Carisma - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

Irmãos Menores (II)

francisco
Frei Almir Guimarães

01Francisco de Assis continua sendo atual, diríamos mesmo atualíssimo. Entre milhões de pessoas de boa vontade há muitos que se deixam tocar pelo perfume franciscano, sem pertencer a nenhum grupo oficial de espiritualidade franciscana, a nenhuma Ordem. Francisco é uma pregação viva. Ninguém se torna cristão da noite para o dia, ninguém se torna franciscano apenas com um calor emotivo interior de apreço pelo Francisco das pombinhas e do lobo de Gubbio ou porque, na Ordem, professou diante de um superior. Uma alma franciscana é forçosamente evangélica. Demora muito para alguém se tornar franciscano. Estamos convencidos da urgência da renovação da formação inicial e permanente para os frades. Precisamos irmãos de verdade. Precisamos de irmãos que sejam menores.

02Gostamos muito de dizer às pessoas que encontramos que somos franciscanos, de uma Ordem que se chama dos Frades ou dos Irmãos Menores. Podemos dizer que o texto básico do desejo de Francisco seja este: “Nenhum irmão exerça qualquer poder ou domínio, mormente entre si. Pois como diz o Senhor no Evangelho: “Os príncipes das nações as dominam, e os que são os maiores exercem poder sobre elas (Mt 20,25), não será assim entre os irmãos (Mt 20,16a), quem quiser ser o maior entre eles seja o ministro e servo deles; e quem é o maior entre eles faça-se como o menor” (Regra não bulada V, 9-12). Francisco rejeita toda forma de dominação e de poder. Insistirá em duas palavras: ministro e servo. Há, em Francisco, uma ligação estreitíssima entre ministro e servo. Os frades exercerão tarefas que não chamem atenção. Não são chefes lá onde trabalham. São submissos a toda criatura humana. Dão a mão a todos e não manifestam superioridade.

03Outro texto importante: “Assim se pode conhecer se o servo de Deus tem o espírito do Senhor: se seu eu não se exaltar quando Deus realizar por ele algum bem – mas antes se considerar o mais desprezível e se avaliar como menor do que todos os homens” (Admoestação XII).

04Nada Francisco acentua mais que aquela verdade bíblica de que Deus é o doador e dador de todo o bem. Tudo quanto em nossa vida é bem deriva dele. “E todo bem atribuamos ao Senhor Deus altíssimo e soberano, e reconheçamos que todo o bem a Ele pertence, e lhe demos graças a Ele, de quem procede todo bem. E o mesmo Altíssimo e soberano, único Deus verdadeiro, tenha, e se lhe preste todas as honras e reverências (…) porque todo bem lhe pertence (Regra não bulada, 17). Esta consciência é a base fundamental para a tão importante pobreza interior, a verdadeira pobreza de espírito, que em tudo vê um dom imerecido da livre vontade divina. Quem é pobre diante de Deus vê em todo o bem uma operação do espírito do Senhor que habita em nós” (cf. K. Esser, Exortações de Francisco de Assis).

05O lava-pés foi a última confidência de Jesus aos seus. O evangelista João não conservou no quarto evangelho o relato da instituição da Eucaristia. O lava-pés é o equivalente. Através desse gesto, Jesus tenta revelar o sentido profundo de toda a sua vida, de sua missão e o próprio coração de Deus, seu Pai. A hora da morte se aproxima. Não é mais momento de fazer discursos. Como todos os profetas, Jesus “encena” uma parábola viva, realmente sua última confidência. Deus é plenitude de amor que serve o homem para que ele possa crescer revelando-lhe sua dignidade. O Cristo servidor se entrega até a morte. Há uma reviravolta. Fica definitivamente contestada uma hierarquia fundada no prestígio, na força e no poder que oprime: “Eu vos dei o exemplo para que também o façais” (Jo 13,15). Francisco e seus frades desejam ser os herdeiros do Testamento do Cristo-servo, testemunhas da louca ternura de Deus que livremente se abaixou para que todos tivessem consciência de sua grandeza de irmãos e de filhos. A nobreza do homem é servir.

06Pequeno decálogo do frade menor:

• Somos obra da bondade do Senhor. Reconhecemos nossos limites e nossas fragilidades. O Senhor opera em nós. A ele atribuímos todo o bem. Vivemos cantando um Te Deum. A nós não atribuímos nada. Somos servos que fazemos o que é preciso fazer e ponto final. Servos inúteis.

• O frade trabalha, faz o melhor que pode. O que sai de suas mãos é belo e bom: a comida que prepara, o estudo que faz, a evangelização que opera. Mas é sempre Deus agindo nele.

• O frade menor tem sempre o cuidado de não roubar as obras do Rei.

• Na linha do lava-pés, o frade menor serve os irmãos que lhes forma confiados. Não julga. Acompanha. Conversa. Mostra luz ao que estão patinando nas trevas.

• O frade menor não privilegia os poderosos e grandes da terra. No lugar onde vive os mais simples são tratados com todo carinho… Os grandes da terra não gozam de privilégios. O frade menor não anda à cata de bens e de prestígio.

• O frade menor contempla o Cristo, de modo particular, quando ele se torna fragilidade e debilidade. Nasce criança no presépio e morre nu na cruz depois de servir.

• No seio das fraternidades, nas atividades paroquiais, pastorais e evangelizadoras está sempre com uma bacia e uma toalha por perto. Tem as antenas ligadas para quando deve parar e lavar os pés dos que precisam de seu serviço.

• Estaremos sempre atentos aos que vivem perto de nós.Há um serviço que lhes pode ou lhes deve ser prestado? Serviço da escuta deixando de lado nossos pequenos interesses, serviço de encorajamento, de esquentar uma sopa mesmo que se esteja preparando a aula inaugural na Universidade Raimundo Lullo.

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