Lembranças e evocações do Capítulo Geral da OFS
São Paulo, 22 a 29 de novembro de 2011
Não tomem estas linhas como “relatório” do Capítulo. Não constituem elas uma análise detalhada e crítica desse evento importante para a OFS do mundo. São reflexões, talvez um pouco soltas e impressões que precisam ser colocadas por escrito antes que passe muito tempo. Elas misturam impressões deixadas no coração e algumas falas que questionam a significação da OFS para nosso mundo e para a Igreja.
1. As coisas são assim mesmo. Há a preparação, a realização e depois tudo passa. Assim se deu com o XIII Capitulo da Ordem Franciscana Secular. O Conselho da Presidência esteve presente entre nós com a Ministra Geral Encarnación del Pozo e capitulares do mundo inteiro. Trabalho, canseira, preocupações, ausências, presenças, tempo de chuva e sol aberto quase, ônibus com avaria, dias com jeito de verão. Um evento que, certamente, deixará marcas em todos os que participaram como capitulares, como colaboradores ou observadores. A realização do Capítulo é uma exigência das Constituições e dos Estatutos da OFS. Somos um “corpo”. Há alternâncias no serviço. Há decisões que são tomadas em comum. Um Capítulo Geral tem o condão de mostrar que nossa Fraternidade Franciscana Secular está em todo o mundo. Ficamos muito felizes em ver que há sérios empenhos, apesar de todas as dificuldades, de implantação de células franciscanas seculares na China e nos países mais frágeis do mundo. Sentimos também alegria em ver emergir algumas fraternidades na África francofone e lusitanofone. Na sala capitular estavam esses homens simples com o desejo de acertar e de ver suas fraternidades nacionais progredirem. A presença e o depoimento do Conselheiro do Haiti foi comovente.
2. Sentimos, entre os presentes, uma força toda particular nos países que faziam parte da antiga União Soviética. No Capítulo, nota-se uma presença física desses terceiros e também um vigor dos jovens franciscanos. Os jovens provenientes destas partes do mundo parecem mais organizados como grupo, participam das Jornadas Mundiais da Juventude de forma mais regular. Tem-se a impressão que manifestam uma piedade mais intensa do que outros. São fraternidades juvenis com forte dimensão orante. Não houve relatórios e depoimentos de fraternidades nacionais. O tempo, certamente, não permitia. Teria sido bom sentir mais de perto como andam, por exemplo, as fraternidades da Europa. Claro, em seu relatório, a Ministra Geral alude a todas elas.
3. Em sua prestação de contas do triênio passado, a Ministra teceu algumas considerações que devem nos levar à reflexão:
- Por ocasião das visitas e de presidência de Capítulos, constatou-se que continua a diminuição do número e o envelhecimento na Europa central, ocidental e do sul. Há nessas fraternidades pouco interesse em promover a JUFRA. Parece que a primeira preocupação esteja nas ideologias e na posse (consumismo), no comodismo e não nos valores humanos e evangélicos. Há, no entanto, fraternidades que estão em processo de rejuvenescimento.
- Estão em fase de crescimento as fraternidades da Europa do Leste. Dá-se um fenômeno curioso. Há a geração do tempo da perseguição comunista e as novas vocações com idade de 25 a 35 anos. Falta uma geração ponte. Em algumas dessas fraternidades estão sendo feitos esforços na criação de grupos de casados. Na medida em que as novas gerações assimilarem a Regra da OFS e os formadores as mantiverem inseridas nas coisas temporais poderá haver florescimento.
- O desenvolvimento da Ordem no sudeste asiático é estimulante. Merecem ser mencionados esforços na linha da formação inicial e permanente e também iniciativas apostólicas. No Capitulo eram muitos os irmãos e irmãs com os “olhos puxadinhos”.
- Na América Latina, observa-se um progressivo envelhecimento sem muitas perspectivas de revitalização. Não há muita comunicação entre as fraternidades nacionais e a presidência da OFS. A comunicação se faz somente no momento em que aparecem problemas. Normalmente, as Fraternidades nacionais pedem a visita mas não se preocupam com os custos das viagens. Por vezes observamos que não há o cuidado de acolher as recomendações do visitadores na linha de superar algumas anomalias identitárias. A instabilidade política de alguns países é elemento negativo.
