“Nós, os sacerdotes, tendemos a clericalizar os leigos”
23/04/2013
Por Frei Antonio Michels, OFM
Em rápidos tópicos, vou contar algo do que vivemos aqui em Canindé nesta segunda-feira, 22 de abril, início do Congresso. Quero compartir con vosotros o que, na minha visão, foi mais significativo neste primeiro dia. Uma e outra expressão em espanhol é para dar uma ideia do “portunhol” que se ouve por aqui.
Às sete da manhã estávamos na basílica São Francisco para a eucaristia de abertura do Congresso. O povo da cidade também compareceu e, assim, todos os bancos do templo estavam tomados. Na Liturgia da Palavra, ouvimos como o apóstolo Pedro compreendeu, a duras penas, que a Igreja não deve chamar de impura a diversidade que desce dos céus, mas abrir-se aos outros. E o Bom Pastor garantiu que suas ovelhas conhecem a sua voz e que ele é a porta das ovelhas. Os que entram por outro lugar son ladrones. O definidor geral para a América Latina Frei Nestor Schwertz, que presidiu a celebração, frisou na homilia a prioridade da prática e do testemunho na evangelização.
Após o desayuno, deu-se, na quadra paroquial, a sessão de abertura do Congresso. Lembrando que a região vive há dois anos uma grande seca, Frei Marconi Lins, Ministro da Província anfitriã de Santo Antônio e o guardião do convento do Canindé Frei Jean Souza, hablando espanhol, acolheram as delegações dos diversos países da América Latina e do Caribe, bem como os representantes da Cúria Geral da Ordem aqui presentes. As boas vindas foram dadas também pelo prefeito da cidade, que se chama Francisco, é membro da OFS e é casado com Esperança, uma mexicana.
Comunicando-se igualmente em espanhol, disse do seu desejo de administrar com técnica, profissionalismo, mas também com espiritualidade. Mas testemunhou como é difícil cambiar la política com os valores evangélicos e franciscanos, dadas as grandes tentações e vícios que se encontram no exercício do poder público.
Frei Artur Rios Lara, Secretário da Ordem para a Evangelização, expôs-nos as motivações, objetivos e lema deste Segundo Congresso Missionero. Vale registrar:
Motivações:
1. Caminhar a partir do nosso carisma como Igreja da América Latina e Caribe, no espírito do Sínodo sobre a Nova evangelização.
2. Continuar com o caminho aberto pelo Primeiro Congresso OFM da América Latina celebrado em Córdoba (Argentina) em 2008, onde se nos convidou a celebrar e renovar nosso ardor missionário urgente e audazmente.
3. Renovar nossa prática evangelizadora como franciscanos a partir da contemplação de Jesus e de São Francisco de Assis, ajudados pelo documento da Ordem do Capítulo Geral de 2009: Portadores do Dom do Evangelho.
4. Assumir comprometidamente a missão compartilhada com a Família Franciscana, especialmente os leigos.
5. Apontar propostas práticas para o próximo Congresso Internacional para as Missões e a Evangelização da Ordem, programado para 2014 em Roma.
Objetivos:
Objetivo Geral:
Reafirmar o primado da prática de nossa missão franciscana para uma nova evangelização na América Latina e Caribe.
Objetivos Específicos:
a) Animar a conversão dos irmãos para responder vital e profeticamente à nova evangelização.
b) Animar os irmãos a seguir caminhos novos em nossa missão evangelizadora.
Lema: “Novos Franciscanos para uma Nova Evangelização”.
Com o documento de Córdoba em mãos, Frei Gerardo Crespo fez a memória histórica do 1º Congresso e Frei João Sannig da Província Santo Antônio, deu seu depoimento pessoal de participante daquele Congresso e opinou que “são as estruturas interiores que mais precisamos superar” e que padecemos do “vício dos intelectuais: resolvemos as coisas na cabeça mas não caminhamos com os pés”.
