Frei Moser analisa primeiros dias do Sínodo da Família
08/10/2015
FREI ANTÔNIO MOSER
Após a solene abertura ocorrida no domingo, dia 4 e festa de São Francisco, todos os participantes do Sínodo aguardavam a outra abertura: a dos trabalhos. E estes trabalhos começaram naturalmente com dois grandes relatórios. Um primeiro, feito pelo Secretário Geral, Cardeal Baldisseri, nosso antigo Núncio, se constitui numa espécie de resgate histórico tanto dos passos já dados, quanto sobretudo das ideias mais importantes contidas no Instrumento de Trabalho. Com sua veia poética, de exímio músico, revelou também extraordinária facilidade de fazer uma leitura de 1 hora e meia, sem cansar ninguém. Não se ouvia nenhum cochicho sequer. E não era pela presença do Papa Francisco, que entrou discretamente, falou poucas palavras e ficou dê ouvidos bem abertos mas sem se mexer.
Após o intervalo de praxe, seguiu-se um segundo relatório, feito pelo Cardeal Erdo”, de Budapeste, fazendo uma espécie de releitura sobre o texto em questão. E esta releitura foi do agrado de poucos e de alguma forma também não agradou ao Papa. Isto é tão verdadeiro que, no dia seguinte, terça, dia 6, o Papa, presente todo o tempo, fez um brevíssimo, mas significativo comentário: A base do Sínodo é o texto que já vem sendo trabalhado há tempo e o caráter do Sínodo deve ser eminentemente pastoral. Com isto quis dizer que não há lugar para exegeses restritivas, mas um convite para um enriquecimento das muitas questões que estão sendo objeto das discussões.
Já na tarde da mesma segunda-feira da abertura, bem como durante toda a terça-feira, houve colocações de uns 60 bispos. Cada um dispunha de 3 minutos, controlados por uma campainha, e em seguida se abriu a possibilidade para algum outro tipo de intervenção. Por ali já se vê que não se está trabalhando para reconfirmar as colocações já conhecidas. O convite várias vezes expresso é o de que embora não estejamos num parlamento, estamos respirando ares de partilha, sem freios.
Mas é claro que esta liberdade de expressão está sendo trabalhada nos chamados grupos menores. Na realidade não são tão pequenos, contando cada um com mais de 20 pessoas. E é nestes grupos que se percebe uma dinâmica muito sugestiva. Palavra aberta para todos e cada um, mas desde que depois coloque sua intervenção por escrito. Cada texto é colocado em votação. Teremos mais um dia para passar todo o documento. Depois uma comissão de síntese vai somar as contribuições de cada grupo, tentando encontrar um fio condutor. Quais são as ideias sustentadas por uma maioria, quais são as que foram expostas apenas em um dos grupos. Enfim, novamente, não se trata de um parlamento, mas num diálogo muito mais proveitoso do que os do nosso parlamento. Com muita tranquilidade vão sendo feitas as emendas, sempre depois de uma boa troca de ideias.
Como o Instrumento de Trabalho está dividido em três partes, cada uma das partes ocupará uma semana nas denominadas Congregações gerais. Estas são evidentemente mais solenes, e por isso mesmo, todos vão devidamente ‘fardados’. Nos grupos todos se vestem mais à vontade, de tal forma que não se consegue distinguir um cardeal de um bispo, nem um bispo de um expert….
Para concluir estes poucos ecos de hoje, e retratar bem o espírito de comunhão reinante, vou trazer o exemplo de D. João de Avis, da Congregação dos Religiosos. Ele estava ao meu lado, ou melhor eu ao lado dele. Ele muito à vontade, não perdia ocasião para algum pequeno comentário à parte. No final lhe perguntei como se sentia ao ser chamado de Eminência. Sorrindo, respondeu: olhe há muito já me acostumei a ser chamado simplesmente de João…e não sou mais do que um João. Claro que com a estatura dele, também ninguém ousaria fazer brincadeira com o nome dele. Enfim, os trabalhos são intensos, mas o ambiente favorece a colheita de bons resultados.