4. Durante a realização do Capítulo ficou evidenciada a necessidade de se encontrar recursos para viagens, formação e ajuda a tantas fraternidades do mundo inteiro. Há necessidade de se compreender que a Ordem é de todos e que há que se fazer um esforço sério face às despesas. Insistiu-se na generosidade e espontaneidade de doações, mormente destinadas às fraternidades emergentes presentes em muitas partes do mundo. Bem no final de seu relatório ao Capitulo, a Ministra falou de dois grandes desafios: a resposta dos conselheiros internacionais (e dos Conselhos Nacionais) de animar e guiar a OFS e questão da comunhão nos bens materiais e espirituais no interior da Ordem.
5. Tomo a liberdade de “pinçar” alguns elementos que aparecem nas conclusões que ainda não foram oficialmente publicadas:
- Durante os dias do Capítulo foram vividos intensos momentos ao se compartilhar as dores e incríveis experiências de nossos irmãos e irmãs do mundo que sofrem em extrema pobreza, padecem de perseguição religiosa, são vitimas de calamidades naturais, inclusive de genocídios. Tudo deixou em alto de grau de perplexidades nossas consciências, convidando-nos a sair de nossa autocomplacência egoísta para nos aproximar com solidariedade daqueles que sofrem.
- Nossa Ordem está sendo chamada a renovar-se a partir de seu interior para que os irmãos e as irmãs possam ser instrumentos mais fiéis e generosos do Reino de Deus, uma presença mais eficaz e crível nos assuntos temporais, projetando sobre estes a luz do Evangelho e dirigindo-os segundo os planos de Deus. (À margem do texto acrescento que este é um ponto delicado: tanto a OFS como a Primeira Ordem, em suas concretizações, precisam ser críveis, dignas de crédito.
- Uma séria formação permanente deverá possibilitar às Fraternidades se abrirem às realidades humanas (família, trabalho, luta comunitária, ecologia. O mundo sofre demais.
- A OFS quer colocar a família no centro de sua atenção e dar-lhe um lugar mais importante na vida das Fraternidades. O Capítulo exorta as Fraternidades locais a que facilitem o crescimento das famílias no interior das Fraternidades. Os jovens, aos quais preocupa muito, e com razão, o grande tema da sexualidade, precisam de ajuda dos Franciscanos seculares, a começar pelo testemunho de vida. As experiências de casais membros da OFS, maduros e preparados, partilhadas com os jovens da JUFRA em seus encontros ajudá-los-ia a serem verdadeiros profetas e sinais de contradição no mundo.
- Para fomentar a comunhão entre a OFS e a JUFRA, os Conselhos da OFS incluirão representantes da JUFRA tanto na organização dos encontros comuns bem como sua realização.
- Os animadores fraternos da JUFRA, no acompanhamento dos jovens, têm que promover conteúdos e métodos que os capacitem a assumir as responsabilidades da vida familiar e social.
- No bloco de recomendações referentes à presença dos franciscanos seculares no mundo há um pedido de que talentos se coloquem à disposição de muitos: os franciscanos seculares comprometam-se com a proteção da família e de seus direitos sociais e promovam uma educação que permita o desenvolvimento total das crianças e dos jovens, servindo-se dos instrumentos sócio-políticos a seu alcance. Em suas iniciativas precisam reunir e incluir a todos os irmãos e irmãs preparados em diferentes especializações para que ponham à disposição do bem comum os talentos que receberam de Deus (tenho certeza que o amanhã da OFS depende também da ação apostólica e pastoral feita por pessoas santas, é verdade, mas também com “especializações”.
6. Algumas observações de ordem geral:
- Foi incansável a dedicação dos irmãos e irmãs da OFS do Brasil, de modo especial as Fraternidades de São Paulo, para que esse Capitulo pudesse se realizar. Houve o trabalho físico duro, os plantões esperando retardatários, o estar sempre no seu lugar literalmente à disposição. Houve a presença física no local, a ajuda com recursos financeiros, o cuidado de oferecer pequenos “souvenirs” aos participantes. Enfim, os seculares franciscanos brasileiros souberam ser generosos e hospitaleiros.
