Perspectivas de ontem e de sempre para a OFS
A vida nunca é plenitude nem êxito total. Precisamos aceitar o “inacabado”, o que nos humilha, o que não conseguimos corrigir. O importante é manter o desejo, não ceder ao desalento. Converter-se não é viver sem pecado, mas aprender a viver no perdão, sem orgulho nem tristeza, sem alimentar a insatisfação pelo que deveríamos ser e não somos. Assim diz o Senhor no livro de Isaías: “Na conversão e na calma sereis salvos, na tranquilidade e na confiança está a vossa força”(Is 30,15) (José Antonio Pagola)
1. Aí estão estas nossas fraternidades franciscanas seculares. Aí estão estes que designamos de irmãos e irmãs em Cristo Jesus e Francisco. Ingressaram há pouco ou muito tempo em nossas fraternidades. Tiveram boa ou razoável formação. Há esses que de simpatizantes vão passando para o tempo da iniciação e da formação e são admitidos à profissão. Solenemente, no seio da Igreja, seus propósitos-promessas de seguimento do Evangelho à maneira de Francisco são aceitos pelo Ministro. De onde eles vêm e para onde vão? Esta pergunta é importante para que se possa captar o sentido de sua presença em nossa Ordem e que contribuição eles darão ao mundo e à construção do Reino.
2. Cada pessoa é um mistério. Todos carregam suas histórias, seus passos bem dados e outros cambaleantes. Chegam de seu passado, de sua família, de sucessos e de vacilações em suas empreitadas. Nem sempre eles conseguem exprimir aquilo que viveram ou que vivem. Há os que chegam depois de terremotos interiores: uma doença séria superada ou não superada, um casamento desfeito, um filho morto na guerra do tráfico, desânimos e cálices amargos que andaram sorvendo. Chegam para encontrar pessoas que os ajudem a viver, para buscar a perfeição da caridade, a santidade. Querem trilhar um caminho de transformação do coração que se chama metanoia, conversão. Desejam que as feridas do passado possam ser curadas e cicatrizadas. Buscam seguir o Evangelho.
3. Há aqueles e aquelas que começam a experimentar em seu coração uma misteriosa sede, uma insatisfação com os resultados magros e medíocres de suas vidas, com sua história de envolvimento com a fé tão marcada pela rotina e pela mesmice. Querem um espaço de aprofundamento de suas convicções, desejam que suas vidas sejam iluminadas com uma claridade mais densa. Desejam encontrar outras pessoas desejosas também de seguir o Evangelho à maneira de Francisco. Por isso querem viver em Fraternidades. Será que nossas Fraternidades conseguem responder a esses apelos?
4. Sim, há aqueles e aquelas que não querem viver ao léu, aspirando o perfume de todas as flores da vida. Dispomos desse espaço de tempo que vai do nascer ao momento da chegada da irmã morte que quer nos levar à terra dos vivos, ou seja, do tempo da vida. Vivemos: corpo, inteligência, um coração para amar e ser amado, teia de relacionamentos, trabalho de nossas mãos, filhos, esposa, esposo, pais envelhecidos e doentes. Muitos, em determinados momentos, querem encontrar uma sabedoria de viver. Há tempo para tudo, tempo para nascer e morrer, tempo para chorar e rir, mas sempre tempo para viver. Precisamos aprender a conviver, a tecer laços, a cerzir o que anda querendo se rasgar. Literalmente nos sentimos peregrinos de um amanhã que desconhecemos. Entramos na Ordem para iluminar esse caminhar.
5. Esperando que as Fraternidades Franciscanas Seculares sejam espaços de pessoas que busquem a Deus, que queiram entrar num caminho de conversão, queremos fazer caminhada com esses que, segundo informações que tivemos, buscam a perfeição da caridade no seio da Igreja, seguindo uma Regra de vida proposta pela Igreja. O que chegam e os que já estão buscam encontros, momentos de partilha da vida, dos sucessos e dos temores, momentos de escuta comum de um Palavra que muda e transforma. Querem efetivamente viver a fraternidade no seio da Ordem Franciscana Secular. Conscientes de sua fragilidade, insatisfeitos com o pífios resultados de busca de santidade entram num caminho de penitência, numa estrada de libertação de seu ego, que se chama estado de conversão. Para Francisco, esse caminho começara com o beijo do leproso e terminaria com o abraço da irmão morte, entregando seus dias nu na terra dura.
6. Os que estão na Fraternidade e aqueles que chegam desejam não detestar o amargo e desconfiar do doce. Querem converter-se, mudar o coração. Querem aceitar a graça da vida, tanto o positivo como o negativo, sem murmurações. Buscam o Reino de Deus seguindo de perto os pedidos do Evangelho. Querem seguir bem de perto o Sermão da Montanha (Mt 5-7). Estão dispostos a sair do centro, a abandonar a passarela da vida e discretamente estar perto de todos os leprosos da vida. Não querem sempre seguir sua vontade e não se cansam de fazer a pergunta: “Senhor, o que tu queres de, mim, de nós?”. Escutando São Paulo crucificam com Cristo sua concupiscência e vivem crucificados com ele. Não dividem os homens entre bons e maus, exaltando uns e execrando os outros. Querem ser irmãos de todos. Desejam sinceramente que a Fraternidade os ajude a conservar, ao longo da vida, a delicadeza de consciência e a ternura no coração. Não querem deixar que seu coração venha a endurecer.
