Vida Cristã - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

Cadernos de formação – Maio 2021

Um cego clarevidente

Marcos 10, 46-52

Vamos meditar sobre o delicado episódio e sugestivo da cura Bartimeu na saída da movimentada cidade de Jericó. Estamos em pleno estilo vivo de Marcos. Importante ler antes a passagem para depois acompanhar estas reflexões.

Tudo indica que Jesus não pretendia demorar em Jericó. Nada mais faz do que atravessar a cidade. Apressado em chegar a Jerusalém? Sabia que muitos adversários estariam à sua espera para suprimi-lo? Jesus não está sozinho. Muitas vezes, no evangelho de Marcos, ele está “com” seus discípulos. Um pouco antes havia lhes lembrado de ele deveria dar a vida em resgate de muitos. Estamos na perspectiva da morte próxima de Jesus. A passagem de Jesus por Jericó atrai as massas. Marcos não tece comentário a esse respeito. Alguém que não pertence ao grupo dos acompanhantes de Jesus sai da cidade. Devido à sua deficiência, fica fora. Trata-se do cego Bartimeu. Está na beirada da estrada. É precisamente para o encontro do filho de Timeu com o Filho de Davi que Marcos nos convida. O acontecimento parece revestido de certa importância devido à multidão numerosa, sem esquecer os leitores do evangelho que somos nós.

Pedem que ele se cale. Por que quiseram impor silêncio a Bartimeu? Será que ele, com seu grito, atrapalhava a passagem do cortejo? Ou quem sabe as palavras do cego é que provocam escândalo. Bartimeu vê em Jesus o que os outros recusam a ver. Bartimeu reconhece em Jesus o filho de Davi. Teria sido s isso que incomodaria os circunstantes? É isso que incomoda os que o interpelam. Não conseguem calar Bartimeu que grita o que ele vê. Sabe que no tempo do Messias as coisas virariam de cabeça para os pés: os famintos seriam saciados, os pobres explodiriam de alegria, os olhos dos cegos se iluminariam. Jesus é o Messias: esta é a sua visão, sua fé.

A caminhada para Jerusalém se interrompe por momentos. Normalmente, no evangelho de Marcos, Jesus não gosta de ser reconhecido como Messias. Esta função evocava nos seus contemporâneos sucessos políticos, força militar, glória nacional. Ora, Jesus escolheu um outro caminho para exercer o reinado de Davi, o do serviço e do dom de sua vida. Às vésperas de entrar na cidade de seus sofrimentos e de sua morte, Jesus acolhe o grito de Bartimeu. O mal-entendido não deve continuar, não pode continuar. Jesus não será o salvador político que muitos esperavam.

Bartimeu abandona o lugar em que estava sentado. Como ressuscitado, ele se levanta. Apesar da noite dos olhos a clarividência permitiu que ele descobrisse. A iniciativa fora de Jesus.

“Que eu veja”, pede Bartimeu. Na verdade, ele já enxerga. Cegos são aqueles que o impediam de gritar. Jesus era capaz de fazer com que ele se levantasse, ressuscitasse. Jesus afirma a clarividência que a fé pode dar: “Tua fé te salvou”. A partir desse momento Bartimeu acompanha Jesus pelo caminho, ou seja, tornou-se por sua vez, discípulo de Jesus. Comprometeu-se nesse caminho que passa pela Cruz, antes de chegar à Páscoa.

A aventura de Bartimeu é a aventura da igreja e de todo cristão. Ainda hoje não é fácil acreditar que Jesus seja o Messias, Messias cujas armas são o serviço e o dom total de sua vida. Não é ácil colocar os passos nos passos do Messias crucificado. Somente o olhar da fé permite o engajamento no caminho da Páscoa. Teremos nós a clarividência de Bartimeu?


Fonte: “La clairvoyance de Bartimée”, Marc Sevin, Les Dossiers de la Bible,Setº 1987

Acolhida

Nunca como em nossos dias se tornou tão importante a acolhida em todos os sentidos. As pessoas se sentem desamparadas. É tempo de gerar esperança por meio de atitudes que arranquem-nas da desesperança. Uma dela é a acolhida. Vamos nos apoiar em reflexões de José Antonio Pagola seguindo o título Atitudes para gerar esperança, do livro Caminhos de Evangelização (Vozes).

1. Quando acolhemos uma pessoa nós a ajudamos a reencontrar a esperança. Ela se sente mais segura, mais forte interiormente. Por mais complicadas sejam as situações que vive e os dramas que atravessa ela percebe que não está completamente sozinha. A acolhida suscita nela uma nova esperança. Se quisermos despertar esperança nas pessoas a acolhida é o primeiro e fundamental passo a ser dado. Não se trata apenas de uma estratégia, mas de uma atitude revestida e profundo cunho humano e evangélico.

2. Acolher não é colocarmo-nos diante da pessoa, mas ao lado dela e acompanhar o mal que sofre e machuca. “Penso em você. Estou perto. O que estiver a meu alcance haverei de fazer sempre respeitando sua liberdade”. Esta atitude não será abandonada mesmo que nos sintamos impotentes ou rejeitados. Quando uma pessoa sente que queremos seu bem mais facilmente ela se abre.