- A casa onde ser realizou o Capítulo, o Centro Santa Fé dos jesuítas, é local aprazível e extremamente agradável. O quadro exterior ajudou também ao bom êxito do Capítulo: jardins, bela capela, amplos corredores, comida bem feita.
- Dom Odilo Scherer, cardeal de São Paulo, presidiu a abertura do Capítulo com a celebração da Eucaristia na tarde do sábado 22 de novembro. A capela estava belamente enfeitada com antúrios vermelhos e outras flores brancas numa tarde serena e bela. Dom Odilo fez sua homilia em italiano, o que agradou aos italofones. Sua homilia foi extremamente oportuna e com muita propriedade falou da radical importância de Francisco para seu tempo e para nosso tempo. Convidou os capitulares a darem sua contribuição para a renovação evangélica da Igreja como Francisco em seu tempo. Foi um momento muito especial e importante para o Capítulo. É preciso inventar o novo. Estamos de plantão para evangelizar.
- Houve um momento particularmente importante para os Capitulares: a peregrinação a Aparecida, a missa na luminosa basílica presidida por Dom Caetano Ferrari, que procurou conversar com todos. E lá estavam irmãos e irmãs de várias regiões do país para um encontro com os membros da Presidência do Conselho Internacional… Era uma manhã ensolarada e quente. Havia uma visível alegria desses irmãos e irmãs sentados em cadeiras brancas, olhando para esses que são os gestores da OFS no nível mais elevado. Havia o canto, os aplausos, a satisfação do encontro de pessoas que são muito próximas umas das outras em Francisco e Clara.
- Em Guaratinguetá, todos fomos, cordial e amavelmente, recebidos no Seminário Frei Galvão: os frades do seminário, os postulantes, os irmãos da Ordem Franciscana Secular das Graças. Uma sala cheíssima, com alegria, fotos, comida simples e boa. Nossa Província foi extremamente carinhosa através dos frades daquela cidade e da comunidade da fraternidade Frei Galvão.
- Ainda em Guará houve um encontro singelo com clarissas da Fazenda Esperança. Mulheres abertas e alegres… esse sentimento de família veio à tona. Pena que não tenha havido um encontro e um diálogo dos seculares franciscanos do mundo com os jovens recuperandos. Estivemos no território mas não tivemos ocasião de olhar uns nos olhos dos outros. Um momento de partilha naquele quadro teria sido de grande utilidade para todos, de modo particular para os Conselheiros Internacionais da JUFRA.
- Frei Alberto Beckhäuser e o professor Paulo Machado da Costa e Silva, de Petrópolis, participaram do evento na qualidade de convidados e em sinal de preito de gratidão a tudo o que os dois significam para a Ordem Franciscana Secular. Assinalamos ainda a presença vibrante e animada da Maria Tereza, a mulher do canto, da voz bonita, da simpatia em fazer com que todos cantassem… Sua participação discreta mas eficiente na liturgia não deixou de encantar a todos.
- Ao longo do Capítulo houve festas e recreios, bem cuidados. Cada grupo linguístico ou geográfico fazia suas “peraltices”. Bela foi a festa brasileira na última noite antes do encerramento. Irmãos e irmãs das fraternidades de São Paulo, mormente Santa Clara, serviam às mesas. Um conjunto de chorinhos animou a noitada numa clima de efusiva alegria. Tenho certeza que os irmãos e irmãs do mundo inteiro não vão esquecer a cordialidade e a alegria brasileiras.
Concluindo:
Não tomem estas linhas como resultados do Capítulo. Elas quiseram apenas evocar aspectos que chamaram minha atenção. Certamente o Senhor deve ter se servido desse evento para colocar mais fogo e mais vigor na vida dos franciscanos.
(*) Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM
Assistente Nacional da OFS pela OFM e Assistente Regional do Sudeste III