Coube ao vice-ministro geral, Frei Micahel Perry, a primeira relación do Congresso, seguida de diálogo em grupos e perguntas ao expositor. Frei Micahel disse que parece evidente do ponto de vista teórico que “nossa fé cristã deve ser encarnada, interiorizada e contextualizada em nossa vida, na vida da Igreja e na vida do povo com quem estamos chamados a viver e a quem somos chamados a servir”, e que a Boa Nova se refere à pessoa toda e a todas as pessoas, mas que é preciso passar da palavra à ação, abandonando velhas visões e práticas. Para conter o vinho novo precisamos ser odres novos. Retomando as significativas propostas do documento de Córdoba, Frei Michael fez perguntas que deixam claro sua suspeita de que aquelas recomendações encontraram dificuldades para serem postas em prática, em particular o chamado à conversão pessoal e coletiva. Ao se referir à proposta de maior participação dos leigos e leigas em nossa missão, citou uma palavra do Cardeal Bergoglio, hoje Papa Francisco, em entrevista em 2011: “Nós, os sacerdotes, tendemos a clericalizar os leigos. Nós não nos damos conta, mas é como se os infectássemos com nossas enfermidades. E os leigos – não todos, mas muitos – nos pedem de joelhos que os clericalizemos, porque é mais cômodo ser um pequeno clérigo que um protagonista de um caminho laical”.
A participación de los laicos y de las laicas foi a questão que mais provocou intervenções no diálogo que se seguiu à palestra. Parece, digo eu, que se trata de um problema estrutural da Igreja que, há séculos e séculos, separou o clero do laicato, concentrou a missão na mão do clero (clericalismo) e fez dos leigos cidadãos de segunda categoria. Sem conversão estrutural, sem mudança no modo de a Igreja se configurar e exercer a missão, não teremos leigos adultos na fé e missionários. Há que se retomar a oficina do Concílio Vaticano II e de Medellin, as Comunidades Eclesiais de Base, por exemplo, e reconhecer que o neoconservadorismo católico é “um tiro no pé”, pois infantiliza os leigos conservando-os como plateia.
Já na parte da tarde, coube a Frei Massimo Tedoldi, Secretário Geral para as Missões, a segunda palestra do Congresso. Discorreu sobre “As prioridades da Ordem em chave de missão evangelizadora”. Frei Massimo abordou cada prioridade (Vida com Deus, Fraternidade, Minoridade, Evangelização e Formação) a partir do ocular da Evangelização e recordou que tais dimensões não caminham separadamente, mas formam um todo articulado pela comunhão. Em seguida à fala de Frei Massimo, a assembleia se organizou espontaneamente em animados grupos de troca de impressões e levantamento de questões.
Após o café da tarde, Frei Eugenio Ortiz, moderador do dia, deu as boas vindas a Frei João Inácio Müller, presidente da UCLAF, que acabara de chegar, vindo da celebração dos 20 anos da presença dos frades menores em Roraima, iniciativa da Conferência Brasileira.
Prosseguindo os trabalhos, ouvimos de Frei Amilton, pároco e reitor do Santuário de São Francisco das Chagas do Canindé, um relato da história e da experiência de evangelização vivida neste Santuário que já soma 255 anos de existência. Impressionou o perfil dos romeiros (cerca de dois milhões por ano) e o volume das atividades aqui desenvolvidas.
Após a oração vespertina e o jantar, encerramos os trabalhos do dia ouvindo a presentación da Conferência do Cono Sur. O Congresso segue nesta terça-feira, dia 23 de abril. Na parte damanhã, a assembleia tratará dos temas Evangelização na paróquia e diálogo inter-religioso e ecumênico. Na parte da tarde começam as oficinas temáticas. O II Congresso de Evangelização e Missão da América Latina e do Caribe termina no próximo sábado, dia 27 de abril. Amanhã, Frei José Francisco dos Santos apresentará neste site o seu relato sobre o dia de hoje.