Notícias - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

A força da devoção a São Francisco das Chagas no Nordeste

14/09/2023

Notícias

Imagem: Santuário de Canindé

Como faz uma vez por mês, sempre em cada dia 13 (para lembrar e celebrar Santo Antônio), o Vigário Provincial, Frei Gustavo Medella, comanda o programa “Santo Antônio in Live”, diretamente do Convento Santo Antônio do Largo da Carioca (RJ). Os temas são quase sempre antonianos, mas neste dia 13 de setembro à noite, o tema recordou a Celebração da Impressão dos Estigmas de São Francisco de Assis, que será neste domingo, dia 17 de setembro.

Para falar desta Festa Franciscana, Frei Gustavo convidou o Mestre da Espiritualidade Franciscana, Frei Fidêncio Vanboemmel, que reside em São Paulo, na Sede Provincial, e Frei Francisco Rogério Sousa, do Santuário de São Francisco de Canindé, no Ceará.

Para contextualizar, Frei Fidêncio lembrou que a Festa da Estigmatização de São Francisco é muito significativa, não só para os franciscanos, mas para toda a Igreja. “Então, no dia 17, nós estamos celebrando aquele momento culminante na vida de São Francisco. Ele, ao longo de sua existência buscou a conformidade com o Santo Evangelho, impregnar este Evangelho dentro de seu coração. Nós sabemos que uma das páginas que ele gostava de meditar era justamente a do mistério da cruz, o mistério da Paixão do Senhor”, recordou.

Segundo o frade, São Boaventura, que chega a dizer “o angélico Francisco”, não se cansava na procura do bem. “Ou subia até Deus ou descia até os homens e nesse movimento ele estava fazendo a Quaresma de São Miguel no Monte Alverne, o monte que ele ganhou do conde Orlando de Chiusi em 1213, portanto em 1224, quando Francisco recebeu a Estigmatização, não foi a primeira vez que ele subiu ao Monte Alverne. Ou seja, subir até Deus para depois descer divinizado ao encontro das pessoas. Esta data que vamos celebrar dia 17 é justamente esse ponto culminante. Depois de várias subidas ao Monte Alverne, ele pergunta o que deveria fazer para se conformar com o amor do Cristo Crucificado, mas ele queria sentir na própria pele a mesma dor que o Cristo Crucificado viveu na sua Paixão. E isso foi concedido a Francisco no momento em que recebeu os Estigmas no Monte Alverne. Então, no dia 17, celebramos esta festa importante para a nossa Ordem Franciscana. Uma festa importante para a Família Franciscana, uma festa importante para toda a Igreja”, enfatizou Frei Fidêncio.

Frei Medella lembrou que São Francisco das Chagas é uma devoção muito forte no Nordeste, especialmente a partir do Santuário de São Francisco em Canindé e pediu para o frade da Província de Santo Antônio falar do surgimento desta devoção em torno deste Santuário.

“O Santuário de Canindé, assim como a maioria dos Santuários do Brasil, nasce da experiência do povo. Aqui, neste Santuário, a experiência começa em 1758, quando por aqui chegaram  terceiros franciscanos e daí se começa a devoção a São Francisco. Ela se inicia com uma reza que é feita nas casas das pessoas”, contou o frade do Santuário de Canindé, lembrando que já havia a vontade de ter uma capela dedicada ao Santo. “Enquanto isso, de casa em casa, a reza acontecia nas casas das pessoas”, acrescentou.

“Depois se conseguiu um espaço aberto à beira do Rio Canindé para fazer uma capela dedicada a São Francisco, no mesmo local que temos a Basílica hoje. O sr. Francisco Xavier de Medeiros, um terceiro franciscano, tinha a imagem de São Francisco que temos ainda no Santuário. Na construção da capela, aconteceu o que se considera um primeiro milagre quando o pedreiro que estava no andaime, caiu e, ao se valer de São Francisco, ficou dependurado numa tábua e não se machucou. Esse acontecimento foi considerado o primeiro milagre de São Francisco. A partir daí, começa um movimento popular que vai aumentar essa devoção. Isso sem a participação de padres ou frades. Era o povo mesmo que fazia suas rezas”, explicou. Frei Gustavo acrescentou: “Surgiu do coração do povo, confirmando essa vocação missionária intuída por São Francisco de Assis, essa vocação inclusiva, vocação ao diálogo e inculturação. Isso tudo a gente percebe na bonita história desta devoção”, observou.

A Ribeira de Canindé, local que veio a se originar na atual região onde fica o Santuário de São Francisco das Chagas de Canindé, teve sua origem registrada no dia 27 de fevereiro de 1731, sob o livro 11 e a sesmaria de nº 108 “em favor da nação Canindé”.

