Vida Cristã - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

Caderno de Formação – Abril 2021

José e Nazaré ou o absoluto do silêncio

Este ano de 2021 é consagrado a São José. Esta página de Alain Corbin nos coloca diante do mistério do esposo de Maria e guardião da Sagrada Família. Junta José e Nazaré para nos falar do silêncio.

O silêncio de um homem, José, e de um lugar, Nazaré, estão estreitamente ligados: são dois silêncios absolutos. O pai adotivo de Jesus permanece mudo nas páginas das Escrituras. É o patriarca do silêncio. Inútil querer procurar uma única palavra dele nos quatro evangelhos. Quando Jesus demora mais tempo em meio aos doutores de Jerusalém, Maria e José ficam preocupados com sua ausência. É a mãe e não o pai que lhe dirige uma advertência. Em Belém, José se cala. Quando ouve em sonhos a palavra do anjo que lhe dá ordem de partir para o Egito (Mt 2,13), guarda total silêncio, e obedece sem pronunciar uma palavra sequer. A morte de José em Nazaré é silenciosa. Em suma, José respondeu por meio do silêncio a tudo o que lhe dizia respeito no evangelho de Mateus. Seu silêncio é o coração que escuta, absoluta interioridade. Ao longo de toda a sua vida contemplou Maria e José e seu silêncio significa superação da palavra.

José ilustra aquilo que Bossuet, no duplo panegírico que lhe consagrou, qualifica de severidade e humildade do silêncio. Para Bossuet, Nazaré é ao mesmo tempo um lugar e um tempo, o grande tempo do silêncio. Nunca, em lugar algum, pesaram ao longo do tempo, nem com tanta força, as emoções silenciosas.

Sem dúvida, Charles de Foucauld foi quem mais longamente refletiu sobre o silêncio de Nazaré. Desejou colocar Nazaré no centro de sua reflexão espiritual. Ao longo de seus escritos não cessou de desejar fazer de sua vida uma “vida de Nazaré”, quer dizer de humildade, de pobreza, de trabalho, de obediência, de caridade, de recolhimento, de contemplação. Tenta explicar, para viver melhor, silêncio desta vida obscura. Maria e José, conscientes de deterem um admirável tesouro, calam-se a fim de guarda-lo na solidão e no silêncio de uma vida escondida. Como eles, ninguém praticou o silêncio.

Charles de Foucauld ouve um dia Jesus lhe dizer evocando parte de sua vida: “Não cesso de vos instruir, não por palavras, mas por Meu silêncio”. De Foucauld acredita que quando Jesus estava ainda no seio de sua mãe, o silêncio de adoração atingiu seu mais alto pico. Charles de Foucauld acreditava que Maria e José nunca puderam usufruir de Jesus num silêncio tão perfeito. Na proximidade do Natal Charles de Foucauld medita sobre a vida de Maria e José, partilhada entre a adoração imóvel e silenciosa, as carícias, os cuidados necessários, devotados e ternos. Quando a noite caía, De Foucauld imaginava que Maria e José voltavam silenciosos e felizes sentar-se diante do berço de Jesus.


Alain Corbin, Histoire du silence, Albin Michel, Paris, p. 101-103

O que conta mesmo é o amor e nada mais? João 13, 31-35

“O resultado do individualismo é uma sociedade instalada no bem estar, composta de indivíduos respeitáveis que se comportam corretamente com todos os setores, mas que vivem encerrados em si mesmos, separados de sua própria alma e afastados de Deus e de seus semelhantes” (José Antonio Pagola).

♦ Tema do amor, mandamento e testamento do Senhor. Somos discípulos daquele que, por amor, deu sua vida no alto do madeiro. Ressoa sempre aos nossos ouvidos a palavra daquele que amou até o fim: amar a Deus de todo o coração, amor ao próximo como a nós mesmos, sadio amor por si mesmo. Não há maior amor do que dar a vida pelos seus. Amor, palavra gasta e desgastada, usada sem critério nem profundidade. E, no entanto, é a coisa mais importância em todas as existências. O amor nos cura da banalidade de termos dançado a dança macabra em torno de nós mesmos num pequeno e tacanho universo. Esquecendo de viver.

♦ No entardecer de nossas vidas seremos julgados pela qualidade de nosso amor pelos outros. Os primeiros cristãos eram conhecidos pelo amor que viviam e exprimiam. “Vede como eles se amam”. Como se vive concretamente o amor?

♥ Amar, antes de mais nada, é respeitar o outro o que se manifesta de muitos modos: acolhida, nunca expor o outro a situações que o diminuam aos olhos estranhos.

♥ É respeitar a dignidade do ser humano, feito à imagem de Deus.
Amar é olhar e escutar.

♥ Significa acolher o diferente e a diferença na cor, na raça, na cultura, na formação, na rudeza, na religião, em sua escolha no campo da sexualidade.

♥ O amor se traduz em gestos de serviço: dar banho num doente, visitar os abandonados e enfermos, carregar os fardos e assumir as tarefas de nossos queridos que estão cansados.

♥ Em nível mais amplo o amor significa a criação e implementação de políticas que zelem pela dignidade do ser humano: pão para a mesa, moradia digna para um filho de Deus, educação e instrução de qualidade, em suma, defender os direitos humanos.

♥ Amar é ter um aguçado senso de partilha em todos os níveis de uma vida.

