublinhando o serviço inspirado no lava-pés (Jo 13,1-15), a sinodalidade missionária e a “amizade com os pobres”. Ele lembrou dos responsáveis pelas Frentes de Evangelização garantindo articulação entre frentes e os trabalhos.
Já no período da tarde e em sintonia com o Conclave para eleição do 267º Papa, Frei Paulo Roberto refletiu sobre a “Proteção na Igreja e na Ordem”, por meio da Política Provincial de Proteção, atenção a menores e vulneráveis, prevenção de abusos de autoridade e correções éticas.
Centro de Pesquisa e Referência Cultural da Província
Frei Alvaci Mendes da Luz, Reitor da Universidade São Francisco (USF), apresentou o recém-criado CEPRI (Centro de Pesquisa e Referência Cultural da PFICB). Segundo ele, foi no dia 5 de fevereiro de 2025 que a Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil (PFICB) oficializou a criação do CEPRI, sediado no campus da USF. Reúne uma equipe técnica especializada e corpo administrativo próprio, com a missão de proteger, examinar e divulgar o vasto acervo cultural das fraternidades franciscanas da província.
Desde sua fundação, o CEPRI estruturou-se em três frentes de trabalho: Arquivo Histórico da Província Franciscana – preservação de documentos, correspondências e registros que narram a presença franciscana no país desde os primeiros conventos; Reserva Técnica Central — espaço climatizado para a guarda de peças raras e sensíveis, instalado no campus da USF em Bragança Paulista; Acervos Setoriais – núcleos de patrimônio mantidos nas próprias fraternidades de origem, garantindo acesso local e manutenção sistemática.
Segundo Frei Alvaci, “o termo ‘acervo’ não se limita a objetos antigos: ele engloba todo material – livro, pintura, peça litúrgica, fragmento arquitetônico – que contribui para a identidade e a memória viva de nossas comunidades”. A partir dessa visão ampliada, o novo organismo propõe-se a levar adiante diversas linhas de ação, como por exemplo oferecer suporte a projetos de restauração, catalogação e digitalização, tanto para a PFICB quanto para órgãos externos interessados em patrimônios relacionados;
Para garantir um início robusto, o CEPRI definiu um cronograma de implantação em fases. Neste ano, os trabalhos são de diagnóstico das condições de acervo e identificação das necessidades; nos segundos e terceiros anos, avança para o inventário completo e estudo aprofundado de cada coleção, preparando a base para intervenções de conservação e digitalização.
“Mais do que guardar relíquias, é nosso dever assegurar que esse patrimônio inspire novas gerações a viver o carisma de São Francisco, mantendo viva a memória de nossa história”, resumiu o frade.
Frei Ivair Bueno de Carvalho, presidente da Fundação Imaculada Mãe de Deus de Angola (FIMDA), também partilhou a sua experiência com a Missão em Angola, destacando os desafios e as graças vivenciadas pela fraternidade local. “Dentro do amadurecimento institucional no início do triênio nos propomos a caminhar juntos em sinodalidade, com o espírito da Igreja, estando atentos a qualidade de vida fraterna, que se corrige, e atentos as necessidades uns dos outros, ouvindo uns aos outros nas alegrias e tristezas, com um testemunho de vida fraterna e minoridade. Também nos comprometemos a fazer uma organização econômica com transparência”, disse Frei Ivair.
Segundo o presidente da FINDA, a maioria dos frades da fundação são jovens. Para ele, é necessário estar atento ao compromisso que assumimos com a fraternidade e como fraternidade. “Observando esses caminhos que foram dados no início do triênio imbuídos do Espírito e seu santo modo de operar nota-se a necessidade, segundo os sinais dos tempos, de um reflorescimento carismático do modo de ser como franciscano”, ressaltou.
No final do encontro, Frei Paulo Roberto comunicou a data e local da Celebração Eucarística de Abertura do Ano Jubilar da Província, em comemoração aos 350 anos de fundação. Será no dia 15 de julho, às 10h, no Convento Santo Antônio, Largo da Carioca (RJ).
O encontro provou novamente ser um momento de formação, partilha e decisão. Dos desafios pessoais dos novos guardiães às grandes questões canônicas, econômicas e pastorais, os três dias em Agudos revigoraram o compromisso franciscano de governar “como quem serve”, apontando para uma autoridade que descansa no cuidado, na misericórdia e na escuta constante. Ao retornar a suas fraternidades, cada guardião e coordenador levará consigo não apenas decisões práticas, mas uma renovada paixão por conduzir seus irmãos “como companheiros de caminhada” rumo à santidade e à verdadeira comunhão.
Frei Augusto Luiz Gabriel