Frei Fidêncio lembrou que as Chagas de São Francisco não é um milagre isolado na vida de São Francisco e que é preciso ver todo o itinerário que o Santo de Assis fez como um todo. “Francisco ganhou essa montanha em 1213, mas bem antes disso devemos entender a cruz na vocação de São Francisco. Então, o primeiro grande sinal da cruz aconteceu no processo de sua conversão, quando ele era jovem, cheio de sonhos, quando ele estava a caminho de Espoleto. Lá nesta cidade, ele teve aquela visão do Castelo, onde as armas e armaduras estavam assinaladas com o sinal da cruz. A partir deste sonho, ele começa a se perguntar: o que eu devo fazer, para onde devo ir, o que queres que eu faça? E a voz misteriosa teria dito: ‘Volta para a cidade de Assis e ali será dito o que deves fazer’. E foi ali, em Assis, que Francisco se depara com a cruz de São Damião, que todos conhecemos, e dela recebeu um outro mandato, uma outra missão. Rezando naquela igreja, ouviu do Senhor: ‘Vai, Francisco, e restaura a minha Igreja!’. E daí para frente continua se questionando: O que essa voz, o que o Crucificado quer de mim? Foi logo depois de restaurar a Porciúncula que ele descobriu que deveria viver segundo a forma do Santo Evangelho: ir pelo mundo como discípulo de Cristo, anunciador do Crucificado, anunciador do livro da cruz, o livro dos Evangelhos. Caminhando, subindo aos eremitérios, aos lugares ermos, estando com os crucificados, ou como chamavam na época os ‘crucíferos’, que eram os leprosos. Então, havia essa identificação da Cruz com os crucificados da época. Francisco vai discernindo e restaurando igrejas e restaurando tudo aquilo que estava crucificado, excluído da humanidade”, explicou Frei Fidêncio.

Ele continuou: “Então, nesse caminhar, nesse aperfeiçoar no Evangelho, Francisco foi fazendo esse itinerário. E é muito interessante, como falava antes, que Francisco unia dois mistérios na vida dele. O mistério da Encarnação – nós hoje estamos celebrando 800 anos do Natal de Greccio – e, na sequência, ele vai para o Alverne, onde vive o mistério da Paixão de Cristo. Então, esse caminho que ele fez, de busca, de conformidade com o Senhor, São Boaventura define de uma maneira muito bonita. Ele diz que a cruz foi se revelando na vida de Francisco até ele chegar no Monte Alverne e, ali, ele define esse encontro de Francisco com Cruz como o ‘ponto culminante’. Estigmatizar-se é chegar ao cume da perfeição do Santo Evangelho”, completou Frei Fidêncio.

Frei Medella quis saber de Frei Francisco por que a devoção a São Francisco das Chagas toca tanto as pessoas, especialmente “o nosso povo simples do Nordeste”.

Segundo Frei Francisco, há uma identificação do povo com o Santo Chagado. “Ele é irmão dessa gente. Aqui em Canindé, as pessoas acreditam e têm essa certeza de que São Francisco caminha com eles. É o santo que está vivo, a partir da vivência da fé das pessoas. Então, as chagas que as pessoas carregam se identificam com o Santo das Chagas”, esclareceu o frade.

“Aqui, o Santuário é marcado pelas curas. Na Sala dos Milagres vamos encontrar muitas manifestações e agradecimentos por alguma cura. Além disso, os sofrimentos trazidos da vida humana, na realidade nordestina, que hoje é melhor, mas ficou marcado na vida das pessoas que não tinham uma casinha para morar, não tinham água para consumo e para criar os animais e plantar sua alimentação. Então, todos esses sofrimentos marcaram o povo do Nordeste, que recorre ao santo pobre e marcado com as Chagas, as chagas gloriosas do Cristo vivo. Isso está muito presente na vida do povo.  Olhar para o Santo e olhar para o povo é olhar a mesma face, a mesma busca de quem acredita em Deus”, completou o frade.

O Santuário de Canindé vai celebrar neste domingo as Chagas de São Francisco e a grande festa em honra ao Padroeiro vai começar no dia 24 até o dia 4 de outubro. O tema deste ano é: “São Francisco nos ensina a evangelizar em fraternidade”. “Nesta Festa de São Francisco das Chagas de Canindé vamos viver a fraternidade ensinada pelo Pai Francisco, nosso baluarte e guia nesta procissão cuja meta é Cristo”, explica Frei Gilmar Nascimento da Silva, OFM, Reitor do Santuário de São Francisco das Chagas.


Moacir Beggo