3. Acolher significa aproximar-se da pessoa que anda perdendo a esperança com respeito. Cada pessoa é um mistério, portanto não podemos compreende-la em sua totalidade. As pessoas possuem valores, qualidades e capacidades que desconhecemos. Podem ter vivido na infância, na juventude ou recentemente experiências alegres ou dolorosas que construíram seu mundo interior e que não conhecemos. As pessoas tiveram aspirações e fizeram projetos que foram levadas a abandonar com muito sofrimento.

4. Acolher significa não julgar precipitada e superficialmente, não classificar, libertar-nos de preconceitos que nos condicionam, manter-se uma pessoa aberta e confiante, estar em sintonia com os pensamentos negativos. Uma acolhida calorosa só pode nascer da empatia, da interiorização do sofrimento do outro, da proximidade.

5. Transcrevo na íntegra uma reflexão em torno do assunto: “Quero adicionar algo de que quase sempre nos esquecemos. Para acolher verdadeiramente o outro, é importante que acolhamos a nós mesmos, que nos aceitemos como somos, com simplicidade e sinceridade, com nossos erros e limitações, sem complicações, com paz. Sempre acolhemos o outro a partir da nossa pobreza, das nossas limitações. Fazemos o que podemos pelo bem dessa pessoa. Não vamos além do que podemos” (p.83).

Maria, nossa discreta companhia

Maria,
Tu és cidadã da glória.
Dia após dia, no entanto, temos a certeza
de tua intercessão e de tua proximidade.
Nossa companheira, aquela que sempre insiste
que façamos o que o seu Filho manda,
que mudemos o coração para vivermos em plenitude.

Tu te fazes presente como a mãe dos desvalidos,
dos filhos abandonados.
Nossa Senhora dos andarilhos, nossa mãe da esperança,
estás presente em no cotidiano das tarefas monótonas,
de tantas coisas que nos esperam sem que nelas
vejamos muito sentido.

Tu te fazes presente nas horas de sofrimento
quando a noite é longa e ausência pesada;
quando o coração fica apertado com esperas e preocupações
e futuro incerto quando o medo de nós se apodera,
tu que estiveste ao pé da cruz, tu estás perto de nós.

O teu “sim” torna-se nosso sim
e desta forma nosso cotidiano ganha sentido.

Maria das coisas de todos os dias,
de todas as andanças,
andanças com as pernas e com o coração.
Maria de Nazaré, Maria de Belém, Maria da Glória,
Maria de Caná, Maria do Dia das Dores, Maria da manhã de Pentecostes.
Maria de Lourdes, Maria de Fátima, Maria Aparecida,
intercede por nós.

Os dois amigos

Uma história inventada ou verdadeira? Pouco importa. Elas nos interpela. Diz até onde vai nosso compromisso alegre no campo da amizade. Emocionante história. Somos capazes de arriscar a vida por uma promessa de amor?

O mais velho se chamava Frank e tinha vinte anos. O mais jovem era Ted e só tinha dezoito. Andavam sempre juntos desde o tempo da escola primária. Juntos se alistaram no exército. Ao partirem de casa prometeram a si mesmos e aos pais que um cuidaria do outro.Tiveram sorte. Os dois izeram parte do mesmo batalhão.

Ora, precisamente este batalhão foi enviado para a guerra. Guerra terrível no meio das areias do deserto. Durante um certo tempo permaneceram no acampamento protegidos pela aviação. Certa tarde veio a ordem de avançar no território inimigo. Os soldados caminharam por toda uma noite, sob a ameaça de um fogo infernal.

Na manhã o batalhão se reuniu num vilarejo. Ted não estava. Frank o procurou por toda parte entre os feridos e os mortos. Encontrou nome na lista dos desaparecidos.

Foi ter com o comandante.
– “Peço permissão para buscar meu amigo”, disse.
– “É muito perigoso, respondeu o comandante. “Já perdi o teu amigo. Agora vou também perder a ti. O bombardeio não termina”.

Mesmo assim Frank partiu. Depois de algumas horas encontrou Ted ferido mortalmente. Tomou em seus ombros. No caminho Frank foi atingido por um estilhaço. Mesmo arrastando-se chegou ao acampamento.

– “Valeu morrer para salvar um morto?” gritou-lhe o comandante.
– “Sim, porque antes de morrer, Ted me disse: Frank, que tu haverias de vir”.


Fonte: “Il canto del grillo”, Picole storie per l’anima, Bruno Ferrero

Silêncio

Silêncio não como ausência de ruído ou de vozes. Silêncio como um estado interior. Não é uma experiência reservada aos místicos, mas gente do dia a dia, como nós. Muitas pessoas, muitíssimas, ao menos uma vez na vida fizeram esta experiência, mais ou menos breve ou mais demorada, de um estado interior diferente: um estado mais alto de consciência e que foram deixados de lado todos os componentes habituais da vida mental ( ânsias, preocupações, sofrimentos, expectativas, medos, desilusões) dando lugar a uma paz imprevista, uma abertura, um sentimento de união com o Todo, um Silêncio (Raffaella Arrobio).

O autor

CADERNOS DE FORMAÇÃO
Maio de 2021

Em suas mãos o Caderno de Formação de maio de 2021, 2º ano da pandemia. Para ler em casa.

FREI ALMIR GUIMARÃES

freialmir@gmail.com