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Frei André: “O fervor missionário é fermento vocacional”

06/12/2018

Entrevistas

Enquanto estava de férias no Brasil, o paulista de Ilha Solteira (SP), Frei André Luiz da Rocha Henriques, falou de sua experiência como missionário na Fundação Imaculada Mãe de Deus de Angola, onde está residindo desde 2016. Frei André nasceu no dia 5 de março de 1984 e ingressou na Ordem Franciscana no dia 8 de janeiro de 2005. Foi ordenado presbítero no dia 27 de abril de 2013, na Igreja Nossa Senhora Aparecida, em Nilópolis (RJ), pelo bispo Dom Luciano Bergamin, CRL, bispo de Nova Iguaçu (RJ). Filho de Luiz Firmino e Conceição Aparecida da Rocha Henriques, Frei André tem como irmãos Flávia Marcela da Rocha e Clóvis Assis da Rocha e uma tia materna, Luiza Aparecida, que é deficiente mental e tem sua mãe como tutora.

O jeito calmo e tranquilo de Frei André tem origem nos pais e avós do interior de Minas Gerais. “Em vista de um crescimento profissional, meu pai foi trabalhar em uma barragem hidrelétrica em Ilha Solteira (SP), onde nascemos meus irmãos e eu. O nome da barragem acabou sendo bem significativo, pois somos de fato ‘Três Irmãos’, sendo eu o do meio. Devido ao trabalho do meu pai, mudamos de cidade constantemente, permanecendo em algumas cinco anos; em outras, um ano e meio; e até mesmo um único semestre em Assis (SP)”, conta Frei André, lembrando que sua história vocacional se desenrola quase exclusivamente em Cândido Mota (SP), cidade vizinha de Assis, última cidade onde morou com os familiares e onde eles resolveram fixar residência.
“Minha paróquia de origem é capuchinha, assim como o era também na minha cidade natal. Meus irmãos foram batizados por um frade capuchinho, enquanto eu fui batizado em Minas Gerais por um padre diocesano. Foi justamente esta convivência próxima com os frades capuchinhos a minha primeira experiência relacionada à vida religiosa. Quando eu tinha por volta dos meus quinze anos, comecei a frequentar com maior assiduidade as missas semanais e outros encontros de oração e pastoral. Falando sobre vocação com um frade capuchinho, ele me aconselhou a terminar os estudos na casa dos meus pais. Passado este tempo de amadurecimento, junto com alguns amigos, comecei a frequentar os encontros vocacionais na diocese e a visitar algumas congregações e ordens religiosas. Por indicação de um aspirante capuchinho, acabamos conhecendo a Ordem dos Frades Menores e a Província da Imaculada. Meus amigos e eu fizemos o acompanhamento vocacional no Seminário de Agudos e, em 2003, entrei para o Aspirantado, em Ituporanga (SC)”, recorda.

Frei André é um dos poucos frades que só tira o hábito franciscano para dormir. “Mesmo sem conhecê-lo, São Francisco sempre esteve muito próximo de mim. Lembro que no meu quarto sempre esteve um quadro da Terra Santa, onde figurava São Francisco, com o hábito da Ordem dos Frades Menores. Além disso, seja na minha cidade natal, seja em Cândido Mota, minha família sempre teve certa proximidade com os frades capuchinhos. Inclusive, meu irmão recebeu o mesmo nome de um frade, Frei Clóvis. Contudo, foi a leitura das Fontes Franciscanas na internet que me moveu definitivamente a buscar este carisma”, observou.

Ele mesmo se descreve como um “frade tímido, às vezes indeciso, e paradoxalmente muito teimoso”. Acrescento, humilde pelo testemunho que tem dado. “Tenho grande desejo de consagrar-me inteiramente à vontade de Deus, mas facilmente durmo na oração; sou um tanto dedicado à leitura e aos estudos, sem, contudo, poder ser considerado um intelectual; esforçado nos trabalhos pastorais e fraternos, ainda que nem sempre consiga dar conta do recado. Sou um religioso em formação… Queira Deus que eu chegue lá um dia!”, dizia na entrevista que deu por ocasião de sua ordenação presbiteral.  Acompanhe a entrevista a Moacir Beggo!

Site FranciscanosComo está sendo sua experiência missionária em Angola?

Frei André – Cheguei a Angola no dia 26 de abril de 2016 e, desde então, tenho residido na Fraternidade São Francisco de Assis no Bairro Palanca, em Luanda, capital de Angola. Não viajei muito pelas outras cidades; estive apenas uma semana em Quibala, onde temos o nosso Postulantado. Confesso que não tinha planos de me tornar missionário e que a missão surgiu como uma resposta a um apelo do visitador geral por missionários para a Fundação Imaculada Mãe de Deus de Angola (FIMDA), missão prioritária da nossa Província da Imaculada Conceição do Brasil. Porém, a missão tem me conquistado e gosto muito de estar lá. Há muitos desafios, mas com certeza vale a pena todo o trabalho de adaptação e de doação à missão. O angolano é um povo muito religioso, alegre e generoso. A convivência com os confrades brasileiros e angolanos, com as Clarissas e tantos religiosos e religiosas missionários de todas as partes do mundo é formidável e profundamente enriquecedora. A missão é uma experiência ímpar!

 

Site FranciscanosQual é o seu trabalho missionário? Como é sua rotina, se é possível falar assim?