♥ Amar significa não ser conivente com tudo aquilo que banaliza o ser humano, todo hedonismo tolo, toda existência açodada sem reflexão, sem silêncio, sem vida interior.

♥ Amar é fazer com que as pessoas redescubram sua verdade mais profunda e deixem de trilhar caminhos da superficialidade que pode tornar sua vida alguma coisa de inútil.

♥ Amar é cuidar anos a fio de um pai ou de uma mãe idosos deixando de lado escolhas lícitas que poderiam ser tomadas para dar tempo a quem precisa.

♥ Amar é preservar a boa fama do outro nas conversas, nos escritos e nas mensagens eletrônicas.

♥ Amar é adivinhar o que o outro necessita sem que ele precise dizer.

♥ Amar é desistir  de fazer da vida uma eterna luta de competição. O amor não se sente à vontade no clima da competição.

♥ Amar é gostar de estar junto com outros diante do Senhor

Casamento é feito para durar

Certamente casamento é feito para durar. Para o bem dos cônjuges, dos filhos e da sociedade. O amanhã do mundo depende de casais sólidos. A incapacidade de um amor conjugal duradouro torna tudo instável e problemático. Não conseguimos entender facilmente essa dança dos amores e humores. Casamento é construção que precisa atravessar as estações da vida.

Fundamental para durar será que cada um seja personalidade bem formada, que saibam o que querem, que tenham riquezas interiores, que não irreversivelmente pessoa ocas, que saibam mergulhar em silêncios tonificantes.

Dificilmente uma pessoa doentiamente desconfiada ou que nunca mereceu confiança tem casamento que dure. Paira um ar de incerteza no ar. Incerteza e desconfiança.

Necessário aceitar a possibilidade do conflito. Não se arranca os cabelos por nadinhas. O conflito é inevitável. Há os que jogam debaixo do tapete as dificuldades que não foram resolvidas ou dissolvidas. Com o andar da carruagem elas reaparecem potencializadas.

Lutar pelo relacionamento, ter vontade de ver o relacionamento progredir e não deixar as coisas rolarem. Adotar uma postura de vigilância, de crítica madura, aproximar-se do mistério do outro respeitosa, amorosa e exigentemente.

Fundamental querer comunicar: trabalho, alegrias e dificuldades com os filhos, encontros havidos, projetos, dinheiro (pouco ou muito). Não basta apenas esta comunicação. Importante partilhar sentimentos e emoções sentidos e ressentidos nas coisas do dia a dia. “Senti, gostei, me fez mal”. Para que a relação se solidifique será preciso conviver com sentimentos de um e de outro.

Delicadamente os esposos devem saber partilhar também as feridas, limitações, falhas. Será fundamental ter a vontade de dizer ou de confessar tais lacunas mutuamente: um perdão difícil de conceder, uma mágoa, bloqueios, querer amar e não saber amar. Somos todos feitos de fissuras e bloqueios.

Muitos casais limitam suas conversas às questões do filhos e das finanças…Cuidado, não esquecer de construir a casa sobre a rocha.

Deveríamos agora falar do casal diante do Senhor….Mas o espaço acabou…

Para rir e para pensar

No primeiro dia de aula, o professor trouxe um vidro enorme:
– Isto está cheio de perfume – disse a Miguel Brun e aos outros alunos. Quero medir a percepção de cada um de vocês. Na medida em que sintam o cheiro levantem a mão.
E abriu o frasco. Num instante, já havia duas mãos levantadas
– Posso abrir a janela professor? Suplicou uma aluna, enjoada de tanto perfume, e várias vozes fizeram eco. O forte aroma que pesava no ar, tinha se tornado insuportável para todos.
Então, o professor mostrou o frasco aos alunos, um por um. Estava cheio de água.

Fonte: Eduardo Galeano, O livro dos abraços, L&M Pocket, p. 156

Perder a vida para recebê-la toda inteira do Pai

Dia de trevas,
dia de combate, a Sexta-feira Santa.
No coração dos homens, existe angústia e abandono,
porque o mundo à sua volta é muito duro;
porque em si mesmos se dão conta que o tempo está fugindo
e que a morte já se apresenta e que roe sua existência;
porque estando divididos uns contra os outros não cessando de perpetuar neles mesmos o mal que padecem.

Dia em que a oração dos cristãos
mistura-se com os gritos de dor da humanidade,
meditando no relato da paixão do Salvador
como nos deu o discípulo amado:
o Senhor sobe ao calvário,
vestido de púrpura
cingido de uma coroa
carregando como cetro o instrumento de seu suplício,
cambaleando rumo ao lugar em que uma inscrição
vai apresentá-lo como rei,

Dia em que não se chora por um morto,
mas onde a morte precisa ser olhada de frente
com Aquele que, nesse dia,
consentiu em perder a vida
para recebê-la toda inteira do Pai

Dia de vitória!

(Sem nome de autor)

Nesta edição

CADERNOS DE FORMAÇÃO
Abril de 2021

Abril, começo de tempo menos calorento. Outono. No hemisfério norte, primavera. Eles lá de cima sempre celebram a Páscoa na primavera. Eis alguns textos para sua formação, reflexão e oração. Começamos com São José, falamos do tema do amor e da construção do casal.

Boa Leitura!
Frei Almir