7. Os franciscanos são pessoas que se dizem discípulos do seráfico Francisco, em outras palavras, daquele que teve imensa proximidade com o Senhor devotando-lhe um amor carinhoso e vivendo a oração nos graus mais elevados possíveis enquanto caminhava na terra e não no face a face. Uma Fraternidade de OFS é bem-sucedida quando leva seus membros a uma intensa vida de relacionamento com o Senhor:
• Não podemos postergar nosso empenho de uma vida de profunda oração. Sabemos perfeitamente que a vida de amor fraterno tem traços de intimidade com Deus. Reza aquele que dá um copo de água fria ao menor de seus irmãos. Precisamos, no entanto, nos adentrar num saboroso empenho de sermos serafins de amor no explícito e generoso louvor do Amado.
• Insiste-se hoje que todos tenhamos uma vida pessoal de oração. Não bastam os encontros comunitários por mais densos que possam ser. Precisamos dessa oração pessoal. Importante o exercício da meditação. Quando entramos na Ordem queremos que ela nos propicie retiros orantes, aprofundamento nos graus de oração. Desejamos, a curto prazo, nos unir ao ofício da Liturgia das Horas. Não queremos ser coniventes com um simplificação ruinosa da vida de oração.
8. Queremos aprender a ser irmãos. Fazemos a experiência no seio da fraternidade: aceitamos serviços e responsabilidades, somos pontuais nos encontros e fiéis aos compromissos; evitamos ser fonte de desentendimento, quando necessário esquecemos as ofensas recebidas e seremos sempre dos primeiros a realizar a caridade no seio da comunidade. Também tomamos iniciativas corajosas. Não queremos viver uma vida de fraternidade cor-de-rosa e idílica. Há um lobo dentro de todos nós. Um frade francês assim se exprime escrevendo sobre o olhar os outros como irmãos: “Todas as criaturas saíram das mãos de Deus. As criaturas espirituais, para nós as pessoas humanas – têm preço inestimável aos olhos de Deus. Esta convicção determina respeito absoluto diante da pessoas, uma postura de benevolência a priori, confiança na capacidade de cada pessoa mudar, melhorar, converter-se, tornar-se santa com a graça de Deus. São Boaventura dizia: “Ninguém tem o poder de destruir em si a imagem de Deus… o máximo que consegue velá-la e desfigurá-la”. Francisco dizia muitas vezes que é preferível alegrar com o bem que Deus opera nos outros do que o bem que se realiza em si mesmo. Dizia também que não se pode desprezar alguém pelo qual o Cristo deu a vida. Sobre isto se fundamenta o propósito de considerar todos os homens irmãos, amá-los e servi-los quaisquer que sejam as condições” (Luc Mathieu, OFM, L’héritage de François d’Assise, in Evangile Aujourd’hui, n. 200, 2004, p.34-35).
9. Os que ingressam na Ordem Franciscana Secular são cristãos leigos que sabem de sua responsabilidade no mundo e na Igreja. Sabem que o Amor precisa ser amado. Gostariam eles de poderem, com irmãos da fraternidade, se engajarem nas tarefas da Igreja: ir às periferias, anunciar pela palavra e pelo exemplo o amor de Deus nas pastorais da Igreja, de modo preferencial fazendo núcleos de pessoas em torno da palavra, da discussão dos graves problemas e na arrumação de estratégias que acelerem o surgimento de um mundo mais conforme o Reino: justiça, paz, liberdade, respeito. Esse empenho evangelizador e missionário quer responder ao que Cristo pediu a Francisco: “Vai e reconstrói a minha Igreja que, como vês, está em ruína.
10. Terminamos com um texto síntese de Frei Antonin Alis, OFMCap, em artigo publicado em Évangile Aujourd’hui, n.205. O autor depois de examinar a resposta de Francisco ao Evangelho da missão com o famoso: É isso que quero, que busco de todo o coração, conclui: “Por sua exclamação, por seu gesto, Francisco nos convida a levar a sério o Evangelho. Ele reagirá, antes de tudo, numa atitude de verdade com relação a si mesmo e com respeito àquilo que ele percebe e sente como sendo vontade de Deus. Esse ir despojadamente mundo afora é percebido pelo Poverello como uma evidência que brota do mais profundo de seu ser. Abandonando tudo começa a palmilhar uma trilha de conversão. Despoja-se exteriormente de seus bens, conservando apenas o essencial. Depois vai progressivamente se despojar do orgulho, da suficiência e de seu narcisismo. Progressivamente o despojamento vai tomar conta de toda a sua vida, vai entrar num caminho de serviço, minorismo, fraternidade que fará com que abandone todo desejo de poder, de dominação sobre quem quer que seja, imitando assim o Cristo servo. Aos poucos vai se abrindo ao Espírito Santo e ao seu santo modo de operar, deixando-se transformar em seu interior. Este despojamento, desencadeado pela escuta da Palavra vai prosseguir até se purificar em sua morte, nu sobre a terra nua. Lentamente a palavra germina nele e torna-se fecunda de tal modo que identifica Francisco com seu Senhor e Mestre; essa mesma Palavra torna-se fecunda para os outros, os que assistem o trabalho do Espirito nele. A palavra haverá de transformá-lo totalmente. Isto será para ele a alegria, a verdadeira alegria, a alegria perfeita que o plenifica e faz com que transborde de ação de graças” (p.36).
Questionamentos:
• Que motivos sólidos fazem com que alguém queira fazer parte das Fraternidades Franciscanas Seculares? Por que tomamos a decisão de ser franciscanos ou franciscanas?
• Como é que se manifesta concretamente a vocação para seguir Cristo de modo particular na Ordem Franciscana Secular?
• As reuniões gerais da OFS, a Regra, retiros e outras programações visam formar cristãos maduros que se deixem guiar pelo Espirito. Na verdade o que significa abrir-se à ação do Espírito e seu santo modo de operar?
• Há pessoas que buscam fraternidades franciscanas porque precisam ser ajudadas na busca do Senhor. Como nossas fraternidades podem responder a este desejo?
• O que significa ir ao encontro dos homens e mulheres de nosso tempo?