Frei André – Sou assistente do Mosteiro Sagrado Coração de Jesus, da Ordem de Santa Clara; atendente do Kimbo São Francisco, um centro de acolhimento e oração que congrega milhares de fiéis todas as quintas-feiras e também em outros dias da semana; e vigário paroquial da Paróquia São Lucas, que possui seis comunidades, contando com a matriz, que atualmente está em construção. Nossas atividades pastorais giram em torno das missas diárias no mosteiro, Kimbo ou paróquia; formações com as Clarissas da comunidade permanente e inicial; formação, retiros e direção espiritual com formandos de algumas comunidades religiosas próximas; formação litúrgica e acompanhamento das pastorais e movimentos da paróquia; catequese, oração e escuta com os fiéis que frequentam o Kimbo; atendimento dos paroquianos na secretaria paroquial.

Site Franciscanos – Como é a religiosidade do povo angolano?

Frei André – O angolano dá grande importância à peregrinação aos santuários, e a procura pelo atendimento de escuta é bastante grande. Existe necessidade de poder contar os seus problemas, pedir um conselho, uma oração. Os grupos e movimentos apostólicos são numerosos, particularmente entre os jovens. Quando se trata de oração, o tempo parece não contar. É comum ver grupos reunidos em oração por manhãs ou tardes inteiras; sem contar o grande gosto pelas vigílias. Missa dominical de uma hora? Nem pensar! O angolano gosta de cantar, dançar e o que não faltam são grupos corais. Sãos inúmeros coristas, monitores, leitores, acólitos e peditoras. Parecem incansáveis quando se trata de animar uma missa. O único que se preocupa com o relógio acaba sendo o padre, que muitas vezes tem outra missa em seguida. Mas é impossível não se admirar com o empenho em ensaios e formações.

Site Franciscanos Como veem a presença franciscana em Angola?

Frei André – A presença franciscana é bastante antiga, marcada principalmente pelos capuchinhos, muito numerosos no país, que completaram este ano 70 anos da segunda presença missionária, sendo proclamada como Província em agosto de 2016. Existe uma grande devoção do povo ao Frei Benjamim Maiato, capuchinho angolano, que faleceu no ano passado aos 94 anos com fama de santidade, a quem tive a honra de conhecer. As Clarissas possuem três mosteiros: em Malange, Lubango e Luanda, sendo este último o mais numeroso. A Ordem Franciscana Secular (OFS) e a Juventude Franciscana (Jufra) estão espalhadas por quase todo o país; e são muitas as congregações franciscanas presentes em Angola. A nossa presença, por sua vez, vai crescendo, e o povo nos vê com muita estima. Nosso confrade, também falecido no ano passado, Frei Márcio Terra, sempre é recordado pelos fiéis do Kimbo e da paróquia. O povo tem muita devoção aos nossos santos e muito respeito pelo carisma franciscano.

Site FranciscanosComo você vê o “celeiro vocacional” em Angola?

Frei André – São muitos os fatores que favorecem a animação vocacional em Angola, como a taxa de natalidade, a religiosidade popular, os numerosos grupos juvenis etc. É admirável o número de vocacionados que, todos os anos, batem às nossas portas. Porém, isto exige de nós um maior número de formadores, bem preparados, que possam ajudar a discernir prudentemente e acompanhar eficazmente a caminhada vocacional de tantos jovens. Com o crescimento das seitas, é preocupante também o acompanhamento pastoral dos jovens, que acabam sendo alvo do proselitismo e das promessas ilusórias de prosperidade. A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. É preciso rezar para que o Dono da messe mande mais trabalhadores para a Sua colheita.

Site Franciscanos Em sua opinião, a Fundação está pronta para se tornar Custódia?

Frei André – Em muitos aspectos, a nossa missão já é mais do que uma simples Fundação. Temos atualmente cinco Fraternidades constituídas, dois padres angolanos, três diáconos e muitos confrades no noviciado, Filosofia e Teologia. Atendemos três paróquias e uma quase-missão, diversos projetos sociais e outras frentes de evangelização. A nossa presença já completa este ano 28 anos e a Fundação, seus 20 anos. É verdade que a missão carece de missionários e que ainda é muito dependente economicamente da Província, por conta das casas de formação, mas isso não a impediria de ser uma Custódia Dependente.

 

Site FranciscanosComo está Angola hoje, politicamente e economicamente falando?

Frei André – Angola vive um momento novo após a eleição presidencial do ano passado. A alternância no poder após 38 anos de governo do antigo presidente trouxe novos ares para o país, ainda que não tenha acontecido nenhuma mudança quanto ao partido no poder (MPLA). Existe maior liberdade de expressão, combate à corrupção e busca pela diversificação da economia, ainda muito atrelada ao mercado petrolífero. Angola é um país rico, mas com uma desigualdade social assustadora. Está em andamento o projeto de constituição das autarquias (eleição direta de governadores e prefeitos), que tem apoio da Igreja. Após o seu primeiro ano no poder, o Presidente João Lourenço goza de grande aprovação interna e externa.

Site Franciscanos Quais desafios para a Fundação hoje?

Frei André – O desafio da Província de continuar a enviar missionários, apesar do nosso declínio numérico e das tantas casas que precisamos fechar aqui no Brasil por falta de frades, apostando assim na dimensão missionária de nosso carisma. O desafio da Fundação de formar bem os seus frades e de consolidar suas frentes de evangelização, quer nas paróquias e centros de acolhimento, quer na educação, comunicação e projetos sociais. O desafio da Fundação de desenvolver meios de subsistência própria, alcançando assim a necessária autonomia econômica.

Site FranciscanosO que você diria para os frades e leigos que querem se tornar missionários em Angola?

Frei André – Sejam bem-vindos! A missão precisa de vocês. Mas também, de certo modo, nós precisamos da missão. Uma Igreja fechada à missão perde seu vigor, sua vitalidade evangélica. A nossa Ordem é fundamentalmente missionária. A missão faz parte da nossa identidade, de nossas raízes carismáticas. O fervor missionário é fermento vocacional. Nossos jovens querem ser desafiados. A missão nos desafia.